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3 PLURIATIVIDADE NO CAMPO: O NOVO RURAL E O IMPACTO DE

4.3 PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 384, DE 2016

Interessante apontar que se encontra em tramitação o Projeto de Lei de iniciativa do Senado Federal nº 384, de 2016281, o qual pretende alterar a Lei nº 8.629, de 1993 (que trata da

regulamentação dos dispositivos constitucionais referentes à reforma agrária), e permitir ao assentado a exploração do potencial de energia eólica ou solar existente no imóvel do qual é beneficiário, mediante autorização do INCRA.

De autoria de ex-senador pelo Estado do Rio Grande do Norte, José Agripino Maia, o Projeto de Lei tem por justificativa o fato de que alguns assentamentos da Reforma Agrária se situam em localidades favoráveis à produção de energia elétrica a partir da matriz eólica ou solar, e os assentados, ao serem eleitos para o Programa de Reforma Agrária, assinam Contrato de Concessão de Uso com o INCRA, sob uma série de condições resolutivas, dentre elas a proibição de cessão do imóvel a terceiros e a vedação à alienação, com o objetivo de dificultar a negociação desses imóveis e obter a demonstração por parte do beneficiário de sua vocação rural.

Assim, como não possuem o pleno título de domínio, estariam alijados da possibilidade de firmar contratos de concessão de uso ou de arrendamento rural de parte do imóvel para fins de exploração de energia eólica e solar sem que incidissem em violação ao contrato de assentamento.

Contudo, ante as novas possibilidades econômicas dos imóveis rurais, sobretudo decorrentes de avanços tecnológicos, notadamente a exploração de fontes de energia alternativas e sustentáveis, reconhece-se a necessidade de flexibilizar as relações contratuais firmadas com a entidade responsável pela reforma agrária.

A alteração proposta acresceria um parágrafo único282 ao art. 21 da Lei nº 8.629, de

1993:

280 “Não é incomum que os órgãos de controle interpretem políticas públicas de modo a conduzi-las numa ou

noutra direção, às vezes forçando novos rumos sequer aventados pelo texto legal”. In: SUNDFELD, Carlos Ari; ROSILHO, André. Direito e Políticas Públicas: dois mundos? In: SUNDFELD, Carlos Ari; ROSILHO, André (orgs.). Direito da Regulação e Políticas Públicas. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 45-79. p. 60.

281 Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/127240. Acesso em: 06 maio

2020.

282 Chama-se atenção para o fato de que à época, o art. 21 não possuía parágrafo único. Hoje existe um parágrafo

Art. 1º O art. 21 da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 21.

... Parágrafo único. Nos imóveis rurais com potencial para produção de energia eólica ou solar, o Incra autorizará ao beneficiário da reforma agrária a celebração de contratos com terceiros objetivando a exploração do referido potencial.” (NR)

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

De início, percebe-se a imprecisão da redação, a qual não estabelece qualquer requisito que não a mera autorização do INCRA, nem mesmo remete a um regulamento a ser oportunamente editado.

A proposta desconsidera o processo dinâmico de um projeto de assentamento, com as constantes entradas e saídas de assentados pelos mais diversos motivos, bem como a dinâmica necessária à implantação do parque eólico com seus aerogeradores, os quais demandam, como condição de viabilidade técnica e financeira para o projeto, longos contratos (sendo usual contratos de mais de 20 anos).

Logo, reconhece-se ao assentado, que detém título precário (contrato de concessão de uso), a possibilidade de firmar contrato de longo prazo com terceiros para a implantação de parque eólico, em terreno de propriedade de ente público (INCRA) e insusceptível de prescrição aquisitiva, o que se revela temerário à continuidade das relações jurídicas encetadas com o terceiro, haja vista a possibilidade de problemas quando da necessidade de eventual substituição do assentado, ou mesmo na fase de negociação com o empreendedor.

Tais inconsistências não passaram despercebidas pelo relator do Parecer da Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle do Senado Federal283, de

29 de março de 2017, no qual se externa uma preocupação salutar com a reforma agrária. É que no modelo proposto, como apontado, desvirtua-se a função da reforma agrária, não se incentivando a permanência do agricultor à terra, com prejuízo na contenção do êxodo rural e na agricultura alimentar (soberania alimentar).

Deve-se evitar que a exploração das matrizes energéticas seja a principal atividade da área, tornando o beneficiário do PNRA um mero rentista.

Assim, a celebração desses contratos com terceiros para a exploração de energia eólica e solar deve ocorrer apenas de forma complementar às atividades agrossilvipastoris ou extrativistas desenvolvidas no imóvel rural. As condições e formas de autorização a serem

283 Disponível em https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=5203954&ts=1583936839154&

concedidas pelo órgão competente devem ser objeto de regulamento. Propôs-se a seguinte redação:

Art. 1º O art. 21 da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 21. Nos instrumentos que conferem o título de domínio, concessão de uso ou CDRU, os beneficiários da reforma agrária assumirão, obrigatoriamente, o compromisso de cultivar o imóvel direta e pessoalmente, ou por meio de seu núcleo familiar, mesmo que por intermédio de cooperativas, e o de não ceder o seu uso a terceiros, a qualquer título, pelo prazo de dez anos.

Parágrafo único. Excetua-se da vedação contida no caput a celebração de contratos com terceiros tendo por objetivo a exploração do potencial para produção de energia eólica ou solar de forma complementar às atividades agrossilvipastoris ou extrativistas desenvolvidas no imóvel rural, mediante autorização do órgão federal competente para a execução do Programa Nacional de Reforma Agrária, nos termos do regulamento.” (NR)

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Em Parecer da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária284, de 31 de outubro de

2017, propõe-se a renumeração do parágrafo único em face da superveniência da Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017, e acrescentam-se dispositivos à proposta anterior (sem justificativa expressa a respeito), dispondo também sobre outras atividades como a exploração de petróleo e gás natural:

Art. 1º O art. 21 da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, passa a vigorar com a seguinte redação, renumerando-se o parágrafo único para § 1º:

Art. 21. ... § 1º ... § 2º Excetua-se da vedação contida no caput a celebração de contratos com terceiros, tendo por objetivo a exploração do potencial para produção de energia eólica ou solar de forma complementar às atividades agrossilvipastoris ou extrativistas desenvolvidas no imóvel rural, mediante autorização do órgão federal competente para a execução do Programa Nacional de Reforma Agrária, nos termos do regulamento. (NR)

Art. 2º O art. 22-A da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 22-A. ...

§ 1º Nos imóveis rurais com potencial para exploração de petróleo e gás natural, de recursos hídricos e eólicos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais, o órgão federal competente para a execução do Programa Nacional de Reforma Agrária autorizará ao beneficiário da reforma agrária a celebração de contratos com terceiros objetivando a exploração do referido potencial, na forma estabelecida em regulamento.

§ 2º É direito dos beneficiários da reforma agrária a participação no resultado da exploração, realizada em áreas de projetos de assentamento, de petróleo e

284 Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=7248442&ts=1583936839801

gás natural, de recursos hídricos e eólicos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais, cujo valor será revertido em benefício do desenvolvimento socioeconômico e da sustentabilidade ambiental do assentamento, na forma estabelecida em regulamento.

§ 3º É devida aos beneficiários da reforma agrária a indenização por danos e prejuízos causados em decorrência de obras e empreendimentos de interesse público em áreas de projetos de assentamento, na forma estabelecida em regulamento.” (NR)

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

O Projeto de Lei continua em seu natural trâmite no âmbito do Senado Federal e, após a realização de audiência pública em 26 de junho de 2019, apresenta atualmente a redação constante do Parecer da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária285, de 06 de novembro de

2019, o qual orientado pelo que chamou de princípios norteadores da reforma agrária (necessidade de produção de alimentos, geração de ocupação e renda e o combate à fome e à miséria), limitou a 30% a área a ser explorada para qualquer finalidade não inerente à reforma agrária, vedou que a assinatura desses contratos gere a perda da qualidade de segurado especial da Previdência Social ou a restrição ao acesso a outras políticas públicas destinadas às atividades rurais, e assegura o acompanhamento da celebração desses contratos pelos Sindicatos de Trabalhadores Rurais, de Agricultores Familiares.

Por fim, excluiu-se da redação às menções às atividades de exploração de petróleo, gás natural e mineração, as quais possuem fundamento direto na própria Constituição Federal.

A atual redação propõe:

Art. 1º O art. 21 da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, passa a vigorar com a seguinte redação, renumerando-se o parágrafo único para § 1º:

“Art. 21.

... §

1º... ...

§ 2º Excetua-se da vedação contida no caput a celebração de contrato, tendo por objetivo a exploração e o aproveitamento sustentável do potencial de energia renovável, eólica, solar, hídrica e bioenergia do imóvel rural, de forma complementar às atividades agrossilvipastoris ou extrativistas, mediante autorização do órgão federal competente para a execução do Programa Nacional de Reforma Agrária, nos termos do regulamento.” (NR)

Art. 2º O art. 22-A da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, passa a vigorar com a seguinte redação:

285 Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=8035631&ts=1583936840515

“Art. 22-A. ... § 1º Nos imóveis rurais com potencial para exploração de energia renovável, eólica, solar, hídrica e bioenergia, o órgão federal competente para a execução do Programa Nacional de Reforma Agrária autorizará o beneficiário assentado a celebrar contratos com terceiros, individuais ou coletivos, objetivando o aproveitamento do referido potencial, na forma estabelecida em regulamento.

§ 2º O órgão federal competente para a execução do Programa Nacional de Reforma Agrária, objetivando o aproveitamento competitivo do potencial previsto no §1º, está autorizado a celebrar contratos com terceiros priorizando cooperativas e associações de trabalhadores assentados, mediante prévia licitação.

§ 3º A autorização de que trata o § 1º não poderá ser concedida a atividade de geração de energia renovável, eólica, solar, hídrica e bioenergia quando envolver mais de 30% (trinta por cento) da área do imóvel, ou quando se constatar que inviabiliza a finalidade do projeto de assentamento.

§ 4º Independentemente de celebração de contrato, a família beneficiária da reforma agrária poderá explorar, ela própria, o potencial previsto no §1º da área que lhe foi destinada.

§ 5º A autorização de que trata o § 1º não será considerada para a exclusão do assentado da condição de segurado especial perante a Previdência Social, nem poderá constituir impedimento para o acesso a políticas públicas destinadas à atividade rural.

§ 6º A celebração de contrato com terceiros objetivando a exploração do potencial econômico referido no § 1º deverá ser acompanhada por Sindicato de Trabalhadores Rurais.

§ 7º A autorização de que trata o § 1º se estende aos beneficiários do Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF).

§8º É direito dos beneficiários da reforma agrária a participação em 50% (cinquenta por cento) do valor do resultado do aproveitamento sustentável do potencial de energia renovável, eólica, solar, hídrica e bioenergia, para fins de geração de energia elétrica, realizado em áreas de projeto de assentamento, sendo o restante revertido em benefício do desenvolvimento socioeconômico e da sustentabilidade ambiental do assentamento, na forma estabelecida em regulamento.

§ 9º A construção ou instalação da fonte geradora nos imóveis rurais dos beneficiários de reforma agrária, bem como das servidões necessárias para seu pleno funcionamento, deverão ser autorizadas por cooperativas ou associações dos trabalhadores assentados.

§ 10º É devida diretamente aos beneficiários da reforma agrária a indenização por danos e prejuízos causados em decorrência de obras e empreendimentos de interesse público em áreas de projetos de assentamento, na forma estabelecida em regulamento.” (NR)

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação

A evolução da tramitação processual com suas emendas ao texto revelou-se necessária para se entender a complexidade do tema e as incertezas que o rodeiam. Não há regulação anterior que a permita expressamente, nem que proíba a exploração de potencial eólico em

projeto de assentamento. Há uma zona de penumbra, marcada pelo aspecto puramente negocial (contratos privados ou eventual concessão de uso, no caso de contrato administrativo), revelando-se salutar, sobretudo, para fins de segurança jurídica a regulação do tema.

Verifica-se de plano que o raciocínio o qual inaugurou o Projeto de Lei, ou seja, sua primeva redação, foi superado por várias razões, dentre elas o desconhecimento da realidade dos projetos de assentamento e dos empreendimentos eólicos; a complexidade e multidisciplinaridade do tema; a necessidade de se aclarar a prioridade da opção pela reforma agrária; a necessidade de se conferir um protagonismo ao órgão responsável pela execução da reforma agrária; a necessidade de se avaliarem aspectos secundários ou a consequência da assinatura dos contratos na vida dos beneficiários da reforma agrária. Desfigurada a proposta original, merece análise crítica a atual proposta.

De início, fez bem o relator ao excluir as atividades de exploração de petróleo, gás natural e exploração mineral, uma vez que tais atividades têm foro constitucional e estão bem regulamentadas em seus próprios normativos. No mais, diferentemente da exploração eólica e solar, são poucas ou nenhuma as alternativas locacionais para as referidas explorações, pois a ocorrência da substância a ser extraída ocorre de forma fixa em um determinado ponto.

Quanto à inserção do segundo parágrafo ao art. 21 da Lei nº 8.629, de 1993, ela estabelece uma exceção à cláusula do contrato de concessão de uso que impossibilita a cessão total ou parcial de imóveis a terceiros. Por outro lado, estabelece que o INCRA autorizará que o assentado firme contrato com terceiro para fins de exploração dos citados potenciais de energias renováveis (eólica, solar, hídrica e bioenergia). Essa redação se conjuga com a do parágrafo primeiro proposta para o art. 22-A. Contudo, em crítica inicialmente tecida, surge a preocupação de que o assentado que possui vínculo precário com o órgão ou entidade executora da reforma agrária assine diretamente o contrato com o terceiro responsável pela exploração da fonte renovável de energia.

É que esses contratos para a produção de energia eólica demandam alto investimento, e só são viáveis a longo prazo (em geral, mais de vinte anos). No mais, a usina eólica é uma empreitada de alta complexidade para a instalação e para eventual remoção. Se o título do assentado, o Contrato de Concessão de Uso, é precário (ou seja, não é definitivo), não faz sentido ser ele a negociar com o empreendedor. O beneficiário pode ser excluído do PNRA, e o benefício por ele aferido não será revertido às finalidades do programa. O proprietário da terra é, no caso dos projetos federais, o INCRA. A autarquia, com todos os seus técnicos é quem melhor deterá as condições para entender a sobreposição do empreendimento eólico com o projeto de assentamento, com uma visão sobre o todo.

No mais, quem detém a competência para a escolha do empreendedor? Um assentamento é um conjunto de unidades agrícolas independentes entre si. Os lotes na maioria dos assentamentos já são definidos com base em fração mínima de parcelamento de forma a assentar o máximo de indivíduos possível. O interesse do empreendedor é em grande extensão de área propícia à exploração eólica e que se encontre desembaraçada.

Não se vê suporte lógico para que o assentado (que não é proprietário, repise-se) faça a escolha do empreendedor, já que o assentamento ou bloco de assentamentos contíguos será explorado por um mesmo empreendedor.

Da mesma forma, na negociação entre empreendedor e beneficiário do PNRA (esses, com todo o perfil social já apontado em capítulo anterior), pesará o poder do detentor do capital, da assimetria de informação, em detrimento do assentado, fato que já é observado em negociações com pequenos produtores no Estado do Rio Grande do Norte.

Portanto, defende-se um modelo que seja capitaneado pelo Estado, por meio do órgão executor da política de reforma agrária, que é quem é capaz de analisar a sobreposição, a viabilidade da convivência entre os empreendimentos, de escolher de forma lícita e transparente o empreendedor, negociar com ele os valores decorrentes da exploração, receber, em um primeiro momento, os recursos para aplicá-los em projetos de desenvolvimento do assentamento, e construir, junto com os assentados, a regra de transição para quando esses últimos passarem à condição de proprietários.

Quanto a um segundo aspecto da proposta legislativa, a qual limita o tamanho da área a ser concedida para as aludidas explorações a uma área máxima de 30% (trinta por cento), ele é desprovido de qualquer base técnica ou estudo que o ampare.

Embora seja importante priorizar o projeto de assentamento, não é razoável estabelecer um limite de área sem estudo técnico que o embase. Com efeito, a título de exemplo, há no Estado do Rio Grande do Norte o Projeto de Assentamento Zumbi/Rio do Fogo, no Município de Rio do Fogo, no qual boa parte de sua área é coberta por dunas e imprópria para as atividades agrícolas ou pecuárias.

Portanto, deve-se focar na parte final do dispositivo, permitindo-se a concessão de tanto quanto seja necessário ao empreendimento, desde que não se inviabilize a finalidade do projeto de assentamento. A definição do quantitativo de área é estritamente técnica, de competência do INCRA (em face da preponderância do assentamento), e depende das particularidades de cada projeto de assentamento.

Cumpre ao INCRA, previamente ao processo de escolha do cessionário, indicar, com nível de precisão adequado, em cada projeto de assentamento, as áreas que efetivamente

poderão ser utilizadas para fins de instalação do empreendimento, pensando-se no canteiro de obras, aerogeradores e demais construções necessárias para a sua operação, bem como informar as áreas que não poderão ser impactadas em qualquer hipótese.

A regra que permite a exploração direta dos potenciais de energia renováveis pelo próprio assentado (parágrafo quarto) se faz interessante, sobretudo em face da energia solar, cuja microgeração, por exemplo, não consumirá grandes recursos. Contudo, para atividades que demandam maior investimento, conhecimento e complexidade técnica, como o caso da eólica no modelo ora proposto, torna-se tecnicamente e financeiramente inviável.

Milita em favor do assentado e se revela imprescindível a regra que prevê a não perda da qualidade de segurado especial por conta da renda eventualmente aferida, bem como do acesso a políticas públicas destinadas à atividade rural (quinto parágrafo).

Em relação à qualidade de segurado especial, essa técnica legislativa não é inovadora. Com efeito, nos termos da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, o empreendedor que exerça as atividades de industrialização, comercialização e prestação de serviços no âmbito rural e que efetuar seu registro como microempreendedor individual não perderá a condição de segurado especial da Previdência Social.

Ante a preponderância da finalidade do assentamento, é razoável a regra que não exclua o assentado da qualidade de segurado especial, acaso perceba alguma renda decorrente da exploração eólica. Não se deve esquecer que o benefício previdenciário em questão equivale a um salário mínimo. Acaso o trabalhador deseje um benefício maior, terá de abrir mão dessa qualidade especial e verter contribuições maiores para a Seguridade Social.

A regra de obrigatoriedade de acompanhamento por sindicato de trabalhadores rurais soa anacrônica (sexto parágrafo). Embora o sindicalismo seja internacionalmente reconhecido e atue também em questões referentes ao meio ambiente do trabalho, os projetos de assentamento contam com as associações representativas de seus membros. Essa sim tem de participar obrigatoriamente do processo visando à concessão de uso para o aproveitamento eólico. Contudo, não se vê empeço a que o sindicato de trabalhadores rurais acompanhe seu desenvolvimento, legitimando-o a participar do processo administrativo na construção de uma solução. Em todo caso, no modelo que se propõe, o protagonismo será do órgão executor da Reforma Agrária, pelos motivos já apresentados.

A regra que estabelece a participação em 50% (cinquenta por cento) do valor do resultado do aproveitamento sustentável do potencial de energia renovável pode parecer um interessante programa de distribuição direta de renda em um primeiro momento.