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4. A ESCOLA COMO CONTEXTO ONDE CIRCULAM CONCEPÇÕES E

4.2 Experiências profissionais e prática pedagógica das professoras

4.2.3 A professora Lírio

A professora Lírio é dinâmica e alegre. Casada e mãe de dois filhos é a única das participantes da pesquisa que tem dupla jornada de trabalho e, às vezes, precisa complementar com aulas extras para melhorar a renda da família. Cursou o magistério por ter se espelhado em uma professora que foi para ela exemplo de profissional:

Eu estudava em São Paulo, tinha 15 anos. Eu me sentia estranha nessa escola me chamavam de nordestina como se fosse um problema. Nessa época eu tive uma professora, muito boa, competente e que me marcou. Ela um dia pediu para fazer uma redação falando sobre a vida. Eu fiz acreditando que estava ruim, mas a professora elogiou muito minha redação e disse que eu era capaz de tudo que eu quisesse na minha vida realizar, que só precisa acreditar nisso e correr atrás. Isso me marcou. Ela me incentivou tanto que perguntei a minha irmã se poderia ser professora. Aí quando voltei para Natal fui estudar no Kennedy fazer o magistério. (1º Encontro Reflexivo –10/09/2014)

A esse respeito Freire nos lembra que

O professor autoritário, o professor licencioso, o professor competente, sério, o professor incompetente, irresponsável, o professor amoroso da vida e das gentes, o professor mal-amado, sempre com raiva do mundo e das pessoas, frio, burocrático, racionalista, nenhum desses passa pelos alunos sem deixar sua marca (FREIRE, 1996, p.73).

A relação professor-aluno possibilita não só o acesso ao conhecimento e à aprendizagem, mas também à descoberta de definições ideológicas, políticas, referentes ao próprio posicionamento e interesses ligados a vida pessoal. Nesse sentido, na relação entre professor e alunos faz-se necessário a existência de confiança, empatia e respeito, haja vista, que tais sentimentos podem interferir no processo de ensino aprendizagem e interferir na vida.

Lírio leciona há 22 anos. Atuou na Educação Infantil, EJA, Ensino Fundamental e Ensino Superior. Pertence ao corpo docente da Escola Florescer faz

2 anos. Apesar de pouco tempo, conhece bem a rotina da instituição e interage com todos mantendo um bom relacionamento.

Revela em sua fala o gosto por ensinar apesar das dificuldades da educação básica no sistema público. Entre as experiências significativas de sua atuação nas Escolas que já vivenciou evidenciou:

Eu trabalhei num local que havia muitas dificuldades de recursos e de apoio da escola e do serviço público, Trabalhei um tempo na Casa do menor. Era uma turma difícil, meninos com experiências terríveis. Eu passei sufoco. Isso me marcou porque entendi a necessidade de ouvir o aluno, procurar entende e ouvir suas histórias. Um dia com uma história de um aluno fiquei super pra baixo porque era caso de abuso, exploração, abandono e drogas com uma criança. Isso me marcou muito! Foi quando eu pensei: eu tenho que conhecer o histórico do meu aluno, quer seja médico ou social, mas é preciso conhecer o perfil do aluno. (transcrição 1º Encontro Reflexivo).

Quanto ao ciclo de vida profissional dos professores descrito por Huberman (2000) Lírio encontrasse na mesma etapa que Violeta, na diversificação. Lírio está na fase de revisão profissional buscando novos desafios a sua prática, o que se evidenciou no fato de ser coordenadora do Projeto Mais educação, assim atuava como professora do Ensino Fundamental, no turno matutino, e como coordenadora deste projeto, no turno vespertino.

Segundo Huberman (2000) é característica da fase de diversificação a mudança no percurso profissional, pois o professor se sente motivado a ter outras responsabilidades, em alguns das vezes por se sentir desencantado quanto ao papel de professor desenvolvido.

Esta fase é também a fase do “pôr-se em questão”, ou seja, a fase das indagações a respeito da carreira. A esse respeito a professora assim explanou:

Eu às vezes me pego pensando será que é isso mesmo que eu quero?! Porque são muitas questão que envolvem o trabalho do professor e esse trabalho não é fácil e não é reconhecido nem valorizado, nem temos apoio da família nem da escola.( Portfólio Reflexivo - 29/04/2015)

Essa reflexão que a professora fez no seu registro reflexivo e trouxe para ser compartilhado no grupo foi decorrente de uma situação vivenciada em sala com seus alunos quanto a problemas comportamentais apresentados por estes que

dificultavam o desempenho de sua função. A sua angústia também dizia respeito a ausência de apoio de pais e da escola.

No ano de 2014 a professora lecionava numa turma de 2º ano com 25 alunos sendo uma criança com Síndrome de Down e no ano de 2015 ela estava numa turma de 3º ano com uma criança que tinha paralisia cerebral e outra com deficiência intelectual. Como tinha dois alunos com deficiência a sua turma, contava com a presença de uma auxiliar.

De acordo com as observações e com os registros das notas de campo, notamos que a ação pedagógica desenvolvida pela professora despertava o interesse e motivava a participação de todos, pois ela partia dos conhecimentos prévios dos alunos, através de uma metodologia alinhada a uma matriz interacionista e com uso de recursos audiovisuais. O planejamento pedagógico de Lírio não considerava as especificidades dos alunos com deficiência, mas com sua metodologia conseguia facilitar o processo de aprendizagem e desenvolvimento de boa parte dos alunos, entre eles, o que apresenta uma deficiência intelectual. Entretanto, “João” que tem uma deficiência por ser diagnosticado com paralisia cerebral era prejudicado em sua interação, participação e aprendizagem, sobretudo, pela pouca interação vivenciada com as crianças e professora em decorrência da dificuldade em se comunicar com ele e em planejar estratégias que atendessem as suas necessidades.

A professora nos encontros ressaltava essa questão, como podemos verificar no recorte de fala abaixo:

A pessoa que tem paralisia cerebral apresenta muitas limitações motoras, mas o que dificulta minha interação com João é a questão da comunicação porque ele não consegue articular a fala. Eu já consigo compreender alguns sons emitidos por ele, mas quando explico a atividade não sei como fazer pra ele entender. Sei que preciso adequar mais meu planejamento pensando nas especificidades dele. Aprendi no curso do PNAIC33 que posso me comunicar com ele

através de placas de comunicação acho que você vai poder me ajudar nisso aí (entrevista individual).

A pessoa acometida pela paralisia cerebral apresenta um grupo de desordens caracterizado pela disfunção motora que pode causar, de forma isolada ou

33Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa é um compromisso assumido pelos governos

federal, do Distrito Federal, dos estados e municípios de assegurar que todas as crianças estejam alfabetizadas até os oito anos de idade, ao final do 3º ano do Ensino Fundamental.

associada, alterações no andar e em atividades que exijam o controle do corpo e da coordenação motora, lesão cerebral que provoca um desenvolvimento cerebral abaixo da média, dificuldade para ver, ouvir e na produção e articulação da fala, entre outras lesões e ou disfunção que podem implicar o desenvolvimento da pessoa com esta deficiência.

Conforme Basil (2004, p. 220)

As disfunções motoras afetam todos os aspectos da vida do indivíduo, limitam suas experiências, e, portanto, suas possibilidades de aprender, e alteram as formas como as outras pessoas se relacionam com ele.

Face ao exposto, o acompanhamento ao desenvolvimento da criança com paralisia cerebral deve ser instituída a partir de uma abordagem interdisciplinar envolvendo um trabalho de equipe entre médico, psicólogo, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, pedagogo, professor especialista, entre outros profissionais, que possam dentro de sua especialidade contribuir para o desenvolvimento máximo de suas capacidades e colaborar com o êxito da inclusão escolar.

A professora Lírio tinha ciência da relevância da contribuição de especialistas de diversas áreas, bem como da colaboração da família para o desenvolvimento do aluno. Em sua fala destacava essa necessidade veementemente:

Eu sei da minha função que preciso de mais tempo para planejar e poder atender melhor as necessidades de João pra ele poder participar das aulas e aprender realmente, mas também acho que ele precisa de um acompanhamento melhor de outros profissionais e mais empenho da família (transcrição do 7 º Encontro Reflexivo). No que diz respeito a rotina da professora quando lecionava no 3 º ano, esta se estruturava da seguinte maneira:

Acolhida

Contação de história

Atividade dirigida (auto ditado, produção de texto, reescrita) Intervalo

Vale destacar que a professora Lírio tem uma dinâmica parecida a de Violeta, pois ambas investiam em atividades baseadas nas interações sociais; propondo um ambiente alfabetizador a partir de materiais lúdicos e recursos áudio visuais, partindo dos conhecimentos prévio dos alunos; se preocupando em atingir os direitos da aprendizagem dos educandos, entre outras ações que fomentavam suas práticas. Acreditamos que esse trabalho semelhante era decorrente da parceria entre as docentes, uma vez que as professoras, sempre que possível, trocavam informações e conhecimentos sobre o ensino aprendizagem dos alunos, pois estavam participando do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa -PNAIC.