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5. A cooperação entre estados e municípios em quatro estados brasileiros

6.2. O PAR e os programas federais

O PAR foi iniciado em 2007 com a finalidade de organizar as transferências voluntárias do MEC às Secretarias Estaduais e Municipais de Educação a partir do estabelecimento de critérios universais e impessoais. Como apresentado, desde 1995, houve mudanças nas transferências voluntárias, que eram distribuídas de maneira partidarizada. O PAR representou, portanto, uma grande mudança nas relações intergovernamentais, especialmente, na relação entre o Governo Federal e os municípios.

Com ele, os municípios passaram a coletar dados sobre as suas características socioeconômicas e das suas redes municipais para a adesão e implementação dos programas federais, resultando em um planejamento mais sistêmico das suas redes de ensino. Na maioria dos municípios analisados, foi somente a partir do PAR que as Secretarias Municipais passaram a realizar esse planejamento mais sistemático, embora ainda haja dificuldades nesse processo. Nesse sentido, algumas Secretarias Estaduais criaram órgãos de assessoramento às Secretarias Municipais na elaboração do PAR, adesão, acompanhamento e prestação de contas dos programas federais. Entre os casos analisados, o Ceará e o Mato Grosso do Sul são exemplos disso, sendo que o último conseguiu ocupar de maneira mais institucionalizada o papel de coordenador estadual do PAR e dos programas federais.

Outro resultado importante é que os programas federais foram disseminados de maneira mais intensa nas redes municipais. Todos os entrevistados citaram o PNLD, PDDE, PNAIC e Mais Educação. Isso significa que os municípios implementam um “pacote” igual de programas federais, mesmo que os outros programas implementados variem entre as redes.

Isso auxilia o estabelecimento de condições institucionais mínimas na política educacional em todos os municípios brasileiros.

Segundo os entrevistados, o PNLD e PNAIC são os mais importantes para isso. O PNLD garante os livros didáticos na maioria das redes municipais analisadas. Em algumas dessas, as formações também se restringem às oferecidas pelo PNAIC e o PDDE garante recursos suplementares para as escolas. Apesar disso, o Mais Educação não desempenha esse papel. Ele foi citado pelos entrevistados como um programa presente nas redes municipais, no entanto ele é, na maioria dos casos, implementado em apenas algumas escolas e as duas Secretarias Municipais do Mato Grosso do Sul pararam de implementá-lo. Os entrevistados o criticaram profundamente, pois ele não oferece as condições para a implementação do tempo integral nas escolas de maneira adequada. O Programa somente realiza o pagamento dos bolsistas das universidades que atuam nas atividades de contraturno escolar, isto é, não oferece nenhum recurso para a adaptação da infraestrutura das escolas e compra de materiais, por exemplo.

Essa disseminação mais intensa dos programas federais nas políticas municipais de Educação fez com que dois grupos de municípios se formasse. No primeiro grupo, as Secretarias Municipais dependem dos recursos transferidos pelo FUNDEB, pois eles são a maior parte do orçamento das Secretarias Municipais. Dessa forma, elas dependem fortemente dos programas federais, que constituem quase toda a política municipal de Educação. As Secretarias Municipais somente realizam ações próprias no que se refere ao acompanhamento pedagógico das escolas por meio de seus coordenadores. No segundo grupo, as Secretarias Municipais contam com um orçamento maior e, portanto, implementam programas e projetos próprios, como sistemas estruturados de ensino, sistemas de avaliação e formações. Nesse grupo, a maioria das redes municipais constitui-se enquanto Sistemas Municipais de Educação ou já elaboraram seus Planos Municipais de Educação e possuem Conselhos Municipais de Educação atuantes.

Mesmo com o estabelecimento de padrões mínimos em todos os municípios brasileiros, o modo como os programas federais são implementados e a sua adaptação às demandas locais geram resultados distintos. Alguns municípios implementam os programas federais e encontram dificuldades durante esse processo, como os municípios paraenses que pararam de utilizar as lanchas fornecidas pelo Governo Federal. Outros combinam os programas federais com programas e projetos próprios a fim de ajustá-los às demandas locais

ou preencher lacunas deixadas por eles, como a formação e a troca de experiências entre equipes de gestão escolar.

O aumento e a disseminação dos programas federais também resultou em uma aproximação entre Secretarias Estaduais e Municipais de Educação e as universidades, principalmente, a partir da implementação do PAIC. A maioria dos programas federais já contava com o acompanhamento das universidades federais, no entanto, a relação entre eles não era próxima e frequente. Esse quadro se alterou com as formações do PNAIC realizadas por professores das universidades estaduais e federais e supervisionadas por alunos da pós- graduação às equipes das Secretarias. Destaca-se que a utilização do material fornecido pelo MEC e elaborado por alguns professores universitários tem sido importante para manter uma uniformidade das formações e uma aproximação com o cotidiano da sala de aula.

Por fim, alguns dos entrevistados criticaram essa adesão maciça dos municípios aos programas federais. De acordo com eles, as Secretarias Municipais são, em algum grau, obrigadas a aderirem a eles, na medida em que muitas delas não possuem um grande volume de recursos para a implementação de programas e projetos educacionais em suas redes e seus recursos são comprometidos com o pagamentos de servidores, infraestrutura, transporte e merenda escolar. Em função disso, um dos entrevistados disse que o regime de colaboração é um regime de “tutela” dos municípios pelo Governo Federal.

A relação entre interdependência e autonomia não é consensual na política educacional brasileira. Para alguns, os programas federais, ao induzirem a implementação desses programas formulados pelo Governo Federal, diminuem a autonomia dos municípios. O fato é que, em primeiro lugar, o federalismo envolve necessariamente interdependência e, dessa forma, não há uma autonomia completa dos governos subnacionais. Eles compartilham competências comuns e atuam em um mesmo território e população, o que ocorre de maneira mais profunda na Educação no plano do ensino fundamental. Em segundo lugar, em função das diversidades que caracterizam a Federação brasileira e da trajetória da própria política educacional, as condições socioeconômicas e, sobretudo, institucionais são muito diferentes entre os municípios. Nesse sentido, os programas federais são fundamentais para a garantia de condições institucionais iguais e, consequentemente, de direitos sociais e universais.

6.3. Os diferentes modelos de relação entre estados e municípios na