Procedimentos pedagógicos

A Tabela 8 apresenta de forma sintética os procedimentos de professores que estimulavam a criatividade, sob a ótica dos estudantes. Os referidos procedimentos se distribuíram em quatro categorias:

a) procedimentos em aula (15 citações, 78,94%), que compreende: despertar maior interesse dos alunos pela disciplina por meio de uso de técnicas e métodos inovadores, livros novos, exemplos e maquetes; aliança da prática com a teoria; diálogo com os alunos, estimulando-os a buscarem novos caminhos, a serem reflexivos e críticos; adoção de novas práticas de ensino; quebra de padrões. Exemplos:

Então, ele propõe coisas novas, ele cria coisas novas, cria métodos, ou incentiva o próprio aluno a criar [...] (ED9)

É o professor que consegue, é...explicar uma matéria ou um tópico, dando exemplos, dando formas diferentes de pensar sobre aquilo para que você entenda melhor. EM10)

[...] o professor que estimula que o aluno pense, professor que não dá respostas prontas, nem perguntas daquele tipo que a própria pergunta já induz qual a resposta que o aluno tem de encontrar; mas, uma pergunta que estimule o aluno a pensar e refletir para chegar às soluções. (ED16)

b) procedimentos interdisciplinares (duas citações, 10,53%), abrangendo o diálogo com outras disciplinas e áreas do conhecimento, não se restringindo à sua própria área. Exemplo:

Acho que estudo aprofundado de um determinado tema, por exemplo, ele não ficar somente focado em livros básicos, que nós temos, por exemplo, na Biologia Molecular, mas, tem que estar sempre atualizando a literatura [...] não só ficar focado dentro de uma área, por exemplo, se ele trabalha com plantas, por exemplo, o fato delas também estarem ligadas a mamíferos, animais, com fungos, por exemplo, eu acho que aquilo pode abrir a cabeça da pessoa e faz com que ele dê numa aula um conceito básico celular muito mais amplo, é uma forma de poder criar. O professor é aquele que está atualizado na área em que atua. (ED1)

c) procedimentos avaliativos (duas citações, 10,53%), abarcando diferentes formas de avaliação adotadas e a realização de constantes feedbacks aos alunos. Exemplo:

Olha, desenvolver trabalhos em vez de provas, propor seminários, propor discussões, que algumas poucas vezes foram feitas no curso, é ... professores que participam mesmo da... apresentam seminários e vão ver como está andando, se propõem a ajudar „vá na minha sala, procuramos pesquisar juntos‟. Isso seria uma atitude que... nesse sentido. Alguns poucos professores fizeram, mas uma minoria, mas a maioria é aula e prova. (EM15)

Dos 20 estudantes entrevistados, seis não indicaram professor algum criativo no programa de pós-graduação que cursavam. O estudante EM4 apenas apontou um professor já aposentado. Os demais indicaram, no máximo, dois professores criativos do programa de pós- graduação cursado, sendo os procedimentos criativos desses professores: desenvolver coisas

diferenciadas em laboratório; fazer pesquisa de fronteira; usar maquetes, mapas conceituais, técnicas de cinema; dar feedback aos alunos sobre cada trabalho elaborado; ensinar gradativamente, sem abarrotar o aluno de conteúdo; forçar o aluno a refletir sobre um assunto e elaborar críticas; realizar trabalhos com discussões, seminários, análise de artigos recentes; deixar os alunos “bastante livres, mas não abandonados”; dar atenção aos alunos e suas dificuldades; construção de artigos; avaliações diferenciadas. A seguir, algumas falas ilustrativas:

[...] ele sempre usa maquetes, faz os alunos fazerem maquetes, modelos pra auxiliar na aula e auxiliar o rendimento também. (EM3)

[...] ele não te deixa abarrotado de coisas, ele vai ensinando um pouquinho de cada vez e no final você aprende bastante. (EM4)

Então você lê e tem de fazer inferências em cima daquilo, opiniões. Ele falou que queria acréscimos, não queria que reproduzisse texto - “não quero apresentação de trabalhos, técnicas que foram feitos por pesquisadores e produções, não quero questão de certo ou errado, quero que você produza um raciocínio interessante”. (EM8) [...] você sente maior segurança de fazer os trabalhos dela porque ela dá feedback e acho que essa história de dar feedback é muito importante para estimular a sua criatividade, a partir do momento que você vê que está indo bem, você é estimulado a andar, a continuar e rápido. (EM13)

Tabela 8 - Procedimentos pedagógicos estimuladores da criatividade apontados pelos estudantes Procedimentos f % › Procedimentos em aula

Técnicas e métodos inovadores, livros novos e maquetes Novas práticas de ensino

Prática aliada à teoria Diálogo com os alunos Estímulos diversos Quebra de padrões

› Procedimentos interdisciplinares

Diálogo com outras disciplinas e áreas do conhecimento

› Procedimentos avaliativos

Diferentes formas de avaliação Constantes feedbacks aos alunos

15 02 02 78,94 10,53 10,53 TOTAL 19 100

Nota: as porcentagens foram calculadas a partir do total de procedimentos explicitados nas entrevistas, incluindo-se as barreiras à criatividade e não a partir do número de estudantes entrevistados.

Também foram apontados sete procedimentos considerados barreiras ao desenvolvimento do potencial criativo dos alunos: focar em apenas livros básicos; trabalhos rotineiros; considerar que adulto não necessita ser estimulado; críticas a novos posicionamentos; falta de autonomia; rigidez do programa. Exemplos:

Olha, eu vou te falar, que na pós-graduação eu tive poucos professores que estimularam algum tipo de criatividade, ah, eu acho que os trabalhos são muito assim... rotineiros. Agora... e também são muito assim... você tem de fazer uma resenha, um texto assim, você tem que ler este artigo e depois apresentar este artigo. Bom... então... assim... é sempre a mesma coisa, você tem que apresentar um trabalho final x, y... né? tantas folhas, computadas e blá, blá, blá. Eu acho que esses modos fechados não facilitam, não estimulam, a criatividade do aluno. (ED5)

Do meu programa mesmo, eu não me recordo de nenhum. Porque os meus professores são pouquíssimos e eles repetem muito. Deles, não consigo me lembrar de nenhuma prática que me chamou a atenção, não. Aulas muito expositivas, cansativas muitas vezes, sistema de provas com acúmulo muito grande de conteúdo. Para mim não estimula criatividade nenhuma. (ED11)

4.4 Procedimentos pedagógicos incentivadores de criatividade utilizados pelos professores, de acordo com eles próprios

Para alcançar o quarto objetivo deste trabalho, que visou relacionar os procedimentos pedagógicos utilizados pelos professores de pós-graduação stricto sensu que, sob a ótica deles, eram incentivadores da criatividade discente, foram utilizadas as respostas de várias perguntas: se a atividade docente na pós-graduação requeria criatividade, se ele considerava que ser criativo influía positivamente no exercício de sua profissão; se a(s) disciplina(s) que lecionava podia(m) propiciar o desenvolvimento do potencial criativo dos estudantes; o que era um aluno criativo; a relação entre ensino de forma criativa e o desenvolvimento da criatividade discente; a relação entre criatividade, aprendizagem e desempenho acadêmico; a criatividade em sua formação; modelos de criatividade para os professores; e, por fim, quais os procedimentos pedagógicos que utilizava para dar uma aula incentivadora do desenvolvimento do potencial criativo.

4.4.1 Atividade docente X criatividade

Os professores foram unânimes em salientar a necessidade de se ter criatividade na pós-graduação, aliás, em todos os níveis da educação e nas profissões, bem como de revitalizar o papel do professor na sala de aula. Alguns exemplos a seguir demonstram essa unanimidade:

Tradicionalmente, o professor era aquele cara que tinha o dom de saber, o repositório do conhecimento e ele ia para frente da sala da aula e só ele sabia, só ele praticamente falava e os alunos perguntavam e ele respondia, né? Esse era o papel tradicional do professor. O professor significava conhecimento, saber, enciclopédia, autoridade e hoje, com a internet, com a grande disseminação de bibliotecas físicas com livros, bibliotecas virtuais, o professor deixou de ser dono exclusivo do conhecimento. O saber já não é mais propriedade do professor. E ele está desesperado por uma razão muito simples: ele vai pra frente da sala de aula e os alunos, especialmente alunos de graduação e pós-graduação, podem conhecer métodos de pesquisa mais do que ele, podem entrar em sites de busca e se aprofundar no assunto, podem ler coisas que nunca o professor leu [...] Os professores têm um grande desafio: descobrir qual é o seu novo papel. Bom, e aí o que o professor tem de fazer hoje? Ele tem que ser criativo, tem que ser criativo. [...] a capacidade operacional destes alunos não significa sabedoria; então, ele pode ser com sua experiência, com seu conhecimento, muitas vezes até sabedoria, ele pode ser o indutor para estimular a criatividade dos alunos [...] e o professor com sua sabedoria, com sua experiência, ele pode ser, ele pode despertar a curiosidade, ele tem de ter uma visão mais distanciada de como é que este fenômeno se comporta, o que este aluno pode explorar mais [...]orientar bem. Isso o professor pode muito bem mais do que o aluno que está mergulhado, trabalhando sobre um tema. [...] Agora, ele precisa ser criativo para descobrir neste novo mundo para descobrir qual é o seu verdadeiro papel neste mundo novo, ele não pode mais ficar sentado no seu universo antigo porque o mundo hoje é outro, o mundo hoje mudou. Então, junto com o mundo ele tem de descobrir novos caminhos,

é explorar novas picadas, ultrapassar as novas fronteiras pra descobrir o seu papel, e aí, novamente, ele precisa ter coragem para dizer que não sabe, para explorar junto com o aluno eventualmente, mas também com sua experiência, ele pode fazer isso muito bem. O que ele não pode é lecionar o beabá da forma tradicional [...]. (PR1) [...] a gente está formando cada vez mais pessoas, sem motivação, sem motivo para atuar, sem capacitação, sem as mínimas habilidades técnicas para desenvolver suas atividades. Estamos publicando? Muito. Agora, que qualidade técnica é essa que estamos fazendo? Quando você olha a quantidade de artigos que estão publicando, que é o resultado de pesquisas, mas pesquisas que não dizem nada, que não acrescentam nada, que não contribuem nada para o conhecimento. O que está acontecendo? Falta de criatividade. Porque o conhecimento formal está nos livros e se você se ater a pegar o conhecimento formal dos livros e repassar para os alunos, isso não precisa de ter professor. O aluno vai sozinho à biblioteca e estuda. Para isso é preciso criatividade, é a forma mais fácil de compreender aquele conteúdo, é a forma mais divertida de trabalhar aquele conteúdo, a forma mais interativa de desenvolver aquele conteúdo e, aí, precisa de criatividade, é fundamental para gente. (PR3) Sem dúvida, a aprendizagem é um processo difícil, tanto para o professor quanto para o aluno. Então, o professor tem que ser criativo certamente para ter novas maneiras de ensinar e novas maneiras de repassar o que já é conhecido e ser criativo para instigar nos seus alunos a serem criativos. (PR10)