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Os benefícios da biotecnologia superam os riscos?

4 A Regulação dos Cultivos Geneticamente Modificados

4.2 Os Diferentes Tipos de Políticas para os Cultivos GM

4.2.4 Políticas dos Direitos dos Consumidores

Enquanto que nos países em desenvolvimento, principalmente nos grandes exportadores agrícolas, o debate sobre os cultivos GM seja dominado pelas questões de DPI, biossegurança e comércio, na Europa, Japão e nos Estados Unidos, a segurança dos alimentos e o direito dos consumidores de serem informados tende a dominar o debate público. Não que a segurança dos alimentos não seja um problema para os países pobres, mas o preço e escassez normalmente geram preocupações muito maiores do que a qualidade dos alimentos.

Uma forma de regular os cultivos GM de modo a promover a sua produção e consumo é partir do pressuposto de que os alimentos GM até o momento não foram associados com nenhum novo risco de segurança para os consumidores suficientemente

sério para exigir um tratamento especial. A segurança dos alimentos GM seria então reguladas pelos mesmos princípios e padrão de rigor do que os alimentos não GM e, portanto, não se justifica, por exemplo, medidas como a rotulagem para os alimentos GM. Este enfoque é o adotado nos Estados Unidos, que como no caso da regulação da biossegurança, os alimentos GM são regulados pela mesma agência, no caso o FDA, e pela mesma lei, a Lei Federal de Alimentos, Medicamentos e Cosméticos, que regula os alimentos não GM (BELSON, 2000).

Até 2000 não havia nenhuma recomendação de rotulagem de alimentos GM nos Estados Unidos, porque o FDA não considerava que o método “engenharia genética” de produzir o alimento era uma informação que justificasse um rótulo. A partir de 2001, o FDA passou a incentiva a rotulagem voluntária e continuou a não exigir rotulagem diferente para os cultivos GM, exceto quando o uso da biotecnologia resulta em mudança significativa na composição do alimento. Neste caso, a etiqueta é exigida somente para descrever a mudança na qualidade do produto e não no processo pelo qual ele foi produzido.

Uma atitude permissiva, menos promocional do que a dos Estados Unidos, seria reconhecer como legítimas as preocupações dos consumidores com relação a segurança dos cultivos GM. Os governos poderiam concluir que mesmo que os riscos específicos dos alimentos GM não tenham sido demonstrados a pelos cientistas ainda, os consumidores tem o direito de saber o que eles estão consumindo. A partir desta abordagem, a política regulatória poderia exigir das empresas rotular os alimentos como “GM” caso a porcentagem de material GM fosse superior a uma porcentagem especificada pelo governo. Na abordagem permissiva mas resguardando o direito dos “consumidores de saber”, a rotulagem seria apenas para os alimentos processados, ficando de fora, portanto, os alimentos frescos ou in natura.

para os consumidores, poderá resultar em elevação dos custos de produção, de transporte e de armazenamento.

A política preventiva de segurança dos alimentos poderia ser simplesmente o banimento de todo o comércio de alimentos GM dentro das fronteiras do país. O objetivo desta política seria proteger os consumidores contra riscos hipotéticos e desconhecidos.

4.2.5 As Políticas de Investimento Público em Pesquisa e

Desenvolvimento

Os quatro tipos de políticas apresentados acima se caracterizam por serem típicas políticas regulatórias, ou seja, são políticas que estabelecem regras e criam normas de comportamento para os agentes privados. O quinto tipo de política – a política de investimento público em pesquisa – destoa das demais por ser uma política de gasto governamental e não simplesmente uma política regulatória.

As inovações biológicas ou vegetais, como uma semente ou uma variedade melhorada, possuem características de bens públicos e geram muitas externalidades, dado que os benefícios sociais de uma tecnologia agrícola podem superar os seus custos privados. Segundo COSTA & FREITAS (2006), o aumento da produtividade via melhoramento vegetal teve um impacto significativo na redução dos preços dos grãos, como soja, milho e trigo. Além do mais, os investimentos públicos em pesquisa têm uma taxa retorno muito alta.

Por esta razão que a maioria dos governos faz investimentos diretos na pesquisa e no desenvolvimento de tecnologias vegetais e grande parte do investimento público em pesquisa agrícola é feito nos países em desenvolvimento. Em 2000, cerca de 55% do total do investimento público no mundo foi realizado nos países em desenvolvimento. Enquanto nos países desenvolvidos a participação dos gastos públicos com pesquisa agrícola é de 45,7%, nos países em desenvolvimento a participação do setor público é de mais de 90% (PARDEY et al, 2007).

Os sistemas públicos de pesquisa agrícola em muitos países sempre enfrentaram escassez de recursos, o que os obrigavam a tomar decisões difíceis de quais cultivos deveriam ser priorizados pelas instituições de pesquisa. Devido a revolução da engenharia genética, os sistemas públicos de pesquisa enfrentam também a difícil decisão sobre o quanto de recursos deverão ser direcionados para pesquisas com cultivos GM.

A questão é que o acesso às variedades geneticamente modificadas para os agriculores dos países em desenvolvimento depende dos investimentos das instituições públicas, seja para desenvolver os seus próprios cultivos GM ou para adaptar aqueles desenvolvidos pelas empresas multinacionais às condições e necessidades locais. As empresas privadas com sede nos países desenvolvidos estão na liderança da comercialização de variedades GM e elas têm dado pouca atenção as necessidades dos agricultores pobres dos países tropicais. Portanto, se os governos quiserem promover a revolução dos cultivos GM dentro das fronteiras dos seus países, terão que necessariamente colocar recursos em seus sistemas públicos de pesquisa e extensão agrícola.

Os governos dos países em desenvolvimento que buscam promover ou bloquear o desenvolvimento da biotecnologia agrícola poderão assumir diferentes posturas de políticas de investimento público em pesquisa. Caso adotem uma postura mais promocional, eles poderão investir recursos oriundos de doações de instituições filantrópicas internacionais e mais os recursos próprios. Uma motivação para este tipo de política poderá ser o investimento em pesquisa e desenvolvimento de novas variedades de “cultivos órfãos”, aqueles cultivos que são negligenciados pelas empresas privadas.

Uma abordagem menos promocional seria usar as instituições públicas não para o desenvolvimento de novos cultivos GM, mas apenas para transferir e adaptar as variedades desenvolvidas nos países desenvolvidos.

Uma política de precaução de investimento público seria permitir a transferência de atributos de características GM para as variedades desenvolvidas localmente, mas somente se as instituições internacionais filantrópicas ou de pesquisa quiserem patrocinar esta atividade, enquanto que os recursos públicos não seriam destinados nem para o desenvolvimento nem para a adaptação de novas variedades GM. Neste caso, os recursos públicos seriam destinados para outros tipos de pesquisa, podendo incluir as biotecnologias não GM, como a cultura de tecidos. Uma abordagem preventiva seria aquela em que os

Quadro 8. Os Tipos de Políticas Regulatórias para os Cultivos Geneticamente Modificados

Promocional Permissivo Precaucional Preventivo

Direitos de Propriedade Intelectual Concessão de patentes e direitos dos melhoristas sob a UPOV 1991

Garantia dos direitos dos melhoristas sob a UPOV 1991

Garantia dos direitos dos melhoristas sob a UPOV 1978, que preserva os privilégios dos agricultores de reproduzir suas sementes

Nenhuma lei de DPI para plantas ou animais ou lei de DPI somente no papel

Biossegurança

Ausência de estudos, aprovação de cultivos GM com base nos estudos e aprovação feitos em outros países

Realização de estudos minuciosos caso a caso para demonstrar a existência real de riscos

Realização de estudos minuciosos caso a caso, mas levando em consideração também as incertezas científicas ligadas ao caráter revolucionário da engenharia genética Ausência de estudos caso a caso, os riscos são assumidos a priori, porque são produzidos através de engenharia genética Comércio Ausência de restrições sobre importações de sementes e plantas GM, porque eles contribuem para redução de custos, aumentar a produtividade e, portanto, aumentar a competitividade das exportações

Não há políticas nem de promover e nem de prevenir o uso de cultivos GM; a importação de sementes ou cultivos GM seguem os procedimentos científicos estabelecidos pela OMC A importação de cultivos GM não é proibida, mas ela deverá estar sujeita a procedimentos específicos; poderá haver a exigência de rotulagem de cultivos GM e seus derivados, de acordo com as cláusulas do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança A importação de sementes ou cultivos GM é proibida; o país prefere o status de livre de transgenico na esperança de que os países importadores pagaram prêmios para cultivos não GM Segurança dos alimentos e direitos dos consumidores Ausência de distinção regulatória entre alimentos GM e não GM Há distinção entre alimentos GM e os não GM; mas a rotulagem dos GM seguirá as mesmas regras dos não GM; não há exigência de segregação ao longo da cadeia produtiva Rotulagem de forma clara de todos os alimentos GM e exigência de segregação As vendas de alimentos GM são banidas ou a rotulagem é feita de forma a estigmatizá-los como algo perigoso

Investimento público em pesquisa Recursos públicos gastos no desenvolvimento de novos cultivos GM e na adaptação dos cultivos desenvolvidos em outros países

Recursos públicos gastos somente na adaptação dos cultivos desenvolvidos em outros países

Poucos recursos públicos investidos em pesquisas com cultivos GM; uso basicamente de donativos para as pesquisas com cultivos GM

Nenhum recurso público ou donativos são utilizados para pesquisas com cultivos GM

Fonte: Elaborado a partir de Paarlberg, 2001.

4.3 Os

Determinantes

das

Políticas

Governamentais: Grupos de Interesses e