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FUNDAMENTAL À RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO E DA EFETIVIDADE JURISDICIONAL?

5.3 Ativismo judicial vs garantismo processual

5.3.2 Princípio da cooperação

Com inspiração no direito português,296 o princípio da cooperação tem sido o fundamento para legitimar a postura proativa do juiz no processo. Trata-se de um princípio

295 LOPES, Maria Elizabeth Castro. O juiz e o princípio dispositivo. São Paulo: RT, 2006, p. 117.

296 O princípio da cooperação está expressamente previsto no código de processo civil português: “Art 266. (princípio da

cooperação): 1. Na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio. 2. O juiz pode, em qualquer altura do processo, ouvir as partes, seus representantes ou mandatários judiciais, convidando-os a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurem pertinentes e dando-se conhecimento à outra parte dos resultados da diligência. 3. As pessoas referidas no número anterior são obrigadas a comparecer sempre que para isso forem notificadas e a prestar os esclarecimentos que lhes forem pedidos, sem prejuízo do disposto no n.3 do art.519. 4. Sempre que alguma das partes alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade ou o cumprimento de ônus ou dever processual, deve o juiz, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo.” Também o art.519 do Código de Processo Civil português faz expressa referência ao princípio da cooperação para a descoberta da verdade, a saber: “Art.519. (Dever de cooperação para a descoberta da verdade) 1. Todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendo-se às inspecções necessárias, facultando o que for requisitados e praticando os actos que forem determinados. 2. Aqueles que recusem a colaboração devida serão condenados em multa, sem prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis; se o recusante for parte, o tribunal apreciará livremente o valor da recusa para efeitos

voltado à conduta do juiz no processo com a finalidade de afastar a imagem do juiz inerte, estranho da relação processual, que funciona apenas como um mero expectador.

Como afirma Daniel Amorim Assumpção Neves, o objetivo do princípio da cooperação é exigir uma participação efetiva do juiz no processo.

O objetivo do princípio é exigir do juiz uma participação mais efetiva, entrosando-se com as partes de forma que o resultado do processo seja o resultado dessa atuação conjunta de todos os sujeitos processuais. O juiz passa a ser um integrante do debate que se estabelece na demanda, prestigiando esse debate entre todos, com a ideia central de que, quanto mais cooperação houver entre os sujeitos processuais, a qualidade da prestação jurisidicional será melhor.297

O princípio da cooperação, também chamado da colaboração, surge do entendimento da relação jurídica processual fundada por Bülow. Essa relação jurídica processual consiste na relação entre os sujeitos do processo, isto é, entre o juiz e as partes de um lado e as partes entre si de outro.

A concepção processual de que o processo é um meio de busca da justa aplicação do ordenamento jurídico no caso concreto conduz à ideia de que para concretizar este intento é necessário um juiz ativo e a participação ativa das partes. Assim, o juiz “não pode agir como mero fiscal da lei, devendo se portar como agente colaborador do processo, participante ativo do contraditório”.298

A compreensão correta dessa postura ativa não é a de um juiz que conduza o processo com arbitrariedades, mas em conjunto com as partes. A fim de evitar arbitrariedades, o juiz na condução do processo, e em atenção ao princípio da cooperação, deve ficar atento a três deveres: esclarecimento, de consulta e de prevenção.

(I) Dever de esclarecimento, consubstanciado na atividade do juiz de requerer às

partes esclarecimentos sobre as suas alegações e pedidos, o que naturalmente evita a decretação de nulidades e a equivocada interpretação do juiz a respeito de uma conduta assumida pela parte;

(II) Dever de consultar, exigindo que o juiz sempre consulte as partes antes de proferir decisão, em tema já tratado quanto ao conhecimento de matérias e questões de ofício;

(III) Dever de prevenir, apontando às partes eventuais deficiências e permitindo suas devidas correções, evitando-se assim a declaração de nulidade, dando-se ênfase

ao processo como genuíno mecanismo técnico de proteção de direito material.299

probatórios, sem prejuízo da inversão do ônus da prova decorrente do preceituado no n.2 do art.344 do Código Civil [...] (SOUZA, Artur César de. O princípio da cooperação no projeto do novo código de processo civil. Revista de Processo. v.225., nov.2013, p.65).

297 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 2.ed. São Paulo: Método, 2010, p.74. 298 DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 14.ed. São Paulo: Atlas, 2010, p.92.

Entretanto, o dever de colaborar para que a tutela jurisdicional se torne efetiva, rápida e adequada é também das partes do processo, uma vez que esse movimento colaborativo de todos em prol de um processo civil mais dinâmico e adequado ao tratamento do conflito judicializado aponta para uma democracia participativa no processo, que possibilita o exercício ativo de todos os sujeitos processuais.

Assim, as partes e o magistrado devem cooperar/colaborar com boa-fé para a eficaz condução do processo e eficiente administração da Justiça. Desse modo, configurar-se- á o processo como um procedimento enfatizado no diálogo das partes e o juiz, e não um combate ou um jogo destrutivo, ocasionando assim, um tratamento construtivo do litígio.

Mesmo sem previsão legal, o princípio da cooperação é utilizado e “deve ser entendido como diálogo, no sentido de troca de informações, de municiar o magistrado com todas as informações possíveis e necessárias para melhor decidir”300.

Importa referir que em alguns sistemas jurídicos, “a concepção do princípio da cooperação mostra-se tão intenso que se veda ao magistrado que fundamente a sua decisão em ponto de vista estranho ao das partes, por elas considerado irrelevante ou por elas valorada, analisada diferentemente sem que lhe dê, antes, possibilidade de se manifestar”.301

O Projeto do novo CPC (PL nº8.046/10) recepciona o princípio da cooperação em seu artigo art.6º, que dispõe: “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”. Havendo aprovação do referido projeto de lei, a cooperação não só é reconhecida, por sua importância, como também é recepcionada como princípio basilar do processo civil.