• Nenhum resultado encontrado

1.3.6.2 SISTEMAS DE RECOMPENSA

3. POLITICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO

3.4. POLÍTICAS SOCIAIS OU DE EDUCAÇÃO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS

O subcapítulo anterior configurou-se como abordagem prévia às políticas sociais. Aqui iremos aprofundar a especificidade das políticas sociais no panorama das PP.

Se nas políticas públicas é entendido que o governo é ator entre atores – cabendo-lhe um papel de relevo – e a coalização com grupos de interesse e movimentos sociais é aceite como prática de boa governação, na política educacional pede-se que os envolvidos estejam mais próximos e incorporados no “governo em ação”.

Nesta linha de relevância dos envolvidos surge Höfling (2001), ao sustentar esta posição numa política de Educação consolidada com o contexto de Estado. O autor afirma que na avaliação dos resultados de programas da política educacional, os Estados podem declarar índices positivos na sua concretização, contudo uma efetiva avaliação política da Educação

só surgirá quando for ampliada a participação dos envolvidos nas esferas de decisão, planeamento, e execução de politicas de Educação. Prossegue o autor, referindo que “mais do que oferecer ‘serviços’ sociais – entre eles a educação – as ações públicas, articuladas com as demandas da sociedade, devem se voltar para a construção de direitos sociais” (Höfling, 2001, p. 40), razão pela qual se consubstancia a necessidade em envolver a sociedade em geral, e os diretamente envolvidos em particular.

Uma investigação sobre políticas públicas de educação (PPE) deve, na conceção de Morrow e Torres (1997), surgir integrada numa análise objetiva dos desígnios da PP. Por outras palavras, compreende-se uma relação entre políticas públicas e políticas de educação (PE) numa dimensão vertical e horizontal, onde a segunda surge na dependência da primeira, mas também com ela partilha um eixo de definição e compreensão num contexto de Estado (Afonso, 2003).

As PE, contrariamente a outras políticas públicas, como por exemplo a política económica, são – em alguma literatura de influencia francófona – revestidas com a noção de “bem comum local”, pelo que sobre elas recai a necessidade de harmonizar o interesse público e os interesses privados (Afonso, 2003). O interesse público é representado pelo Estado, enquanto os interesses privados encontram-se dispersos pelas famílias e outras instituições, atores ou serviços locais.

Barroso (1998) propõe a concretização da Educação como um “bem comum local” por via da incorporação de duas medidas: territorialização e parcerias socioeducativas. Para este autor essa solução envolve vários organismos e entidades (tais como a escola) na concretização de interesses comuns, onde a contratualização corresponsabiliza as entidades, parceiros e atores locais no desenvolvimento de políticas educativas específicas. Esta visão apresenta-se como vantajosa na forma em que não subjuga toda a sociedade à mesma visão de Estado e evita a difusão de um “modelo de mercado” influenciado por interesses particulares.

Contudo, Afonso (2003) não vê na ideia de “bem comum local” apenas virtudes. Na sua perspetiva a comunidade sofre hoje de conceções, referências e apelos ideológicos contraditórios e diversos, pelo que o vetor local pode causar tensões. Entende ainda que o

“bem comum local” assenta na recente conceção de redes entre parceiros coletivos e o Estado, pelo que se reveste, por um lado, como uma forma inovadora e eficaz de praticar politicas educativas, sendo, por outro, um meio de legitimar a ação do Estado no âmbito de retração das políticas públicas, dos direitos sociais, económicos e culturais.

Argumenta o mesmo autor que o Estado hoje apresenta-se como um Estado-articulador. Pelo que abordar políticas públicas de educação deve ser feito na reactualização de uma nova forma de poder do Estado, o da regulamentação. Nesta medida a responsabilização pelas políticas é diluída entre o Estado e parceiros, permitindo ao Estado descentralizar uma pressão social que antes era realizada apenas sobre ele.

Outro fator que a literatura revela no estudo das PPE é a globalização. Para discutir a relação da globalização com a educação existem pelo menos duas propostas teóricas distintas, designadamente a “perspetiva dos institucionalistas do sistema mundial” e a “agenda globalmente estruturada para a educação”, discutidas criticamente por Dale (1998, 1999, 2000). Sobre estas vias, Dale (2000) sintetiza que ambas ambicionam verificar como é que a natureza mutável da economia capitalista – tida como principal impulsor da globalização – afeta os sistemas educativos, aceitando que existe uma dimensão nacional que modela esta implementação.

A discussão sobre a globalização de PP aceita as dinâmicas transnacionais e globais como influentes na definição de políticas nacionais, contudo, fica em aberto a profundidade com que esta ocorre. Teodoro (2001) alinha-se com outros autores que propõem a designação de “globalização de baixa intensidade”, quando analisado em contexto europeu. Compreendendo que os Estados têm a sua capacidade diminuída num contexto de mundo como espaço comum, e, portanto, com políticas tendencialmente próximas, os Estados têm mediado a formulação entre as políticas propostas transnacionalmente e as políticas educativas nacionais. Evidencia-se uma resistência à influência da globalização, como uma homogeneização pretendida.

Afonso (2003), analisando trabalhos das áreas da sociologia e das PE, no período posterior à integração europeia de Portugal, encontrou especificidades nas políticas educativas

mediante a condicionante do movimento globalizador. Esta particularidade é atribuída à especificidade da educação, pois em período idêntico é possível identificar orientações neoliberais em relação à política económica, enquanto na política educativa foram tomadas medidas em contraciclo com a ideologia neoliberal, designadamente medidas coerentes com um modelo de Estado-providência que ainda pretendia a expansão de direitos.

O Estado parece apresentar uma visão sobre a educação dependente do seu modelo de Estado. Assim, num modelo de Estado-providência, a contribuição da educação surge como forma de legitimar o próprio modelo. Num contexto mais consolidado de globalização, ao qual os Estados consideram em grau diferenciado, a prioridade em relação ao que se espera da educação é direcionada para o processo de acumulação, isto é, os Estados consideram a competitividade económica como prioridade a seguir, o que fez surgir o conceito de Estado- competidor (Afonso 2003). A noção de Estado-competidor caracteriza uma nova forma de ação do Estado. Dale (1998) considera que, na essência, esta nova conceção redefine as prioridades atribuídas aos três problemas centrais, que têm norteado o mandato designado à educação nas sociedades capitalistas democráticas. Vindo para primeiro lugar o apoio ao processo de acumulação, seguindo-se a garantia da ordem e controle sociais, e, por último, surgindo a legitimação do sistema.

No caso português compreende-se a influência da globalização, contudo, outro constrangimento recai sobre o país sob a designação de “europeização das políticas educacionais”. Se o contexto global pode ser mediado pelos governos, o efeito das políticas comuns europeias já exerce diferente restrição sobre as PE, não eliminando em absoluto a influência do Estado na sua definição.

Na análise do papel da globalização, numa perspetiva europeia, sob o quadro teórico de Dale (1998) de modelo Estado-competidor, podemos encontrar uma situação distinta face ao modelo difundido. Antunes (2001), sobre as escolas profissionais como objeto de estudo, encontrou uma reordenação das prioridades. Estas escolas atendem, primeiro, à questão do controle e ordem social, numa lógica de resolução de problema político para o desemprego

dos jovens e escolarização prolongada de novos públicos, e em segundo, apoia o processo de acumulação, pela criação de mão-de-obra qualificada, adequada às demandas do mercado.

As PE são construídas numa dinâmica de tensões e dilemas difíceis de resolver, designadamente quando a lógica da regulação ganha relevância face à lógica de emancipação. Incontornável é a complexidade de influências internas e externas que rivalizam por plasmar-se em PE, tornando o papel dos governos cada vez mais sofisticado. Sobre esta realidade torna-se relevante atender transversalmente a que a “Educação e as políticas educacionais também devem ser pensadas e equacionadas como parte integrante dos processos de globalização contra-hegemónica” (Afonso, 2003).

Para além disto, a esfera educativa apresenta-se com uma pluralidade de olhares distintos, surgidos em variados campos, tais como: o epistemológico, sociocultural, político, ético e técnico. Identificam-se uma pluralidade de valores que implicam uma multiplicidade de abordagens em relação à avaliação da educação. Constata desta forma Sobrinho (2004), que estas formas específicas de conceção de educação, acompanhadas de determinado modelo social, tornam parcial qualquer prática avaliativa em educação.

O mesmo autor compreende que educação e avaliação são processos dinâmicos que evoluem no tempo, fenómenos sociais que procuram responder a desafios que são colocados em determinado contexto e época. Assim uma reflexão sobre Educação, tal como aos paradigmas epistemológicos que lhe respeita, deve apresentar-se abrangente, abarcando para além do carácter tecnicista, as componentes ética e política da avaliação. Desta forma compreende-se, a solicitação de Sobrinho (2004), ao pedir uma conjugação dialética das diferentes forças de poder, isto porque a melhoria da qualidade da Educação é uma construção de todo um povo. Projeta-se uma administração pública eficaz e eficiente, numa medida de qualidade da democracia, podendo responsabilizar o Estado e a sociedade em torno de um objeto comum.

O campo educativo pode ser perspetivado segundo uma lógica mercantilista ou tido como bem comum. Ao primeiro paradigma ocorre uma epistemologia objetivista em que a

educação tem como principal função servir os interesses do mercado, enquanto ao segundo, respondem os epistemólogos subjetivistas, defendendo que a Educação consolida a identidade de um povo, desenvolve e modela a consciência crítica, sendo um compromisso cívico.

Na conceção mercantilista, a escola gere-se como uma empresa, e a avaliação surge em função de avaliar a sua eficiência e eficácia, isto é, a avaliação consolida-se como mecanismo de controlo do Estado (Vogler, 1996; Höfling, 2001). Refere Neave (1988) que neste entendimento, a avaliação reveste-se de importância ao ser considerada como instrumento preferido de regulação do evaluative state. Ganha uma dimensão política e ética, na medida em que a avaliação condiciona os processos decisórios em Educação, envolvendo toda a comunidade num conceito de bem e justiça do coletivo.

O Estado coloca na avaliação da Educação o conceito de accountability – prática difundida pela ideologia difundida sob a designação de new public management – ignorando que a formação educativa abarca outras dimensões que devem ser contempladas na avaliação. Contudo, e mesmo com diversas práticas e instrumentos de avaliação, não se conhece uma relação direta entre a qualidade do ensino proporcionado a um cidadão e os resultados que possa obter. Compreende Afonso (2001) que o “Estado-avaliador” atua segundo dois objetivos. Por um lado, legitimar os objetivos das reformas educativas, assegurando a qualidade das suas práticas depois da implementação de uma política, por outro, responder à exigência de organismos financiadores ou de regulação supranacionais.

A conceção de bem público opõe-se à visão de que o desenvolvimento humano assenta na economia como referencial central. Critica a função mercantilista da avaliação, questiona a racionalidade da gestão científica, a pedagogia por objetivos e a cienciometria em educação (Sobrinho, 2004). Continua o autor, concebendo que a avaliação se apresenta com uma função pedagógica que não pode ser minimizada, isto porque compreende uma sociedade democrática que valoriza a formação de cidadãos autónomos, a solidariedade e a justiça social. Desta forma, a avaliação compreende uma função ética e política.

No concreto, as políticas educativas transcendem a objetividade dos programas e planos organizacionais, projetando-se além da racionalidade prática. Consequentemente, mesmo que as organizações nacionais e internacionais se pautem pela accountability, acabam sobretudo exercendo uma atividade fiscalizadora, mais do que avaliadora ou “educativa”, torneando, segundo Sobrinho (2004), a real essência funcional da Educação.

Granheim e Lundgren (1992) reconhecem que a análise racional dos resultados compreende, para os tecnocratas, um tripo sentido: legal e burocrática (normativa); económica; e ideológica. Estes autores inferem, desta forma, que uma avaliação segundo estes parâmetros, ignora alguns atores do sistema educativo, pelo que uma avaliação concebida exclusivamente na dimensão tecnocrática é parcial pelo sonegar de interlocutores.

Os autores Ball e Bowe (1992) reforçam a abrangência de uma avaliação, defendendo que uma análise sobre PE deve alargar-se da esfera do discurso político (writerly) até à sua interpretação (readerly). Esta conceção compreende que a influência, produção e prática são contextos distintos que interagem de forma dinâmica, influenciando tanto os processos como os resultados.