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A relevância do cumprimento dos pressupostos legais pelo empregador para utilização dos meios de vigilância à distância no local de trabalho

A utilização pelo empregador dos registos obtidos através dos meios de vigilância à distância como meio de prova

3. Da admissibilidade da utilização pelo empregador dos registos obtidos pelos meios de vigilância à distância para despedir o trabalhador: o estado da questão na

3.1. A relevância do cumprimento dos pressupostos legais pelo empregador para utilização dos meios de vigilância à distância no local de trabalho

Com o intuito de assegurar ao trabalhador a proteção da sua personalidade, o legislador limitou a utilização de meios de vigilância à distância no local de trabalho. Fê-lo limitando os casos em que concebe a sua utilização e que surgem configurados com caráter de excecionalidade. O que é em parte garantido ao trabalhador através da imposição ao empregador de diversos pressupostos de caráter procedimental, que analisaremos de seguida.

Refira-se que nos diversos arestos analisados o cumprimento dos pressupostos legais não é unanimemente considerado para legitimar a utilização pelo empregador dos registos por si colhidos.

De seguida procuraremos alcançar em algumas decisões dos tribunais superiores de que modo tem aplicado a lei e apreender a relevância atribuída ao cumprimento de tais pressupostos nas decisões que proferem.

3.1.1. A utilização dos meios de vigilância pelo empregador para a proteção da segurança de pessoas e bens ou das necessidades inerentes à sua atividade

A primeira das condições para que o empregador possa instalar no local de trabalho os equipamentos de vigilância é que não o faça para controlar o desempenho profissional do trabalhador (n.º 1 do artigo 20.º CT); a instalação é lícita sempre que tenha por fim a proteção e segurança de pessoas e bens ou quando particulares exigências inerentes à natureza da atividade o justifiquem.

Cabe à CNPD, em face do pedido de autorização remetido pelo empregador, decidir se e em que medida os fins e as necessidades do empregador justificam o recurso aos meios de

vigilância. A CNPD apenas deve conceder autorização para o seu uso quando concluir que se verifica a adequação dos meios às necessidades do empregador13.

Sobre a admissibilidade da utilização da videovigilância no local de trabalho com finalidades de segurança, a jurisprudência tem considerado unanimemente essa possibilidade mesmo nos casos em que se pronunciam desfavoravelmente quanto à utilização dos registos para fim disciplinares.

A título de exemplo, vejam-se os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 3/05/2006, processo 872/2006-4, e os Acórdãos do Tribunal Relação do Porto de 4/02/2013, processo 2291/11.6 TTLMG.P1, e de 17/12/2014, processo 231/14.6TTVNG.P1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

Ilustrativo do exposto, consta no primeiro dos arestos que “(…) sendo o fim visado pela videovigilância exclusivamente o de prevenir ou reagir a casos de furto, vandalismo ou outros referentes à segurança de um estabelecimento relacionados com o público - e, ainda assim, com aviso aos que se encontram no estabelecimento ou a ele se deslocam de que estão a ser filmados - só nesta medida a videovigilância é legítima”.

3.1.2. A autorização administrativa para o empregador utilizar os meios de vigilância à distância no local de trabalho

Outro dos pressupostos que o CT estabelece, é que o empregador carece de autorização da CNPD para utilizar estes meios, nos termos do n.º 1 do artigo 21.º CT.

Embora a CNPD não possa autorizar a utilização dos meios de vigilância com o objetivo de controlar o desempenho do trabalhador, aquando do pedido feito pelo empregador, avalia os argumentos invocados pelo empregador e se as correspondentes necessidades por si invocadas

13 Para maior desenvolvimento sobre o tema ver Moreira, Teresa Alexandra Coelho, “Os Ilícitos Disciplinares

dos Trabalhadores Detectados Através de Sistemas de Videovigilância”, Estudos de Direito do Trabalho (Coimbra, 2011), Almedina, p. 277.

para recorrer a tais meios correspondem à realidade da empresa. Avalia ainda se o tipo de atividade que o empregador exerce justifica tal instalação14.

Motivada é certo por fins diversos, mas considerando que o plano da segurança não se pode dissociar totalmente da execução da atividade dos trabalhadores, consideramos que em qualquer situação em que o empregador pretenda utilizar os registos captados pelos meios de vigilância só é admissível se estiver autorizado a fazê-lo. Ou seja, a legitimidade do empregador para utilizar tais registos para qualquer fim depende da sua captação estar autorizada pela CNPD. Tal autorização só será concedida se os meios empregues se adequarem às necessidades do empregador e forem reputados de necessários, adequados e proporcionais às necessidades do empregador (n.º 2 do artigo 21.º CT)15.

Cremos que o cumprimento deste pressuposto procedimental é um ponto relevante e decisivo no sentido de se poder admitir a utilização licita dos registos com a finalidade disciplinar16.

A jurisprudência vem considerando que a inexistência de autorização da CNPD impede a utilização dos registos, quer no processo disciplinar, quer no subsequente processo judicial. Neste sentido, vejam-se os Acórdãos do Supremo de Tribunal de Justiça de 14/05/2008, processo 08S643, do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16/11/2011, processo 17/10.7 TTBRR.L1-4, do Tribunal da Relação do Porto de 9/5/2011, processo 379/10.6TTBCL-A.P1 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 8/10/2014, processo 149/14.2TTCSC.L1-4, e mais recentemente o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26/06/2017, processo 6909/16.2T8PRT.P1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

14 É possível encontrar no sítio online da CNPD, disponível em www.cnpd.pt, toda a informação necessária para

instruir o processo de autorização para instalar os equipamentos de vigilância na empresa.

15 Sobre a interpretação da CNPD sobre os requisitos legais importa atentar no conteúdo da deliberação n.º

61/2004, disponível em www.cnpd.pt, onde se pode ler que “(…) o tratamento a realizar e os meios utilizados devem ser considerados os necessários, adequados e proporcionados com as finalidades estabelecidas: a proteção de pessoas e bens. Ou seja, para se poder verificar se uma medida ou um direito fundamental supera o juízo de proporcionalidade imporá verificar se foram cumpridas três condições: se a medida é idónea para conseguir o objetivo proposto (princípio da idoneidade); se é necessária, no sentido de que não existia outra medida capaz de assegurar o objetivo com igual grau de eficácia (principio da necessidade); se a medida adotada foi ponderada e é equilibrada ao ponto de, através dela, serem atingidos substanciais e superiores benefícios ou vantagens para o interesse geral quando confrontados com outros bens ou valores em conflito (juízo de proporcionalidade em sentido estrito)”.

16 No sentido da necessidade da obtenção da autorização da CNPD como condição de o trabalhador poder ser

vigiado, Leitão, Luis Manuel de Menezes Telles, Direito do Trabalho, 3.ª edição (Coimbra, 2012), Almedina, p. 150.

3.1.3. A informação ao trabalhador sobre a existência e finalidade dos meios de vigilância à distância existentes no local de trabalho

Um outro dos requisitos de que a lei faz depender a utilização destes meios no local de trabalho é a informação ao trabalhador, embora não preveja qual o meio adequado para o empregador cumprir este seu dever.

O empregador tem assim a obrigação de informar os trabalhadores sobre a existência de equipamentos de vigilância que utiliza no local de trabalho e da finalidade com que os utiliza, afixando nos locais referidos as menções que supra referimos.

O incumprimento deste dever de informação pelo empregador constitui uma contraordenação laboral leve nos termos do n.º 4 do artigo 20.º CT.

Esta obrigação do empregador é um corolário do princípio da boa fé na execução do contrato de trabalho previsto no artigo 126.º CT e assegura ao mesmo tempo o princípio da transparência consagrado no artigo 2.º LPDP.17

No texto dos acórdãos que analisámos a propósito da verificação deste requisito legal, a questão tem sido colocada da seguinte forma: o cumprimento deste dever pelo empregador legitima ou não a utilização dos registos para o exercício da ação disciplinar? Ou seja, se o empregador cumpriu pode utilizar, se não cumpriu não poderá utilizar os registos.

No Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 09/05/2011, processo 379/10.6TTBCL- A.P1, disponível em www.dgsi.pt, considerou-se que mesmo que tenha sido prestada a informação pelo empregador ao trabalhador tal facto é irrelevante para legitimar o

17 Para maior desenvolvimento sobre o tema ver Redinha, Maria Regina, “Direitos de Personalidade”, acessível

em www.cije.up.pt/download-file/198 e Moreira, Teresa Alexandra Coelho, A privacidade dos trabalhadores e as novas tecnologias de informação e comunicação: Contributo para um estudo dos limites do poder de controlo electrónico do empregador (Coimbra, 2010), Almedina.

empregador a utilizar os registos colhidos para a ação disciplinar, ou seja em caso algum podem ser utilizadas as imagens colhidas para exercício da ação disciplinar18.

Por sua vez, o Acórdão da Relação de Coimbra de 06/02/2015, processo 359/13.0TTFIG- A.C1, disponível em www.dgsi.pt, admite que a utilização dos meios de vigilância no local de trabalho é lícita se cumprir os requisitos de fim e publicidade previstos nos nºs 2 e 3 do mesmo art.º 20º19.

O Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 25/6/2015, processo 522/14.6 TTGMR- A.G1, disponível em www.dgsi.pt, relativiza o dever de informação do empregador em face dos demais interesses em questão, tendo decidido que numa agência bancária se estavam afixados os avisos de que naquele local se procedia à gravação de imagens, o trabalhador não o podia ignorar, mostrando-se concretizado o conhecimento que o empregador deve dar ao trabalhador.

Resulta do exposto que, em concreto nesta decisão existe uma tendência para desvalorizar o cumprimento pelo empregador do dever de informação aos trabalhadores, concebendo a utilização dos registos obtidos como meio de prova para despedir o trabalhador, mesmo quando tal dever não tenha sido cabalmente cumprido pelo empregador.

3.2. A admissibilidade da utilização dos registos obtidos pelo empregador com vista ao

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