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Os postos de revenda de combustíveis líquidos, citado doravante neste trabalho como “postos de revenda de combustível”, são caracterizados como estabelecimentos comercializadores de combustíveis líquidos (gasolina, etanol, diesel, óleos e graxas lubrificantes). Estes produtos, com a exceção do etanol, são derivados de petróleo e constituídos de hidrocarbonetos aromáticos (BTEX) e poliaromáticos (HPA). Concomitante a esta atividade primária, ocorrem atividades secundárias associadas a estes empreendimentos, como: lavagem de veículos, lubrificação, lojas de conveniência, etc.

Os produtos derivados do petróleo, segundo diversas pesquisas realizadas por institutos conceituados como a americana Environmental Protection Agency – EPA (EPA, 2012) são tóxicos e cancerígenos justificando assim, um maior controle sobre a sua utilização, seja no transporte, no armazenamento ou na distribuição, exigindo um licenciamento ambiental obrigatório, para um maior controle sobre as possíveis contaminações.

Nos combustíveis líquidos, os compostos aromáticos detêm uma maior preocupação na sua utilização, pois são considerados como os mais tóxicos entre as demais substâncias presentes na composição dos combustíveis e os de maior mobilidade no meio ambiente,

podendo ser rapidamente transportado através do solo e da água subterrânea, devido a sua volatilidade e solubilidade, respectivamente (Silva & Ramalho, 2012).

Esses compostos (comumente denominados BTEX) são poderosos depressores do sistema nervoso central, apresentando toxidade crônica, mesmo em pequenas concentrações (da ordem de ppb – parte por bilhão). O benzeno, dentre eles, é reconhecidamente o composto mais tóxico, devido às evidências epidemiológicas e suas propriedades carcinogênicas relatadas em vários trabalhos e pesquisas. Segundo estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS), de um grupo de mil trabalhadores expostos a 1 ppm (uma parte por milhão) de benzeno durante sua vida de trabalho, três deles desenvolverão leucemia (OMS, 2012).

2.1.1 - Potencialidade e riscos de contaminação do solo e águas subterrâneas por combustíveis

O problema da contaminação do solo por hidrocarbonetos de petróleo em postos de revenda de combustível vem, cada vez mais, merecendo a atenção da população em geral, bem como dos órgãos de controle ambiental. A contaminação pode ocorrer por vazamento, derramamento ou transbordamento de combustível. As principais causas são associadas à falha humana durante a descarga do combustível, defeitos na estrutura do tanque e linhas subterrâneas. Medidas preventivas foram tomadas em relação ao licenciamento dos postos a fim de evitar acidentes. Dentre essas medidas, destaca-se a adequação das instalações e equipamentos especializados.

A principal preocupação, relacionada ao vazamento de combustível, é decorrente da possível contaminação de aquíferos, utilizados como fontes de abastecimento da população, ocasionando danos à saúde humana. A cidade de Natal/RN é geograficamente dividida pelo rio Potengi, conforme ilustrado na Figura 2.1. A distribuição locacional do abastecimento público de água para a cidade de Natal/RN é concebido de duas maneiras: 1) na região localizada ao norte do rio (zona norte do município), 30% provêm dos aquíferos subterrâneos, enquanto 70% provêm da Lagoa de Extremoz; 2) na região localizada ao sul do rio (zonas sul, leste e oeste do município) ocorre o inverso: 70% do abastecimento público de água é oriundo de aquíferos subterrâneos e 30% da Lagoa do Jiqui (Silva & Xavier 2010).

Figura 2.1. Mapa da cidade de Natal/RN – divisão administrativa. Fonte: SEMURB (2007)

Nessa perspectiva, a preocupação com possíveis contaminações é agravada devido à fragilidade geológica do sistema aquífero Dunas-Barreiras, onde se encontra o manancial de águas subterrâneas. O aquífero possui ambientes livres - dunas (onde não existem barreiras de acesso ao manancial) e confinados - barreiras. Contribui, ainda para a vulnerabilidade deste aquífero, quanto à contaminação, o lençol freático ser raso e o solo de natureza arenosa, bastante poroso e permeável (Silva & Ramalho, 2012).

A porosidade do solo, definida pela razão entre o volume de espaços vazios pelo volume total da amostra, tem relação direta com a permeabilidade, devido a capacidade de algumas rochas possuírem e deixarem-se atravessar com maior ou menor facilidade por líquidos. Em outras palavras, um solo poroso com alta permeabilidade facilita a migração de líquidos pelo mesmo, neste caso, os contaminantes. A Figura 2.2 ilustra a diversidade da porosidade e permeabilidade dos solos para uma melhor compreensão dos conceitos.

Figura 2.2. Porosidade e permeabilidade do solo. Fonte: Elaboração própria.

2.1.2 - Preocupação global e local com as contaminações de solo e águas subterrâneas

Os países industrializados da Europa e da América do Norte têm demonstrado grande preocupação com a contaminação do solo e das águas contaminadas. O que pode ser comprovado pela evolução nos últimos 40 anos de projetos de identificação, cadastramento e reabilitação desses ambientes executados por órgãos como a Enviromental Protection Agency – EPA americana e a European Environment Agency – EEA europeia (EPA, 2012; EEA, 2007).

Na década de 70, a agência ambiental federal americana (EPA) diagnosticou a existência de mais de 36.000 áreas consideradas contaminadas. No continente europeu, a

Alemanha é o país mais desenvolvido no estudo de áreas contaminadas, inclusive prestando uma cooperação técnica com a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental - CETESB para a elaboração do manual de gerenciamento de áreas contaminadas, publicado pelo órgão no ano de 2001.

Os Estados Unidos, há cerca de três décadas, fortificou as regulamentações federais e estaduais, evitando futuras contaminações e por meio da agência nacional de proteção ambiental - EPA estima um total de 450.000 áreas contaminadas no país, sendo que 50% do total, contaminadas por derivados de petróleo, os chamados brownsfields (EPA, 2012). A EPA vem atuando em intensos projetos de identificação e remediação dessas áreas e, apesar da legislação e controle, estima que cerca de 7 mil novos lançamentos de poluentes ocorrem por ano naquele país, sendo a maioria relativamente de pequena proporção, detectados em pouco tempo depois de seu início, não ocasionando grandes contaminações.

Diante do exposto, os Estados Unidos têm-se demonstrado o país mais avançado nas ações de identificação, caracterização e remediação das áreas contaminadas. Por sua vez, o continente europeu vem empenhando grandes esforços neste sentido, sendo destaques países como a Holanda, Alemanha e Dinamarca.

O dinamismo dos Estados Unidos pode ser um influenciador para despertar a política pública brasileira na intervenção dos ambientes dos postos. Com leis federais mais rígidas, a partir de 1998, houve uma evasão de muitos proprietários americanos de postos de revenda de combustível porque haviam recursos insuficientes e infraestrutura inadequada para atender à legislação, os quais tornavam os passivos ambientais uma ameaça à saúde pública americana, sendo necessária a intervenção do governo para desativação e remediação dessas áreas. Com a inspiração dessa realidade, o governo brasileiro poderá direcionar suas políticas públicas, no sentido de propor linhas de crédito e até mesmo financiar a remediação e adequação dessas áreas, minimizando os danos econômicos e sociais na sociedade.

Observa-se com este fato que o princípio poluidor-pagador nem sempre funciona, seja por contaminações passadas ou pela insolvência dos poluidores. Faz-se necessário adotar um fundo público para esta necessidade (EEA, 2007). A Figura 2.3 apresenta uma estimativa da porcentagem de recursos europeus públicos e privados para a remediação de áreas contaminadas no ano de 2007, quando foi estimado um total de 250.000 áreas contaminadas nos países membros da EEA e numa tendência crescente.

Figura 2.3. Distribuição de recursos públicos e privados para remediação de áreas contaminadas na Europa. Adaptado de EEA, 2007.

Observa-se que a República Tcheca, a Espanha e a Macedonia tem privilégio na subvenção governamental em 100% para remediação de áreas contaminadas. Em contrapartida, os demais países necessitam dos recursos privados na adequação da conformidade ambiental.

De maneira similar, segundo a pesquisa anterior realizada pela EEA, houve um detalhamento com profundidade das diversas fontes de contaminação, resultando em indícios de uma grande participação dos postos de revenda de combustível na contaminação dos solos. A lista completa das atividades industriais e comerciais, responsáveis pela contaminação do solo, em relação ao número de locais para cada ramo de atividade é apresentada na Figura 2.4. No Canadá, o panorama é atualmente similar ao dos EUA e está sob controle, por meio de uma rigorosa legislação e fiscalização. No entanto, o aumento do uso do etanol em ambos os países desperta uma nova preocupação por parte dos especialistas sobre o seu impacto nas águas subterrâneas, devido à propriedade do etanol de tornar componentes da gasolina, como o benzeno, mais móveis e persistentes nas águas subterrâneas. Atualmente, cerca de 80% da gasolina dos EUA contêm 10% de etanol, o que incentiva novas pesquisas na compreensão dos efeitos conjuntos entre o etanol e o benzeno no solo e nas águas subterrâneas.

Na perspectiva do cenário mundial exposto, pode-se concluir que a regulamentação, fiscalização e adoção de novas tecnologias tornaram-se atuantes na prevenção, identificação e

remediação de solos contaminados. Exige-se maiores esforços por parte do Governo em ações com suportes financeiros aos pequenos empresários, para adequação das instalações e remediação de passivos ambientais.

Figura 2.4. Atividades industriais e comerciais, responsáveis pela contaminação do solo de países europeus no ano de 2007. Adaptado de EEA, 2007.

No Brasil, os processos de investigação da contaminação dos solos iniciaram no Estado de São Paulo, por meio da CETESB, sendo o primeiro órgão de controle ambiental na América Latina a possuir um sistema organizado no gerenciamento de áreas contaminadas. A CETESB é uma referência para ações similares em outros estados. Dos 4.131 registros, no cadastro de áreas contaminadas no estado de São Paulo, cadastradas pela CETESB em dezembro de 2011, 78 % (3.217) são devido a postos de abastecimento de combustíveis (CETESB, 2012).

As regulamentações ambientais mais rígidas, referente a Resolução CONAMA nº 273/2000, têm exigido uma investigação, identificação e remediação do passivo ambiental (caso exista) para licenciamento dos postos de revenda de combustível. Tal resolução, de maneira similar aos países desenvolvidos, possibilitou uma maior transparência da grande contaminação desse segmento, sendo uma realidade desconhecida no cenário brasileiro. A implementação dessa legislação foi um ganho para a preservação ambiental brasileira, sendo assim representada em números quantitativos a ameaça ao meio ambiente.

Diversas capitais, pela imposição da legislação, acionaram seus órgãos responsáveis para a fiscalização e licenciamento de postos de revenda de combustível. No entanto, em pequenas cidades do interior brasileiro, o cenário é muito diferente, devido aos órgãos municipais de fiscalização e defesa do meio ambiente dessas cidades, quando existentes, não possuírem infraestrutura necessária para o licenciamento da atividade.

Áreas contaminadas impõem algumas restrições ao desenvolvimento urbano, devido a limitações no seu uso. Esses impactos podem refletir em diferentes ambientes econômicos, como, por exemplo, na redução do valor imobiliário de bens. É iminente a necessidade de divulgar em veículos públicos um cadastro das áreas contaminadas e restrições de uso, como realizado no Estado de São Paulo pela CETESB, para conscientizar a população. Esse conhecimento público é fundamental para a sociedade, principalmente em centros urbanos, cujo solo é extremamente valorizado e para conhecimento das restrições de uso de determinadas áreas. Resistências quanto à divulgação dessas áreas são impostas pelos mais diversos setores, sobretudo o imobiliário. Registra-se neste trabalho, a importância da divulgação desse conhecimento para a população.

A Figura 2.5 apresenta uma sistematização dos procedimentos realizados pela CETESB para o cadastramento de áreas contaminadas. A CETESB classifica em diferentes amplitudes as áreas contaminadas, como: contaminada sob investigação; contaminada; monitoramento para reabilitação e reabilitada.

Figura 2.5. Sistematização dos procedimentos para identificação e cadastramento de áreas contaminadas. Fonte: Adaptado de CETESB, 2012.

Identificação das áreas contaminadas (região de interesse) Avaliação preliminar Avaliação confirmatória Cadastro das Áreas

Reabilitação das áreas contaminadas Investigação detalhada Avaliação de risco Concepção da remediação Projeto de remediação Remediação Monitoramento