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3. INCENTIVOS FISCAIS

3.3. Incentivos fiscais e algumas formas de manifestação

3.3.4. Redução de base de cálculo

O incentivo fiscal também poderá ser efetivado por meio da figura da redução da base de cálculo. Por meio do referido instrumento, o ente tributante autoriza que, em certas situações, o contribuinte calcule o tributo sobre um valor inferior àquele que, em tese, seria o devido.

Neste contexto, o tratamento benéfico é conferido por força da modificação de um dos elementos quantitativos da hipótese de incidência, que irá diminuir o quantum devido a título do tributo.

Tendo em vista que tanto a redução da base de cálculo quanto a isenção implicam a desoneração quanto ao recolhimento do tributo, a redução da base de cálculo pode ser concebida como hipótese de isenção parcial.

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MARTINS, Ives Gandra da Silva; PAVAN, Claudia Fonseca Morato. ICMS. Substituição tributária. Transferência de créditos autorizada por portaria. Inconstitucionalidade. Nulidade ex tunc. consequências.

Sob o aspecto jurídico, a concepção de que a isenção constitui uma regra de exceção ao fato gerador, obstando a constituição da obrigação tributária em si, e que a redução da base de cálculo somente produz efeitos em relação a um dos aspectos quantitativos da hipótese de incidência (situado na consequência da norma), faz com que muitas vozes afastem essa classificação, consoante já descrito acima217.

Voltando-se para a Carta Política de 1988, verifica-se que, em seu art. 150, § 6.º, o constituinte, ao dispor que o subsídio, isenção, redução de base de cálculo, anistia e remissão devem ser instituídos por lei específica, designou de forma diferenciada cada um dos referidos institutos. Com lastro em tal preceito, a categorização da redução de base de cálculo como modalidade de isenção parcial vem sendo contestada. Vittorio Cassone218 assevera que promover equiparações nesse sentido seria hipótese de interpretação absurda:

Uma hipótese que podemos considerar como interpretação absurda dá-se quando se pretende atribuir os mesmos efeitos jurídico-tributários a dois ou mais institutos relacionados no art. 150, § 6.º, da CF, quais sejam: subsídio, isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia, remissão. Isto porque, se a CF nomeou-os um a um, é óbvio que cada um tem seus traços distintivos próprios e fundamentos constitucionais e infraconstitucionais diferentes.

A possibilidade de equiparação da redução da base de cálculo à isenção parcial, longe de afigurar-se mero preciosismo acadêmico, é imprescindível para o adequado manejo do instituto em questão, haja vista que a Constituição Federal de 1988, ao versar sobre o ICMS, houve por bem afastar o creditamento integral do imposto que haja incidido na operação anterior, quando as operações subsequentes forem objeto da isenção e da não incidência, para as quais expressamente previu o estorno de créditos.

Deveras, a Carta Política autorizou o creditamento irrestrito por parte dos contribuintes quanto ao ICMS cobrado em operações ou prestações anteriores pelo mesmo ou por outro Estado da Federação, em prestígio ao primado da não cumulatividade. Todavia, ressalvou o direito ao creditamento do imposto quando as operações ou prestações anteriores forem isentas ou não tributadas. É o que se depreende do inciso II do § 2.º do art. 155 da Carta Magna:

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No dizer de Sacha Calmon, “as reduções de base de cálculo e de alíquota não são isenções, nem mesmo parciais. São reduções do quantum debeatur e, portanto, pressupõem a ocorrência do fato gerador da obrigação. Atuam na consequência da norma de tributação. A diversidade é material” (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Op. cit., p. 876).

218

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

[...]

II – operações relativas à circulação de mercadorias §2.º. O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

I – será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal.

II − a isenção ou não incidência, salvo determinação em contrário da legislação:

a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes;

b) acarretará anulação do crédito relativo às operações anteriores;

Considerando que, no caso do ICMS, as duas exceções à aplicação do princípio da não cumulatividade estão preconizadas no texto acima reproduzido e se reportam a hipótese de isenção e de não incidência, o cerceamento do creditamento integral do imposto que houver incidido na operação anterior, quando as operações subsequentes são objeto de redução de base de cálculo, é considerado inconstitucional para aqueles que descartam a sua equiparação a uma isenção parcial.

Noutros termos, o entendimento de que a redução da base de cálculo é figura desonerativa distinta da isenção (parcial) afasta a necessidade de o contribuinte estornar proporcionalmente o crédito de ICMS nos casos em que a operação é beneficiada pela redução de sua base de cálculo.

Por um período, ficou assentado no Supremo Tribunal Federal o entendimento no sentido de que as limitações legais ao direito ao creditamento do ICMS somente poderiam ser efetivadas em se tratando de hipótese de isenção e de não incidência, razão pela qual era lícito ao contribuinte aproveitar integralmente os créditos correspondentes às operações anteriores.

Ao interpretar a questão da classificação da redução da base de cálculo como hipótese de isenção parcial, o ministro Marco Aurélio assim se posicionou219:

219

STF, Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n.º 21.514, Segunda Turma do STF, Rel. Min. Marco

Aurélio, j. 27.04.1993. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RMS%24%2ESCLA%2E+E+

21514%2ENUME%2E%29+OU+%28RMS%2EACMS%2E+ADJ2+21514%2EACMS%2E%29&base=ba seAcordaos>. Acesso em: 6 jul. 2012.

Sempre tenho presente a premissa de que o Direito é ciência e, como tal, possui institutos, expressões e vocábulos com sentido próprio, havendo de se presumir que o legislador, especialmente o constituinte, haja atuado com técnica, atentando para o fato de que o esmero da linguagem é essencial à revelação do sentido correto da disposição normativa.

Em suma, de acordo com as regras hermenêuticas sedimentadas no Direito brasileiro, o conceito de isenção não pode ser elastecido de modo a abarcar hipóteses de redução de base de cálculo.

Conclusivamente, entendemos, pelas razões acima expostas, que a redução da base de cálculo em nada se confunde com a isenção, não constituindo uma hipótese de isenção parcial.

Todavia, a evolução da jurisprudência revela que a Corte Constitucional brasileira, a partir do julgamento do Recurso Extraordinário n.º 174.478220, em 2005, modificou o seu entendimento precedente, de modo a defender a constitucionalidade da restrição ao direito de creditamento do ICMS, em se tratando de hipótese de redução de base de cálculo.

Por meio de análise realizada com base na substância dos institutos, o referido julgado do STF equiparou a redução da base de cálculo a uma isenção parcial, pelo que a anulação do crédito do imposto estaria contemplada no quanto preceituado pelo inciso II do parágrafo 2.º do artigo 155 da Lei Maior.

Vale notar, no entanto, que poderá o ente tributante, ao estabelecer hipótese de redução de base de cálculo, no bojo de norma instituidora de incentivo fiscal que visa a incentivar determinado bem ou serviço, prever expressamente o direito à manutenção do crédito, afastando, assim, questionamentos a esse respeito. Contudo, tal previsão seria, sob o ponto de vista teleológico, desnecessária, haja vista que somente se terá efetivo estímulo fiscal se o creditamento for permitido, sendo o estorno responsável por esvaziar todo o seu conteúdo.