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Relações bilaterais com a Indonésia

CAPÍTULO IV. TIMOR-LESTE E A GEOPOLÍTICA REGIONAL

4.3. Relações bilaterais com a Indonésia

“As relações com a Indonésia serão centrais para os interesses de segurança de Timor-Leste, e os desenvolvimentos políticos indonésios exercerão uma forte influência sobre o teor dos laços bilaterais. Após os acontecimentos de agosto-setembro de 1999, a Assembleia Popular Consultiva de Jacarta reconheceu a separação de Timor-Leste e revogou a sua decisão, de 1978, de integrar o território como a vigésima sétima província indonésia”190.

Desde que Timor-Leste restaurou a sua independência, em 2002, uma das prioridades da sua política

externa tem sido esquecer o passado e pensar em desenvolver uma relação mais próxima com a Indonésia, porque em termos económicos e na questão da defesa é provável que possa haver uma inquietação, sobretudo nos primeiros anos de independência, pois Timor-Leste tem fronteiras terrestres, marítimas e aéreas com o país vizinho.

O desenvolvimento das relações bilaterais com a Indonésia é um assunto de grande ponderação, tendo em vista um futuro baseado na confiança e no respeito mútuos, como se espera de países vizinhos, e, ao mesmo tempo, a resolução de um conjunto de assuntos pendentes (fixados no Joint Communiqué entre a Indonésia e a UNTAET, assinado a 29 de Fevereiro de 2000)191, para suavizar um passivo que a memória

coletiva dos timorenses registou. Após a independência foi dado um primeiro passo positivo com a criação de uma Comissão Conjunta de Cooperação Bilateral (2 de Julho de 2002), para continuar a discutir os assuntos residuais (regresso dos refugiados, demarcação das fronteiras terrestre e marítima e resolução da reclamação de bens) e para facilitar as consultas e a cooperação entre os dois países em todas as áreas.

Além do mais, a região onde os dois países se inserem precisa de conquistar a estabilidade necessária para garantir a paz e o crescimento, não obstante a pesada herança de um e de outro lado, legada por um período dramático de 25 anos de convivência forçada. Timor-Leste e a Indonésia compartilham agora uma transição política tumultuosa, diversa na sua natureza e efeitos, mas em ambos os casos fruto de nacionalismos ativos e auxiliados por dinâmicas globais que ajudam sempre a repensar, pela força dos exemplos, os equilíbrios e desequilíbrios do poder, bem como as novas configurações das relações internacionais e dos seus atores.

Hoje, na conjuntura da política internacional, a aposta numa via armamentista já não é muito viável. Nesta perspetiva, Timor-Leste procura intensificar ou apostar mais nos canais da diplomacia e da economia, pois são prioritários no bilateralismo que se pretende desenvolver. Existe, da parte de Timor-Leste, a consciência de que pode ter um papel crucial no diálogo mais construtivo entre a Indonésia e a Austrália e, deste modo, potenciar a sua ação na política externa através de uma postura de neutralidade ativa.

A Indonésia afigura-se assim como um interlocutor evidente ao nível bilateral e, simultaneamente, no plano regional. A sua intervenção na ASEAN e na sua eventual reforma é crucial, razão para que também as considerações sobre a integração de Timor-Leste passem pela atitude que a Indonésia tome relativamente ao futuro da organização. Neste cenário, os governantes timorenses estão conscientes de que há uma dependência clara de Timor-Leste em relação à evolução política na Indonésia, de que beneficiou a partir de

1997, após da queda do regime Suharto, e da qual deverá continuar a tirar partido.

Independentemente de ser um caso excecional, a cooperação bilateral que Timor-Leste procura desenvolver com a Indonésia, no curto e longo prazo, deverá assentar nos aspetos fundamentais para o seu interesse nacional, nomeadamente, no potencial dos seus recursos económicos, como as ameaças tangíveis que existem já em relação à pesca, o outro recurso marinho importante de Timor-Leste. As águas timorenses são presa fácil para pescadores indonésios, chineses, tailandeses e taiwaneses. É necessário proteger os recursos marítimos vivos para que Timor-Leste não perca uma fonte valiosa de alimento e de meio de vida. Casos as águas não sejam suficientemente vigiadas, existe igualmente o perigo de serem vistas como um paraíso para atividades marítimas ilegais, como a pirataria, o contrabando de pessoas e o tráfico de droga.

O tráfico ilegal de pessoas é outra atividade lucrativa das organizações internacionais de crime. Desde o fim da Guerra Fria que o movimento irregular de pessoas se tornou numa questão humanitária e de segurança para a região Ásia-Pacífico. Os destinos são, geralmente, países desenvolvidos, mas outros Estados são usados como pontos de passagem, escolhidos em função da localização geográfica, de procedimentos de imigração e inspeções de entrada relativamente fluxos e da potencial cumplicidade de funcionários locais. Os vizinhos de Timor-Leste da Ásia Oriental abrigam relutantemente entre 2 a 3 milhões de refugiados e deslocados internos, bem como 4 a 5 milhões de trabalhadores migrantes indocumentados, enquanto a sul a Austrália se debate com um fluxo de pedidos de asilo provenientes do Afeganistão, do Médio Oriente e da China.

É inconcebível que os contrabandistas de pessoas venham a explorar a localização estratégica de Timor-Leste, na encruzilhada marítima da Ásia e do Pacífico, como destino de trânsito para indivíduos que procuram asilo e para imigrantes ilegais que querem chegar à Austrália. Isso poderia complicar as relações com Camberra, para além de criar problemas de segurança e de recursos para Díli.

Estados fracos são um ambiente fértil para terroristas, como se vê no sul das Filipinas e, cada vez mais, na Indonésia. Organizações terroristas e grupos criminosos colaboram de forma prejudicial para os Estados que os abrigam e para os seus vizinhos. No entanto, uma avaliação realista indica que Timor-Leste, com uma população na sua esmagadora maioria católica, não é um bom terreno para indivíduos ou grupos ligados às redes terroristas islâmicas.