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SEÇÃO 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.4 Representações sociais

Como o objetivo desta pesquisa é investigar e analisar as representações dos professores que ministram a disciplina Inglês Instrumental no Ensino Superior, apresento, nesta seção, o conceito de representações sociais de Moscovici (2004), autor e estudioso da Psicologia Social, que tomarei como base para este estudo. Além disso, trarei à discussão outros autores, como Jovchelovitch (1998), Ramos e Lessa (2010), Farr (1994), Minayo (1994), Medrado (1998), Jodelet (1984, 2001), Guareschi e Jovchelovitch (1994), entre outros.

De acordo com Jovchelovitch (1998, p.55), “a teoria das representações sociais é uma teoria sobre a produção dos saberes sociais” e surgiu no final da década

de 1950, em um estudo sobre Psicanálise, conduzido por Serge Moscovici, na França. A autora afirma que essa teoria “se centra sobre a análise da construção e transformação do conhecimento social, e tenta elucidar como que o saber e o pensar se interligam na trama do tecido social” (JOVCHELOVITCH, 1998, p.55).

Moscovici (2004, p. 45) afirma que o conceito de representações foi abordado primeiramente pelo sociólogo Émile Durkheim (1912/1945). Porém, o autor relata que a visão dada às representações sob o ângulo da Sociologia de Durkheim é diferente do ângulo da Psicologia Social, pois, como explanam Ramos e Lessa (2010, p.105), Moscovici denomina o conceito de representações como sociais, diferentemente de Durkheim, que as denomina como coletivas.

Ramos e Lessa (2010, p.105) expõem que, para Moscovici, as representações sociais são como modos particulares de compreender e comunicar aquilo que já sabemos. As autoras afirmam que as representações sociais são assim denominadas por serem elaboradas em processos de troca de interações, e não apenas por substratos individuais ou de grupos. Em contrapartida, de acordo com Durkheim (1912/1995), as representações coletivas expostas por Moscovici (2004, p. 14) caracterizam-se pela capacidade de manutenção e conservação do todo social.

Segundo Durkheim (DURKHEIM, 1898 apud FARR, 1994, p.31), as representações coletivas não podem ser reduzidas a representações individuais. De acordo com Farr (1994, p.31), as representações coletivas de Durkheim eram semelhantes aos objetos de estudo da “Volkerpsychologie” de Wundt. O que diferenciava os estudos dos dois autores era o fato de que o primeiro interessava-se mais por estudar a sociedade.

De acordo com Minayo (1994, p.74), as categorias de pensamento de Durkheim não são dadas a priori e não são universais na consciência, elas surgem ligadas aos fatos sociais, sendo passíveis de observação e interpretação. A autora afirma que, para Durkheim, é a sociedade que pensa, sendo assim, as representações não são, necessariamente, conscientes do ponto de vista individual. Além disso, Minayo (1994, p.74) acrescenta que, no pensamento de Durkheim, não há representações falsas, pois todas respondem de “diferentes formas, a condições dadas da existência humana”.

Farr (1994, p.38) afirma que, como Durkheim foi um dos fundadores da Sociologia moderna, a teoria de Moscovici é compreendida como uma forma sociológica da Psicologia Social. Porém, segundo o autor, Moscovici afirma que a noção de representação coletiva de Durkheim pertence a “uma categoria coletiva que deve ser explicada a um nível inferior, isto é, em nível da Psicologia Social” (FARR, 1994, p.39). E assim foi criada a noção de representações sociais de Moscovici, como argumenta Farr (1994, p.39).

Para Moscovici (2003), representações sociais são como

um sistema de valores, ideias e práticas, com uma dupla função: primeiro, estabelecer uma ordem que possibilitará às pessoas orientar- se em seu mundo material e social e controlá-lo; e, em segundo lugar, possibilitar que a comunicação seja possível entre os membros de uma comunidade, fornecendo-lhes um código para nomear e classificar, sem ambiguidade, os vários aspectos de seu mundo e da sua história individual e social (MOSCOVICI, 2003, p.21).

Moscovici (2003, p.48) afirma que as representações sociais de seu interesse são aquelas de “nossa sociedade atual, de nosso solo político, científico, humano”, e descarta as das sociedades primitivas, dos tempos pré-históricos. No intuito de facilitar a compreensão das representações sociais, Moscovici (2003, p.53) enfatiza que essas “devem ser vistas como uma atmosfera, em relação ao indivíduo ou ao grupo”. Além disso, afirma que, sob determinados aspectos, as representações sociais são específicas de nossa sociedade.

A finalidade de todas as representações sociais, segundo Moscovici (2004, p. 54), é “tornar familiar algo não familiar”, ou seja, o que estava distante parece estar ao alcance de nossas mãos, o que era abstrato, concretiza-se, dando a impressão de segurança, de algo “já visto” (déjà vu) e “já conhecido” (déjà connu) (MOSCOVICI, 2004, p.58).

De acordo com Medrado (1998, p.87), um dos teóricos que melhor define o conceito de representações sociais é Jodelet (1984). Medrado (1998, p.87) expõe que, para Jodelet, as representações sociais são imagens compartilhadas que “condensam

um conjunto de significados” e explica, segundo a autora, o que vêm a ser as representações sociais:

[...] sistemas de referência que nos permitam interpretar a nossa realidade e inclusive dar um sentido ao ‘inesperado’; categorias que servem para classificar as circunstâncias, os fenômenos e os indivíduos com os quais mantemos relação (JODELET, 1984, p. 174 apud MEDRADO, 1998, p.87).

Medrado (1998, p. 87) conclui que as representações sociais são “esquemas mentais ou imagens que as pessoas utilizam para fazer sentido no mundo e para se comunicar, ou seja, interagir com os outros”.

Para Guarechi e Jovchelovitch (1994, p.19), as dimensões cognitivas, afetivas e sociais estão presentes nas representações socais, e o fenômeno das representações sociais está ligado à construção de saberes sociais, o que, consequentemente, envolve a cognição. Assim, explanam os autores:

O caráter simbólico e imaginativo desses saberes traz à tona a dimensão dos afetos, porque quando sujeitos sociais empenham-se em entender e dar sentido ao mundo, eles também o fazem com emoção, com sentimento e com paixão. A construção de significação simbólica é, simultaneamente, um ato de conhecimento e um ato afetivo (GUARECHI e JOVCHELOVITCH, 1994, p.19).

Corroborando esse pensamento, Ramos e Lessa (2010, p.106) ressaltam o quanto é relevante estudar representações sociais, não apenas por sua “importância na vida social”, mas também pela “possibilidade de elucidar os processos cognitivos e as interações sociais”.

Guarechi e Jovchelovitch (1994, p.20) defendem que as representações sociais são formadas quando as pessoas se encontram para falar, argumentar, discutir o cotidiano, ou quando são expostas às instituições, aos meios de comunicação, aos mitos e à herança histórico-cultural de suas sociedades. Assim como os autores, Celani e Magalhães (2002, p. 321) também entendem que as representações sociais são construídas a partir da interação de um contexto sócio-histórico, podendo esse

estar relacionado a questões políticas, ideológicas e teóricas. A definição de representações sociais, de acordo com as autoras, é a seguinte:

[...] uma cadeia de significações, construídas nas constantes negociações entre os participantes da interação e as significações, as expectativas, as intenções, os valores e as crenças referentes a: a) teorias do mundo físico; b) normas, valores e símbolos do mundo social; c) expectativas do agente sobre si mesmo como ator em um contexto particular (CELANI E MAGALHÃES, 2002, p. 321).

Moscovici (2004, p.60-61), por sua vez, explana que as representações sociais são formadas por dois mecanismos baseados em memória e conclusões passadas: a ancoragem e a objetivação. Segundo o autor, trata-se de um processo que transforma algo que nos é estranho, perturbador e intrigante em “nosso sistema particular de categorias e o compara com um paradigma de uma categoria que nós pensamos ser apropriada”. Moscovici (2004, p. 61) afirma que o processo de ancoragem consiste em classificar e dar nome a algo, sendo esse já possuidor de um nome ou não. Pelo fato de conseguirem classificar algo que não é possível classificar, as pessoas são capazes de imaginar algo e assim representá-lo.

De acordo com Moscovici (2004, p.62), representação é “um sistema de classificação e de denotação, de alocação de categorias e nomes”. O autor defende que categorizar é escolher um dos paradigmas armazenados em nossa memória e “estabelecer uma relação positiva ou negativa com ele” (MOSCOVICI, 2004, p.63).

Já o segundo mecanismo, a objetivação, trata-se de tornar real algo não real, unir a ideia de não familiaridade com a realidade, para que assim possa torná-la real. Moscovici (2004, p. 78) conclui que as representações dependem da memória, para que algo não familiar torne-se familiar, e que a ancoragem e a objetivação são maneiras de lidar com a memória. O autor as diferencia afirmando que a ancoragem é o mecanismo que mantém as memórias em movimento e as dirige para dentro, e a objetivação, o mecanismo que dirige imagens e conceitos para reproduzi-los no mundo exterior.

A compreensão de muitas das representações que surgiram durante a coleta de dados desta pesquisa será sustentada pelo arcabouço teórico apresentado nesta

seção, fundamentada em Moscovici e outros autores. Creio que a análise de dados apresentada nesta pesquisa revelará as representações sociais que subjazem os discursos dos participantes, professores de Inglês Instrumental no Ensino Superior, assim como suas representações sobre a disciplina em questão, do papel do professor de Inglês Instrumental, do aluno que frequenta a disciplina e do material didático utilizado nesse contexto.

Apesar de Ramos e Lessa (2010, p.108-109) citarem diversos estudos sobre representações no contexto de ensino-aprendizagem de línguas, desenvolvidos no PEPG-LAEL/PUC-SP, não há muitos estudos sobre representações no contexto de ensino-aprendizagem de Línguas para Fins Específicos. O único trabalho sobre representações desse contexto no LAEL é o de Monteiro (2009), que investigou as representações dos professores de inglês da Universidade Federal do Amazonas sobre o ensino-aprendizagem de inglês por meio da Abordagem Instrumental.

Exteriormente ao LAEL, como já mencionei em introdução a este trabalho, encontrei apenas uma dissertação de mestrado (CHIARO, 2009), que pesquisou as representações dos alunos de uma escola de idiomas que oferece cursos de Inglês para Fins Específicos.

Assim, creio que minha pesquisa seja relevante à área de ensino- aprendizagem de Línguas para Fins Específicos por constatar que há poucos estudos sobre representações tanto de professores como de alunos nesse contexto.

Na presente seção, busquei apresentar o aporte teórico que fundamentou esta pesquisa, discutido em três subseções e suas respectivas seções terciárias: O ensino-aprendizagem de Inglês para fins Específicos, Professores e alunos de Inglês para Fins Específicos, Material didático de Inglês para Fins Específicos e Representações sociais.

A seguir, apresento, na Seção 3, a metodologia de pesquisa empregada neste trabalho.