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O que explica a variedade de modelos de relacionamento entre estados e municípios

4. Relações entre estados e municípios na política educacional brasileira: diferentes

4.2. O que explica a variedade de modelos de relacionamento entre estados e municípios

A análise da colaboração entre estados e municípios na política educacional brasileira reforça o argumento de que há diferentes modelos de cooperação intergovernamental no Brasil. Como apresentado, a partir dos dados coletados, foi possível identificar cinco principais categorias de cooperação entre estados e municípios nessa política, chamadas nesta pesquisa de coordenação estadual, programas conjuntos, resolução de conflitos, ações conjuntas e políticas independentes. Ainda no primeiro caso, de coordenação estadual, os estados buscam desempenhar um papel de coordenação federativa e redução de desigualdades semelhante ao do governo federal em algumas Federações, especialmente, por meio dos mecanismos de indução financeira.

Para compreender os resultados da cooperação nas políticas municipais de Educação, é fundamental analisar os fatores que explicam a variedade desses modelos. As diversidades étnicas, linguísticas, religiosas, socioeconômicas e territoriais podem resultar em diferentes políticas públicas em países federalistas, na medida em que elas atendem às preferências de determinadas localidades ou regiões. Dessa forma, no caso brasileiro, as diferenças físico- territoriais, demográficas, regionais, socioeconômicas e institucionais poderiam explicar a variedade na cooperação? Algumas variáveis relacionadas com essas diversidades foram comparadas com as categorias de cooperação entre estados e municípios na Tabela 2. Essas

variáveis são: partidos políticos, IDH, número de municípios em cada estado, extensão territorial, população, orçamentos estadual e municipais.

A Tabela 2 retrata, em primeiro lugar, as diversidades supracitadas e, em segundo, mostra que as categorias não tem uma relação direta com as variáveis relacionadas as essas diversidades. A partir disso, o que se buscou foi levantar hipóteses baseadas nessa Tabela e nas trajetórias políticas e educacionais apresentadas anteriormente para a análise comparativa entre Ceará, Mato Grosso do Sul, Pará e São Paulo, escolhidos pela sua variação nas categorias apresentadas anteriormente e nos seus resultados educacionais.

No que se refere às diversidades socioeconômicas e institucionais, não há uma relação direta entre o IDH ou o orçamento e o tipo de cooperação. Não significa, portanto, que quanto menor o IDH ou o orçamento, maior será a cooperação. Ainda assim, uma hipótese é a de que, em alguns estados com baixo IDH e desempenho educacional (ver Figuras 2 e 3 no capítulo 1), os governos estaduais tendem a redistribuir recursos para melhorar a qualidade da Educação, como no caso do Ceará. Outra hipótese é a de que a cooperação é mais difícil nos estados que possuem municípios com maior orçamento e resultados educacionais melhores, o que pode ocorrer em São Paulo, por exemplo.

No âmbito das diversidades regionais e físico-territoriais, verifica-se que alguns estados têm trajetórias de cooperação em diversas políticas públicas, como no Rio Grande do Sul. Na região Norte, a relação entre os estados e os municípios é semelhante. Com a maior parte dos municípios, ela é hierárquica, pois esses municípios são de pequeno porte, não possuem orçamentos expressivos, são institucionalmente frágeis, territorialmente extensos e o acesso a alguns deles é difícil. Em muitos deles, quando há indicação política de coordenadores regionais e diretores de escola, a relação entre o governo estadual e as prefeituras municipais é informal e partidarizada. Isto é, as coordenadorias regionais e diretores de escolas da rede estadual são politicamente vinculados ao partido do governador e eles é que se relacionam com as Secretarias Municipais de Educação.

Além disso, outras três variáveis relacionadas com a trajetória política e educacional nos estados aparecerem nos questionários como importantes para a cooperação. A primeira compreende a relação entre as Secretarias Estaduais de Educação e as seccionais da UNDIME nos estados, que são importantes na articulação e negociação federativa. A segunda se refere à trajetória de municipalização. Como apontado, há uma variação grande na municipalização entre os estados. Por exemplo, no caso do Ceará, a municipalização alcançou quase todas as

matrículas do ensino fundamental e, no Paraná, há uma ainda uma divisão entre as matrículas das redes estadual e municipais no segundo ciclo do ensino fundamental. A terceira diz respeito à trajetória dos dirigentes estaduais, nos casos do Ceará, Mato Grosso do Sul e Acre, os secretários estaduais e suas equipes vieram de experiências anteriores em Secretarias Municipais de Educação, o que, segundo eles, influenciaram a entrada da cooperação na agenda dos governos estaduais.

Estados Tipo de cooperação Área (km²) População (2010) População rural (%) (2010) Número de municípios IDH Municipal por UF (2010)

Orçamento per capita

em reais (2010) Partidos políticos (2011-2014) Estadual Municipal Acre Programas conjuntos 164.123 733.559 27,44 22 0,663 5.252,04 1.101,85 PT* Amapá Políticas independentes 142.829 669.526 10,23 16 0,708 3.918,39 965,39 PSB**

Amazonas Ações conjuntas 1.559.159 3.483.985 20,91 62 0,674 2.781,63 1.151,85 PSD***

Pará Políticas independentes 1.247.955 7.581.051 31,52 144 0,646 1.613,66 957,20 PSDB**** Rondônia Políticas independentes 237.591 1.562.409 26,45 52 0,690 3.064,49 1.557,68 PMDB***** Roraima Políticas independentes 224.301 450.479 23,45 15 0,707 5.236,42 1.537,27 PSDB Tocantins Programas conjuntos 277.721 1.383.445 21,20 139 0,699 3.697,05 1.452,15 PSDB

Alagoas Ações conjuntas 27.779 3.120.494 26,36 102 0,631 1.846,64 1.275,04 PSDB

Bahia Programas

conjuntos 564.733 14.016.906 27,93 417 0,660 1.773,52 1.141,41 PT

Ceará Indução estadual 148.920 8.452.381 24,91 184 0,682 1.843,59 1.289,27 PROS****** Maranhão Políticas

independentes 331.938 6.574.789 36,92 217 0,639 1.304,42 1.067,99 PMDB

Paraíba Indução estadual 56.470 3.766.528 24,63 223 0,658 1.548,89 1.199,43 PSB

Pernambuco Programas conjuntos 98.148 8.796.448 19,83 185 0,673 2.214,53 1.190,32 PSB Piauí Programas conjuntos 251.578 3.118.360 34,23 224 0,646 1.778,78 1.146,16 PSB Rio Grande do Norte Políticas independentes 52.811 3.168.027 22,19 167 0,684 2.320,03 1.310,65 DEM******* Sergipe Programas conjuntos 21.915 2.068.017 26,48 75 0,665 2.876,50 1.351,95 PMDB

*Partido dos Trabalhadores **Partido Socialista Brasileiro ***Partido Social Democrático

****Partido da Social Democracia Brasileira

*****Partido do Movimento Democrático Brasileiro ******Partido Republicano da Ordem Social *******Democratas

Fonte: elaboração própria baseada em IBGE (2010), IPEA (2010) e PNUD (2013).

Goiás Programas

conjuntos 340.112 6.003.788 9,71 246 0,735 2.315,09 1.503.24 PSDB

Mato Grosso Programas

conjuntos 903.366 3.035.122 18,20 141 0,725 3.308,97 1.613,83 PMDB Mato Grosso do Sul Programas conjuntos 357.146 2.449.024 14,36 79 0,729 3.257,34 1.973,78 PMDB Espírito

Santo Ações conjuntas 46.096 3.514.952 16,60 78 0,740 3.379,17 1.939,67 PSB

Minas Gerais Programas

conjuntos 586.522 19.597.330 14,71 853 0,731 2.374,87 1.583,18 PSDB

Rio de Janeiro

Políticas

independentes 43.780 15.989.929 3,29 92 0,761 3.177,88 1.887,79 PMDB

São Paulo Ações conjuntas 248.223 41.262.199 4,06 645 0,783 3.620,10 2.245,90 PSDB Paraná Ações conjuntas 199.308 10.444.526 14,67 399 0,749 2.125,48 1.622,63 PSDB Rio Grande do Sul Resolução de conflitos 281.730 10.693.929 14,90 497 0,746 3.247,05 1.847,80 PT Santa Catarina Políticas independentes 95.736 6.248.436 16,01 295 0,774 2.107,55 1.910,39 PSD

O que se buscou neste capítulo foi mapear as relações entre estados e municípios na Educação, categorizá-las segundo a literatura sobre relações intergovernamentais (AGRANOFF, 2001; 2007; BANTING, 2005; WATTS, 2006) e analisar os fatores que influenciam a variedade de tipos de relacionamento entre eles. É importante ressaltar que não se pretendeu estabelecer uma relação causal entre as diversidades características da Federação brasileira e os tipos de cooperação, mas estabelecer hipóteses que foram analisadas posteriormente na comparação entre os casos.

As relações entre estados e municípios na política educacional são heterogêneas no Brasil. Há modelos mais hierárquicos e institucionalizados, horizontais com extensa negociação, informais e não intencionais. Conclui-se também que há dois casos que incluem a indução financeira para a adoção de determinados programas estaduais pelos municípios e não há nenhum caso de redistribuição de recursos para reduzir desigualdades de gastos educacionais, como o modelo do FUNDEB. Ainda, há um único caso de existência de uma arena de negociação entre os entes.

Esses distintos modelos não são determinados pelas diversidades físico-territoriais, demográficas, socioeconômicas, institucionais e regionais, mas são influenciadas por elas. O que ocorre por meio, por exemplo, da trajetória de associativismo nos estados, da capacidade institucional das Secretarias Municipais de Educação, da trajetória de municipalização do ensino fundamental, do envolvimento de diferentes atores, como as seccionais da UNDIME nos estados, e da existência de dirigentes públicos nas Secretarias Estaduais de Educação que possuam uma trajetória na gestão municipal. Essas e as demais hipóteses levantadas neste capítulo foram analisadas na análise comparada apresentada a seguir.

5. A cooperação entre estados e municípios em quatro estados