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Pulseira douradaPulseira douradaPulseira dourada

Pulseira douradaPulseira dourada

Pulseira dourada

Mais lembranças inúteis. Tinha eu meus 7 anos... Se você quiser parar por aqui, tudo bem. Não, não, nenhum constrangimento. Vá ler o resto do jornal, aqui você só estaria perdendo tempo. O que é isso? Eu entendo. Numa boa. Eu mesmo só fico porque preciso botar o ponto final. Mas tinha eu meus 7 anos e morávamos em Los Angeles. Meu pai lecionava na Ucla, eu e minha irmã freqüentávamos uma escola perto de casa. E me apaixonei por uma menina da escola. Uma daquelas paixões dos 7 anos, terrível e, no meu caso, secreta e silenciosa. Os donos da casa que alugávamos tinham deixado uma bijuteria mal escondida atrás de uns livros, numa prateleira da sala. Uma pulseira dourada dentro de uma caixa. Um dia, tomei a decisão. Meu amor justificava tudo, até o crime. Peguei a pulseira e a levei, escondida, para a escola. Na saída, entreguei a caixa para a menina - e saí correndo.

Em casa nunca deram falta da pulseira. A menina nunca disse nada sobre o presente. Eu, obviamente, nunca mencionei o fato para ninguém, muito menos para a menina - com quem, aliás, nunca troquei nem um

Mas às vezes penso naquela pulseira e imagino coisas. Chegar, um dia, nos Estados Unidos e alguém da imigração americana consultar um computador e dizer “Há a questão de uma certa pulseira dourada na Califórnia, Mr. Verissimo...” Estar assistindo à entrevista de alguma atriz famosa na TV e ela contar que um dia, quando tinha 7 anos, um garoto estranho lhe entregara uma pulseira e saíra correndo, e mostrar a pulseira dourada, que lhe dera sorte, que era responsável pelo seu sucesso, e que ela nunca pudera agradecer... Pelo menos minha vida de crimes acabou ali.

Post-scriptum tipo nada a ver com nada. Muitos anos depois visitei o bairro em que morávamos em Los Angeles e fui procurar a escola, palco do meu gesto tresloucado. Tinha sido destruída por um terremoto.

Mudança - As seis colunas semanais que publico no Estadão vão ser reduzidas para duas: esta, aos domingos, e uma que sairá às quintas- feiras. A mudança é a meu pedido, por nenhuma outra razão além da mais antiga que existe, a vontade de trabalhar menos. Esta seção continuará igual. Não adianta protestar, continuará.

Banalidades, banalidades.

Banalidades, banalidades.Banalidades, banalidades.

Banalidades, banalidades.

Acho que devemos todos nos dedicar seriamente à banalidade. O mundo não tem jeito mesmo, deixa o mundo para lá. Não se preocupe em se distrair e ficar desinformado: quando o mundo chegar ao fim, com um estrondo ou uma inalação, nós saberemos. Fique descansado, ele não acaba sem você. Às banalidades, portanto.

Por exemplo: para onde vão os seios à mostra quando saem das passarelas?

Espera um pouquinho. Deixa eu reformular a pergunta. Em todos os desfiles de moda pelo menos metade das modelos mostra roupas

transparentes em que os seios aparecem. Mas é raro encontrar alguém na, digamos, vida civil usando as mesmas roupas, ou roupas com a mesma transparência. Os seios não aparecem na mesma proporção, quando as roupas saem das passarelas para a realidade.

Ou eu é que ando freqüentando a realidade errada?

Pode-se argumentar que os desfiles são representações de um ideal impossível de ser reproduzido no cotidiano. Num desfile de modas todas as mulheres são lindas, altas e magras. São, por assim dizer, mulheres destiladas, ou a mulher como ela sonha ser - e andar, e brilhar, e vestir roupas caras. Desta maneira os seios à mostra nos desfiles também seriam idealizações. Só seriam seios reais se viessem junto com o vestido, e a mulher, usando sua transparência, automaticamente ficasse com seios de manequim.

Pessimamente comparando, as manequins são como aqueles desenhos nos cartões à sua frente nas poltronas dos aviões, de pessoas ajustando o colete salva-vidas, colocando as máscaras de oxigênio, assumindo a posição adequada para o caso de queda do avião, atirando-se pelo tobogã para sair do avião acidentado - enfim, em situações de emergência. E ninguém tem cara de quem está numa situação de emergência. Não estão exatamente sorrindo, mas suas expressão é de quem enfrenta emergências com naturalidade, até com um certa indiferença. São o tipo de pessoas que seguiriam as instruções de respirar normalmente depois de colocar as máscaras de oxigênio - coisa que você e eu nunca faríamos. As manequins são assim. Desfilam como se ser magnífica, com seios magníficos, fosse uma coisa comum. Na vida real, poucas mulheres podem usar uma roupa cara como a roupa cara merece, como manequins. Na vida real, ninguém respira normalmente durante uma emergência.

Banalidades, banalidades. Nada mais invejável, hoje em dia, do que não estar nem aí. E a forma mais enternecedora de desinformação é a conclusão errada.

Como a daquela senhora hipotética que ouviu contarem que as companhias de aviação estavam pensando em eliminar as facas nas suas refeições de bordo e achou que já não era sem tempo. Aplaudiu a medida, pois sempre fora da opinião que a maior ameaça à segurança dos vôos era servirem carne - muitas vezes carne dura, sabe como é comida de avião - e provocarem guerras de cotoveladas entre as pessoas tentando cortá-la sem espaço, e que cedo ou tarde resultaria num conflito de proporções no interior da aeronave. O fim das facas significava que daqui por diante só serviriam comida pré-cortada, ou que se pode cortar com o garfo. Bravo.

- Não, não, Edimilda. É por causa dos terroristas. - Que terroristas?!

Também tem o caso daquele antropólogo amador que desenvolveu a tese de que já existiram seres com três braços, deduzindo isso dos poucos vestígios deixados pela raça desaparecida sobre a Terra, como o chuveirinho para se segurar com a mão, com o qual ninguém com apenas duas mãos consegue tomar banho; o coquetel, no qual, com uma mão segurando uma bebida e a outra um canapé, usava-se a terceira para cumprimentos ou coceiras extemporâneas, e... Está bem, chega. Mas me agradeça pela banalidade. Conseguimos chegar até aqui sem falar uma só vez em antraz.

Banalidades

Banalidades

Banalidades

Banalidades

Acho que devemos todos nos dedicar seriamente à banalidade. O mundo não tem jeito mesmo, deixa o mundo para lá. Não se preocupe em

se distrair, ficar desinformado e ser esquecido: quando o mundo chegar ao fim, com um estrondo ou uma inalação, você saberá. Fique descansado, o mundo não acaba sem você.

Às banalidades, portanto.

Por exemplo: para onde vão os seios à mostra quando saem das passarelas?

Espera um pouquinho. Deixa eu reformular a pergunta. Em todos os desfiles de moda pelo menos metade das modelos mostra roupas transparentes em que os seios aparecem. Mas é raro encontrar alguém na, digamos, vida civil, usando as mesmas roupas, ou roupas com a mesma transparência. Os seios não aparecem na mesma proporção, quando as roupas saem das passarelas para a realidade.

Ou eu é que ando freqüentando a realidade errada?

Pode-se argumentar que os desfiles são representações de um ideal impossível de ser reproduzido no cotidiano. Num desfile de modas todas as mulheres são lindas, altas e magras. São, por assim dizer, mulheres destiladas, ou a mulher como ela sonha ser - e andar, e brilhar, e vestir roupas caras. Desta maneira, os seios à mostra nos desfiles também seriam idealizações. Só seriam seios reais se viessem junto com o vestido, e a mulher, usando sua transparência, automaticamente ficasse com seios de manequim.

Pessimamente comparando, as manequins são como aqueles desenhos nos cartões à sua frente nas poltronas dos aviões, de pessoas ajustando o colete salva-vidas, colocando as máscaras de oxigênio, assumindo a posição adequada para o caso de queda do avião, atirando-se pelo tobogã para sair do avião acidentado - enfim, em situações de emergência. E nenhuma das pessoas tem cara de quem está numa situação de emergência. Não estão exatamente sorrindo, mas suas expressão é de

indiferença. São o tipo de pessoas que seguiriam as instruções de respirar normalmente depois de colocar as máscaras de oxigênio - coisa que você e eu nunca faríamos. As manequins são assim. Desfilam como se ser magnífica, com seios magníficos, fosse uma coisa comum. Na vida real, poucas mulheres podem usar uma roupa cara com a cara que a roupa cara merece, como fazem as manequins. Na vida real, ninguém respira normalmente durante uma emergência.

Banalidades, banalidades. Nada mais invejável, hoje em dia, do que não estar nem aí. E a forma mais enternecedora de desinformação é a conclusão errada.

Como a daquela senhora hipotética que ouviu contarem que as companhias de aviação estavam pensando em eliminar as facas nas suas refeições de bordo e achou que já não era sem tempo. Aplaudiu a medida, pois sempre fôra da opinião que a maior ameaça à segurança dos vôos era servirem carne - muitas vezes carne dura, sabe como é comida de avião - e provocarem guerras de cotoveladas entre as pessoas tentando cortá-la sem espaço, e que cedo ou tarde resultaria num conflito de proporções no interior da aeronave. O fim das facas significava que daqui por diante só serviriam comida pré-cortada, ou que se pode cortar com o garfo. Bravo.

- Não, não, Edimilda. É por causa dos terroristas. - QUE TERRORISTAS?!

Também tem o caso daquele antropólogo amador que desenvolveu a tese de que já existiram seres com três braços, deduzindo isso dos poucos vestígios deixados pela raça desaparecida sobre a Terra, como o chuveirinho para se segurar com a mão, com o qual ninguém com apenas duas mãos consegue tomar banho; o coquetel, no qual, com uma mão segurando uma bebida e a outra um canapé, usava-se a terceira para cumprimentos ou coceiras extemporâneas, e... Está bem, chega. Mas me

agradeça pela banalidade. Conseguimos chegar até aqui sem falar uma só vez em Iraque, Bin Laden, armas químicas ou o terrível, etc.

Beijinho, beijinho.

Beijinho, beijinho.Beijinho, beijinho.

Beijinho, beijinho.

Na festa dos 34 anos da Clarinha o seu marido, Amaro, fez um discurso muito aplaudido. Declarou que não trocava a sua Clarinha por duas de 17, sabiam por que? Porque a Clarinha era duas de 17.Tinha a vivacidade, o frescor e, deduzia-se, o fervor sexual somado de duas adolescentes.

No carro, depois da festa, o Marinho comentou: - Bonito, o discurso do Amaro.

- Não dou dois meses para eles se separarem - disse a Nair. - O quê?

- Marido, quando começa a elogiar muito a mulher...

Nair deixou no ar todas as implicações da duplicidade masculina. - Mas eles parecem cada vez mais apaixonados - protestou Marinho.

- Exatamente. Apaixonados demais. Lembra o que eu disse quando a Janice e o Pedrão começaram a andar de mãos dadas?

- É mesmo...

- Vinte anos de casados e de repente começam a andar de mãos dadas? Como namorados? Ali tinha coisa.

- É mesmo...

- E não deu outra. Divórcio e litigioso. - Você tem razão.

- E o Mário com a coitada da Marli? De uma hora para outra? Beijinho, beijinho, “mulher formidável” e descobriram que ele estava de caso com a gerente da loja dela.

- Você acha, então, que o Amaro tem outra? - Ou outras.

Nem duas de 17 estavam fora de cogitação.

- Acho que você tem razão, Nair. Nenhum homem faz uma declaração daquelas assim, sem outros motivos.

- Eu sei que tenho razão.

- Você tem sempre razão, Nair. - Sempre, não sei.

- Sempre. Você é inteligente, sensata, perspicaz e invariavelmente acerta na mosca. Você é uma mulher formidável, Nair.

Durante algum tempo, só se ouviu, dentro do carro, o chiado dos pneus no asfalto. Aí Nair perguntou:

- Quem é ela, Marinho?