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Reflexões sobre as questões presentes e ausentes na implantação das unidades estudadas

Pequeno I I Médio Grande Metrópole

CRAS COMO NOVA REFERÊNCIA NA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL

3.1 Reflexões sobre as questões presentes e ausentes na implantação das unidades estudadas

Quanto ao porte, na maioria dos estudos prevalecem municípios de pequeno porte I, com seis casos e grande porte, com seis casos. Dois estudos foram realizados com municípios de pequeno porte II. Há um estudo de município de médio porte e um estudo que contemplam todos os portes de município, exceto metrópole. Interessante ressaltar que, dentre os dez estudos, nenhum aborda metrópole, ou seja, ainda na produção científica, não há especificamente estudo sobre a implantação de CRAS nas metrópoles.

Nos casos estudados, os municípios de grande porte estão localizados em cinco Estados brasileiros: São Paulo, Paraná, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí. Os municípios de pequeno porte I objetos de pesquisa encontram-se em Minas Gerais e a maioria no Paraná. Os municípios de grande porte podem revelar dados interessantes, uma vez que estão localizados em três das grandes regiões brasileiras.

O porte do município influencia diretamente a forma de organização e estruturação do sistema, uma vez que pode facilitar e/ou dificultar o processo, considerando a múltipla realidade dos municípios em relação à estrutura administrativa e de gestão pública. Essa é uma questão que ainda demanda diretrizes, quando da exigência do MDS na operacionalização das ações e organização da unidade.

Em relação aos interlocutores, os trabalhos abordam de forma múltipla:

- 6, o órgão gestor e/ou seus representantes; - 4, as famílias e usuários dos CRAS;

- 2, os técnicos e representantes estaduais;

- 1, a Gerência Executiva de Desenvolvimento Social; - 1, os coordenadores da Proteção Social Básica; - 2, os coordenadores de CRAS;

- 2, os conselheiros municipais de Assistência Social; - 1, o prefeito municipal;

- 1, líderes comunitários; - 1, dirigentes de entidades;

- 1, representante do Fórum Ampliado da Assistência Social.

Os interlocutores participantes dessas pesquisas concentram-se, principalmente, como técnicos/profissionais dos CRAS e representantes do órgão gestor. Apenas quatro trabalhos abordam diretamente as famílias atendidas pelos CRAS. Somente dois estudos tiveram a participação de conselheiros da Assistência Social e, especificamente, um estudo apresenta abordagem com o prefeito. Outro aspecto interessante e com baixa presença é a abordagem de líderes comunitários e dirigentes de entidades, que se apresenta apenas em um estudo.

Realmente, para se avaliar o processo de implantação dos CRAS, seu entendimento pelos atores e o impacto no município, as melhores fontes de informações são os técnicos e gestores. Ainda que muitos gestores tenham dificuldades e limitações, principalmente devido ao seu perfil e comprometimento com a política, estes exercem papeis estratégico e político na condução do processo no município.

Porém, há que se reforçar que o público-alvo, os conselheiros da Assistência Social, os representantes de entidades e lideranças comunitárias exercem papel fundamental nesse importante momento e que sua participação em todo e qualquer estudo, pesquisa, publicação deve ser valorizado e priorizado.

Baixa participação para implantação dos CRAS

Nos municípios, prevalece a visão dos atores públicos, mas, e a visão dos atores da sociedade civil, em relação a esse importante processo de inovação e mudanças complexas na área da Assistência Social?

No tocante à organização da implantação dos CRAS, a realidade é heterogênea. Há municípios que não adotaram procedimentos de planejamento e organização, e há municípios com diversidade de procedimentos, enquanto passos para a constituição dos CRAS. Entretanto, esse aspecto e ponto analítico desta pesquisa aparecem com pouca frequência no trabalho anterior à implantação da unidade.

Entre os procedimentos, destaca-se a utilização dos dados do CadÚnico, IBGE, Seads, Seade, Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS) – Mapa de Vulnerabilidade Social; conhecimento dos territórios, com algumas pesquisas municipais sobre informações dos territórios; estudo da documentação - MDS, PNAS, guias de orientação técnica; informações e dados do BPC e do PBF.

Alguns outros procedimentos são citados de forma bastante esporádica: visitas à comunidade e domiciliares; utilização de dados e cadastros municipais; diagnóstico social elaborado pela Drads; Plano Municipal de Assistência Social, Plano Plurianual e Plano Decenal; processo seletivo para composição das equipes dos CRAS; busca de outras experiências; convencimento do Executivo da importância da política; rede descentralizada prévia que foi aprimorada; entendimento da Assistência Social como um sistema; discussões no CMAS; capacitação dos recursos humanos.

Ausência de preparo para implantação dos CRAS

Nesta questão, alguns itens citados pelos profissionais e gestores chamam a atenção:

 não possuem diagnóstico socioterritorial,

 não receberam treinamento para trabalhar no CRAS.

Estes itens denotam falta de planejamento e instrumentos importantes para um processo de implantação efetivo e programado. Os procedimentos citados, de forma geral, expressam falta de padronização, inclusive por porte de município, pois grande parte deles fica sem direcionamento das ações que devem tomar para a implantação da unidade.

Há implícita falta de preparo e apoio para o processo de implantação dos CRAS, onde os municípios apressaram-se para adiantar as mudanças necessárias para a gestão do SUAS no nível municipal, porém, sentem, após a implantação e efetivo funcionamento do CRAS, inúmeras dificuldades e limites, que poderiam ter sido sanados e/ou minimizados se houvesse um momento de estudo, diagnóstico e planejamento estratégico, por parte da administração municipal, do órgão gestor e da equipe técnica.

Quadro de pessoal

No item dos recursos humanos, surgem na maioria dos municípios estudados quadros mínimos de profissionais (1 assistente social, 1 psicóloga, 1 auxiliar administrativo e 1 auxiliar de serviços gerais). A coordenação do CRAS, exercida em sobreposição ao papel técnico, é uma constante, ou, então, a ausência de coordenação na unidade. Alguns poucos municípios citam a presença de estagiários de Serviço Social em seus quadros.

A utilização de recursos humanos já existentes também é mencionada em alguns casos. Grande parte apresenta recursos insuficientes e falta de equipe efetiva, sem estruturas mínimas para desenvolvimento do trabalho proposto pelos CRAS.

Na tese que aborda especificamente os profissionais do Serviço Social, surgem questões interessantes como: maior parte dos trabalhadores efetivos, somente com graduação, percentual significativo com especialização, não há Plano de Cargos e Salários, profissionais parcialmente satisfeitos, há identidade com o trabalho, possuem equipes fixas. Ou seja, há heterogeneidade em todos os portes de município, pois as

equipes, na maioria das vezes, são compostas sem um processo de planejamento e, principalmente, sem nenhum tipo de capacitação específica sobre a nova política, o Suas e o CRAS.

Um item que nos chama a atenção é que, mesmo diante de um quadro instável, precário e deficiente, há alguns profissionais nos estudos que se posicionam como parcialmente satisfeitos e que possuem identidade com o trabalho desenvolvido nos CRAS. Ou seja, mesmo diante de condições adversas e ideais, esses profissionais demonstram comprometimento com a política, com a população atendida e com a proposta dos CRAS. Esses profissionais valorizam o novo momento da Assistência Social e trabalham acreditando que a nova proposta é viável, apesar de tantas falhas e aspectos a serem conquistados e garantidos.

Serviços ofertados

Entre os serviços e atividades oferecidos pelos CRAS, apresentam-se de forma mais presente:

1- recepção e acolhida; 2- plantão social;

3- ações:

a) acompanhamento individual e familiar;

b) ações socioeducativas com famílias, crianças e idosos; c) visitas domiciliares;

d) encaminhamento para serviços e rede socioassistencial; e) inserção de demandatários no CadÚnico;

f) orientação e acompanhamento dos benefícios eventuais e BPC;

g) acompanhamento dos beneficiários do ProJovem, Agente Jovem e PETI;

h) desenvolvimento de programas de geração de renda e ações de inserção produtiva; 4- campanhas e palestras educativas.

Descontinuidade

Ações consideradas prioritárias no funcionamento dos CRAS estão sendo ofertadas de forma esporádica, segundo a análise das produções, tais como: trabalho com grupos de famílias, orientação e concessão de benefícios eventuais, trabalho com grupos de convivência, acompanhamento das famílias beneficiárias do PBF, desenvolvimento do PAIF, articulação e fortalecimento de grupos sociais locais, atendimento de demandas psicossociais das famílias, busca ativa, inserção em programas sociais e de transferência de renda, produção e divulgação de informações sobre serviços e direitos sociais.

Ausência de unidade

Em relação aos serviços ofertados e atividades desenvolvidas, há grande e variada gama, que necessitaria de maior padronização, de acordo com necessidades e demandas apresentadas.

Atualmente, esse aspecto está sendo modificado diante da Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais que define os serviços, objetivos, trabalho essencial ao serviço, de acordo com os níveis de complexidade do SUAS. Todavia, os municípios ainda apresentam dificuldades em adaptar e estruturar as ações em serviços, prevalecendo a velha lógica dos programas/projetos e a divisão por segmentos etários.

Relação CRAS e CREAS

Outra característica apontada nos municípios de pequeno porte é que o CRAS assume muitas vezes o atendimento e acompanhamento dos casos da Proteção Social Especial, pois como não há CREAS, essa demanda avoluma-se para a equipe da unidade. A questão é delicada e necessita de diretrizes e estudos, pois muitas vezes esse CRAS deixa de executar suas funções essenciais e da Proteção Social Básica, em virtude da demanda por Proteção Social Especial.

Entretanto, essa é uma realidade comum nos municípios de pequeno porte e que necessita de investimentos e estrutura para sua operacionalização, principalmente no que diz respeito aos recursos humanos disponíveis e qualificados.

Método de trabalho nos CRAS

No que diz respeito à metodologia de trabalho, metade das pesquisas analisadas não cita de forma específica como vem sendo estruturada essa questão nos CRAS. A metodologia do trabalho não é objeto de investigação e não possui um formato definido na maior parte desses municípios.

A maioria dos CRAS trabalha por programas e observa-se ausência de metodologia sistematizada. Dois municípios alegam que não tem priorizado e desenvolvido o trabalho socioeducativo com famílias.

Trabalho com famílias

Alguns municípios citam que consideram e reconhecem a diversidade dos arranjos familiares, o respeito às diferenças, a definição dos instrumentos técnicos de acordo com as demandas grupais e individuais. Dois municípios apresentam que há investimento na capacitação dos recursos humanos para a construção e desenvolvimento da metodologia do trabalho com famílias e grupos na lógica do empoderamento das famílias e da integração da equipe. Ainda surge o aspecto de que a leitura da realidade é priorizada.

O princípio da matricialidade sociofamiliar no método e na condução do trabalho dos CRAS ainda não foi incorporado, como previsto, uma vez que grande parte dos municípios trabalha por programas, projetos e benefícios e não privilegia a ótica familiar na definição de ações a serem desenvolvidas com determinado grupo.

A questão do método, até o momento, constitui-se em um aspecto que necessita de investimentos e definições mais palpáveis às equipes, pois grande parte dos

profissionais de CRAS tem apresentado limitações nessa questão. O método envolve teoria e nesse tocante há uma lacuna na formação dos recursos humanos. As capacitações realizadas pelo MDS e algumas secretarias estaduais necessitam priorizar e criar alternativas para suprir e minimizar essa dimensão.

Estrutura física

Quanto à estrutura física, as avaliações mostram-se mais uma vez heterogêneas, pois há um número significativo de CRAS com estrutura mínima (recepção, salas de atendimento, cozinha, banheiros, salão, com acessibilidade) em prédios próprios ou alugados. Outros implantados com inúmeras dificuldades devido à precariedade e utilização de prédios disponíveis, além de contar com a falta de infraestrutura mínima em relação a materiais de consumo e manutenção das instalações.

Relatos apresentam situações muito contraditórias, como poucos CRAS que possuem até piscina e quadra poliesportiva e outros que utilizam em rodízio as salas de atendimento. Em pequenos municípios, há vários CRAS que funcionam junto com o órgão gestor. Somente em um caso está instalado em imóvel próprio construído especificamente para o funcionamento e as necessidades do CRAS, que possui estrutura diferenciada dos demais. Um estudo afirma que o CRAS possui um carro à disposição e infraestrutura necessária. Dois estudos não tratam especificamente desse item.

Nesse aspecto, um ponto importante é que, além do espaço físico, para o devido funcionamento da unidade, há necessidade de infraestrutura, como recursos materiais e pedagógicos, que subsidiem o trabalho e apoiem os profissionais. Essa questão também permeia o cotidiano das equipes dos CRAS, que, na maior parte dos municípios, é insuficiente.

O espaço físico do CRAS é condição imanente para sua devida implantação e funcionamento, e, na maioria dos municípios, é definido de acordo com a disponibilidade e possibilidade de adaptação. Essa dimensão, até o momento, não é priorizada da forma

como deveria e certamente impacta no resultado das ações, de forma positiva ou negativa. Um ponto que chama a atenção é que a quase totalidade dos CRAS estudados não possui espaços apropriados para o trabalho com grupos e famílias, que dependem de locais cedidos para realizar um das ações mais importantes do trabalho do CRAS.

Territorialização

Em relação ao princípio da territorialidade, a metade dos estudos analisados cita que os CRAS foram instalados em áreas de maior vulnerabilidade do município – regiões de alta vulnerabilidade e média vulnerabilidade com focos de alta vulnerabilidade.

Há os casos dos municípios de pequeno porte, que instalaram seus CRAS no centro da cidade pelo porte do município e há um caso de município de pequeno porte que instalou o CRAS distante 8 km do centro da cidade, em área com características rurais e próximo a um loteamento popular. Um estudo em município de grande porte afirma que dos cinco CRAS, somente um foi instalado em área de vulnerabilidade. Duas pesquisas não citam de forma específica esse aspecto.

Observa-se que há realidades distintas para a operacionalização desse princípio, pois nos municípios de pequeno porte e de grande porte a territorialização apresenta diferentes características e demandas. Porém, a necessidade de aproveitamento de prédios já existentes para instalação dos CRAS, muitas vezes, compromete essa prioridade e privilegia as condições prévias.

A territorialidade na implantação dos CRAS é uma diretriz fundamental, que garante o alcance de seus objetivos e que faz parte de sua concepção metodológica e operacional. O estudo dos territórios e a definição de prioridades para implantação dos CRAS pouco ocorre e deveria fazer parte do processo de planejamento e diagnóstico territorial.

Nesse sentido, observa-se que as equipes e gestores possuem diversos obstáculos para priorizar e se dedicar a esse aspecto, que vão desde a falta de tempo

pela sobreposição de funções, sobrecarga de trabalho, até a falta de preparo técnico para estudos e pesquisas na área.

Financiamento

No financiamento, três estudos não citam esse item especificamente. Alguns afirmam que o cofinanciamento estadual é incipiente; os recursos para os CRAS são quase que exclusivamente da esfera municipal; há a dependência de recursos federais para operacionalização da política; para a estruturação do CRAS foram utilizados os recursos já disponíveis.

Um município afirma que o orçamento da Assistência Social para pequeno porte II é de 3,55% e outro que, no município de grande porte, esse orçamento chega a 10%, desde 2004. Um município de grande porte apresenta a situação de depender de doações da comunidade e associações para desenvolvimento do trabalho.

Somente um município cita que a fonte de financiamento do CRAS é composta por recursos municipais, estaduais e federal, através do piso básico fixo, piso básico de transição e IGD.

Dos dez estudos realizados, somente um caso apresenta exemplo de que o cofinanciamento realmente ocorre da forma planejada e em consonância com a PNAS. Essa é uma questão recorrente nos municípios que afirmam, muitas vezes, ficarem sobrecarregados com o ônus de todo processo e que a esfera estadual pouco contribui para o seu desenvolvimento e efetivação.

Esse item é polêmico e há uma diversidade de realidades, de acordo com o porte do município e a trajetória da área da Assistência Social na localidade. Na maioria dos casos, há dificuldades com o financiamento estadual e com o federal, sobrecarregando o município em suas responsabilidades e custos operacionais para execução da política.

É necessário que a Assistência Social alcance o patamar mínimo do orçamento para sua implementação e manutenção, que é uma questão de estruturação enquanto

política pública e requer esforços estruturais na administração pública, mas que pode e devem ser reforçados pela mobilização da população, categorias profissionais envolvidas, gestores e administradores.

Diversidade

Relacionando todos os pontos analíticos das teses e dissertações levantados e descritos no capítulo II, pode-se observar que há uma realidade muita diversa de implantação dos CRAS, onde, de acordo com o porte do município e as condições operacionais (recursos humanos, materiais e financeiros), o processo se dá de diferenciadas formas e, consequentemente, reflete-se na oferta dos serviços, ações e atividades ofertadas.

Atualmente, há uma série de documentos e guias publicados pelo MDS, que orienta essa implantação, em um país continental, que convive com realidades desiguais de norte a sul, dificilmente se obterá a hegemonia na estruturação de uma unidade de serviços, que de forma preponderante atende famílias em situação de vulnerabilidade social com múltiplas demandas e necessidades.

Interferências políticas

Um ponto comum e sujeito a afirmações é que as administrações públicas municipais convivem com interferências políticas e de acordo com as afinidades aderem, ou não, às diretrizes federais e estaduais, ou seja, ainda há esse aspecto para realmente avaliar o processo de implantação dos CRAS, que são influenciados pelas questões político-partidárias das esferas estadual e federal.

A trajetória histórica e os avanços na concepção da Assistência Social enquanto política pública também causa reflexos na gestão da Assistência Social nos municípios e no processo de implantação dos CRAS. De acordo com as condições e posicionamento da administração em relação a essa política, a prioridade e o modo de operacionalização

da unidade se apresenta de formas diferenciadas. E também, dependendo do perfil das equipes técnicas, concepções e experiências profissionais, os CRAS assumem características peculiares e distintas.

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