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F UNDAMENTAÇÃO T EÓRICA

1. Sobre a teoria da atividade (TA)

1.2 Princípios

Os princípios que embasam a teoria da atividade são amplamente discutidos por diversos estudiosos, tais como Engeström (1987, 1999), Russel (2002), Jonassen (1999b) e Kaptelinin & Nardi (1997).

O primeiro princípio relaciona-se à hierarquia da atividade. Um sistema de atividade é visto como uma unidade de análise e ações e operações individuais e grupais, relativamente independentes, mas ainda assim consideradas como unidades subordinadas de análise, entendidas somente quando interpretadas levando-se em conta a divisão do trabalho para a realização da atividade e as regras que cada participante do sistema pode interpretar. Jonassen (1999b) enfatiza ser esse o princípio que lida com a comunidade a qual negocia e medeia as regras e os procedimentos que descrevem como a comunidade funciona, no que ela acredita e as formas em que se apoiam diferentes atividades. A divisão de trabalho na comunidade é mediada por regras e por negociação social. Por sermos participantes de várias comunidades (comunidade do trabalho, do círculo social, do círculo familiar), precisamos nos ajustar às expectativas socialmente mediadas nos diferentes grupos.

O terceiro princípio trata da historicidade. Na teoria da atividade, as atividades desenvolvem-se em um espaço de tempo e dentro de uma cultura de forma irregular e descontínua. Para compreendermos a dinâmica de uma situação particular, é necessário entendermos as mudanças ou evoluções

ocorridas na situação estudada. Russel (2002) subdivide esse princípio em mudanças históricas, desenvolvimento individual e mudanças seqüenciais.

O quarto princípio lida com a mediação de ferramentas (instrumentos, signos, procedimentos, máquinas, métodos, leis, conceitos etc.) e seu papel precisa ser entendido. As ferramentas medeiam ou alteram a natureza da atividade humana, são criadas e transformadas durante o desenvolvimento da atividade e, quando internalizadas, influenciam o desenvolvimento mental do homem. A noção de mediação ajuda a entender a relação entre o(s) sujeito(s) e seu(s) objetivo(s) para se engajar(em) em uma atividade particular. A natureza da ferramenta é, então, entendida no contexto da atividade humana e, assim, temos de observar o modo como as pessoas a utilizam, as necessidades satisfeitas e a história de seu desenvolvimento (Kaptelinin & Nardi,1997).

O quinto princípio trata da fonte de transformações e desenvolvimento de uma atividade, quando surgem as contradições e, a partir daí, as inovações. Esse princípio gera o princípio seguinte: a possibilidade de transformações expansionistas nos sistemas de atividade, fruto das contradições mencionadas no princípio anterior. A nova estrutura de atividade surge com base na reflexão e análise da estrutura anterior – “é necessário conhecer e entender o que se pretende transcender” (Engeström, 1999: 33. Tradução minha).

Além dos princípios mencionados, Russel (2002) sistematiza outros princípios baseados no trabalho de Michael Cole (1996) e aplica-os em questões relacionadas ao uso da tecnologia no contexto educacional. Para ele, o sexto princípio está ligado ao fato de o comportamento humano ser social e de a atividade humana ser coletiva. Corroborando o pensamento de Russel, Jonassen (1999b: 8) destaca que “poucas atividades são realizadas individualmente. As pessoas podem individualmente atuar em contextos, como a escola, por exemplo, mas a habilidade de atuar é estabelecida por

um grupo de pessoas” (Tradução minha). Ele dá o exemplo do pianista concertista cuja ação individual de uma apresentação solo se apóia em seus professores passados, nos fabricantes de piano, nos construtores do lugar onde se apresenta, na orquestra e no regente etc. Portanto, a atividade humana individual é um sistema de relações sociais e não existe sem essas relações (Jonassen, 1999b). As atividades são complexas, interativas e necessitam de esforço colaborativo.

O modo de visualizar a atividade em si realiza-se por meio do sistema de atividade. Ele interage com uma cadeia de outros sistemas de atividades e cada componente do sistema de atividade pode ser o produto ou o resultado de outros sistemas de atividade. O exemplo dado por Jonassen é o de um grupo de aprendizes que podem ser sujeitos de uma atividade instrucional específica e também serem o resultado (objeto) de uma tarefa de um instrutor que procura pessoas com idéias semelhantes para trabalhar em um projeto. Assim, influências externas (de outros sistemas de atividades) podem gerar modificações na atividade humana e isso pode provocar o que Engeström (1987: 82) chama de contradições no sistema de atividade.

Russel (2002) e Jonassen (1999b) concordam com o princípio seguinte, o sétimo, associado ao conceito de “consciência humana”. Na teoria da atividade, consciência é o fenomêno que une atenção, intenção, memória, razão e fala (Jonassen, 1999b) e ela se manifesta na praxis. A prática se insere em uma matriz social composta por pessoas e ferramentas (artefatos ou instrumentos físicos e sistemas de signos) usados na atividade. A consciência está presente no sistema de atividade mais geral, que rodeia as atividades do indivíduo. Jonassen (1999b) destaca que mudanças nas condições físicas, mentais ou sociais de um indivíduo são internalizadas e diretamente se refletem nas atividades conscientes desse indivíduo.

Além dos princípios mencionados, Jonassen (1999b ) refere-se a um oitavo princípio, relacionado à ação mediada no contexto. Para ele, as

atividades são as interações humanas com o mundo objetivo e com as atividades conscientes que são uma parte dessas interações. A teoria da atividade postula que a atividade é precursora da aprendizagem e a mente humana surge como um componente especial das interações com o ambiente. Por exemplo, designers entendem os processos instrucionais de

design com a prática de design em algum contexto. Assim, a ação é essencial para o entendimento: à medida que atuamos, ganhamos conhecimento que, por sua vez, afeta nossas ações, que mudam nosso conhecimento e assim por diante.

Jonassen (1999b) ainda destaca o nono princípio, o da intencionalidade, segundo o qual interagimos com os diversos contextos com um determinado objetivo e aprendemos sobre o mundo por intermédio dessas interações. O objetivo (ou motivo) pode ser consciente ou não e predetermina a estrutura de uma atividade, direcionando-a. O sujeito da atividade pode, então, controlar seu comportamento direcionando suas ações para a realização de certas metas. Nesse sentido, a teoria da atividade foca suas atenções nas ações realizadas por meio das intenções conscientes, as quais, antes de se manifestarem no mundo, são planejadas. Todavia, as intenções e os planos não são rígidos, mas sim incompletos e têm o caráter de serem tentativas. As intenções surgem a partir das contradições percebidas pelos indivíduos – o que eles acreditam que precisam saber para concretizar um objetivo e o que eles sabem de fato – e existem somente em seus contextos específicos.

As intenções são direcionadas para objetos da atividade (ver Quadro 5) e esse fato remete ao décimo princípio. Jonassen (1999b) explica que o objeto pode ser qualquer coisa, contanto que possa ser transformado pelos sujeitos do sistema de atividade. A transformação do objeto move seus sujeitos em direção à realização da meta (Quadro 1) e uma vez que o processo de transformação continua a motivar a atividade, o objeto da

atividade enfoca as ações intencionais sobre o objeto. O objeto da atividade afeta a natureza da atividade que, por sua vez, afeta o objeto em uma relação dinâmica. O objeto transformado é o motivo da atividade.

Um outro princípio importante na teoria da atividade trata de órgãos funcionais. Os indíviduos são dotados de recursos internos, e no mundo que nos rodeia existem os recursos externos. Como exemplos de recursos internos, podemos pensar nos olhos, nas mãos, na memória etc. E como exemplos de recursos externos, podemos pensar em óculos, tesouras, cadernos, entre outros. As ferramentas externas têm a função de dar suporte às habilidades humanas naturais e de complementá-las na realização de novas funções ou na realização de funções já existentes com maior eficiência. Por exemplo, podemos usar uma tesoura para ampliar a capacidade das mãos para cortar papéis. Quando existe uma integração entre uma ferramenta interna e outra externa, temos o desenvolvimento de um novo órgão funcional (Kaptelinin,1996).

Em resumo, onze principios foram mencionados: a) hierarquia da atividade; b) ênfase na divisão de trabalho para a realização da atividade e nas regras; c) historicidade da atividade; d) mediação de ferramentas; e) transformações e desenvolvimento da atividade e contradições; f) comportamento humano social e caráter coletivo da atividade; g) consciência humana; h) ação mediada no contexto; i) intencionalidade; j) direcionalidade das intenções e k) órgãos funcionais.