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4 LINGUAGEM, DISCURSIVIDADE E PSICANÁLISE: FREUD,

4.2 Lacan e o inconsciente estruturado como linguagem

4.2.1 O real, o simbólico e o imaginário

Nessa esteira é que Lacan constrói as dimensões do real, simbólico e imaginário, que também formam um compósito ou aparelhagem psíquica. Lacan cria um paradigma acerca do

sujeito, que procura também dar conta do desse sujeito e da sua subjetividade.

A dimensão ou registro do que veio a ser chamado de imaginário passou a ser construído por Lacan por volta dos anos 1930, logo que lança a teoria do Estádio do Espelho.

Essa teoria trata do momento de constituição do Eu, da identidade, da distinção entre o Eu e o outro, ou seja, estabelece os limites entre a borda do corpo e o outro, e a sensação de identidade do sujeito. É o momento em que o sujeito percebe sua identidade como alguém no mundo, alguém constituído neste mesmo mundo. O Eu, para Lacan, não se dá a partir de um amadurecimento biológico, mas que se estabelece por meio de uma relação que o precipita no mundo. O Estádio do Espelho demarca um campo onde se estabelecem relações que produzem o Eu:

[...] ao conceber a chamada dinâmica do estádio do espelho como consequência de uma prematuração do nascimento, genérica no homem, da qual resulta, no tempo demarcado, a identificação jubilatória do indivíduo ainda infans com a forma total em que se integra esse reflexo do nariz, ou seja, com a imagem de seu corpo [...] (LACAN, 1998b, p. 429).

Basicamente, Lacan (1998) exemplifica este momento com uma criança de até dezoito meses que é colocada diante de um espelho e este se apresenta de forma indistinguível para a criança. Este é o primeiro momento. O espelho é uma coisa a mais diante de todos os demais objetos que estão diante dela. Ao olhar para o espelho, a criança não vê nada de diferente como enxerga as demais coisas em seu torno.

Num segundo momento ou tempo, a criança vê surgir diante dela, no espelho, um semelhante, que é seu próprio reflexo. Ela vê um outro, que tenta pegar, cheirar, interagir com este outro corpo no espelho na condição de uma companhia, de uma outra criança. Ela ainda não se reconhece, mas identifica um outro, tal como acontece quando um animal ao observar a si mesmo no reflexo do espelho, que não se reconhece, mas enxerga um outro. Além disso, a criança não percebe que se trata de uma imagem, mas tomado como algo concreto.

No terceiro momento, onde havia o outro, a criança não interage mais com este outro, pois ela sorri, segundo Lacan, retira o olhar do espelho e dirige o olhar para a mãe ou o adulto que estiver com ela. Há um corte nesta imagem, e a criança procura o olhar do adulto para verificar se o adulto também reconhece que a imagem no espelho não é de um outro, mas, sim, a sua própria imagem. Ela perde a fascinação pela imagem no espelho como sendo um outro, mas percebe que se trata de si mesma, e se identifica com esta imagem que, agora, pela sua perspectiva, é sua. O sorriso para o espelho é a marca de uma conquista para a criança, e o corte para o olhar do adulto é para demonstrar a este que ela está se vendo, que ela está se

reconhecendo no reflexo do espelho. Ela necessita do olhar do adulto, de um outro, que a reconheça também como outro. É o momento do eis-me aqui, em que a criança busca no adulto o seu reconhecimento como ser-no-mundo.

Nesse momento do estádio, o bebê reconhece sua imagem refletida no espelho, ocorrendo a unificação da imagem com o corpo, quando ele é capaz de formular uma concepção da borda do corpo por meio da imagem de si:

o estádio do espelho é um drama cujo impulso interno precipita-se da insuficiência para a antecipação – e que fabrica para o sujeito, apanhado no engodo da identificação espacial, as fantasias que sucedem desde uma imagem despedaçada do corpo até uma forma de sua totalidade que chamaremos de ortopédica – e para a armadura enfim assumida de uma identidade alienante, que marcará com sua estrutura rígida todo o seu desenvolvimento mental. (Lacan, 1998a, p.100).

Neste momento surge a noção de borda do corpo, do Eu, através da busca de uma autorização de um outro que confirme que há um Eu-próprio:

Ora, o reconhecimento pelo sujeito de sua imagem no espelho é um fenômeno que, para a análise desse estágio, é duplamente significativo: o fenômeno aparece depois de seis meses e seu estudo, nesse momento, revela demonstrativamente as tendências que então constituem a realidade do sujeito; a imagem especular, justamente em razão dessas afinidades, fornece um bom símbolo dessa realidade: de seu valor afetivo, tão ilusório quanto a imagem, e de sua estrutura, que, como ela, é reflexo da forma humana (LACAN, 2003, p. 47).

O sorriso do outro é o aval para que a criança tenha a chamada marca de conquista, conforme Lacan, o reconhecimento de que quem está no espelho é o Eu. A autorização é dada pelo outro, de fora do espelho, numa intervenção externa.

O estádio, ou a fase do espelho é a “vassourinha com a qual [Lacan] entrou na psicanálise”. Ele renova as teorias do eu [moi] – recusando qualquer concepção que tenda a fazer do eu uma instância do conhecimento do real – e funda a dimensão do imaginário. Essa “vassourinha” limpa até mesmo a casa de Freud, por ser aí que se acha a descrição do eu como núcleo do sistema percepção consciência. Em compensação, Lacan reconhece em Freud a pertinência de referir o eu ao corpo (e à superfície), como também à divisão da segunda tópica entre eu, isso e supereu. Longe de ser aparelho de conhecimento, o eu é o lugar do desconhecimento e da Verneinung (denegação).; sua gênese com o estádio do espelho o explica (PORGE, 2006, p. 67). A base lacaniana do estádio do espelho vem dos ensinamentos de Freud, que chamou este momento de autoerotismo, que é o momento em que a criança e as coisas a sua volta se misturam, não há uma identidade, não há uma borda do corpo, uma distinção, um momento de indiferenciação entre a criança e o outro. Freud afirma que para que a criança supere este momento é necessária uma nova ação psíquica, um acontecimento que venha de outro lugar, uma espécie de atravessamento ou intervenção de fora, que repercuta neste autoerotismo, uma

espécie de corte.

[...] é apenas após a experiência especular, que a criança repete experimentalmente por suas idas e vindas deliberadas diante do espelho, que ela começa, de certa forma, a se apropriar de seu próprio corpo e armadilhar além de seu narcisismo. [...] Em particular, seu próprio rosto, que o espelho lhe revela e que será doravante indissociável de sua identidade, solidária de seu corpo, tórax, tronco membros, convence a criança de que ela é semelhante aos outros humanos, um dentre eles (DOLTO, 2004, p. 129).

Para Lacan, o momento da identificação do Eu está diretamente ligado com a dimensão da linguagem, como o espaço em que a criança obtém o sim do mundo exterior (sim, eis aí você!), onde ela obtém o reconhecimento como ser-no-mundo.

Além disso, é importante observar que o espelho da experiência não é apenas o objeto, mas, sim, tudo aquilo que é capaz de devolver ao Eu uma imagem, uma superfície que devolve algo, como o olhar do outro, o olhar do grupo.

As imagens devolvidas pelos outros fazem parte da instância do imaginário. A partir do momento em que a criança deixa o útero materno, que significa uma morte para o nascimento em um novo mundo cheio de angústia é que se dá o início da instância do imaginário e do real, pois enquanto o primeiro está ligado às imagens e percepções do mundo exterior, o segundo diz respeito às angústias e ao que não pode ser traduzido por meio de palavras.

Neste momento devo apontar a diferenciação feita por Lacan a respeito da relação dual do outro e do Outro (maiúsculo) ou O Grande Outro:

Mas a solução deve ser buscada de outro lado, do lado do Outro, distinguido por um A maiúsculo, sob cujo nome designamos urn lugar essencial e estrutura do simbólico. Esse Outro é exigido para situar no verdadeiro a questão do inconsciente, isto é, para the dar o termo estrutural que faz de toda a sequência da neurose uma questão, e não um engodo: distinção que mostra urn relevo, no que o sujeito só exerce seus engodos para "inverter a questão" (LACAN, 1998b, p. 455).

Lacan, em seus primeiros seminários define o Outro como um lugar que não se identifica com o semelhante, com outro sujeito, com o próximo, com o pequeno outro, aquele com quem o indivíduo conversa e interage, ou conforme Lacan (1998b, p. 432) “o Outro é, portanto, o lugar onde se constitui o [eu] que fala com aquele que ouve, o que um diz já sendo a resposta, e o outro decidindo, ao ouvi-lo, se esse um falou ou não”.

O outro é um duplo do sujeito, pois ele possui um corpo, uma imagem como a do sujeito, é tido como um semelhante e não representa a função do Outro, aquilo que não é idêntico, que não é o mesmo, que não é um.

O Outro é um lugar simbólico de onde o sujeito recebe sua própria mensagem de forma invertida, ou:

Na linguagem nossa mensagem nos vem do Outro, e para enuncia-lo até o fim: de forma invertida. E lembremos que esse princípio se aplicou a sua própria enunciação, pois, tendo sido emitido por nós, foi de um outro, interlocutor eminente, que recebeu seu melhor cunho (LACAN, 1998b, p. 9).

O lugar simbólico permite ao sujeito escutar a si mesmo “mais além de si mesmo”, isto é, por meio do seu inconsciente, indo além do Eu, do consciente, da condição egóica:

Isso fala no Outro, dizemos, designando por Outro o próprio lugar evocado pelo recurso à palavra, em qualquer relação em que este intervém. Se isso fala no Outro, quer o sujeito o ouça ou não com seu ouvido, é porque é ali que o sujeito, por uma anterioridade logica a qualquer despertar do significado, encontra seu lugar significante. A descoberta do que ele articula nesse lugar, isto é, no inconsciente, permite-nos apreender ao preço de que fenda (Spaltung) ele assim se constituiu (LACAN, 1998a, p. 696).

Para Lacan, o Outro é aquele lugar que fala com o sujeito, de onde este recebe sua própria mensagem através de atos falhos, de sonhos, de chistes, pois “o desejo inconsciente é o desejo do Outro” (LACAN, 1998a, p. 638), isto é, tudo aquilo que venha a ser manifestação do inconsciente nada mais é que manifestação do Outro: “o inconsciente é o discurso do Outro”. Lacan (1998b, p. 381).

E complementa afirmando que “o inconsciente é esse discurso do Outro em que o sujeito recebe, sob a forma invertida que convém à promessa, sua própria mensagem esquecida” (LACAN, 1998b, p. 440).

Tudo aquilo que construiu o sujeito e que foi esquecido, que está em seu passado, que o precedeu, que fez parte de sua conjuntura familiar, isto é, a própria história do sujeito é uma manifestação do outro.

Partindo desta premissa, Lacan afirma que a linguagem e o Outro são alteridades, pois o Outro se forma a partir do nascimento e vai sendo localizado no aparelho psíquico a partir das experiências do pequeno outro (sujeito), sendo este Outro lugar uma alteridade psíquica.

A linguagem, por sua vez, não nasce com o indivíduo, também sendo considerada uma alteridade, que determina e sobredetermina o sujeito, que o precede e o “corta”, que o “morde” e deixa nele a sua marca de alteridade.

O objeto pequeno a são as perdas, a falta, especialmente nas questões pulsionais. O

objeto pequeno a une os três aros das instâncias do real, do simbólico e do imaginário, e é a

causa do desejo, que permite que este exista de uma forma ética.

Para Lacan somos seres faltantes, pois há um espaço vazio dentro do sujeito e a esta falta denominou de objeto pequeno a a uma sucessão de perdas pelos processos frustracionais, privacionais, de renúncias e processos castracionais do sujeito que ocorrem ao longo da sua

vida. É o buraco entre o aro do real, do simbólico e do imaginário. Lacan teorizou que o nó borromeano seria uma nova tópica, uma outra parte do aparelho psíquico, um enlaçamento que se um dos aros se soltar todo o resto se desfaz. Este aparelho psíquico compõe a estrutura do sujeito, do Eu-moi, do Eu-je, do Ideal do Eu e do Super Eu.

A representação da Figura 6, denominada de nó borromeano, mostra as três dimensões do aparelho psíquico lacaniano: à direita está um aro que é a representação do imaginário, à esquerda, outro aro que é a representação do simbólico e, embaixo, um aro que é a representação do real. São três aros interligados entre si e no centro está o objeto pequeno a, de Lacan, o qual significa a falta, o desejo que é inerente a cada sujeito.

Somos seres faltantes porque somos sujeitos clivados, isto é, castrados por vários outros que nos antecederam e colaboram na constituição de nosso eu ou na constituição de nosso sujeito, conforme se diz na psicanálise. Esta castração é fundamental para que o sujeito se constitua a partir do processo de alienação em relação à metáfora materna, isto é, em que o sujeito se torna uno e não mais um apêndice do corpo daquele ou daquela que realiza a metáfora materna.

O significante materno representa a díade primeva, isto é, quando a criança e o sujeito que realiza a metáfora materna são um só, e representa o campo do gozo. A criança, ao nascer, é uma coisa-em-si no mundo da lalangue, pois compõe uma unidade com a mãe e sua ontogênese irá se instalar no falar da mãe e no ouvir da criança. A lalangue, a lalation da mãe

Figura 6 ̶ Nó borromeano

Fonte: LACAN, Jacques. O seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2008.

atende ao gozo da criança.

Neste sentido, o sujeito clivado surge da alienação, isto é, ocorre uma cisão fundamental e o sujeito encontra-se alienado de si mesmo, já que é o resultado do significante do Grande Outro ou dos Grandes Outros, sem nenhuma possibilidade de encontrar a completude pela qual buscará por toda a existência, sem sucesso.

Conforme explica Fink (1998),

No conceito lacaniano de alienação, as duas partes envolvidas, a criança e o Outro, têm pesos muito desiguais e a criança quase que inevitavelmente perde na luta entre eles. No entanto, ao assujeitar-se ao Outro, a criança ganha algo: ela torna-se, em certo sentido, um dos sujeitos da linguagem, um sujeito “da linguagem” ou “na linguagem”. (1998, p. 71)

Representado, esquematicamente, a criança, assujeitada ao Outro, permite que o significante a substitua, e a criança, advindo na forma de um sujeito dividido, desaparece debaixo ou atrás do significante, S, conforme Fink (1998):

Outro criança

S S

Entretanto, mesmo constituído por um Outro, o sujeito não pode ser totalmente representado neste Outro, visto que há um resíduo, que é a falta, pois ao se unir ao Outro, o sujeito se depara com um buraco, algo que foi perdido no decorrer deste processo. O sujeito busca se encontrar no Outro, mas percebe que não pode ser este Outro, pois se constitui como um sujeito com o significante do Outro, mas não é este Outro em sua totalidade.

O sujeito passa a ser constituído como um ser a parte com sua própria cadeia de significantes, mas sem poder jamais se constituir totalmente no Outro. O sujeito é uma extensão do Outro, mas não pode ser o Outro em sua completude, assim como o bebê é constituído a partir da alienação do corpo daquele que realiza a metáfora materna, mas não pode ser a mãe ou quem realizou tal metáfora.

Ao mesmo tempo, Fink (1998) lembra que a criança é sujeito por ser causa do desejo do Outro:

A causa da presença física do sujeito no mundo foi um desejo por algo (prazer, vingança, satisfação, poder, imortalidade e assim por diante) por parte dos pais da criança. Um ou ambos desejaram algo, e a criança resulta desse desejo. As motivações para se ter filhos são frequentemente muito complexas e sobre determinadas, e os pais de uma criança podem muito bem discordar um do outro com relação aos seus motivos. Um ou ambos podem até nem ter desejado um filho, ou podem ter desejado

apenas um filho de determinado sexo. (p. 72).

Da mesma forma, quando é clivado pela metáfora do Nome do Pai, recebe a lei e é constituído por este Outro que lhe introduziu no mundo da lei, mas não pode ser uma cópia completa deste que realizou a metáfora paterna.

Eis que ocorre a dicotomia entre o significante do desejo da mãe e o significante do Nome do Pai:

Nome-do-Pai Desejo da Mãe

O significante do Nome do Pai é quem introduz a criança na cadeia de significantes S = S1 = S2 = S3, e assim por adiante, castrando, frustrando, privando o sujeito que agora se constituiu a partir da alienação da metáfora materna.

O imaginário modula o Eu-moi (Eu), que faz parte de nosso dia-a-dia, onde o sujeito deve tomar escolhas sobre o que dizer, falar ou fazer. O imaginário controla e faz com que o sujeito escolha os discursos de forma a interagir com o Eu-moi do outro.

Escolhem-se discursos o tempo todo, por meio do imaginário. Repleto de engodos, ilusões, fantasias, o imaginário permeia o Eu-moi para que as relações por meio da linguagem possam, na medida do possível, manter interações de equilíbrio com o Eu-moi de outros.

Além disso, uma vez que a criança identifica seu Eu, a partir de sua imagem refletida no espelho, ela também passa a preencher esse Self com o simbólico que recebe daqueles, a sua volta, pois “complexos, imagos, sentimentos e crenças serão estudados em sua relação com a família e em sua função do desenvolvimento psíquico que organizam desde a criança na família até o adulto que a reproduz.” (LACAN, 2003, p. 36).

O imaginário mantém intima relação com as imagens que encantam o sujeito, que o orientam, que o seduzem, que o provocam, que o capturam, e também se relaciona com a imagem que faz de si e como imagina que é visto pelo outro. O imaginário se estabelece nestes inúmeros compartimentos repletos de imagens como se fossem espelhos a refletir as imagens do eu e as imagens do outro.

O simbólico trata de uma dimensão dual, isto é, a questão da relação entre o eu e o Outro, isto é, a relação do eu com o outro ou sua imagem e do eu com a imagem do Outro enquanto alteridade. Esse eu está em continua inter-relação com o Outro existindo uma ampla mistura entre o que é íntimo do eu com o que é alheio ou externo. O sujeito fala de si, mas

quando fala do outro também fala de si, pois é o inconsciente quem fala.

Assim, primeiro há a dimensão do alheio, que se introduz na subjetividade para que o eu possa se constituir por meio de uma relação dialética (espaço de completude) ou combativa (espaço de tensão).

Já a dimensão do simbólico diz respeito ao diálogo que Lacan faz com o estruturalismo de Ferdinand de Saussure realizando o casamento entre a psicanálise e a linguística, pois esta “pode servir-nos de guia neste ponto, já que é esse o papel que ela desempenha na vanguarda da antropologia contemporânea, e não poderíamos ficar-lhe indiferentes." (LACAN, 1998a, p. 286).

Fundamentalmente, o simbólico possui íntima relação com a regra básica estabelecida por Freud, quando propõe que todo analisando na psicanálise fale sobre seu cotidiano. Neste dialogo com Freud é que Lacan estabelece a dimensão do simbólico, que é a dimensão da palavra, do dizer, e possui relação fundamental com o fato de sermos seres humanos e seres falantes.

Não somente seres capazes de pronunciar sons ou palavras, mas seres que são afetados pela dimensão da palavra, afetados pelo discurso. Os seres humanos produzem sons, mas antes disso são seres falados, existindo outros seres anteriores que falam por nós ou sobre nós. E ainda existem os Outros dos outros que falam conosco. Antes de nascermos já somos falados, já existem outros seres falando sobre nós, por nós e para mim.

Simbólico é uma união de fragmentos em direção à unidade, ao uno, ou seja, de vários significantes, que não perfazem um sentido por si só, mas que produzem um simbolismo a partir da união destes fragmentos.

O simbólico não é a coisa-em-si, mas uma representação da coisa. A palavra representa a coisa, e tudo que é representado de forma discursiva, de forma linguística ou por meio de palavras está simbolizando a coisa-em-si.

Lacan afirmava que não há realidade pré-discursiva, pois o mundo do sujeito é discursivo, já que não é possível pensar sem palavras.

Enquanto Descartes afirmava o cogito, Lacan afirma que cogito e sou onde não cogito em nosso inconsciente. O indivíduo não poderia cogitar ou pensar se não houvesse a linguagem,