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Práticas de Linguagem e PCN: O Ensino de Língua Portuguesa

3 A LINGUÍSTICA TEXTUAL E O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

3.1 Práticas de Linguagem e PCN: O Ensino de Língua Portuguesa

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1998b) de Língua Portuguesa apresentam propostas de organização de conteúdos e delimitação de objetivos que, conforme Souza (1983 apud SANTOS; RICHE; TEIXEIRA, 2015, p. 15), visam à formação dos alunos “como coautores do conhecimento, não somente reproduzindo terminologia gramatical - tal qual se vê no ensino tradicional -, mas principalmente fazendo com que os alunos reflitam sobre sua língua”. Assim, os Parâmetros defendem a ideia de que “ensinar português nos níveis fundamental e médio só faz sentido com base em textos orais e escritos, buscando uma interação entre leitura, produção textual e análise linguística” (SANTOS; RICHE; TEIXEIRA, 2015, p. 15 – 16).

De acordo com Santos; Riche & Teixeira (2015):

quando se defende uma abordagem textual, entra em questão o uso de textos como unidade de ensino, e não como mero pretexto para destacar dígrafos, substantivos abstratos ou sujeitos, por exemplo. Textos artificiais ou em formato de frases soltas, como ‘Ivo viu a uva’ ou ‘Vovô viu a vovó’, não colaboram para a percepção linguística dos alunos, nem para sua formação como leitores. Exemplos assim representam, na verdade, pseudotextos, já que estão descontextualizados, sem uma situação real na qual possam ser usados como elementos de interação. São meras atividades de ‘leitura’, provavelmente para treinar a escrita de sílabas ou palavras com determinado fonema, sem formar um todo significativo (SANTOS; RICHE; TEIXEIRA, 2015, p. 16).

Assim, “o texto como unidade de ensino pressupõe um trabalho que congregue as três práticas de linguagem apresentadas nos Parâmetros: prática de leitura de textos orais/escritos,

prática de produção de textos orais/escritos, prática de análise linguística” (SANTOS; RICHE; TEIXEIRA, 2015, p. 16).

Em comum entre tais práticas de linguagem, o pressuposto de que somente relacionando USO-REFLEXÃO-USO é possível pensar um ensino de língua portuguesa produtivo, em que

O aluno passe da condição de aprendiz passivo para a de alguém que constrói seu próprio conhecimento – com a ajuda do professor, é claro -, por observar o funcionamento da estrutura da língua nos mais diversos gêneros textuais, lidos e produzidos por ele. O desafio que se apresenta ao professor é, então, trabalhar as três práticas de linguagem apresentadas nos Parâmetros de maneira integrada (SANTOS; RICHE; TEIXEIRA, 2015, p. 16 -17). Sobre tal perspectiva, as autoras supracitadas manifestam ainda que, “para que a escola enfatize o texto como unidade de ensino, é necessário, primeiramente, que o professor repense o conceito de texto” (SANTOS; RICHE; TEIXEIRA, 2015, p. 23). Salientam que, “quando os PCN defendem o ensino com base em textos, trata-se de textos orais e escritos. Mais que isso: para compreender certos textos, é necessário observar outras linguagens além da verbal” (SANTOS; RICHE; TEIXEIRA, 2015, p. 23).

As referidas autoras concluem nos alertando sobre a necessidade de compreender que “a junção de palavras e frases, apenas, não constitui um texto: ele precisa ser aceito como tal; o sentido precisa ser construído. E isso só se faz ultrapassando a superfície linguística e entrando numa análise textual e discursiva” (SANTOS; RICHE; TEIXEIRA, 2015, p. 24- 25).

Logo, o ensino de textos, segundo Santos; Riche e Teixeira (2015, p. 25), precisa englobar aspectos variados, como “o suporte onde ele circula, o gênero textual a que pertence, a tipologia textual predominante, considerando elementos verbais e não verbais constituintes desse texto, além da interação entre interlocutores”. Assim, “o objetivo principal dessa abordagem é a formação de leitores e produtores críticos, com conhecimentos linguísticos e textuais suficientes para serem cidadãos, leitores de mundo” (Op. cit. 2015, p. 25).

Dialogando com as ideias de Santos; Riche e Teixeira (2015) sobre o ensino de textos, Marcuschi (2008), ao discutir sobre as características de alguns gêneros e como eles se organizam, revela que “existe grande variedade de gêneros textuais analisada em manuais de língua portuguesa”. Contudo, nos dizeres do autor, uma observação mais atenta e qualificada revela que “a essa variedade não corresponde uma realidade analítica. Pois os gêneros que aparecem nas seções centrais e básicas, analisados de maneira aprofundada são sempre os mesmos” (MARCURSCHI, 2008, p. 206 – 207). Para ele, ainda existem poucos casos de

tratamento dos gêneros textuais de forma sistemática. Mas, a passos lentos, vão surgindo novas possibilidades que incluem até mesmo o recurso da oralidade. Além disso, O autor explica que “os gêneros orais em geral ainda não são tratados de modo sistemático. Apenas alguns, de modo particular os mais formais, são lembrados em suas características básicas” (Op. cit. 2008, p. 207).

Diante da multiplicidade de gêneros existentes e diante da necessidade de escolha dos ideais para o ensino de língua, Marcuschi (2008, p. 207) revela que “não há uma resposta consensual, embora tudo indique que a resposta seja não”. Mas, segundo o autor, “é provável que se possam identificar gêneros com dificuldades progressivas, do nível menos formal ao mais formal, do mais privado ao mais público e assim por diante” (Op. cit. 2008, p. 207).

Marcuschi (2008, p. 207) acrescenta que “há muito mais gêneros na escrita do que na fala, o que é de certo modo surpreendente, mas explicável pela diversidade de ações linguísticas que praticamos no dia a dia na modalidade escrita”. Desse modo, o autor afirma que “as civilizações em que a escrita tem um papel central nas tarefas do dia a dia, mormente no comércio, indústria e produção de conhecimento, tendem a diversificar de maneira acentuada as formas textuais utilizadas” (Op. cit. 2008, p. 207).

Bakhtin (1979 apud MARCUSCHI, 2008, p. 208) aponta os gêneros textuais como “esquemas de compreensão e facilitação da ação comunicativa interpessoal. Essa estabilização de formas textuais repercute não só no processo de compreensão, mas na própria estabilização de formas sociais de interação e raciocínio”.

Assim, Marcuschi (2008, p. 208) considera que “a distribuição da produção discursiva em gêneros tem como correlato a própria organização da sociedade”. Para o autor, “o estudo sócio-histórico dos gêneros textuais é concebido como uma das maneiras de entender o próprio funcionamento social da língua” (MARCUSCHI, 2008, p. 208). Nas palavras do autor, “isto nos remete a uma perspectiva teórica dos estudos linguísticos sobre o texto e do texto, ou seja, a visão sociointeracionista” (Op. cit. 2008, p. 208).

Mediante as considerações a respeito das práticas de linguagem nos PCN, partimos para uma explanação sobre o relacionamento entre Gênero, Texto e Discurso.