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Poder de aplicar sanções contratuais

CAPÍTULO II – AS MÁQUINAS DE VENDA AUTOMÁTICA EM EDIFÍCIOS DO ESTADO

3.3. A regulação dos contratos de concessão efetuados no contexto das máquinas de venda

3.3.3. Poder de aplicar sanções contratuais

Como afirma Pedro Gonçalves, “ainda que, num plano técnico-jurídico, não constituam garantias de cumprimento, afigura-se que as sanções contratuais desempenham um papel relevante enquanto incentivos ao cumprimento: desenvolvem, de forma indirecta, uma função coercitiva, de coerção ao cumprimento, constrangendo o co-contratante a cumprir as obrigações contratuais que assumiu. Expondo o co-contratante à aplicação de medidas com específica e autónoma função punitiva […] o não cumprimento reforça a protecção do interesse público na execução do contrato, diminuindo o espaço para alguns eventuais cenários de “incumprimento oportunista” ou “incumprimento eficiente”. Para a realização deste objectivo não concorre só a previsão da possibilidade de sanções contratuais, mas também a disciplina que as regula324”325.

Segundo Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, “o incumprimento do contrato pode dar origem à aplicação de sanções pela administração ao seu co-contratante faltoso326 […]”327.

Estes autores especificam que a administração pode, de forma unilateral, aplicar sanções “em caso de mora, cumprimento defeituoso ou incumprimento do contrato pelo co-contratante, bem como em caso de incumprimento de outras obrigações de fonte extracontratual mas conexas com

324 “Por exemplo, quanto à natureza da decisão de aplicação de sanções, que se qualifica como acto administrativo, dotado de executividade e, em

certos casos, de executoriedade”. GONÇALVES, Pedro, Cumprimento…, cit., p. 589.

325 GONÇALVES, Pedro, Cumprimento…, cit., p. 589. 326 Cfr. artigo 329.º, do CCP.

deveres contratuais”328.

Contrariamente aos outros poderes de autoridade que o artigo 307.º, n.º 2, do CCP, refere, que “são directamente habilitados por lei geral, o poder de sanção carece de uma habilitação específica, legal ou contratual”329.

Neste caso, “as sanções administrativas mais frequentes são a resolução sancionatória, as multas contratuais, as sanções compulsórias e o sequestro do contrato”330.

No que diz respeito à resolução sancionatória331, esta “distingue-se da resolução unilateral em

sentido estrito […] por, em consequência do seu carácter sancionatório, não gerar o dever de pagamento de qualquer indemnização. Tratando-se de um acto de carácter sancionatório, para mais de efeitos extremos, os pressupostos da resolução sancionatória são objecto de tipificação apertada: ela só pode ter lugar ocorrendo incumprimento definitivo do contrato por facto imputável ao co- contratante332 […], incumprimento, por parte do co-contratante, de ordens, directivas ou instruções

transmitidas no exercício do poder de direcção sobre matéria relativa à execução das prestações contratuais333 […], oposição reiterada do co-contratante ao exercício dos poderes de fiscalização do

contraente público334 […], cessão da posição contratual ou subcontratação realizadas sem

observância dos termos e limites previstos na lei ou no contrato, desde que a exigência pelo co- contratante da manutenção das obrigações assumidas pelo contraente público contrarie o princípio da boa fé335 […], acumulação do valor das sanções contratuais com natureza pecuniária em valor

superior a 20% do valor contratual336 […], incumprimento pelo co-contratante de decisões judiciais ou

arbitrais respeitantes ao contrato337 […], não renovação do valor da caução pelo co-contratante338 […],

328 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de, Contratos…, cit., p. 157.

329 As sanções têm que estar “previstas”: artigo 307.º, n.º 2, alínea c), do CCP; o artigo 325.º, n.º 4, do CCP só refere a previsão contratual, no

entanto, o artigo 329.º, n.º 1, do CCP, menciona, a par daquela, a previsão legal. SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de, Contratos…, cit., p. 157.

330 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de, Contratos…, cit., p. 157. 331 Cfr. artigos 329.º, n.º 1, e 333.º, do CCP.

332 Cfr. artigo 333.º, n.º 1, alínea a), do CCP. 333 Cfr. artigo 333.º, n.º 1, alínea b), do CCP. 334 Cfr. artigo 333.º, n.º 1, alínea c), do CCP. 335 Cfr. artigo 333.º, n.º 1, alínea d), do CCP. 336 Cfr. artigo 333.º, n.º 1, alínea e), do CCP. 337 Cfr. artigo 333.º, n.º 1, alínea f), do CCP. 338 Cfr. artigo 333.º, n.º 1, alínea g), do CCP.

apresentação do co-contratante à insolvência ou sua declaração judicial339 […], e outras situações de

grave violação das obrigações assumidas pelo co-contratante especialmente previstas no contrato340

[…]. A resolução sancionatória não prejudica a efectivação da responsabilidade civil contratual341

[…]”.342

Salienta-se que o artigo 423.º, do CCP, encerra os pressupostos e um regime procedimental próprios da resolução sancionatória dos contratos de concessão […] de serviços públicos.343

Relativamente às multas contratuais, especifica-se que o CCP não as refere claramente. Contudo, o artigo 329.º, n.os 2 e 3, menciona-as de modo implícito. As multas contratuais são

sanções menos graves do que a resolução sancionatória, e podem “ser aplicadas nas mesmas situações que justificam aquela, mas carecem sempre de previsão legal ou contratual, nos termos gerais […]. O valor acumulado das multas contratuais ao longo do período de execução do contrato não pode exceder 20% do preço contratual344 […], limite que se eleva a 30% quando o contraente

público decida não proceder à resolução do contrato por considerar que dela resulte grave dano para o interesse público345 […]; a partir do primeiro montante passa a ser possível a resolução

sancionatória do contrato346 […]. As cauções prestadas pelo co-contratante podem ser executadas

pelo contraente público, sem necessidade de prévia decisão judicial ou arbitral, para satisfação das sanções pecuniárias aplicadas nos termos previstos no contrato347 […]”348.

No que se refere às sanções compulsórias, podemos afirmar que estas têm uma dupla funcionalidade: i) destinam-se, por um lado, a castigar o co-contratante da administração por atrasos que lhe sejam atribuídos na execução do contrato; ii) pretendem, por outro, levá-lo a realizar com a maior celeridade possível as prestações em falta. Desta forma, acabam por ter uma dupla

339 Cfr. artigo 333.º, n.º 1, alínea h), do CCP. 340 Cfr. artigo 333.º, n.º 1, do CCP. 341 Cfr. artigo 333.º, n.º 2, do CCP.

342 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de, Contratos…, cit., p. 158. 343 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de, Contratos…, cit., p. 158. 344 Cfr. artigo 329.º, n.º 1, do CCP.

345 Cfr. artigo 329.º, n.º 2, do CCP. 346 Cfr. artigo 333º, n.º 1, alínea e), do CCP. 347 Cfr. artigo 296.º, n.º 1, alínea a), do CCP.

natureza de sanções e de medidas de execução administrativa do contrato349.

No que concerne ao sequestro do contrato350, trata-se do ato através do qual a administração

assume, diretamente ou através de um intermediário, de forma transitória, a execução das prestações contratuais em falta. Os encargos do desenvolvimento das atividades concedidas e as despesas extraordinárias necessárias ao restabelecimento da normal execução são suportados pelo co-contratante351.

Segundo Marcello Caetano, “o sequestro da concessão é sempre uma medida temporária ou

provisória352, que se poderá alargar mais ou menos consoante o entenda a Administração

concedente, a quem caberá decidir sobre o momento em que deve notificar o concessionário para retomar a gestão do serviço”353.

O sequestro tem em vista certificar-se da “continuidade dos serviços públicos e, por esse motivo, é uma sanção característica dos contratos de concessão […] de serviços públicos, a propósito dos quais está especialmente regulada”354. O “pressuposto do sequestro é a existência de

um incumprimento grave, efectivo ou iminente, de obrigações contratuais pelo concessionário355 […],

nomeadamente quando ocorra ou esteja iminente a cessação ou suspensão, total ou parcial, de actividades concedidas356 […] e quando se verifiquem perturbações ou deficiências graves na

organização ou no regular desenvolvimento das actividades concedidas ou no estado geral das instalações e dos equipamentos, que comprometam a continuidade ou a regularidade daquelas actividades ou a integridade e a segurança de pessoas e bens357 […]”358.

De acordo com o estipulado no artigo 421.º, n.º 3, do CCP, “antes de praticar o acto de sequestro, o concedente deve notificar o concessionário para, no prazo que lhe for razoavelmente

349 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de, Contratos…, cit., p. 158. 350 Cfr. artigo 420.º, alínea b), do CCP.

351 Cfr. artigo 421.º, n.os 1, 5, e 6, do CCP.

352 O sequestro prossegue uma finalidade de natureza cautelar, já que visa garantir o cumprimento de uma finalidade que a lei enuncia (o regular e

contínuo funcionamento do serviço público).

353 CAETANO, Marcello, Manual…, II, cit., p. 1130. Apud GONÇALVES, Pedro, A concessão…, cit., p. 253. 354 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de, Contratos…, cit., p. 159.

355 Cfr. artigo 421.º, do CCP.

356 Cfr. artigo 421.º, n.º 2, alínea a), do CCP. 357 Cfr. artigo 421.º, n.º 2, alínea a), do CCP.

fixado, cumprir integralmente as suas obrigações e corrigir ou reparar as consequências dos seus actos, excepto tratando-se de uma violação não sanável” e, em consonância com o n.º 4, do mesmo artigo, “notificar as entidades financiadoras da intenção de proceder ao sequestro”359. Salienta-se

que “o sequestro dura o tempo julgado necessário pelo concedente, com o limite máximo de um ano, sendo o concessionário notificado pelo concedente para retomar o desenvolvimento das actividades concedidas na data que lhe for fixada360 […]. Se o concessionário não puder ou se

recusar retomar as actividades concedidas ou se, tendo-o feito, continuarem a verificar-se os factos que deram origem ao sequestro, o concedente pode resolver o contrato361 […]”362.

De acordo com Pedro Gonçalves, a “rescisão do contrato de concessão é a mais severa e a mais grave sanção em que o concessionário pode incorrer”. E, ainda, segundo este autor, em relação “às infracções contratuais susceptíveis de conduzirem à rescisão, embora não haja no direito português um elenco fixo, definido por via genérica, existe contudo um catálogo mais ou menos estável, que é reproduzido com poucas variações nos vários regimes de concessões de serviços públicos”363.

Desta forma, geralmente o que está em causa é uma infração “relacionada com o incumprimento de obrigações contratuais decorrentes:

- do dever de regularidade e continuidade da gestão (casos de interrupção prolongada da gestão);

- do dever de gerir pessoalmente o serviço (casos de trespasse ou de subconcessão não autorizada);

- das ordens, directivas e injunções e injunções da Administração concedente; - do dever de suportar a fiscalização da Administração concedente;

- do dever de cumprir a lei e os regulamentos aplicáveis; - […]”364.

359 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de, Contratos…, cit., p. 159. 360 Cfr. artigo 421.º, n.º 6, do CCP.

361 Cfr. artigo 421.º, n.º 7, do CCP.

362 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de, Contratos…, cit., p. 159. 363 GONÇALVES, Pedro, A concessão…, cit., pp. 337 e 340.

Pedro Gonçalves acrescenta que, “dado o seu carácter especialmente severo, a rescisão deve ser considerada, no catálogo das sanções disponíveis, uma sanção excepcional, que deve ser aplicada como ultima ratio; é por isso essencial que a infracção que a ela dá lugar consista numa ‘violação grave’ dos deveres descritos (uma violação menos grave dará em princípio lugar a outras sanções, designadamente multas contratuais), que ponha em causa a possibilidade de manter a relação concessória por facto imputável ao concessionário”365366.

3.3.4. Natureza e regime dos atos administrativos de exercício dos poderes