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O PROBLEMA DE PESQUISA NAS MONOGRAFIAS DE G RADUAÇÃO EM F ÍSICA Aqui é preciso interrogar-se sobre o funcionamento da teoria e da epistemologia na

definição (delimitação), caracterização e resolução dos problemas de pesquisa dos estudantes de Física da UEFS, para que se possa instaurar um processo de descrição, interpretação e

compreensão a partir da AD. Para tanto, é preciso manifestar as noções de teoria e de epistemologia que serão utilizadas nesse trabalho.

Segundo Ruiz (2001, p.82) uma teoria é uma macroestrutura que permite “uma aproximação entre o saber e a realidade” De modo mais específico, teoria é um conjunto de definições e proposições estabelecidas com o propósito de explicar ou prever fenômenos, bem como permitir – a partir de seus conceitos-chave – uma organização e sistematização do conhecimento.

No entanto, para a metodologia de trabalho da AD é mais útil seguir uma proposição de Kant (apud ABBAGNANO: 1998, p. 952-953) construída a partir da oposição teoria/prática. Assim para esse estudo:

Chama-se Teoria a um conjunto de regras também práticas, quando são pensadas como princípios gerais, fazendo-se abstração de certa quantidade de condições que exerçam influência necessária sobre a sua aplicação. (...) a Teoria condiciona tanto a observação dos fenômenos quanto o uso mesmo dos instrumentos de observação. (ABBAGNANO, 1998, p. 952-953).

O outro operador importante na elaboração do corpus é o trabalho da epistemologia. Uma definição clássica desse conceito encontra-se em Briones (2002, p.13), onde ele traz a seguinte asserção:

En términos generales, la epistemología se define como el análisis del conocimiento científico. En términos más específicos, esta disciplina analiza los supuestos filosóficos de las ciencias, su objeto de estudio, los valores implicados en la creación del conocimiento, la estructura lógica de sus teorías, los métodos empleados en la investigación y en la explicación o interpretación de sus resultados y la confirmabilidad y refutabilidad de sus teorías.

Uma concepção mais próxima dos objetivos deste trabalho é aquela proposta pelo astrônomo inglês Sir Arthur Eddington (apud PRÉLAT: 1948, p.17):

(...) la epistemología observa observadores científicos y en esto no tiene gran diferencia con la posición general de los hombres de ciencia; pero afirma que estudiando los observadores pueden sacarse consecuencias importantes acerca del resultado de sus observaciones y de la elaboración de las mismas, es decir, del conocimiento científico. (Grifo nosso).

Vê-se, pois, das duas citações supra, que a epistemologia é uma noção que se ocupa do imaginário de ciência daquele que produz o conhecimento e de como isso se reflete nos

planos social e cultural, seja pelos pressupostos, seja pelos valores ali implicados, com seus desdobramentos na linguagem e nos discursos.

Dentre os textos que abordam o conceito de epistemologia, há uma análise mais detalhada, em sua radicalidade, feita por Galeffi (2003, p.193-237). Partindo de uma arqueologia do conceito, tomando em separado suas componentes, inicialmente, Galeffi deriva sentidos e significados outros que apontam para uma epistemologia da abertura. Apoiando-se em Heidegger, ele critica as pretensões de metanarrativa subjacentes à idéia de uma teoria do conhecimento, e realiza uma re-interpretação densa desse conceito, ressignificando-o, trazendo a lume uma interpretação mais radical, porque transformadora.

Mesmo reconhecendo a historicidade do conceito de epistemologia que se expressa pelas formas estratificadas e nomotéticas de compreensão do conhecimento, Galeffi acentua a necessidade de criticar aquilo que ele chamou de “atitude de crença em uma epistemologia praticada ao modo dos lógicos fisicalistas e matematicistas” (p.234). Essa perspectiva crítica proposta por Galeffi foi observada também em um artigo posterior de Marin (2007):

(…) se produce un fuerte cuestionamiento a las versiones objetivistas acerca de la realidad, a los modelos dualistas y representacionistas y a los criterios de verdad enarbolados por la ciencia moderna. En ese marco polémico, el discurso científico que según los positivistas, tiene un alcance universal y por lo tanto se desconoce el anclaje espacio-temporal de su producción, es concebido - desde los supuestos epistemológicos sobre los que asienta el construccionismo - como una producción discursiva elaborada por alguien, desde un lugar históricamente delimitado y ese lugar va a marcar lo que se dice, cómo se dice y qué no se dice. (MARÍN: 2007, p. 56).

Para marcar o afastamento de sua concepção de epistemologia das coerções imobilizadoras de sentido próprias da lógica fisicalista, Galeffi propõe que ela:

(...) passa a significar uma operação metodológica de crítica radical do conhecimento possível e de seus instrumentos e procedimentos de ação, sem que se perca de vista a impossibilidade de um conhecimento verdadeiro articulado ao modo de modelo ideal e monológico. (GALEFFI: 2003, p.234) Assim, ele pleiteia o fim de toda pretensão de acabamento e aponta para uma virada epistemológica que se paute em “uma atitude aprendente de radicalidade diante do tempo instante incessante do ser sendo” e que “deixa de lado o conhecido para se ater ao conhecer” (op. cit. p. 235)

Farei aqui um esforço de compreensão dessa perspectiva, pautando-me no processo de construção do conhecimento – o ato de conhecer – objetivando, por isso, buscar também uma

visão operacional do conceito de epistemologia que permita realizar uma leitura das monografias na perspectiva da AD. Assim, por uma necessidade metodológica, mas sem perder de vista a atitude epistemológica radical, tomarei doravante por epistemologia “os procedimentos efetivos e/ou a linguagem do conhecimento científico implicados na pesquisa” relacionada com a monografia que é analisada, atendendo “a problemas tais como as circunstancias históricas, psicológicas e sociológicas que levam à obtenção desse conhecimento e os critérios pelo quais se lhes justifica ou invalida” (ABBAGNANO, 1998). Com isso, espero poder responder (a partir dos dispositivos de análise da seção precedente) à questão de pesquisa, desvelando como se dá a produção e validação do conhecimento científico implicado nas pesquisas relacionadas com as monografias.

Apenas para exemplificar o que se pretende aqui com a idéia do trabalho da epistemologia, são marcantes nas perspectivas do realismo ingênuo, do empirismo, do racionalismo clássico newtoniano as reduções, as simplificações, os universais, as estruturas, o procedimento analítico – eliminador de relações –, as antinomias, as formas lógicas de disjunção sujeito-objeto, que têm por conseqüência a suspensão ou eliminação do “sujeito

epistêmico” (OLIVA: 1990, p.17), porque haveria aí um “conhecimento verdadeiro” que,

pretende-se, seria independente da presença (ou mesmo da existência de um observador), mas que emergiria de observações cuidadosas e da lógica indutiva como critérios de cientificidade (OLIVA: 1990, p.20-21). Outro exemplo pertinente, ligado aos aspectos de linguagem e aos psicologismos, é a adoração de Kepler pelo sol como motivação metafísica para estudar o sistema solar, já arrolada no Capítulo 3,.

Outro aspecto importante a considerar nessa discussão refere-se à citação. À primeira vista, pode parecer que a citação é apenas uma forma elementar de teorização, mas ela

também se cerca de uma veste epistemológica porque tem como característica a justificação do conhecimento descrito ou produzido. Por isso mesmo, ela também é um mecanismo de

controle das Práticas Discursivas de uma comunidade (CHARAUDEAU e MAINGUENEAU: 2006, p.396). Considere, por exemplo, a submissão de um artigo a uma revista. O editor envia o texto para revisores às cegas, que teriam o papel de atestar a qualidade do material sob análise, verificando sua pertinência e oportunidade, originalidade, apresentação e, sobretudo, se ele é científico – julgamento de nível epistemológico. Um critério de controle é percorrer a lista de referências bibliográficas e julgar o trabalho com base nelas. Se não há referências que a comunidade ou o membro autorizado – o relator – reconheçam como válidas, então o trabalho é simplesmente recusado. Aqui cabe trazer um exemplo famoso: Albert Einstein não foi agraciado com o prêmio Nobel de Física pela

criação da teoria da relatividade. Seu prêmio foi concedido pela explicação do efeito fotoelétrico e contribuições à Física teórica. Isso é uma prática institucional, discursiva, mas é também um mecanismo de controle e de defesa da comunidade. O caso extremo, eticamente reprovável, de uso abusivo da auto-referenciação é aquele em que o artigo é aceito simplesmente porque um dos autores é uma autoridade, um cientista de renome: seria o prejuízo de uma auto-citação involuntária.

D

ESCRITORES DE

P

ROBLEMAS

:

DEFINIÇÃO

,

CARACTERIZAÇÃO E RESOLUÇÃO