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UNIDADES TEMÁTICAS

4 Plano da Caracterização e Análise do contexto de inclusão e exclusão no trabalho

3.1 Planos teóricos da análise

3.1.2 Plano da relação Trabalho e Educação

Os trabalhos categorizados neste plano teórico analisam as relações entre trabalho e educação, no contexto da sociedade capitalista e se estruturam dentro de duas unidades temáticas: a) Formação Profissional/Profissionalização e b) Trabalho e educação na sociedade capitalista.

Lancillotti (2001) discute a profissionalização de pessoas com deficiência auditiva, física, intelectual, múltipla e visual mediante análise de três periódicos que tratam da relação trabalho e deficiência, no período 1988 e 1998, e análise de campo em 46 empresas do mercado formal de Mato Grosso do Sul. A pesquisadora observa que a inadequação dos processos de formação da pessoa com deficiência, o preconceito e o desconhecimento de limites e possibilidades da deficiência, compõem as principais dificuldades impostas à inclusão da pessoa com deficiência no trabalho. Além disso, busca

compreender como o plano teórico se relaciona com o plano empírico, analisando duas leis federais que favorecem a inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho e realizando entrevista semiestruturada junto ao setor de pessoal das empresas pesquisadas.

Os resultados demonstraram que existe uma predominância de pessoas com deficiência física contratadas pelas empresas em detrimento da deficiência intelectual. Outro aspecto que merece destaque são os inúmeros arranjos contratuais feitos, considerando o alto número de trabalhadores terceirizados, com vínculos temporários, sujeitos ao não atendimento de direitos conquistados historicamente pelos trabalhadores, mascarando assim sua exclusão pela via da inclusão desregulamentada e precarizada no trabalho, o que foi corroborado em sua pesquisa de mestrado (LANCILLOTTI, 2003).

Mendes et al (2004) realizam uma análise crítica da produção científica discente de programas de pós-graduação em Educação e Psicologia, acerca da profissionalização de pessoas com deficiências no Brasil, realizadas pela UFSCar, UERJ, UNB, UFMG, UFPR, PUC-SP E UFRGS. Assim como as demais pesquisas na área, constatam os autores que os programas de formação ainda são precários e inadequados tanto às necessidades das pessoas com deficiência quanto às demandas do mercado competitivo. Observam ainda que há uma predominância em trabalhos de natureza descritiva e com foco em pessoas com deficiência intelectual de grau leve.

Embora as oficinas contribuam para o desenvolvimento da pessoa com deficiência intelectual como um todo, o distanciamento da formação das demandas do mercado também é conclusão a que chega a pesquisa de Costa et al (2011), que investiga como ocorre a qualificação profissional de pessoas com deficiência intelectual na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE de cinco cidades mineiras. Para isso, entrevista cinco professoras, 18 alunos e uma psicóloga. Tal trabalho destaca que, de acordo com os percentuais de absorção, as pessoas com deficiência intelectual ainda permanecem excluídas do mercado em comparação às demais deficiências.

Figueiredo e Johann (2013), por sua vez, discutem o Processo de Educação Profissional e Colocação no Trabalho (PECT), implementado pela Federação Nacional das APAE’s, no contexto da reestruturação produtiva do capital na década de 90. A pesquisa demonstra que a formação da pessoa com deficiência responde às transformações sociais, econômicas, políticas e culturais características dessa década, demandando para o trabalhador com deficiência as competências e habilidades requeridas pelo discurso toyotista de qualificação e requalificação. Ao trabalhador é atribuída a responsabilidade

pelo seu sucesso ou insucesso no mercado de trabalho, mascarando as estratégias excludentes do capitalismo.

Assim como Figueiredo e Johann (2013), Aroucha (2012) também contempla a análise de contexto ao analisar o processo de escolarização e de inserção da pessoa com deficiência auditiva no mercado de trabalho em São Luís, no Maranhão. Destaca que a sociedade atual exige um trabalhador polivalente, capaz de se ajustar às velozes e flexíveis demandas do mundo do trabalho contemporâneo, em consonância com o discurso de produtividade capitalista. Deste modo,

Trabalhar numa sociedade nas condições em que vivemos atualmente, requer atender a critérios, como nível de escolaridade, trabalho em equipe, habilidade de desenvolver várias atividades, manejar diversas máquinas, conhecimentos sobre tecnologia e informática, domínio de mais de um idioma, entre outros. Ao analisar essas exigências, percebe-se muitas pessoas excluídas dos postos de trabalho. Pois a forma de organização do trabalho em vigência exige flexibilidade do homem para adequar-se ao demandado pelo setor produtivo, comandado pelo consumo (AROUCHA, 2012, p. 77).

A profissionalização da pessoa com deficiência no Brasil também é discutida por Santos, Rezende e Gomide Neto (2012), mas a partir de uma análise histórica da formação da pessoa com deficiência e de sua inserção no mercado de trabalho. Demonstram que a profissionalização da pessoa com deficiência passou por etapas distintas, atreladas às concepções que marcaram a educação desses sujeitos, e que evoluíram desde a segregação em asilos e instituições específicas para atendimento dos considerados “diferentes”, passando pela integração em ambientes educacionais e chegando, bem recentemente, à fase da inclusão, cuja acepção incorpora conceitos como cidadania, participação, pertencimento, aceitação, direitos humanos e escolha.

Na segunda unidade temática, Costa, fundamentada nos estudos de Adorno sobre a Indústria Cultural e a pseudoformação, analisa a educação e o trabalho como elementos fundantes da formação humana, e propõe repensar a relação entre trabalho, educação e adaptação, partindo do pressuposto de que

a participação social ocorre, em nossa época, predominantemente e contraditoriamente pelo trabalho, e que a deficiência por si só não exclui (ou não deveria excluir) os indivíduos das oportunidades disponíveis nas diferentes instâncias sociais (COSTA, 2005, p. 1).

Neste ensaio, aponta para o fato de que a educação na sociedade contemporânea ainda é fortalecedora da adaptação dos indivíduos, sem a preocupação com a emancipação humana, seja ela de pessoas com deficiência ou não.

Assim como Costa (2005), Neres e Corrêa (2008) também versam sobre a relação trabalho e educação na sociedade capitalista contemporânea, mas o fazem a partir de uma análise da categoria trabalho na educação da pessoa com deficiência visual. Os autores tecem suas reflexões a partir dos pressupostos teóricos de significação do trabalho em Marx. Percorrem a história, pontuando relações, ao longo do tempo, entre educação, trabalho e deficiência, demonstrando como a sociedade, em cada período histórico, se relacionou com o trabalho e como posicionou a pessoa com deficiência no contexto de valorização ou não desta categoria. Com isso, corroboram os estudos que mostram que a pessoa com deficiência passa a ser incluída, quando representa, de algum modo, a agregação de valor ao processo produtivo, em outras palavras, quando é útil aos interesses de reprodução do capital. Sua incorporação ao mercado ocorre como forma de aproveitamento máximo da força de trabalho disponível socialmente. As autoras observam esta tendência do capitalismo desde o seu surgimento, com a introdução da máquina na produção e a ascensão da burguesia.

Pode-se dizer que a divisão do trabalho, imposta pelo emprego da máquina (parcelamento e simplificação de tarefas) permitiu a incorporação de mulheres, crianças e também de ‘deficientes’ na produção. Percebe-se, então, que na sociedade capitalista todo empenho deve ser feito para transformar todos os homens (deficientes ou não) em trabalhadores (homens livres capazes de vender sua força de trabalho) (NERES; CORRÊA, 2008, p. 156).

Constatamos que as pesquisas do presente plano teórico fundamentam suas ilações em uma análise de contexto das relações entre educação e trabalho. Compreendem que esta relação não só diferencia o homem dos demais animais, mas o caracteriza como ser de produção, que é capaz de transformar a natureza para atender suas necessidades e, deste modo, transformar-se a si mesmo, construindo relações com outros homens e gerando novos conhecimentos. Nesta medida, buscam compreender a inserção produtiva da pessoa com deficiência, especificamente no modo de produção capitalista.

Em sua maioria, analisam as apropriações, pelo sistema capitalista, do discurso e prática da inclusão e do acolhimento da diversidade, num contexto contraditoriamente caracterizado pela exclusão. Percebem que o modelo vigente diferencia os trabalhadores entre si por seus atributos individuais de eficácia. Conforme destaca Carvalho-Freitas, no entanto,

Ainda que a inclusão dessas pessoas mantenha as contradições próprias às relações de trabalho capitalistas, transformando as diferenças em mercadoria e em diferencial competitivo para as organizações, ela abre possibilidades para um ordenamento social menos discriminatório (CARVALHO-FREITAS, 2009, p.135).

Percebemos, deste modo, que, ao fazerem uma análise a partir do contexto mais amplo, compreendem as múltiplas dimensões dos processos includentes e excludentes, tanto educacional quanto produtivo, pelas relações dialéticas que se estabelecem entre tais processos e nos quais estão inseridos trabalhadores com e sem deficiência.