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O BRASIL E A CADEIA MERCANTIL DO PETRÓLEO O moderno Sistema-Mundo capitalista, conforme destacado no

2.3 A INSERÇÃO DO BRASIL NA CADEIA MERCANTIL DO PETRÓLEO

2.3.2 A Petrobras e o Pré-Sal Hoje

A descoberta do pré-sal não só consolidou o antigo sonho brasileiro de autossuficiência em petróleo, como alçou o Brasil à décima posição entre os maiores produtores mundiais de petróleo. Hoje, o Brasil possui a segunda maior reserva de petróleo da América Latina, atrás somente da Venezuela (BP, 2016-a, p. 06), e em 2015 foi também o segundo maior produtor (Ibidem, p. 08). Maior descoberta desde Kashagan, no Cazaquistão, em 2000 (YERGIN, 2014, p. 265), a província do pré-sal, polígono de aproximadamente 800 quilômetros de extensão por 200 quilômetros de largura, localiza-se no litoral entre os estados de Santa Catarina e Espírito Santo, com área total de 149 mil quilômetros quadrados – três vezes e meia o estado do Rio de Janeiro. A província é composta por grandes acumulações de óleo leve, de excelente qualidade e com alto valor comercial. No final de 2015, as reservas totais de petróleo no Brasil eram de 24.390,7 milhões de barris. Deste total, 951,8 correspondiam às reservas em terra, e 23.438,9 às reservas no mar.

A figura a seguir apresenta o mapa do polígono do pré-sal brasileiro. Ao sul, temos a Bacia de Santos, e ao norte, a Bacia de Campos. De acordo com a legenda, pode-se perceber os diferentes modelos de exploração da província do pré-sal e do pós-sal: a área de Libra, única leiloada sob o regime de partilha, encontra-se em vermelho; em laranja, na Bacia de Santos, são encontradas as áreas cedidas à Petrobras no processo de cessão onerosa; em azul, às áreas do pré-sal operada pela Petrobras e parceiros que são anteriores ao regime de partilha – ou seja, como já haviam sido leiloadas, são exploradas sob o regime de concessão.

Figura 02: O Pré-Sal brasileiro

Fonte: PRE-SALT, 2017.

Deste modo, o objetivo desta seção é demonstrar, em dados, a inserção atual do Brasil e da Petrobras na cadeia mercantil do petróleo. Antes de tudo, é importante destacar que o petróleo, em 2015, ainda é o combustível dominante na matriz energética brasileira, correspondendo a 47% do total de consumo de energia (BP, 2016-c). A tabela a seguir mostra a evolução da produção de petróleo na última década:

Tabela 07: Produção de petróleo no Brasil, total anual e por localização – 2006-2015 (em mil barris):

Ano Produção Total Terra Mar

2006 628.797 70.841 557.956 2007 638.018 69.893 568.125 2008 663.275 66.337 596.938 2009 711.883 65.465 646.418 2010 749.954 65.973 683.981 2011 768.471 66.441 702.030 2012 754.409 66.046 688.363 2013 738.715 63.893 674.822 2014 822.930 61.577 761.353 2015 889.667 58.368 831.299

Dados: ANP. Anuário Estatístico, 2016 (ANP, 2016). Elaboração própria. Do total de petróleo produzido no Brasil em 2015, de 889.667.381 barris de petróleo, a Petrobrás foi responsável por 92,4%, seguida pela Statoil, com 2,97%, e pela Shell, em terceiro lugar, com 2,64% (ANP, 2016). Também se destaca a importância da exploração e produção no mar, que em 2015 representou 93,4% da produção total de petróleo do país.

Com relação à Petrobras, a exploração e a produção são as suas atividades centrais. No total, considerando os campos do pré-sal e fora dele, a produção da empresa vem crescendo nos últimos anos: em 2015, a empresa realizou uma produção média diária de 2,13 milhões de barris de petróleo por dia, um crescimento de 4,6% em relação ao ano anterior (PETROBRAS, 2015, p. 15). Se considerarmos também a extração de gás natural em 2015, que cresceu 9,8% em comparação a 2014, a produção total da Petrobras chega a 2,6 milhões de barris de óleo equivalente por dia (boed) (Idem).

Além do mais, a produção no pré-sal já é uma realidade: menos de dez anos depois da primeira descoberta, a marca de um milhão de barris de óleo equivalente (petróleo e gás natural) por dia no pré-sal foi atingida em maio de 2016 – e apenas dois anos depois de alcançada a

marca de 500 mil barris diários, em 2014 (PETROBRAS, 2016). Em comparação, a Petrobras levou 45 anos, a partir da sua criação, para atingir a produção do primeiro milhão de barris, em 1998, o que mostra a alta produtividade do pré-sal e a capacidade tecnológica da Petrobras. (Idem). Além disso, o custo médio de extração do petróleo no pré-sal vem sendo reduzido ao longo dos últimos anos: passou de 9,1 dólares por barril de óleo equivalente em 2014, para 8,3 dólares em 2015, e no primeiro trimestre de 2016 atingiu um valor inferior a oito dólares por barril (Idem).

A alta produtividade do pré-sal também é evidente na comparação do número de poços: a Petrobras precisou, em 1984, de 4.108 poços produtores para chegar à marca de 500 mil barris diários; já no pré-sal, foram necessários 53 poços para alcançar o dobro desse volume de produção (Idem). O volume produzido por poço no pré-sal da Bacia de Santos é em torno de 25 mil barris de petróleo por dia, muito acima da média da indústria; dos dez poços mais produtivos do Brasil, nove estão localizados nesta área – sendo o mais produtivo o campo de Lula, antiga área de Tupi (Idem).

Percebe-se também um aumento gradual na capacidade de refino brasileira na última década. A tabela a seguir apresenta a evolução da capacidade total de refino no Brasil, além do fator de utilização das refinarias, que considera o petróleo efetivamente processado no ano:

Tabela 08: Capacidade de refino brasileira e fator de utilização – 2006-2015 (em barris/dia):

Ano Capacidade* Utilização

2006 1.942.007 90,3% 2007 1.960.530 91,1% 2008 1.972.929 89,9% 2009 1.988.166 91,1% 2010 1.988.166 91,2% 2011 2.010.221 92,8% 2012 2.000.660 96,3% 2013 2.093.278 98,2% 2014 2.234.804 94,3% 2015 2.277.826 87,1%

Dados: ANP. Anuário Estatístico, 2016 (ANP, 2016). Elaboração própria. *Capacidade de refino: 95% da capacidade nominal

Pertencem à Petrobras, atualmente, as seguintes: Refinaria Abreu Lima; Refinaria Potiguar Clara Camarão; Refinaria Landulpho Alves; Refinaria Lubrificantes e Derivados do Nordeste; Refinaria Capuava; Refinaria Duque de Caxias; Refinaria Alberto Pasqualini; Refinaria Gabriel Passos; Refinaria Isaac Sabbá; Refinaria Presidente Getúlio Vargas; Refinaria Presidente Bernardes; Refinaria de Paulínia e a Refinaria Henrique Lage. Somam-se, ainda, o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), em construção, e a Unidade de Industrialização do Xisto (SIX), no Paraná.

Tabela 09: Capacidade de refino por refinaria – 2015 (em barris/dia):

Dados: ANP. Anuário Estatístico, 2016 (ANP, 2016). Elaboração própria. * Pertecem à Petrobras; ** Participação acionária da Petrobras.

Do volume total de petróleo processado nas refinarias brasileiras pela Petrobras em 2015, 86% foram provenientes de campos brasileiros (PETROBRAS, 2015, p. 18). No exterior, as três refinarias da Petrobras95 processaram em 2015 um total de 138 mil barris de petróleo e líquido de gás natural (LGN) e produziram 149 mil barris de petróleo por dia de derivados (Idem). Porém, conforme tratado

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Nos Estados Unidos, por meio da Pasadena Refining System (PRSI), a

Petrobras opera uma refinaria

com capacidade de processar 100 mil bpd de petróleo. No Japão, em abril de 2015, a Companhia decidiu encerrar as operações de refino da Nansei Sekiyu Kabushiki Kaisha (NSS), com capacidade de processar 100 mil bpd de petróleo, em Okinawa, assunto que será abordado posteriormente. Na Argentina, por meio da participação na Petrobras Argentina S.A. (PESA), a Petrobras opera a Refinaria de Bahia Blanca, com capacidade de processar 30,5 mil bpd de petróleo (PETROBRAS, 2015, p.18).

anteriormente, é importante destacar que, em nível global, o Brasil participou em 2015 com apenas 2,3% da capacidade de refino total (BP, 2016-a, p. 17).

No setor de transporte, a Petrobras possui outra subsidiária, a Petrobras Transportes S.A. (Transpetro), que se encarrega das atividades de transporte e armazenamento de petróleo e derivados, álcool, biocombustíveis e gás natural (PETROBRAS, 2016-a). A empresa foi criada em 1998 e é hoje a maior empresa de transporte e logística do Brasil, sendo responsável por mais de 14 mil quilômetros de dutos, entre gasodutos e oleodutos, que interligam todas as regiões brasileiras; além disso, possui 48 terminais, aquaviários e terrestres, e uma frota de 60 navios-petroleiros, fazendo a conexão entre as áreas de produção, refino e distribuição da Petrobras e atuando na importação e exportação de petróleo e derivados, de biocombustíveis e de gás natural (Idem). A Transpetro, além da Petrobras, principal cliente, presta serviços a distribuidoras e à indústria petroquímica.

Uma das etapas mais importantes da atuação da Petrobras é a distribuição dos seus produtos para os consumidores e a movimentação da agropecuária, aviação, ferrovias, termelétricas, frotas de veículos e indústria (Idem). A BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras, é hoje líder da distribuição de derivados de petróleo e biocombustíveis no Brasil, contando com uma rede de mais de 7.500 postos em todas as regiões, onde são vendidos combustíveis e lubrificantes; além do mais, a empresa possui postos fora do Brasil no Chile, Colômbia Paraguai e Uruguai (Idem). Deste modo, a BR Distribuidora atua na distribuição, comercialização e industrialização de produtos de petróleo e derivados, além de atividades de importação e exportação (Idem). A tabela a seguir mostra a participação das distribuidoras nas vendas de derivados de petróleo no mercado nacional, destacando a posição de liderança da BR Distribuidora:

Tabela 10: Participação das distribuidoras nas vendas nacionais de derivados de petróleo – 2015 (em porcentagem):

Dados: ANP. Anuário Estatístico, 2016 (ANP, 2016). Elaboração própria. 96 97 Com relação à distribuição de combustíveis automotivos, a tabela a seguir apresenta a quantidade de postos revendedores de combustíveis automotivos, por bandeira, no ano de 2015. Pode-se perceber que, apesar de a área da distribuição não ter sido objeto de monopólio da Petrobras como os demais nódulos da cadeia mercantil, a empresa apresenta uma proeminência notável – seguida de outra companhia nacional, a Ipiranga:

Tabela 11: Quantidade de postos revendedores de combustíveis automotivos – 2015:

Distribuidora Total de Postos

BR 8.069 Ipiranga 6.042 Raízen 4.986 Alesat 1.537 Bandeira Branca 16.228 Outras 3.940 Total 40.802

Dados: ANP. Anuário Estatístico, 2016 (ANP, 2016). Elaboração própria.

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A Raízen é a licenciada da Shell no Brasil. 97

A ALE Combustíveis é uma empresa brasileira de capital fechado criada em 2006.

A BR Distribuidora também é a líder nas vendas nacionais de etanol hidratado, participando de 20% das vendas totais (ANP, 2016). De um total de 140 distribuidoras, a Ipiranga ocupa o segundo lugar, participando de 19,2% das vendas nacionais; em terceiro lugar, a Raízen, com 19,1% das vendas totais (Idem). No exterior, a Petrobras atua no segmento de distribuição no Chile, com 279 postos de serviço; na Argentina, com 265 postos; no Paraguai, com 180 postos; no Uruguai, com 87 postos; e na Colômbia, com 115 postos (PETROBRAS, 2015, p. 22). O market share da Petrobras nestes países é de aproximadamente 12%; 6%; 19%; 23%; e 4%, respectivamente (Idem).

Além disso, é distribuído no Brasil o GLP, ou gás de cozinha, pela Liquigás, outra subsidiária da Petrobras. Com relação à participação nas vendas nacionais de GLP, a Liquigás ocupa a posição de segunda maior distribuidora, participando de 22,6% das vendas (ANP, 2016). A maior distribuidora de GLP no Brasil é a Ultragaz, empresa fundada em 1937 que deu início e faz parte do Grupo Ultra (Ultrapar Participações S/A), detendo 23% das vendas nacionais (Idem). Por fim, a Petrobras ainda possui duas Fábricas de Fertilizantes Nitrogenados, na Bahia, no Sergipe e no Paraná, sendo a maior produtora no Brasil. Os fertilizantes, parte da cadeia do gás natural, possuem papel na indústria e na agropecuária. No segmento petroquímico, a Petrobras atua por meio de empresas controladas, coligadas ou controladas em conjunto. São elas: a Braskem (36,2% do capital), uma das maiores empresas do setor petroquímico no mundo, detida em parceria da construtora Odebrecht; a Deten Química S.A (27,88% do capital); Metanor S.A/Copenor S.A (34,54%); Fábrica Carioca de Catalisadores (50% do capital); Petrocoque S.A (50% do capital); Companhia Petroquímica de Pernambuco – Petroquímica Suape (100% do capital) e Companhia Integrada Têxtil de Pernambuco – Citepe (100% do capital) (PETROBRAS, 2015, p. 20).

Em 1998, foi criada a Petrobras Gás S.A. (Gaspetro), subsidiária da Petrobras com participação em sociedades que desempenham atividades de comercialização, importação, exportação, armazenamento e distribuições de gás natural. A empresa possui participação acionária em dezenove empresas de distribuição de gás natural. Já em 2008, foi criada a Petrobras Biocombustível, subsidiária da Petrobras para a produção de biodiesel e etanol, buscando a diversificação da matriz energética brasileira e a redução da emissão dos gases de efeito estufa (PETROBRAS, 2016-a).

Deste modo, percebe-se que, atualmente, a Petrobras se insere de forma diferente na cadeia mercantil do petróleo. Se ao longo do século passado o Brasil era um consumidor moderado e produtor marginal de petróleo, hoje ele figura entre os maiores produtores mundiais; além disso, abre-se a possibilidade de investimento ao longo de todos os elos da cadeia mercantil, por exemplo, no setor de refino, a fim de que o país possa inserir-se nos elos mais produtivos da cadeia, de maior lucratividade, em vez de tornar-se um exportador de petróleo cru.