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DESENVOLVIMETO DE PRÁTICAS DE ENSINO DA LEITURA E DA ESCRITA

3.3 Saberes-fazeres dos professores: breves considerações

Para tratarmos dos saberes-fazeres docente, mais especificamente daqueles que são mobilizados pelos professores alfabetizadores com vista ao desenvolvimento de práticas de ensino da leitura e da escrita consideradas bem-sucedidas, é importante considerar que os estudos sobre os saberes docentes são recentes na história das pesquisas da área da educação. De acordo Guimarães (2004, p. 30), “eles surgem principalmente a partir da necessidade de se compreender os elementos que caracterizam e compõem o saber fazer do professor e da

professora”. Assim, conforme essa autora, os estudos que se debruçam sobre os saberes têm a preocupação de compreender o que os professores sabem e como mobilizam esses saberes na organização de suas práticas. Como afirma Oja (2011), as pesquisas interessadas em estudar essa temática são significativas para o desenvolvimento profissional, tendo surgido com o objetivo de identificar a grande diversidade de saberes que se originam da prática docente, compreendendo sua natureza, sua construção e a relação entre teoria e pratica em sua constituição. Entretanto, como expõe essa última autora, o reconhecimento dos professores como sujeitos produtores de saberes é algo recente, aparecendo no Brasil de forma mais enfática a partir da década de 1990.

Depreendemos, nesse sentido, que, apesar de sua importância na atualidade, os saberes dos professores nem sempre foram postos em evidência, o que está relacionado, como temos dito anteriormente, às concepções que percebem os referidos profissionais apenas como aplicadores dos conhecimentos elaborados em outros contextos, ou seja, enquanto sujeitos apenas praticantes. Nesse sentido, como aponta Tardif (2008), a necessidade de compreender os habitus do professor – conceito que se aproxima do de “esquemas profissionais”, mencionado anteriormente –, isto é, suas disposições adquiridas na prática e através dela, os quais podem se configurar como um estilo de ensino, manifesto por um saber-fazer validado pelo trabalho cotidiano, ocasiona um deslocamento de concepção em relação à forma de perceber esses profissionais e o seu fazer.

Diante disso, compreendemos que essa perspectiva de investigação que concebe os professores não apenas como mobilizadores, mas também produtores de saberes, é fundamental em nossa pesquisa, pois nos ajuda a olhar não apenas para a dimensão do fazer que constitui a prática dos alfabetizadores, como se eles fossem apenas praticantes. Desse modo, atentamos para o fato de que, além dessa dimensão, existe outra relacionada aos saberes que eles mobilizam, a qual está imbricada com a primeira, de modo que podemos falar de sujeitos praticantes-pensantes, compreendendo-os não enquanto executores, antes como autores de seu fazer cotidiano.

Nessa perspectiva, partimos do entendimento de que “o saber docente é aquele que efetivamente se mobiliza no âmbito do processo educativo, na dinâmica da prática docente, e é esse saber que vai definir, numa relação dialética com fazeres dos professores, as ações, as práticas desse contexto” (SALES, 2012, p. 54). Assim, concebemos que saberes e fazeres estão de tal forma articulados nas práticas de ensino dos professores, que não podemos tratá- los de forma isolada, pois eles estão em íntima relação com o que esses sujeitos fazem- pensam no cotidiano escolar (TARDIF, 2008). Além disso, como afirma Guimarães (2004, p.

25), a polarização entre saber e fazer dificultaria nossa compreensão sobre quais os saberes mobilizados, utilizados e produzidos pelos referidos profissionais. Isto porque, ao pesquisar apenas os saberes, estaríamos retirando-os do espaço em que ocorrem, da mesma forma que não poderíamos pensar o fazer docente sem os saberes específicos que lhe dão sustentação e materializam-no.

Além disso, como expõe Monteiro (2006, p. 148), a separação torna-se inviável também na medida em que “a caracterização das práticas explicita saberes que subsidiam as justificativas e explicações sobre o porquê de certas configurações pedagógicas”. Assim, nossa concepção é a de que o saber e o fazer docente são indissociáveis no contexto da sala de aula dos alfabetizadores. “Por isso tratamos desses elementos como sendo um mesmo componente, o saber-fazer, que em si agrega e relaciona os saberes e os fazeres como um ‘amálgama’ da prática docente” (SALES, 2012, p. 53). Ou seja, compreendemos que os saberes-fazeres funcionam como a liga que constitui as práticas do professor. Dessa forma, quando utilizamos o termo saber-fazer não estamos nos referindo à competência de saber- fazer, no sentido de “saber fazer algo ou alguma coisa”. Quando falamos de saber-fazer, estamos nos referindo àquilo que os professores sabem e fazem, compreendendo, entretanto, que esses dois aspectos estão imbricados e, em conjunto, constituem seus saberes-fazeres. Nesse sentido, concebemos que as práticas do professor não são constituídas apenas do fazer, como se esse profissional fosse apenas praticante e não fosse também pensante, ou como se seu fazer não fosse sustentado por um saber que possibilita sua materialização, ou ainda como se o fazer não tivesse implicações sobre o saber.

Nessa perspectiva, como evidencia Almeida (2013), o imbricamento entre saberes e fazeres imprime coerência à prática dos professores, constituindo um elemento fundamental no perfil de um profissional bem-sucedido. Assim, essa autora conclui, mediante o desenvolvimento de sua pesquisa, que essa coerência permeava a prática da alfabetizadora bem-sucedida por ela investigada, na medida em que, ao mobilizar saberes relacionados à valorização da leitura como forma de motivação, à clareza de que os alunos apresentam diferentes níveis de aprendizagem e à necessidade de retomar conteúdos que não foram bem compreendidos, a professora manifestava, respectivamente, fazeres, como o incentivo à leitura - lendo para os alunos todos os dias e emprestando gibis -, o desenvolvimento de atividades diferenciadas para discentes com dificuldades, a organização de grupos com diferentes níveis de aprendizagem, e retomada de explicações ao perceber que os discentes não compreendiam o conteúdo.

saberes os diversos conhecimentos mobilizados pelos professores no âmbito de suas práticas de ensino. Diante disso, alguns elementos precisam ser esclarecidos. Primeiramente, é importante ressaltar que não consideramos como conhecimento apenas aquilo que é produzido no âmbito acadêmico-científico, mas também as formas de conhecer menos sistematizadas que são mobilizadas e (re)criadas no cotidiano escolar, pois concebemos que considerar como conhecimento apenas aqueles que se desenvolvem nos moldes acadêmicos, pode contribuir para a desvalorização do professor enquanto produtor de conhecimentos. Nesse sentido, não estamos considerando que ambos os conhecimentos (o acadêmico e o docente) devam ser utilizados como sinônimos, pois eles têm suas especificidades. Entretanto, compreendemos que a afirmação de um (conhecimento acadêmico) - por meio da valorização do que é produzido cientificamente - em detrimento do conhecimento de senso comum, não implica, necessariamente, o rebaixamento do outro (conhecimento do professor) a uma categorização de não-conhecimento.

Nessa direção, é importante ressaltara que, apesar do crescimento dos estudos que tratam dos saberes docentes e da vasta literatura sobre seu fazer, ainda é escassa a produção de estudos que tratem dos saberes-fazeres de forma imbricada. Portanto, nos embasando em autores que tratam mais especificamente dos saberes, procurando articulá-los com o fazer, evidenciando a indissociabilidade entre eles. Além disso, partilhamos da ideia de Tardif (2008, p. 60) de que o saber tem “um sentido amplo que engloba os conhecimentos, as competências, as habilidades (ou aptidões), e as atitudes docentes, ou seja, aquilo que foi muitas vezes chamado de saber, saber-fazer e saber-ser”. Nesse sentido, a ideia de saberes não está estritamente relacionada à dimensão cognitiva, mas abrange diferentes elementos de trabalho docente.

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