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Não nos podemos alongar sobre a relação desta cozinha com o resto das peças, dado que não é conhecida a distribuição exata deste corpo nos pisos além do térreo.

URBANAS DO SÉC

46 Não nos podemos alongar sobre a relação desta cozinha com o resto das peças, dado que não é conhecida a distribuição exata deste corpo nos pisos além do térreo.

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Fig. 64 Hôtel de Sens. 2013. Vista do pátio para fachada do corpo principal. O arco abatido substitui a arcada original. A estrutura do oratório também já não é visível.

Fig. 65 Hôtel de Sens. Portal da torre da escada. 2013. O edifício encontrava-se em manutenção.

Fig. 66 Hôtel de Sens. Portal da torre da escada. 2013. Vista do interior da torre.

Fig. 67 Hôtel de Sens. Entrada naquela que seria a sala de aparato. 2013. Vista do interior da torre.

era acedida por meio de um átrio com arcada de três tramos (aspecto que já não podemos ver hoje). Seria uma peça bem à vista de quem entrasse a cavalo pelo portal principal, que funcionava, certamente, como área de recepção coberta apenas para o privilégio do arcebispo e dos seus convidados. Dadas as limitações de espaço, que não existiam numa residência rural, esta era uma condição muito urbana e complexa, a de ter que incluir os espaços destinados aos estábulos na organização espacial do lote, o que resultava numa relação mais próxima entre estes e os espaços de recepção e de recolhimento.

O corpo principal, localizado no centro do lote, está implantado transversalmente, tendo as peças da enfilade original a direção Norte-Sul, o que permitia que cada uma delas tivesse uma exposição solar nas duas fachadas mais longas, a nascente e a poente. Muito embora, no Inverno, apenas a fachada a partir do primeiro piso se encontre exposta ao Sol - o que evidência as superiores qualidades habitacionais deste corpo comparativamente com os restantes [fig.64].

Relativamente à distribuição das peças interiores, mais uma vez o pátio e a escada [fig.65-67] desempenhavam um papel fundamental na sua articulação. Através de dois degraus, passando mesmo ao lado da destacada estrutura de dois tramos e abóbadas de cruzaria que suportavam o oratório do piso superior, era possível aceder à primeira sala de aparato, dotada de uma câmara e com acesso ao jardim através de uma peça estreita que funcionava apenas como passagem. Através dela e da escada, tal como no hôtel anterior, a cozinha podia servir a sala. Embora estivesse encostada ao corpo principal, uma parede encerrava a comunicação direta. Apenas uma peça reservada ao armazenamento, provavelmente uma adega, tinha uma ligação mais próxima com a sala.

Mas a peça de maior aparato era a sala grande do piso superior [fig.68]. A esta acedia-se pela escada em espiral, que cumpria assim a função de aparato.

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Fig. 68 Hôtel de Sens. Reconstituição do piso 1. Legenda: 1 grande sala de aparato; 2 antecâmara; 3 câmara de dormir; 3’ guarda-roupa ou gabinete; 4 gabinete; 5 oratório; 6 grande câmara de dormir; 7 grande gabinete; 8 pequeno gabinete; Escala 1.400 1 2 3 4 5 6 7 8 3’ 3’

Fig. 69 Hôtel de Sens. Fachada do corpo principal. Vista do pátio

Esta sala, também servida pela cozinha através da escada, encontrava-se entre dois aposentos privados. A nascente, a enfilade era composta por cinco peças, sendo as duas primeiras uma antecâmara e uma câmara com ligação à sala de aparato. Já as restantes peças eram dependências. Por sua vez, a poente, estavam os aposentos principais dotados com toda a especificidade de peças conhecidas: gabinete, oratório, antecâmara, grande câmara de dormir, grande gabinete, terminando em três dependências mais pequenas. Assim, o gabinete, o oratório e a antecâmara, dominavam o pátio.

A composição geral das fachadas viradas ao pátio, reflete não só a posição de destaque da escada em espiral, com a sua torre protuberante que se prolonga em altura para lá da cota do telhado e, consequentemente, da sua função de distribuição vertical, mas também a funcionalidade que é inerente à abertura dos seus vãos. Estes são dispostos ‘onde são precisos’ e variam de dimensão. O que se mantém em todos é, de facto, a sua tendência vertical, para captar mais luz, e o recurso a mainéis de pedra, que permitem sustentar tais aberturas e respectivos caixilhos. Mas não se pode deixar de referir a simetria ‘local’ dos três tramos dos dois estratos que eram compostos pela arcada e pelos vãos da antecâmara [fig.61].

No que diz respeito ao corpo principal [fig.69], ainda se observa um friso e uma cornija que marcam dois estratos, embora o topo Norte tenha sido recuperado e não corresponda inteiramente ao plano original e aos registos gráficos. Dos três, o segundo destaca-se claramente, acompanhando a presença das peças interiores de aparato e dos aposentos principais, através dos vãos mais altos e de um segundo friso que os acompanha e emoldura, o que relembra um piano nobile italiano, coroado por duas lucarnas com os seus dois pináculos laterais, arco conopial (ambos com cogulhos) e rendilhado de pedra. Um gesto muito ‘francês’, ao modo do gótico flamejante.

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Fig. 70 Hôtel de Sens. 2013.

Fig. 71 Hôtel de Sens. Torreão. 2013. Fig. 72 Hôtel de Sens. Lucarnas flamejantes 2013.

Residências Senhoriais Urbanas |7 A presença do friso, que já vimos em Vincennes, é uma das primeiras

evidências clássicas que surgem na composição das fachadas na arquitetura francesa. Neste caso, denota uma procura em conferir uma certa unidade horizontal a todo o conjunto, acompanhando a disposição dos corpos longitudinais.

Não obstante, nota-se uma atitude de certo modo contraditória, que se revela sobretudo nas fachadas do perímetro exterior. Embora, de um modo geral, os dois frisos e a cornija percorram todas as fachadas, estes são continuadamente interrompidos na sua horizontalidade, perdendo por vezes a sua ação de estratificação horizontal.

Considerando a fachada Sul e nascente [fig.70], já que as restantes foram modificadas posteriormente relativamente ao seu estado original, a primeira apresenta uma regularidade no ‘trajeto’ dos frisos e da cornija e uma certa simetria e equilíbrio na sua composição, conferida não pelos vãos, que “[...]

they would have been smaller and fewer than are seen today [...]”47, mas pelo

portal quase central e pelos dois torreões laterais. Os frisos e a cornija continuam e ‘dobram’ para a fachada nascente, que contém os dois portais do acesso principal. Contudo, estes são mitigados pela verticalidade, uma máxima do Gótico flamejante, através dos arcos apontados que circunscrevem os portais, das lucarnas flamejantes [fig.71], dos alongados torreões [fig.72] e até do telhado de duas águas com a sua empena bastante apontada. Aqui, a vontade de conferir uma maior riqueza estrutural e decorativa à entrada de aparato, digna do estatuto dos arcebispos, interfere com a leitura global da sua composição. Ou seja, a fachada que demonstra um maior esforço compositivo denota que não existia ainda um domínio total dos elementos clássicos e, essencialmente, de como conjugá-los com a tradição construtiva francesa. O que não será alheio ao facto desta não ter sido uma obra de autoria, pelo que se conhece.

47 THOMSON, David; Renaissance Paris: Architecture and Growth, 1475-1600; Berkeley: University of California Press; 1984; p. 40.

A presença do friso, que já vimos em Vincennes, é uma das primeiras evidências clássicas que surgem na composição das fachadas na arquitetura francesa. Neste caso, denota uma procura em conferir uma certa unidade horizontal a todo o conjunto, acompanhando a disposição dos corpos longitudinais.

Não obstante, nota-se uma atitude de certo modo contraditória, que se revela sobretudo nas fachadas do perímetro exterior. Embora, de um modo geral, os dois frisos e a cornija percorram todas as fachadas, estes são continuadamente interrompidos na sua horizontalidade, perdendo por vezes a sua ação de estratificação horizontal.

Considerando a fachada Sul e nascente [fig.70], já que as restantes foram modificadas posteriormente relativamente ao seu estado original, a primeira apresenta uma regularidade no ‘trajeto’ dos frisos e da cornija e uma certa simetria e equilíbrio na sua composição, conferida não pelos vãos, que “[...]

they would have been smaller and fewer than are seen today [...]”47, mas pelo

portal quase central e pelos dois torreões laterais. Os frisos e a cornija continuam e ‘dobram’ para a fachada nascente, que contém os dois portais do acesso principal. Contudo, estes são mitigados pela verticalidade, uma máxima do Gótico flamejante, através dos arcos apontados que circunscrevem os portais, das lucarnas flamejantes [fig.71], dos alongados torreões [fig.72] e até do telhado de duas águas com a sua empena bastante apontada. Aqui, a vontade de conferir uma maior riqueza estrutural e decorativa à entrada de aparato, digna do estatuto dos arcebispos, interfere com a leitura global da sua composição. Ou seja, a fachada que demonstra um maior esforço compositivo denota que não existia ainda um domínio total dos elementos clássicos e, essencialmente, de como conjugá-los com a tradição construtiva francesa. O que não será alheio ao facto desta não ter sido uma obra de autoria, pelo que se conhece.

47 THOMSON, David; Renaissance Paris: Architecture and Growth, 1475-1600; Berkeley: University of California Press; 1984; p. 40.

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Fig. 73 Paris. Planta atual. Localização hôtel de Cluny. Sem escala.

Fig. 74 Hôtel de Cluny. 2013. Os dois portais e o muro canelado com a torre da escada e as lucarnas como pano de fundo.

Residências Senhoriais Urbanas |8 Este tipo de entrada é um desenvolvimento daquilo que se pode encontrar

na rue des Archives, o portal do hôtel de Clisson. Construído quase cem anos antes, o que resta da fachada apresenta igualmente um portal circunscrito num arco apontado e os dois torreões de vigia laterais.

Pode-se então afirmar, relativamente ao hôtel de Sens, que está presente uma tentativa de conjugar três aspectos: uma vontade de isolamento face à envolvente urbana, que resulta no uso de dispositivos da linguagem construtiva tradicional, contrastante com a maior abertura dos vãos das fachadas interiores; uma aspiração Gótica à verticalidade, que se procura conjugar com aspecto seguinte; a tentativa, mais clássica, de equilibrar e unificar a composição das fachadas. Indicia-se também o pátio como elemento organizador e de transição, a escada como elemento de articulação e sectorização dos espaços interiores, a implantação destacada do corpo principal, com o jardim no seu tardoz.

O hôtel Cluny (1485-1498), situado na margem esquerda do rio Sena, justaposto às termas de Cluny, na atual Place Paul-Painlevé [fig.73], é um exemplo bem conservado e mais evidente dessas características. Foi completado por Jacques d’Amboise (c.1450-1516), que na altura “réunissait en

même temps les titres d’évêque de Clermont, d’abbé de Cluny, d’abbé de Jumièges et d’abbé de Saint-Alyre, reprit, en 1490, l’oeuvre de son prédécesseur [foram dois, Pierre de Chaslus e Jean de Bourbon], et la conduisit jusqu’à entière perfection”48. Amboise, descendente de uma família que detinha vários títulos eclesiásticos

e nobiliárquicos, continuou a construção a partir das fundações. Uma ação englobada numa iniciativa de reconstrução de edifícios da ordem, nomeadamente o Collége de Cluny e a sua capela, entretanto demolidos no tempo Haussmann (1809-1891) e que pertenciam à antiga Universidade de Paris desde meados do séc. XII. De facto, o património da família Amboise teve um importante papel na introdução de novos ‘gostos’ na arquitetura e

Este tipo de entrada é um desenvolvimento daquilo que se pode encontrar na rue des Archives, o portal do hôtel de Clisson. Construído quase cem anos antes, o que resta da fachada apresenta igualmente um portal circunscrito num arco apontado e os dois torreões de vigia laterais.

Pode-se então afirmar, relativamente ao hôtel de Sens, que está presente uma tentativa de conjugar três aspectos: uma vontade de isolamento face à envolvente urbana, que resulta no uso de dispositivos da linguagem construtiva tradicional, contrastante com a maior abertura dos vãos das fachadas interiores; uma aspiração Gótica à verticalidade, que se procura conjugar com aspecto seguinte; a tentativa, mais clássica, de equilibrar e unificar a composição das fachadas. Indicia-se também o pátio como elemento organizador e de transição, a escada como elemento de articulação e sectorização dos espaços interiores, a implantação destacada do corpo principal, com o jardim no seu tardoz.

O hôtel Cluny (1485-1498), situado na margem esquerda do rio Sena, justaposto às termas de Cluny, na atual Place Paul-Painlevé [fig.73], é um exemplo bem conservado e mais evidente dessas características. Foi completado por Jacques d’Amboise (c.1450-1516), que na altura “réunissait en

même temps les titres d’évêque de Clermont, d’abbé de Cluny, d’abbé de Jumièges et d’abbé de Saint-Alyre, reprit, en 1490, l’oeuvre de son prédécesseur [foram dois, Pierre de Chaslus e Jean de Bourbon], et la conduisit jusqu’à entière perfection”48. Amboise, descendente de uma família que detinha vários títulos eclesiásticos

e nobiliárquicos, continuou a construção a partir das fundações. Uma ação englobada numa iniciativa de reconstrução de edifícios da ordem, nomeadamente o Collége de Cluny e a sua capela, entretanto demolidos no tempo Haussmann (1809-1891) e que pertenciam à antiga Universidade de Paris desde meados do séc. XII. De facto, o património da família Amboise teve um importante papel na introdução de novos ‘gostos’ na arquitetura e

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Fig. 75 Hôtel de Cluny. 2013. Os dois portais de entrada.

arte em geral em França49, mais concretamente com a construção do Palais de Justice de Rouen (final do séc. XV e início do séc. XVI) e a reconstrução do château Gaillon (1502).

Neste hôtel, o corpo principal está implantado no meio do lote, afastado da rua [fig.74], dividindo o lote entre pátio e jardim. Os dois corpos laterais completam a formação do pátio. Difere do hôtel de Sens pela organização mais regular e clara, e pela relação entre a rua e o pátio, que se dá por meio de um muro de pedra, e não pelo corpo do edificio. O acesso é igualmente realizado por meio de dois portais, cada um com o mesmo propósito [fig.75]. Ambos são realizados por meio de arcos abatidos, circunscritos por arcos em relevo que descarregam em mísulas. O portal mais pequeno, decorado por dois finos colunelos laterais que parecem dissolver-se na parte superior, tem um o arco conopial em relevo com cogulhos. O maior, emoldurado por relevos vegetalistas, tem um arco abatido em relevo.

A entrada mantém o seu destaque na composição da fachada, assim como em Sens, embora com contornos diferentes, já que a riqueza decorativa dos portais contrasta com muro de pedra, como se estes tivessem um pano de fundo, ganhando ainda mais destaque pela clareza e não pela complexidade. É um aspecto distinto, que lhe confere uma aparência mais leve e menos fortificada, quase transparente, proporcionada também pelo recorte canelado na parte superior do muro, que permite ao passante “[...] a view

from the street of the house’s crown of cornice and dormers”50 e a torre

proeminente. Esta permeabilidade visual, para o interior do lote, desde a rua, seria certamente impensável para os edifícios em que a fortificação e defesa eram factores primordiais.

Estas são diferenças que não se podem justificar pela diferença temporal da construção dos dois hôtels, já que tanto o início como o final da construção

49 BLUNT, Anthony; Arte y Arquitectura en Francia: 1500-1700; trad. Fernando Toda; Madrid: Cátedra; 1983; p.14.

50 THOMSON, David; Renaissance Paris: Architecture and Growth, 1475-1600; Berkeley: University of California Press; 1984; p. 47.

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Fig. 78 Hôtel de Cluny. Piso 1. Legenda: 1 sala de aparato; 2 sala; 3 antecâmara; 4 câmara de dormir; 5 capela. Escala 1.400

10 0m

1

Fig. 77 Hôtel de Cluny. Piso térreo. Por

Viollet-le-Duc. Legenda: 1 pátio; 1’ entrada de aparato; 1’’ galeria de chegada; 2 portaria; 3 estábulos; 4 cozinha; 5 sala de aparato; 6 jardim; 7 pátio Norte. Escala 1.400

1 1’ 2 2 3 4 5 6 7 1’’ 2 3 4 5 10 0m

estão separados por apenas uma década, mas sim por uma diferença de cultura dos seus patrocinadores.

A disposição original das peças “est très difficile de reconstituer [...] puisqu’il fut

entièrement restauré à l’intérieur et à l’extérieur par Albert Lenoir et ses successeurs au XIXe siècle. Les portes, les fenêtres et les murs intérieurs ont été déplacés afin de transformer l’hôtel en musée”51. No entanto, foi possível identificar a função de

algumas peças, o que facilita a compreensão da distribuição original.

Atravessando-se os portais chega-se ao pátio trapezoidal [fig.76]. Neste,

Jacques Amboise, ou um convidado, poderia desmontar do seu cavalo sendo

este depois facilmente guardado nos estábulos, acedendo através da arcada do corpo poente que foi construído entre 1500 e 1510, que também possibilitava o acesso à abadia e aos seus aposentos privados [fig.77-78]. Em seguida, o acesso ao corpo principal dava-se pela escada em espiral que se encontra na torre octogonal protuberante, numa posição de destaque, permitindo o acesso apenas e só através das duas maiores peças do corpo principal, as salas de aparato do piso térreo e do primeiro piso. Tratava-se, por isso, de uma verdadeira escada de aparato, cuja entrada era anunciada pelo rico ornamento flamejante [fig.79] idêntico ao portal pedonal já descrito. O corpo principal estava então quase todo reservado para as peças de aparato que, como em Bourges, estavam compreendidas entre peças oficiais, privadas e de serviço. Mas aqui a distribuição era um pouco diferente.

À esquerda da sala de aparato do primeiro piso [fig.80], estavam as peças pertencentes aos aposentos. Após a entrada do topo Norte da arcada, no piso térreo, mais uma vez observava-se uma peça estreita que articulava as peças de aparato, as peças oficiais da abadia (à esquerda, fora da planta) e as peças privadas. Prosseguindo por esta, uma discreta escada em espiral permitia o acesso à câmara de dormir, seguida de capela privada [fig.81] dotada de uma

51 ROSENFELD, Myra, La distribution des palais et des hôtels à Paris du XIVe au XVIe siècle in Architecture et vie

sociale: l'organisation intérieure des grandes demeures a la fin du moyen âge et a la renaissance / actes du colloque; études réunis par Jean Guillaume; Paris: Picard; 1994 ; p. 213.

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Fig. 81 Hôtel de Cluny. Capela, fotomontagem. Note-se as abóbadas que descarregam num pilar e em mísulas.

Fig. 79 Hôtel de Cluny. Portal da torre. 2013. Vista do pátio Fig. 80 Hôtel de Cluny. Enfilade de peças piso 1. 2013. Vista da antecâmara para a sala.

Fig. 82 Hôtel de Cluny. 2013. Vista da cozinha e da escada de serviço. Articulação entre cozinha e corpo principal.

escada em espiral que permitia o acesso ao jardim (e vice-versa), ambas situadas num corpo que se estendia para o Norte. A câmara de dormir era antecedida, já no corpo principal, de antecâmara, sala e da referida sala de aparato que, enfim, poderia ser servida por peças e dependências que não podemos enumerar, mas que estariam de certa forma ligadas à cozinha localizada no piso térreo do corpo nascente. A cozinha estava articulada com o corpo principal através de uma outra escada em espiral. Para se aceder a esse corpo, através da mesma, tinha que se passar obrigatoriamente pela escada [fig.82], o que resultava que a cozinha, embora estivesse ‘escondida’, servia eficazmente as devidas peças da residência.

Deste modo, as escadas tornam-se no dispositivo principal de transição e organização das áreas sociais, privadas e de serviço, desmultiplicando-se para cumprir essas funções. O pátio torna-se cada vez mais numa peça de chegada de honra, o corpo principal fica reservado para as peças de aparato e dos aposentos, e os serviços ficam relegados para os corpos laterais. Quanto à galeria, embora presente, não se sabe ao certo o seu fim, pelo que não nos iremos alongar. No entanto, era provável que a peça situada na extremidade Sul fosse igualmente uma capela (piso 1), por analogia à residência de Jacques Coeur e a outras que iremos abordar.

Há ainda um autor que refere que a localização da escada de aparato, relativamente ao corpo principal, sugere que ela própria poderia marcar uma “[...] partition between the public and private areas of the building, and on this

principle, seen in other houses, all the rooms to the right of the escalier d’honneur

should have been private apartments”52- isso acontecia, nomeadamente, na

residência de Jacques Coeur. Essa hipótese coloca o problema de que o percurso desde a cozinha passaria pelos aposentos para servir a sala de aparato no primeiro piso. Contudo, poderia ser que nessa sala não fossem servidas refeições. Remetemos mais uma vez para o caso da residência de

52 THOMSON, David; Renaissance Paris: Architecture and Growth, 1475-1600; Berkeley: University of California Press; 1984; p. 49.

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Fig. 83 Hôtel de Cluny. Axonometria. Por Viollet-le-Duc. Reconstituição das fachadas antes da intervenção em meados do séc. XIX para adequação ao museu Cluny.

Bourges, onde a sala de refeições era apenas na sala do piso térreo. De

qualquer forma, uma hipótese não invalida obrigatoriamente a outra. Assim