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3.1 TESES JUDICIAIS

3.1.3 Posicionamento do TRF da 4ª Região

Em 2003 a TNU já trazia o entendimento de que a utilização de EPI não elide a incidência do agente insalubre ruído, conforme explana Lazzari:

No que tange ao agente nocivo ruído, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais editou a Súmula n.° 9, com o seguinte teor: "Aposentadoria Especial - Equipamento de Proteção Individual: O uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado". (LAZZARI, et al, 2017, p. 314).

Inobstante o fato de, no ponto a que se refere ao tema desta pesquisa, o STF já ter pacificado entendimento sobre EPI eficaz para o agente insalubre ruído com a primeira tese firmada no Recurso Extraordinário 664.335 / SC, faz-se necessário desenvolver este tópico para elucidar o que ainda está controverso acerca da utilização de EPI eficaz para reconhecimento ou não da especialidade da atividade laboral insalubre.

Verifica-se que tramita no STJ REsp. (Recurso Especial) nº 1828606 - RS (2019/0218109-8) tratando sobre qual a forma ou documento hábil a comprovar se o EPI pode ser considerado eficaz para elidir a ação de agentes insalubres e afastar a especialidade de um período laboral. Esse Recurso Especial é proveniente do IRDR (Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas) nº 15 do TRF da 4ª Região, Processo 5054341-77.2016.4.04.0000/SC8.

O referido IRDR teve origem do processo que iniciou em 11 de setembro de 2013 protocolado sob o nº 50033794720134047213 na 1ª Vara Federal do JEF (Juizado Especial Federal) de Rio do Sul - SC, no qual o autor, aqui denominado SS, pleiteou o reconhecimento de atividades especiais em dois períodos distintos.

Primeiramente no período de 08/10/1987 a 30/09/2004 com incidência de agente insalubre físico ruído com intensidade média de 86 dB(A) e no segundo período de 01/10/2004 a 06/03/2013 com exposição a agente físico ruído com intensidade média inferior a 85 dB(A) e exposição a agentes químicos hidrocarbonetos, porém, para esse período, consta nas provas menção expressa de utilização de EPIs eficazes.

O Magistrado prolatou Sentença em 08 de novembro de 2013, no sentido de

8 Portal da Justiça Federal - TRF4: <https://www2.trf4.jus.br>; Portal do Superior Tribunal de Justiça – STJ: <https://ww2.stj.jus.br/>

reconhecer a especialidade para o primeiro período laboral, por entender ter sido exercido sob incidência de agente insalubre físico quantitativo ruído em níveis acima do limite de tolerância, razão pela qual entendeu que a insalubridade deve ser caracterizada independentemente de eficácia ou não do EPI utilizado.

Para o segundo período laboral a Sentença veio no sentido de não reconhecer a especialidade, pois o Magistrado entendeu que o nível médio do agente insalubre físico ruído no ambiente de trabalho foi inferior ao limite de tolerância. Assim como, por entender que, mesmo havendo presença do agente insalubre quantitativo químico hidrocarboneto, houve utilização de EPI eficaz para elidir o referido agente, utilizando-se das informações apresentadas nos autos.

Verifica-se que a Sentença é anterior a consolidação do tema 555 do STF, ainda assim, o Magistrado baseou-se na Súmula 9 da TNU:

7) no caso de ruído, a notícia de fornecimento de equipamento de proteção individual não enseja a descaracterização da especialidade da atividade desenvolvida, mesmo que elimine a sua insalubridade, uma vez que inexistem meios de se afastar completamente a pressão sonora exercida sobre o trabalhador, nada obstante a utilização de protetores auriculares, conforme muito bem explica a Juíza Federal Marina Vasques Duarte: 'A súmula 09 da TNU prescreve que 'o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado. É que estudos científicos demonstram que o ruído pode ser nocivo não apenas por redução auditiva, mas também por impactar a estrutura óssea, hipótese em que o protetor auricular fornecido como EPI não é hábil a afastar toda e qualquer possibilidade de prejuízo à saúde' (DUARTE, Marina Vasques.

Direito Previdenciário. 4ª ed. Verbo Jurídico. p. 181). Assim, até mesmo para períodos posteriores à edição do Decreto nº 4.882/2003, a especialidade decorrente da exposição a ruído excessivo não é descaracterizada pela utilização de equipamentos de proteção individual; (Sentença, 2013, Processo nº 5003379-47.2013.404.7213 - JEF/SC).

Da Sentença, ambas as partes recorreram.

O INSS recorreu para que o primeiro período, 08 outubro de 1987 a 30 de setembro de 2004, fosse desqualificado como especial, pois, durante o período de vigência do Decreto Lei 2.172/1997 (06/03/1997 a 18/11/2003) o limite de tolerância para o nível de ruído a ser considerado é de 90 dB(A).

O autor recorreu para que, em relação ao segundo período, 01 outubro 2004 a 06 março 2013, fosse desconsiderada a eficácia dos EPIs informados, para enquadramento da atividade como especial pela incidência de hidrocarbonetos e ruído.

Diante disso, ocorreu o sobrestamento do processo, haja vista a questão da

eficácia do uso de EPI estava sendo julgada pelo STF, conforme justificou o Juiz Federal Relator, Henrique Luiz Hartmann:

DECISÃO O julgamento da lide está afetado pela questão da eficácia do uso de EPI na descaracterização do tempo especial prestado. A matéria é objeto do ARE 664.335, com reconhecida repercussão geral e assim ementado: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTO DE

PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI COMO FATOR DE

DESCARACTERIZAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL.

RELEVÂNCIA DA MATÉRIA E TRANSCENDÊNCIA DE INTERESSES.

REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. (Decisão Interlocutória no Recurso Inominado Nº 5003379-47.2013.404.7213/SC. Relator: Juiz Federal Henrique Luiz Hartamann. Data: 29 jan. 2014).

O processo seguiu sobrestado até 23 de novembro de 2016, quando, após o julgamento do ARE 664.335 do STF, os Juízes da 2ª Turma Recursal de Santa Catarina acordaram para dar provimento ao Recurso do INSS e negar provimento ao recurso da parte autora, que, por sua vez, protocolou Embargos de Declaração objetivando atribuir efeitos infringentes e obter reconhecimento da especialidade para o período de 06/03/1997 a 06/03/2013.

Seguindo o voto do Juiz Federal Redator, Henrique Luiz Hartmann, foram parcialmente acolhidos os Embargos de Declaração pela 2ª Turma Recursal de Santa Catarina, em 12 de abril de 2017, atribuindo-lhes efeitos infringentes, reformando a decisão para considerar especial somente o período de 06/03/1997 a 11/12/1998, por considerar que “[...] a parte autora laborou exposta a ruído de 86 dB, e, ainda, a óleos minerais e graxas, de modo habitual e permanente, com utilização de EPIs nº 11070.”(Recurso Cível nº 5003379-47.213.4.04.7213/SC. 12 abr. 2017.

Portal da Justiça Federal). Consideraram que, apesar de haver utilização de EPI eficaz no período, somente a partir de 11 de dezembro de 1998 essa utilização afasta a agressividade do agente.

Em 23 de agosto de 2017, a Colenda Terceira Seção do TRF4 admitiu o IRDR nº 5054341-77.2016.4.04.0000, para examinar a seguinte questão controversa:

A comprovação da eficácia do EPI, e conseqüente neutralização dos agentes nocivos, deve ser demonstrada somente pelo PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) ou requer dilação probatória pericial, especialmente a descrição do tipo de equipamento utilizado, intensidade de proteção proporcionada ao trabalhador, treinamento, uso efetivo do equipamento e a fiscalização pelo empregador? (Decisão IRDR nº 5054341-77.2016.4.04.0000. Evento 47. Publicação: 24 ago. 2017. Relator Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz).

A decisão da Colenda Terceira Seção do TRF4 acompanhou o voto do Desembargador Federal Relator Jorge Antonio Maurique estabelecendo a seguinte tese jurídica: “A mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário” (IRDR nº 5054341-77.2016.4.04.0000/SC, 2017), o Relator conclui:

Portanto, para o STF, em decisão que vincula este juízo, se a prova produzida não for conclusiva acerca da eficácia do EPI, a dúvida resolve-se pelo reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria especial. Pelo exposto, voto por solver o IRDR estabelecendo a seguinte tese jurídica: a mera juntada de PPP referindo a eficácia de EPI é insuficiente para a comprovação da eliminação/neutralização dos agentes insalubres, incumbindo ao INSS, nos termos do art. 373, § 1º, do NCPC, realizar a prova da eficácia dos equipamentos de proteção individual, de acordo com o que preconizam os artigos 279 e 680 da IN 77/2015 e item 6.6.1 da NR 6, por registros de fiscalização ou por laudo pericial elaborado por perito designado pelo juízo. (Termos do Voto do Redator Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz no IRDR nº 5054341-77.2016.4.04.0000/SC, Evento 131. Data: 29 nov. 2017) [grifo original].

Recorreram ambas as partes, assim como, na condição de amicus curiae, o IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário) e o IEPREV (Instituto de Estudos Previdenciários). Todos protocolaram Embargos de Declaração, conforme descrito no corpo do Relatório do Voto do Redator Desembargador Federal Jorge Antonio Maurique:

1) Os Embargos do IBDP:

O IBDP aduz existência de: a) OMISSÃO sobre o 'Segundo Passo', as situações que dispensam a produção da eficácia da prova do EPI seriam meramente exemplificativas; b) OMISSÃO - o que aconteceria nos casos em que a empresa estivesse desativada e/ou não existisse mais (ao INSS

caberia comprovar a ineficácia do EPI?); c)

OBSCURIDADE/CONTRADIÇÃO - necessidade de se 'amarrar' a tese fixada ao 'roteiro resumido do procedimento'. (TRF4, IRDR nº 5054341-77.2016.4.04.0000).

2) Os Embargos do IEPREV:

O IEPREV sustenta que o 'roteiro resumido' estaria incompleto e/ou errado, isso porque - antes de se deliberar sobre a real necessidade de realização de perícia judicial - a empresa deveria ser notificada para apresentar certas provas documentais (que elenca). Também sustenta que, caso o segurado apresente contracheques a partir de 03.12.1998 (comprovando a percepção de adicional de insalubridade pago pela empresa), não seria necessária a realização de qualquer outra prova documental ou pericial nos termos das Súmulas 80 e 289 do TST para elidir a eficácia do EPI. (TRF4, IRDR nº 5054341-77.2016.4.04.0000).

3) Os Embargos do Autor:

[…] sustenta que o 'roteiro resumido' estaria incompleto e/ou errado, isso porque - comprovado nos autos, através da juntada da Ficha de Entrega do EPI ou outro documento que leve a convicção do juízo a não utilização do EPI (pelo não uso ou não entrega) - não seria necessária qualquer outra espécie de constatação para reconhecimento da atividade especial, devendo o Juiz de ofício reconhecer o tempo de serviço em especial.

Também aponta algumas outras medidas/diligências que o juiz poderia ordenar/tomar antes de transferir ao empregado o ônus de demonstrar a ineficácia do uso do EPI. Ainda sustenta que há contradição no segundo passo do 'roteiro resumido', quando se diz que o juiz poderá determinar a realização da perícia, quando - na verdade e conforme todo o 'espírito' do voto - o juiz deveria realizar a perícia. (TRF4, IRDR nº 5054341-77.2016.4.04.0000).

4) Os Embargos do INSS:

O INSS, por sua vez, sustenta que: a) OMISSÃO - falta de análise de argumento essencial da defesa. Violação do CPC/2015, arts. 371 e 489, caput e inc. IV, e da CRFB/1988, art. 93, IX; sustentou a inadmissibilidade do IRDR, por suas teses implicarem claramente uma tarifação da prova , com violação do CPC/2015, art. 371; b) Decisão fora dos limites para os quais o IRDR foi admitido. Julgamento como IRDR de tese sem os requisitos necessários. Surpresa. Violação do CPC/2015, arts. 10, 976 a 987, e 1.022, III; o Desembargador-Relator teria ampliado o objeto do IRDR para incluir tese sobre a inversão do ônus da prova referente à comprovação da eficácia do equipamento de proteção individual; c) Argumento por cautela: mérito da questão da inversão do ônus da prova.

Prequestionamento do CPC/2015, art. 373; Lei n. 8.213/1991, arts. 57, § 4º, e 58 § 1º; e CRFB/1988, art. 201, § 1º na inversão do ônus da prova: troca-se a efetiva exposição (requisito legal) por uma exposição presumida, com violação da Lei n. 8.213/1991, art. 57 § 4º e art. 58 § 1º, e da CRFB/1988, art. 201, § 1º. No entanto, uma presunção, decorrente do comportamento do réu no processo, não equivale, nem pode equivaler, à efetiva exposição do trabalhador ao agente nocivo. Por força da expressa vedação do art. 201, § 1º, da CRFB/1988, é dever do INSS, do juiz e das partes em juízo, somente aceitar a contagem especial do tempo de contribuição quando provada a exposição efetiva- não fictícia, conjecturada ou presumida- a agente nocivo.

Em resumo, a inversão do ônus da prova não poderia ser fixada em abstrato e de forma vinculante (IRDR); d) OMISSÃO. Falta de análise da questão da indivisibilidade do PPP como prova. Contrariedade ao CPC/2015, arts. 412 e 419. (TRF4, IRDR nº 5054341-77.2016.4.04.0000).

O Acórdão da Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no ED do IRDR nº 5054341-77.2016.4.04.0000/RS, em 03 de outubro de 2018, veio no mesmo sentido do Voto do Relator, para negar provimento aos embargos de declaração do INSS e do IEPREV e dar parcial provimento aos aclaratórios do Autor e do IBDP, assim, reprisa-se as razões parcialmente providas:

VOTO 1) Embargos de declaração do IBDP a) OMISSÃO sobre o 'Segundo Passo', as situações que dispensam a produção da eficácia da prova do EPI seriam meramente exemplificativas; O voto-condutor do acórdão ora embargado apresentou situações TAXATIVAS em seu 'roteiro resumido'.

Todas as demais devem ser solvidas na eventual pericia judicial. b) OMISSÃO - o que aconteceria nos casos em que a empresa estivesse desativada e/ou não existisse mais (ao INSS caberia comprovar a ineficácia do EPI?); Há omissão. Passo a complementar o voto-condutor. Nos casos em que a empresa está desativada e/ou não existe mais, o ônus continua sendo do INSS (comprovar a eficácia do uso do EPI). c) OBSCURIDADE/CONTRADIÇÃO - necessidade de se 'amarrar' a tese fixada ao 'roteiro resumido do procedimento'. A tese está bem construída e não depende de qualquer complemento. Apresenta o núcleo necessário. O 'roteiro resumido' é o seu complemento lógico e teórico, o qual deve ser - por conseqüência - observado na aplicação da tese. […] 3) Embargos de declaração de S. S. Sustenta-se que o 'roteiro resumido' estaria incompleto e/ou errado, isso porque - comprovado nos autos, através da juntada da Ficha de Entrega do EPI ou outro documento que leve a convicção do juízo a não utilização do EPI (pelo não uso ou não entrega) - não seria necessária qualquer outra espécie de constatação para reconhecimento da atividade especial, devendo o Juiz de ofício reconhecer o tempo de serviço em especial. Também aponta algumas outras medidas/diligências que o juiz poderia ordenar/tomar antes de transferir ao empregado o ônus de demonstrar a ineficácia do uso do EPI. Não qualquer omissão, obscuridade, contrariedade ou erro material. A parte está discordando da solução jurídica posta no acórdão. Ou seja, se busca a rediscussão do tema, objetivo ao qual não se prestam estes embargos de declaração (art. 1.022 do Código de Processo Civil - Lei nº 13.105, de 2015). Ainda, se sustenta que há contradição no segundo passo do 'roteiro resumido', quando se diz que o juiz poderá determinar a realização da perícia, quando - na verdade e conforme todo o 'espírito' do voto - o juiz deveria realizar a perícia. Há contradição. De fato, todas as considerações e a linha lógica do voto-condutor apontam a obrigatoriedade de o juiz determinar a realização da perícia. (TRF4, ED-IRDR nº 5054341-77.2016.4.04.0000/SC) [grifos originais] [suprimiu-se o nome do autor “S. S.”].

Diante disso, o Autor protocolou Recurso Especial, a Autarquia protocolou Recurso Especial e Recurso Extraordinário. Houve admissão aos Recursos Especiais, porém, o Recurso Extraordinário não foi admitido.

A Autarquia agravou a inadmissão do REx, mas o TRF - 4 manteve a decisão e determinou o prosseguimento somente do REsp com remessa ao STJ, registrado sob o nº 1.828.606 - RS (2019/0218109-8) em 26 de julho de 2019, onde tramita.

Atualmente, o REsp encontra-se concluso para decisão do Ministro Presidente da Comissão Gestora de Precedentes Paulo de Tarso Sanseverino, desde o dia 15 de outubro de 2020, em fase de análise formal, para decidir acerca do rito e a abrangência que a decisão material terá, portanto, sem julgamento de mérito, conforme se extrai dos despachos constantes portal do STJ consultado em 16 de novembro de 2020.