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5.2 Análise das categorias

5.2.3 Rede Social Familiar

Essa categoria foi apreendida a partir dos relatos das cuidadoras a respeito das fontes de apoio social para o cuidado das crianças com condição crônica e da ausência de tal apoio. Evidenciou-se que as cuidadoras se amparam nos pais das crianças, nos familiares, nos amigos e nas crenças religiosas como rede de apoio.

Foi perguntado às cuidadoras sobre as pessoas que as auxiliam no cuidado das crianças e como se dá esse auxílio. Elas relataram que dentre as pessoas que as apoiam no cuidado encontram-se os pais das crianças, fazendo-se presentes junto ao filho e à família, emocionalmente e financeiramente.

A análise dos dados permitiu identificar que atitudes como levar o filho e a cuidadora no local dos atendimentos; levar a criança ao acompanhamento, mesmo que raramente; levar e buscar o filho na escola foram consideradas importantes pela cuidadoras C9, C5, C2 e C16, como evidenciado nos relatos:

[...] geralmente os meus atendimentos tudo são mais cedo. Ele me deixa na porta do hospital e vai trabalhar. O meu marido é muito prestativo no dia a dia, ajuda bastante! (E9.13.3).

[...] às vezes o meu marido leva [nos acompanhamentos], é raro. Ele teve que ir no oftalmologista, ele levou. Geralmente as consultas que são fora de lá [Hospital Público de Ensino] algumas ele leva, mas a maioria sou eu mesmo [...] (E5.6). Ele estuda de 13:00 às 17:20, meu marido tem a facilidade do carro e a UMEI, ela é lá no bairro Z, ela é distante. De carro é fácil, de ônibus é complicado. Eu tô voltando a dirigir, [...] agora eu vou pegar carro, pra ficar por conta disso também, então esse vai ser mais um cuidado meu nesse momento [...] (E2.11.1).

[...] igual no dia que eu trabalho é o pai dela que leva e busca [na escola] (E16.15.2).

A presença do pai junto ao filho em casa, em atividades de lazer, também foi considerada pela cuidadora C12 como importante para o cuidado dos filhos:

[...] Geralmente ele [pai de M14] me busca na escola a noite e fica aqui. Às vezes vem a semana inteira. Final de semana eu quem vou [para casa do pai de M14], aí tem final de semana que ele vem e a gente sai junto, igual teve um dia que a gente foi no parque ecológico, aí ele foi junto. Então isso também ajuda muito, eu acho isso muito bacana da parte dele (E12.43).

Ao abordar o auxílio do pai de M16 a cuidadora C14 expressou sua compreensão em relação ao “medo” do marido para realizar algumas atividades com o filho e enaltece o que o ele faz, como ficar com o filho e com a família, passear em família e fornecer alimento a M16. Verificou-se durante as observações que a cuidadora considera fundamentais a presença e o apoio emocional do marido para cuidar do filho:

[...] É o meu esposo [que ajuda no cuidado de M16], só que ele não tem tanta coragem quanto eu. Ele melhorou bastante, [...] ele é muito sensível, ele melhorou muito, mas antes ele ficava só chorando. Ele não tem coragem de fazer um alongamento nos braços, nas pernas. Ele me ajuda, ele fica com ele, ele senta com ele, a gente passeia, a gente faz as coisas tudo certinho, mas pra cuidar assim em relação a fazer alguma coisa, não tá nele, ele não consegue, ele tem medo. Ele consegue dar comida [...] (E14.37).

Foram citadas pelas entrevistadas C12 e C14, como importantes fontes de apoio, atitudes dos pais como a demonstração de carinho e a presença. Barbosa et al. (2009), em estudo sobre o suporte social acessado por mães de crianças deficientes, também identificaram que as mães consideram o apoio do pai no cuidado da criança como uma atitude essencial. Os autores identificaram ainda que a participação e o envolvimento do pai no cuidado do filho deficiente fazem com que a mãe se sinta amparada e segura, auxiliando-a a equilibrar-se emocionalmente.

A análise das entrevistas (E12, E8 e E16) e observações (Ob12, Ob8, Ob16) permitiu captar que as cuidadoras também consideram como apoio para o cuidado o financiamento das

despesas da criança, tais como medicamentos (M14), roupas (M14) e pagamento da mensalidade da escola (M10). Esse apoio foi fornecido pelos pais das crianças que não residem com elas e também por avós:

A questão é a seguinte: quando ele [pai de M14] não tava trabalhando, não vou te falar que ele não dava a pensão dele não, a mãe dele que dava. Então a mãe dele transforma a pensão dele em ajuda; dá os remédios, roupas [...]. Foi especificado uma pensão sim, 162 reais, só que, na verdade, nem eles e nem nós nunca mexemos com isso, porque ela ajuda até mais que isso. Se a gente for olhar, ela dá uma ajuda maior que da pensão [...] (E12.45). Ele [pai de M14] comprou os remédios mais caros, aí agora os mais baratos a gente compra. (E12.46). A minha bisavó vai no centro e se ver alguma coisa assim, ela fica louca pra trazer, a outra avó é a mesma coisa (E12.42.2).

O pai dele [M10] paga só a mensalidade da escola dele, o resto é tudo comigo (E8.9).

Somente eu. O pai dá as coisas que precisa, mas é somente eu. É pra medico, é pra tudo, só eu que corro atrás das coisas da saúde, assim, dela (E16.7).

Destaca-se que, apesar de ser um direito garantido por lei, a cuidadora C13 citou a pensão alimentícia como um apoio oferecido pelo pai da criança: “Ele [pai de M15] dá pensão. 200 reais” (E13.17.3).

A pensão alimentícia é garantida e regulamentada pela Lei Nº 5.478, de 25 de julho de 1968, e objetiva assegurar a manutenção e sobrevivência dos “filhos menores de 18 anos ou inaptos para o trabalho, ou de ascendente inválido, ou valetudinário ou de um dos cônjuges” (BRASIL, 1968). Além disso, o artigo 21 dessa lei define que o não provimento da subsistência ou a ausência de pagamento da pensão alimentícia, sem justa causa, tem pena de um a quatro anos de detenção e multa, de uma a dez vezes o salário mínimo vigente no país (BRASIL, 1968).

As cuidadoras relataram que contam com a ajuda de familiares próximos para cuidar das crianças quando precisam se ausentar do domicílio e não podem levar consigo as crianças. C2 conta com o esposo, C3 com a irmã, C6 com a filha, C9 com a madrinha, C13 com os seus pais e C14 com a sogra, como pode ser verificado nos relatos:

Além de mim é o pai dele quando às vezes à noite eu saio, ainda aparece algumas clientes que me pedem pra fazer uma unha, um cabelo, eu deixo com o pai deles. E minha mãe e minhas irmãs são pessoas que tão comigo também, tanto que mora aqui do lado, tão me apoiando em todos os momentos (E2.6).

[...] é muito difícil até pra mim sair, mas eu tenho uma irmã que mora aqui embaixo. Apesar dela trabalhar, quando ela tá em casa e é muita urgência, não tem jeito, ela fica com ele pra mim. Eu quebrei meu pé, fiquei 15 dias internada, ela não tinha costume nenhum com ele, mas se virou e se saiu muito bem (E3.6).

[...] eu faço curso, igual hoje eu tenho, aí essa menina minha fica com ele, mas aí eu dou ele o remédio, o que ele tem que tomar. E aí ela dá janta pra ele pra mim e quando eu chego eu dou os outros remédios [...] (E6.7).

Quando eu preciso sair e não posso levar quem fica é a minha madrinha, mas ela é uma criança muito tranquila (E9.13.2).

[...] Mais quando eu preciso sair mesmo, aí eu a deixo com eles [pais de C13], mas sou mais eu mesma (E13.9).

[...] tem uma pessoa que, infelizmente agora na segunda-feira ela trincou a cabeça do fêmur, que me ajuda muito, é a minha sogra. Ela mora até aqui quase de frente da minha casa, [...] ela me ajuda muito mesmo. Então tá sendo muito difícil conciliar porque eu tô tendo que deixar o outro pequenininho na casa de outro enquanto eu tô com o M16, enquanto eu vou levar pra escola, enquanto eu vou levar pro hospital. Mas cuidar do M16 é só eu e ela; ela é só quando eu tenho fazer alguma compra, alguma coisa, alimentação pra fazer. Qualquer outro tipo de coisa no M16 sou só eu, não tem mais ninguém [...] (E14.38).

Duas cuidadoras (C11 e C8), que trabalham fora do domicílio, relataram que contam com seus pais para cuidarem das crianças:

A minha mãe [bisavó de M13] que fica com ela pra nós [avó e mãe de M13] trabalharmos. Aí minha mãe fica com ela na parte da manhã e leva ela à tarde pra escola [...] (E11.6.1).

O meu pai e minha mãe [participam do cuidado]. Porque eu trabalho o dia inteiro, agora que eu tô de férias (E8.3.1).

Ainda em relação ao apoio fornecido pela família, a cuidadora C15 citou a sogra como a pessoa que forneceu a casa onde mora com o esposo e as filhas. Além disso, a sogra foi mencionada na entrevista em vários momentos, revelando o apoio à cuidadora ao financiar exames diagnósticos durante o período gestacional e permanecer no hospital com as netas (M17 e M18) em momentos de internação: “Quem cuida mais é a minha sogra, minha sogra cuida mais que o pai [...]” (E15.31.1).

O cuidador C7 revelou que seus familiares lhe oferecem moradia e ajuda nas atividades de cuidado de M9:

Todo mundo aqui me ajuda, principalmente a minha prima. Agora que ela começou a trabalhar, porque antes ela me ajudava mais. Minha mãe agora, ela sempre me ajuda porque ela trabalha também, mas no que puder me ajudar, ela me ajuda. Meu pai é aposentado, ele me ajuda, meus irmãos. Então tem sempre alguém me ajudando e a avó materna dela também me ajuda se caso eu precisar, se eu não puder levar ela em algum lugar, eu posso pedir ela pra levar, mas até hoje não precisou, mas eu posso pedir. Porque a gente também teve uma desavença um ano atrás, então aí ela tem o direito de pegar a menina uma vez por semana, final de semana, que aí é mais é eu mesmo, mas aí pra dar banho, essas coisas, a minha mãe me ajuda, a minha prima (E7.8).

Outro apoio identificado foi a disponibilização de um local para morar, como no caso das cuidadoras C1, C3, C5, C6, e C15 e do cuidador C7, que residiam em casa cedida por um familiar, sem pagar aluguel.

Destaca-se que apoio recebido dos amigos foi citado por apenas duas cuidadoras (C13 e C10). A cuidadora C13 relatou que a professora da filha interviu junto ao esposo, que é policial militar, para facilitar o acesso à equoterapia. É importante mencionar que a criança não tem acesso a outros tipos de terapia que possam ter resultados similares ao dessa:

[...] ela faz equoterapia também, tem um mês que ela começou. Ela fica 40 minutos no cavalo [...] (E13.13.1).

[...] foi a professora dela [M15], o marido dela é militar, aí ela me perguntou se eu já tinha feito a inscrição lá, aí eu falei que tinha feito. Ele é militar, aí ele me ajudou, até que não demorou muito não, pra chamar ela (E13.13.2).

O apoio material foi identificado no discurso de duas cuidadoras que revelaram que ganharam cadeiras de rodas para seus filhos (M12 e M15). A cuidadora C10 recebeu a cadeira de uma amiga da família e a cuidadora C13 ganhou a cadeira de uma pessoa que ela não conhece, mas que é amiga de sua prima. A doação das cadeiras permitiu às cuidadoras deixarem uma cadeira em casa e uma na escola, o que, segundo elas, facilita o cuidado cotidiano:

[...] Essa cadeira aqui ela nem ganhou do Serviço Público de Reabilitação não, essa aqui ela ganhou de outra pessoa. Eu achei bom porque eu deixo a dela na escola, pra não ficar indo e voltando todos os dias. Na hora que a gente vem, os ônibus tão assim, olha, essa aqui ela ganhou de outra criança [...]. Eu não conheço, porque foi a minha prima que conseguiu, foi conhecida da minha prima, eu não conheço. Chegou na hora certa (E13.15).

C10 me conta que tem duas cadeiras de rodas: uma foi uma amiga da família que doou para M12 e a outra foi o Serviço Filantrópico de Reabilitação que cedeu. Uma fica dentro do domicílio e outra no carro, para facilitar para C10, uma vez que ela não precisa retirar a cadeira do carro, pode deixá-la e utilizá-la sempre que sair com M12 (Ob10.3.2).

Evidenciou-se que os familiares que residem com as cuidadoras, ou residem próximo, são as principais fontes de apoio. Estudo sobre crianças com necessidades especiais de saúde também identificou que a rede social destacada pelas cuidadoras é constituída pela rede familiar próxima (NEVES; CABRAL; SILVEIRA, 2013).

A análise dos dados permite inferir que as contribuições financeiras e materiais auxiliam as cuidadoras a proverem as necessidades essenciais das crianças e da família. A família, com ênfase no marido e nos próprios pais, destaca-se como a principal fonte de apoio

material e financeiro. Polita e Tacla (2014) destacam que esse tipo de apoio é essencial para não sobrecarregar financeiramente o cuidador.

A análise das entrevistas permitiu verificar que nem sempre as cuidadoras contam com apoio para o cuidado por parte das mães das crianças, de familiares ou de outras pessoas. As cuidadoras se referiram a situações em que precisaram de apoio e não obtiveram, como C14 que relatou a ausência de amigos para ajudá-la em momentos difíceis:

[...] Teve momentos difíceis que eu olhei pro lado e olhei pro outro e eu não vi amigos pra me ajudar, eu não vi pessoas, tinham mais pra criticar. Às vezes eu passava com o M16, tinham olhares diferentes [...] (E14.30).

A cuidadora C15 revelou a necessidade de deixar uma das gemelares em casa sozinha enquanto leva a outra na escola, pois, segundo ela, familiares e vizinhos não se prontificam a ajudá-la:

[...] quando acontece uma desgraça aí vem “Oh, por que que você num me chamou? Eu tava em casa!”. Precisa da gente pedir ajuda sabendo que eu tô sozinha? Que eu não dou conta sozinha? (E15.53).

Ela [M17] fica sozinha aqui em casa enquanto levo e busco M18 na escola (E15.30).

Segundo C3 há dificuldades em encontrar alguém que fique com seu filho mais novo para que ela leve M4 para acompanhamentos. A cuidadora relatou ainda que sua irmã, quando fica com M4, cobra pelo serviço prestado e que a renda advinda do BPC não é suficiente para arcar com esse gasto: “C3 relatou que a irmã dela, quando cuida de M4 ou do irmão de M4, cobra 50 reais, o que dificulta para ela, já que não tem condições de pagar [...]” (Ob3.10.2).

Dentre as formas de apoio obtido pelas cuidadoras C3, C6, C11 e C14 encontrou-se, também, o apoio das crenças religiosas. Verificou-se que as cuidadoras buscam explicar os acontecimentos vivenciados junto às crianças pela religiosidade.

Bjarnason (2007) em estudo sobre o conceito de religiosidade afirma que há consistência considerável relacionada a uma definição de religiosidade que inclui a filiação religiosa, atividade religiosa e crença religiosa. A filiação religiosa estaria relacionada às instituições como as católicas, evangélicas, dentre outras; as atividades religiosas estariam relacionadas às preces e às atividades na igreja; e as crenças religiosas têm relação com uma força superior, com uma divindade.

A análise das entrevistas e das observações com a família de C14 possibilitou verificar que a crença religiosa e a filiação religiosa evangélica são um importante alicerce para o

enfrentamento das adversidades da condição crônica do filho. O relato da cuidadora C14 é permeado por afirmativas sobre a possibilidade de intervenção divina para que o filho não viesse a óbito, além de permiti-la cuidar da criança eficientemente. Isso fica claro quando C14 fala sobre os diálogos que teve com Deus:

[...] Quando ele nasceu eu não cruzei os braços e falei “Não Deus, leva o meu filho não”. Claro que tinham momentos difíceis que pra não ver o M16 sofrendo ou ele chorando, eu falava “Deus, se ele ficar melhor com o senhor no céu, o senhor pode levar, mas se o senhor cuidou e o senhor tá trazendo pra eu cuidar dele, eu sei que eu tenho capacidade, porque o senhor não ia me entregar ele em minhas mãos pra eu cuidar dele mais ou menos, então 100% o senhor me dá certeza” [...] (E14.29).

C14 relatou ainda as dificuldades vivenciadas durante o período entre o nascimento de M16 e a cirurgia para correção da hidrocefalia. Foi revelado no discurso de C14 atribuição a Deus pela possibilidade de M16 não utilizar DVP e não apresentar crescimento anormal do perímetro cefálico:

[...] pra muitos vê o M16 assim “Nossa, mas que Deus que tá ali que eu não vejo nada”. É porque ele não sabe de nada, porque o que eu já passei mais o meu marido pra tá aqui, só Deus sabe. Eu respiro fundo assim porque eu sei quantas noites sem dormir, quantas crises que não passavam, quantas lágrimas que a gente já chorou, quantas noites que ele chorava de dor, quantas vezes que ele chorava porque a cabeça doía muito. A cabeça tava crescendo, por isso teve que fazer cirurgia. Graças a Deus ele não tem válvula, graças a Deus tá mantendo, cada vez que a gente vai no médico o médico fala “Parabéns, M16”, porque quando vai colocar a fita métrica [na cabeça] tá tudo normal, não tá crescendo anormal dos parâmetros pra uma criança [...] (E14.21).

Além disso, a cuidadora C14 atribui a melhora do quadro clínico e as progressões do filho à Deus:

[...] cada coisinha que acontece com o M16 pra mim, quando a fonoaudióloga dá um elogio “Puxa M16, você tá começando a movimentar mais a boquinha, a linguinha”, cada vez que a fisioterapeuta fala assim “Olha M16, parabéns, você tá esticando mais as pernas, esticando mais os braços”, cada vez que o M16 olha pro tablet que ele tá lá estimulando a visão, que ele tá seguindo, mesmo que algumas vezes ele perde a fixação, mas cada vez que o M16 faz alguma coisa, por dentro de mim eu vibro, eu falo “Deus, o senhor é demais, o senhor é lindo” (E14.22).

A cuidadora C14 disse que a criança M16 foi enviada por Deus à família e que a sua vida é um milagre, uma vez que a perspectiva de vida dada pelos médicos era de dois meses a dois anos de vida e a criança estava com seis anos, contrariando o prognóstico informado pelos médicos. A cuidadora demonstrou que acredita que o filho tem a capacidade de trazer força para ela e para o pai:

[...] o M16 não foi planejado pela gente, mas foi por Deus, porque eu sei que Deus trouxe ele pra mim, então quando Deus me trouxe essa bênção, porque o M16 é um milagre na minha vida, ele é uma bênção de Deus por tudo que aconteceu. Porque uma criança nascer com quase sete meses de vida, ter hidrocefalia, por causa da hidrocefalia ter paralisia cerebral, os médicos falaram pra mim e pro meu esposo que daria de dois meses a dois anos de vida pra ele. Hoje o M16 tá com seis anos, então é muita, eu não tenho nem palavras pra falar da força que ele tem e da força que ele passa pra mim e pro meu marido, ele pra mim é um grande milagre [...] (E14.15).

Ao relatar os progressos no quadro clínico do neto a cuidadora C6 demonstrou esperança que a criança apresente outras melhorias por meio da crença religiosa:

[...] foi segunda-feira ele tava deitado aqui na cama [...] ele fazendo tipo engatinhar com o joelho, dobrando o joelho pra engatinhar, aí eu olhei e falei assim “Ele vai fazer isso e muito mais, que ele vai andar, eu quero ver meu neto andando na fé de Deus, Nossa Senhora. Com fé a gente consegue tudo” [...] (E6.14).

As cuidadoras C3 e C14 demonstraram em seus relatos que se sentem fortalecidas pela presença de uma divindade:

[...] a gente respeita o trabalho da medicina, mas a gente sabe que tem outro lado muito importante que é aquele cuidado da gente falar “Puxa, eu tenho fé”. Às vezes muita gente não vai entender, vai fixar assim “Puxa, até onde vai o pensamento positivo, até onde vai a esperança dessa mãe?”. Eu vou falar que vai até onde Deus puder me dar, enquanto eu tiver vida e saúde porque foi através dessa minha fé, dessa minha esperança que hoje eu posso falar que o M16 tá aqui comigo. Porque o neurocirurgião do Hospital Público de Ensino, quando eu fui entrar pra sala de cirurgia, ele falou pra mim “Mãezinha, a gente não sabe como ele vai sair, só que eu quero te dizer uma coisa, o seu filho tá vivo por sua causa”. Então desde o dia que eu ouvi isso, o meu filho tinha quatro meses de vida, isso me deu muita força, porque ele falou pra mim que o meu filho tava vivo por causa de mim, aí eu guardei aquilo pra mim. Só que quando eu cheguei em casa que ele era um bebê, eu cheguei em casa e falei “Não Deus, eu devo tudo isso ao senhor, porque foi o senhor que me deu essa força” [...] (E14.20).

A análise das entrevistas permite inferir que as cuidadoras (C3, C14, C15) utilizam a palavra força para expressar que o cuidado não é fácil e exige algo subjetivo, que é possível de ser realizado por meio do apoio advindo da crença religiosa: “Deus que me apoia muito e me fortalece cada dia da minha vida” (E3.20).

Neves, Cabral e Silveira (2013), Nóbrega et al. (2010), Barbosa et al. (2009) e Polita e Tacla (2014) também identificaram em seus estudos que a religiosidade tem um significado importante para o fortalecimento da família, ajudando-a a compreender e a enfrentar as situações advindas da condição de saúde do filho. Dessa forma, o apoio das crenças religiosas pode ser considerado um importante recurso utilizado pelas famílias para cuidarem de suas crianças.

Além da carência de apoio social, foram encontradas neste estudo três crianças (M8, M9 e M13) pelas quais, no momento da coleta de dados, a mãe não era a responsável. As cuidadoras revelaram o momento em que as crianças passaram a ficar sob sua responsabilidade e as dificuldades advindas da ausência da genitora.