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O Poder Judiciário: desvelando o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, comarca de Uberaba

DESVELANDO UBERABA (MG): O CENÁRIO DA PESQUISA E OS ESPAÇOS SÓCIO-OCUPACIONAIS DOS SUJEITOS

3.5 O Poder Judiciário: desvelando o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, comarca de Uberaba

Com a Constituição de 1988, a organização do Poder Judiciário brasileiro foi regulada pelos artigos 92 a 126, que dispõem sobre suas regras e estrutura, resguardando suas prerrogativas e reposicionando a instituição no cenário da democracia recém-conquistada. Seguindo a norma jurídica constitucional dos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) expressos na Carta Maior, o Poder Judiciário figura-se como instituição independente,9 autônoma, que tem resguardada suas garantias. Sua autonomia perante os demais poderes não exime a responsabilidade de colaboração mútua entre eles (LENZA, 2009).

As garantias institucionais do Poder Judiciário se constituem por meio da autonomia orgânico-administrativa situada na organização, gestão e funcionamento dos órgãos. Deste modo, ao Poder Judiciário cabe a prerrogativa constitucional de eleição de seus órgãos diretivos, bem como a elaboração do regimento interno, a organização da sua estrutura interna. Esta autonomia, na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 99, é tratada como ―autonomia administrativa‖, reforçada a autonomia financeira no que tange à elaboração dos orçamentos, gestão, aplicação dos recursos e sua fiscalização, tudo sem a interferência dos outros poderes. Quanto à gestão financeira, o Poder Judiciário fica jurisdicionado à fiscalização pelo Tribunal de Contas da União e da Controladoria Geral da União.

As garantias atribuídas ao Poder Judiciário se fundam na independência dos seus órgãos além de efetivamente garantir a mesma independência aos membros e aos magistrados visando, também, à imparcialidade dos referidos órgãos e magistrados. Deste modo, estas garantias são essenciais para a consolidação da autonomia e independência do Judiciário (LENZA, 2009).

Atualmente, segundo o art. 92 da Carta de 1988, compõem a estrutura do Poder Judiciário brasileiro o Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça, o Superior Tribunal de Justiça, os Tribunais Regionais Federais e os juízes federais, os Tribunais do Trabalho e os juízes do Trabalho, os Tribunais Eleitorais e os juízes eleitorais, os Tribunais Militares e os juízes militares e os Tribunais e juízes dos estados, do Distrito Federal e dos territórios.

9 A concepção da separação dos poderes foi defendida por Montesquieu, e a primeira experiência do gênero foi consolidada na Constituição norte-americana de 1787.

Deste modo, na esfera da União, além dos órgãos centrais (superiores), concentra-se a justiça que Lenza (2009) e a própria Constituição denominam ―especializada‖, institucionalmente dada nas esferas federal: eleitoral, do Trabalho e militar. Na alçada dos estados (unidades federativas), concentram-se a justiça comum, com a função de julgar aquilo que não se relaciona com essas áreas especializadas. Assim,

[...] é possível compreender o Poder Judiciário brasileiro a partir de dois pontos de vista: o da sua organização vertical, que diz respeito à hierarquia dos tribunais divididos em órgãos de primeiro e segundo graus e órgãos de cúpula, e o da sua organização horizontal, que diz respeito à divisão entre justiça comum e justiças especializadas (ALAPANIAN et al. 2009, p. 30).

Seguindo esta organização de competência entre as esferas que compõem o Judiciário brasileiro, observa-se que sua composição foi construída historicamente a partir da hierarquia e da ordem, desvelando frente a uma análise crítica, o conservantismo no qual esta instituição se funda e se organiza, situando-se na esfera conflituosa de interesses antagônicos, dentre eles, a influência do capitalismo nas suas bases.

Como uma instituição organizada pelo Estado, o Poder Judiciário situa-se na zona conflituosa de satisfação de necessidades do capital, bem como do trabalho, pela compreensão de que o conceito de acesso à justiça é um dos patrimônios da sociedade democrática, na direção da defesa de interesses distintos. Deste modo, fazem-se necessário compreender o Poder Judiciário e sua inserção nas relações sociais de produção, determinadas pela lógica do capital, visto que sua autonomia e independência esbarram nos processos produtivos operados pelo capital em sua relação com a figura do Estado. Em tempos de reestruturação do capitalismo, o Poder Judiciário se vê, então, em um cenário incerto, no qual o Estado-Nação vai perdendo sua autonomia e o ordenamento jurídico vê comprometidas sua história, sua unidade e sua organicidade (FÁVERO; MELÃO; JORGE, 2008, p. 32).

A reflexão sobre o processo de reestruturação produtiva sob uma ótica macroscópica apresentada pelas autoras estabelece mediações e reflexos no Poder Judiciário, visto que o largo processo de (re)ordenamento desencadeado nas/pelas relações sociais de produção imprimem suas marcas no âmbito da justiça, bem como das formas de acesso e na estrutura política e administrativa da instituição.

Gozar de autonomia e independência não torna o Poder Judiciário isento do processo engendrado pelo capital, notoriamente no processo do desmonte do papel do Estado — principalmente pela sua diminuição —, na privatização dos serviços públicos, figurado pela massiva contratação de terceirizados e prestadores de serviços no âmbito do Judiciário, nas precárias condições de trabalho dos servidores, na defasagem salarial e nos tímidos planos de carreira. Tudo isso vem ao encontro de uma justiça morosa, obsoleta, profundamente

burocratizada e burocratizante das ações e litígios, elementos que deturpam a função pública da justiça e torna-se alvo da desmoralização perante a opinião pública.

Alimentados pela direção neoliberal e pela orientação estrutural de base conservadora do Judiciário e do direito como ciência, estes elementos forcejam características, situando a instituição na esfera minimalista de solução dos conflitos de interesse, camuflando sua essência que é conceber a justiça como um elemento essencial da democracia fundado na igualdade10 entre todos os sujeitos. Assim, ―o Judiciário não pode ser considerado um mero órgão de solução de conflitos de interesses, conforme preconiza boa parte da doutrina, ou seja, não se resume a um órgão de Estado cuja função se esgota na prolação de decisões que visam ao apaziguamento da sociedade em conflito‖ (PONCIANO, 2008).

Nesta direção, faz-se necessário romper com este enraizamento minimalista da Justiça, situando-a na esfera da garantia efetiva e inequívoca do direito (pensando em sua totalidade), tornando a justiça ―a marcha que leva a ética em direção ao direito‖ (PASUKANIS, 1989, p. 138).

10 ―A igualdade jurídica é a contrapartida lógica e necessária da desigualdade econômica‖ (PASUKANIS, 1989, p. IX).

Capítulo IV

A PESQUISA

4.1 Apresentação

Para Marx (apud PAULO NETTO, 2009, p. 7), no processo investigatório, o sujeito pesquisador faz uso de instrumentos ou técnicas de pesquisa como meio para ―apoderar-se da matéria, em seus por menores‖, isto é, ―analisar suas diferentes formas de desenvolvimento e de perquirir a conexão que há entre elas‖.

Nesse sentido, a investigação científica se sintetiza na realização da pesquisa social que objetiva conhecer e analisar a realidade social por meio de teorias, técnicas e procedimentos científicos. Assim, as técnicas de pesquisa utilizadas nesse projeto foram realizadas com base no método dialético, que oferece um entendimento sobre a totalidade, por meio de uma leitura e uma interpretação crítica da realidade social posta.

Deste modo, a utilização de um arcabouço teórico é considerada elemento essencial para a compreensão crítica da totalidade da vida social, uma vez que, para Marx, a teoria consiste na ―reprodução ideal do movimento real do objeto pelo sujeito que pesquisa: pela teoria, o sujeito reproduz em seu pensamento a estrutura e a dinâmica do objeto que pesquisa‖ (PAULO NETTO, 2009, p. 7). Ainda fundamentado nas reflexões de Paulo Netto (2009, p. 7), a teoria está inscrita numa esfera de (re)produção ―que constitui propriamente o conhecimento teórico‖, revelando a necessidade de fidelidade do sujeito (pesquisador) ao objeto.

Fundado na perspectiva de compreensão da dinâmica da sociabilidade burguesa, o pesquisador, necessariamente, precisa iniciar sua investigação partindo do cerne da questão ora estudada, como forma de buscar na raiz e apreender a essência e, assim, conhecer, nos dizeres de Paulo Netto (2009, p. 7), ―a estrutura e a dinâmica do objeto‖. Com esta reflexão, o pesquisador descarta os perigos e descaminhos da aparência imediata dos fenômenos, preocupando-se com a sua essência.

O arcabouço oferecido pelo materialismo dialético situa o marco teórico e sua mediação em um contexto muito mais amplo, concebido sob a perspectiva de totalidade, pois, para Marx, a relação entre teoria e sujeito possibilita essa apreensão em sua nuances, refletindo, criticando-o e revisando-o, como um processo constante. Estas reflexões partem do

conceito de totalidade, tendo como elemento mediador a dialética e evidenciando o lugar da sociabilidade burguesa no cenário contemporâneo, sob a égide das relações sociais de produção.

Os mesmos homens que estabelecem as relações sociais de acordo com a sua produtividade material produzem, também, os princípios, as ideias, as categorias de acordo com as suas relações sociais. Assim, estas categorias são tão pouco eternas quanto as relações que exprimem. Elas são produtos históricos e transitórios (MARX, 1982, p. 106).

Deste modo, a ideia — concebida como uma capacidade teleológica — é determinada pelo movimento das relações sociais engendradas pelo modo de produção capitalista, entendido como ―expressões das relações e atividades reais do homem estabelecidas no processo de produção de sua existência social‖ (LARA, 2008, p. 221).

Em decorrência, para atingir os objetivos propostos, utiliza-se a abordagem qualitativa, isto porque esse tipo de pesquisa acredita na relação entre pesquisador e pesquisado, possibilitando a construção fundada na busca pelo conhecimento do real a partir da base material, ou seja, da concretude. Assim, esse método de pesquisa ―propicia o conhecimento teórico, partindo da aparência, [e] visa alcançar a essência do objeto‖ (PAULO NETTO, 2009, p. 8).

Por isso, de acordo com Minayo (2004, p. 21), ―[...] a pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se ocupa muito nas ciências sociais com um nível de realidade que não pode ser quantificado, ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, valores e atitudes‖.

Esta pesquisa é de natureza explicativa, partindo da essência do real concreto para desvelar a realidade estudada. Utilizou-se, quanto aos procedimentos de coleta de dados e quanto às fontes de informação, da pesquisa de campo como técnica necessária à compreensão do objeto em estudo, já que se caracteriza pelo contato direto com a realidade, garantindo a fidedignidade do pesquisador ao objeto em estudo e analisando com objetividade.

Na coleta dos dados de campo, utilizou-se a aplicação da entrevista com profissionais de diversos espaços sócio-ocupacionais do município de Uberaba: um profissional da docência, um da Política de Saúde e um do Judiciário, totalizando três sujeitos de pesquisa. Esse recorte deve-se ao tempo do pesquisador, aos recursos tecnológicos e à disponibilidade livre e consentida dos sujeitos são requisitos indispensáveis à realização dessa pesquisa. , apenas três profissionais de diferentes espaços ocupacionais foram sujeitos participantes da pesquisa de campo, sendo eles: o da saúde, da docência e do judiciário.

A escolha dos sujeitos foi aleatória e simples, sendo que nos setores em que se encontram mais de um profissional em seus quadros, considerou-se aquele que primeiro aceitou participar deste estudo. A justificativa pela escolha dos espaços reside no fato de serem os principais espaços sócio-ocupacionais do assistente social.

Para a coleta de informações, utilizamos a técnica de gravador, com a autorização do sujeito pesquisado (aplicação de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido), mediante aplicação de entrevista semiestruturada, na qual o informante tem o discurso livre e é orientado por algumas perguntas chaves, Isto é, perguntas abertas em que o entrevistado pode livremente discorrer sobre o tema proposto, sendo que o pesquisador pode direcionar o diálogo a fim de que os objetivos sejam alcançados (MINAYO, 2004).

A análise dos dados se deu mediante a análise de conteúdo entendida como tratamento de dados, pois, por meio desta técnica, é possível desenvolver um estudo minucioso a partir da definição das categorias analíticas, se valendo da técnica de ―grade aberta‖, pois as categorias não são fixas a priori, porém, vão se formando no decorrer da própria análise do objeto em estudo (LAVILLE; DIONNE, 1999). A grade aberta caracterize-se como um procedimento metodológico não indutivo, que parte das categoriais iniciais para as finais, em um movimento dialético. Este tipo de procedimento metodológico permite ao pesquisador agrupar categoriais presentes na pesquisa.