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CAPÍTULO III A INCLUSÃO DE CRIANÇAS COM PEA

2. O que é a escola inclusiva?

Na Declaração de Salamanca (1994) encontramos a seguinte demanda,

"O princípio fundamental das escolas inclusivas consiste em todos os alunos aprenderem juntos, sempre que possível, independentemente das dificuldades e das diferenças que apresentem. Estas escolas devem reconhecer e satisfazer as necessidades diversas dos seus alunos, adaptando-se aos vários estilos e ritmos de aprendizagem, de modo a garantir um bom nível de educação para todos, através de currículos adequados, de uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas, da utilização de recursos e de uma cooperação com as respectivas comunidades".

Uma das principais alterações socioeducativas ocorridas nas últimas décadas foi a tentativa de democratizar verdadeiramente o ensino para todos, numa perspetiva de uma escola inclusiva, "(...) aberta a todos, sendo factor de integração e inclusão dos alunos, inclusivamente sociocultural, e de professores que devem possuir competências que ultrapassam o mero domínio dos conhecimentos da sua área de saber a transmitir aos alunos" (Jesus, 1998, citado por Jesus, 2000, p. 5).

Segundo Martins (2000), constata-se uma progressiva tomada de consciência de que o atendimento às crianças e jovens com NEE se deve processar no seio da estrutura do ensino regular. Importa, pois, determinar quais os objetivos educativos, traçar metas comuns relativamente a todos os alunos, tomar decisões acerca do currículo, sequências de aprendizagem e critérios de avaliação e de coordenação dos métodos de ensino de cada professor, são tarefas e decisões muito importantes na assunção de um projeto educativo e organização global da escola, a qual se pretende seja mais inclusiva.

De acordo com o Despacho Conjunto n.º 105/97, de 1 de Julho, dos documentos relativos às "Normas orientadoras para a realização dos apoios educativos nas escolas" e, no entendimento da escola Inclusiva, a utilização das estratégias educacionais que facilitam o processo de reabilitação das crianças/alunos com NEE, implica o desenvolvimento de um trabalho transdisciplinar e uma reflexão coletiva acerca do modo como se adapta o currículo e organiza a escola, de forma a oferecer a estrutura educativa mais adequada.

O papel do Órgão Diretivo da Escola (ODE) é de ser responsável "(...) em conjunto com que todos os docentes, fazer com que todo o pessoal escolar -(…)- os pais e quaisquer outros membros da comunidade se sintam parte de um projecto educacional que tenha por base os princípios da inclusão" (Correia, 2010, p. 32) e garantir o desenvolvimento do processo de atendimento dos alunos com NEE, desde que o problema é detetado até a organização das respostas educativas consideradas mais adequadas. Importa certificar a existência e justificar a correspondência entre as medidas propostas no regime educativo especial e as necessidades do aluno, resultantes da avaliação feita.

Ao professor do ensino regular cabe um papel primordial, considerando que a intervenção junto de alunos com NEE deve estar centrada no processo de ensino/ aprendizagem e não necessária e exclusivamente no aluno. Além disso, importa tentar

corresponder às necessidades de cada aluno com NEE em âmbito da classe regular. Ou seja, a resposta educativa adequada à maioria dos alunos com NEE necessita, reside na qualidade do processo pedagógico, incluindo a adequação dos currículos e dos métodos de ensino, a natureza dos materiais a utilizar, a organização do espaço, a gestão do tempo, etc..

Ainda o citado Despacho Conjunto n.º 105/97, de 1 de Julho vem definir as funções dos docentes que prestam apoio educativo nas escolas e consagra a natureza e abrangências dos mesmos. O conjunto de apoios educativos que tradicionalmente se encontrava centrado na criança com NEE, e da responsabilidade do professor do ensino especial alarga-se a toda a comunidade educativa, incluindo os órgãos de gestão e coordenação pedagógica, as famílias e comunidade em geral.

Em conjunto, cabe aos professores de apoio educativo e do ensino regular reconhecerem e valorizarem o papel dos pais, prestando-lhes toda a colaboração possível. Esta colaboração traduz-se em informação e reforço das atitudes positivas, quer na execução de determinadas tarefas quer em outras formas de apoio.

Contudo, e para que isto seja uma realidade, é necessário garantir a adequação dos métodos de ensino, dos meios pedagógicos e dos currículos, dos recursos humanos e materiais e ainda dos espaços educativos. É, ainda, fundamental que a intervenção seja o mais precoce possível, que envolva as famílias e encare a criança numa perspetiva ecológica, tendo em conta a sua individualidade própria e as características do meio em que está inserida. Esta intervenção, deverá pois resultar, sempre que possível, da articulação e colaboração dos vários intervenientes, atuando numa base multi- profissional e transdisciplinar.

Num contexto de inclusão, a educação deve refletir mais do que o ensino de conteúdos académicos. A educação deverá desenvolver os alunos como um todo e cultivar todas as competências, atitudes e conhecimentos necessários à sua plena integração na sociedade (Katz & Mirenda, 2002).

Entretanto, a escola para se tornar inclusiva, necessita de uma pedagogia da complexidade, capaz de ensinar com alto nível em classes que são heterogéneas do ponto de vista académico linguístico, racial, étnico, social, para que as tarefas académicas sejam atraentes e desafiadoras (Gimeno Sacristán, 2003).

Hunt, Soto, Maier e Doering (2003) corroboram o pensamento de Gimeno destacando que uma educação inclusiva assenta na crença de que todas as crianças podem aprender e, que todas as crianças têm o direito a serem educadas com os seus pares em salas heterogéneas, etariamente adequadas e na sua comunidade.

Desta longa caminhada científica sobre esta problemática, resultou em termos educativos, a ideia de que qualquer criança, independentemente das suas características específicas, é antes de mais, uma criança que necessita menos de classificações e tipologias e mais de cuidados que lhe permitam atingir os seus máximos potenciais. Mas, isto não invalida nem nega a existência de dificuldades específicas que algumas crianças apresentam.

Importa pois, e talvez por isso, salientar que o direito a ser diferente exige uma educação que, por ser educação não poderá ser discriminatória, pelo contrário um fator de inserção social. A escola, como responsável e elemento importante na comunidade, pode e deve tornar-se num dos agentes mais ativos e válidos em todo este processo.

A atenção às diferenças individuais exige uma flexibilização da organização escolar ao nível das estratégias de ensino, da gestão de recursos e da flexibilização de currículos. O objetivo é proporcionar um desenvolvimento maximizado de todos, de acordo com as características pessoais e necessidades individuais de cada um.

A educação inclusiva é pois entendida como o processo de inclusão dos indivíduos portadores de necessidades educativas especiais em todos os níveis da rede comum de ensino. É pois "o modelo de escola para todos (...) que opta pela educação especial integrada, fazendo frente à educação especial segregada que se realiza à parte da educação geral regular" (Bautista, 1997, p. 21).

Neste processo de inclusão, não podemos descurar uma estratégia, considerada por Hewitt (2006), de extrema importância designada familiarização. Segundo esta autora, da aplicação desta técnica poderão sobressair benefícios, particularmente para as crianças e jovens com PEA, tendo em conta a sua generalizada resistência à mudança. Assim, numa situação de iniciar numa nova escola, Hewitt (2006) sugere várias estratégias como sendo:

- Realizar uma visita inicial fora do horário escolar;

- Facultar aos pais fotografias do edifício no sentido de preparar a criança para a visita, assim como dos profissionais com quem a criança irá ficar;

- No primeiro dia, realizar o mesmo trajeto até à entrada da sala que a criança irá percorrer nos dias seguintes;

- Na visita inicial, a criança deve ser sempre acompanhada por um progenitor ou encarregado de educação;

- Deve dar-se liberdade à criança para passear e explorar o novo espaço;

- Apresentar todos os funcionários, sem descurar os que supervisionam os períodos de almoço.

Esta autora realça ainda que esta apresentação carinhosa e individual é reconhecida como necessária e importante, pelas escolas que trabalham de uma forma inclusiva com crianças com PEA.

No mesmo sentido, Grinfeld (2013) alerta para este processo, que denomina de adaptação da criança na escola. Esta psicóloga, classifica este processo como "(...) um período de múltiplas integrações: criança-família, criança-escola, família-escola, não se restringindo apenas às crianças que ingressam na vida escolar", admitindo, porém que "(...) a grande transformação ocorre quando a criança vai pela primeira vez para a escola".

Embora não se refira em particular a crianças com PEA, Grinfeld (2013) considera que cada indivíduo é único e tem a sua maneira própria de lidar com as mudanças, separações e novidades. Por estas razões, considera que várias condições devem estar reunidas para que a transição do ambiente familiar para o escolar decorra da melhor forma, de que destacamos três: a relação de confiança que deve existir entre a escola e a família; dar previamente a conhecer à criança o ambiente escolar; o pai ou a mãe devem acompanhar a criança no processo de adaptação.