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CAPÍTULO 2 A CONSTRUÇÃO DE UM SIGNO NORMATIVO

2.4 SEMIÓTICA DA NORMA JURÍDICA

Firmadas as principais bases teóricas que orientam esse trabalho, resta o desafio de fazer valer a teoria da semiótica em um contexto específico, como é o caso do direito. As idéias de Peirce têm a pretensão de universalidade, foram formuladas em termos abstratos e gerais, dentro da tentativa de redução ao menor cognoscível. Por isso, a aplicação da teoria geral dos signos à disciplina jurídica pode contribuir para a compreensão de ambas as áreas do conhecimento.

Neste capítulo, os fundamentos teóricos da semiótica de Peirce serão comparados com alguns conceitos da Teoria Geral do direito, a fim de identificar, no contexto jurídico, como se apresentam os elementos da relação triádica. O escopo dessa investigação é identificar, ao final, um modelo de signo construído com base em elementos do direito que possa ser afirmado, com amparo teórico, como um signo jurídico.

As categorias semióticas são, por sua própria natureza, formais e alheias a qualquer tipo de vinculação prévia a conteúdos específicos. Isso garante a sua abstração e, por conseqüência, sua flexibilidade e compatibilidade com os mais variados tipos de aplicações. Desta forma, uma proposta modelar de signo jurídico, por mais que sejam delimitados e

explicados os seus elementos, não pode ter a pretensão de ser definitiva ou única. Por sua natureza complexa e dinâmica, o signo tende a se apresentar de formas diferentes, dentro de um mesmo contexto.

A incerteza e o falibilismo, todavia, não tornam essa etapa menos importante. Considerando a crescente relevância que os estudos sobre a semiótica vêm conquistando no âmbito das disciplinas da comunicação, não se pode ignorar a influência que tais teorias podem vir a exercer sobre os estudos jurídicos. Vários juristas e filósofos do direito já desenvolveram discussões nessa área comum39, como fazem exemplo as referências deste trabalho.

O que se oferece é uma análise sistemática e teórica desse entrelaçamento de disciplinas, para que sejam definidos os conceitos básicos, com todo o rigor lógico característico de Peirce. O que não se recomenda, nessa visão, é tratar de semiótica jurídica sem antes explicar o que seria o signo jurídico.

A definição do que é a norma jurídica40 acompanha os trabalhos teóricos sobre o direito desde sua proposição mais reconhecida, pelo jurista Hans Kelsen41. Com marcada influência kantiana (e aqui está evidente uma característica comum com o semioticista norte- americano), o pensador germânico propôs uma “Teoria Pura do direito”42, uma estruturação

39

Convém destacar a proposta de uma epistemologia das significações, assim como uma sociologia das significações, no âmbito jurídico (WARAT, 1995, p. 308).

40

Para Kelsen (1986, p. 1), “a palavra ‘norma’ procede do latim norma, e na língua alemã tomou o caráter de uma palavra de origem estrangeira – se bem que não em caráter exclusivo, todavia primacial. Com o termo se designa um mandamento, uma prescrição, uma ordem. Mandamento não é, todavia, a única função de uma norma. Também conferir poderes, permitir, derrogar são funções de normas.

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A Alemanha da época ainda resistia à idéia de um sistema baseado na legislação, preferindo um direito científico, evidenciado no surgimento do pandectismo e da jurisprudência dos conceitos (BOBBIO, 1995, p. 121-122).

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Sobre a teoria, “quando a si própria se designa como ‘pura’ teoria do direito, isto significa que ela se propõe garantir conhecimento apenas dirigido ao direito e excluir deste conhecimento tudo quanto não pertença ao seu objeto, tudo quanto não se possa, rigorosamente, determinar como direito. Quer isto dizer que ela pretende libertar a ciência jurídica de todos os elementos que lhe são estranhos. Esse é o seu princípio metodológico fundamental” (KELSEN, 1998, p. 1).

dos sistemas jurídicos tomando por base um juízo lógico43 imperativo a que denominou norma jurídica.

Para Kelsen, a norma jurídica envolve um juízo lógico de imputação, em que está evidente um dever-ser44, entre sujeitos submetidos ao seu império. Com essa formulação, a possibilidade de apelo à causalidade para explicar os fenômenos jurídicos ficou afastada. A imputação é atributiva na medida em que associa duas situações diversas, atribuindo a segunda como conseqüência lógica da primeira, em virtude do comando normativo tido como válido. A verificação da ocorrência da conseqüência da norma na realidade empírica não é relevante para a conceituação da norma. Em outras palavras, uma vez concretizada a hipótese da norma, sua conseqüência pode ou não acontecer de fato, sem que com isso seja prejudicada a validade da imputação45.

Uma outra característica da norma jurídica é a determinação de uma relação sempre entre sujeitos. A conseqüência da norma jurídica (ou a conseqüência jurídica da norma) impõe a atribuição de deveres e direitos a um conjunto de sujeitos envolvidos. Ou seja, modifica situações jurídicas ao estabelecer regras de conduta que subordinam um sujeito e que autorizam outro a exigir seu cumprimento. Não desvirtua a natureza da norma a possibilidade de cada um desses sujeitos ser plural ou coletivo, ou ainda indeterminado.

Em acréscimo a esses elementos, uma característica típica da norma jurídica, que a diferencia de outras formas de normas sociais, é a coatividade46. Há uma imperatividade

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Segundo o mesmo autor, há uma relação evidente entre o direito e a lógica: “também não há, no idioma alemão, a palavra ‘lógica’ como nome de uma Ciência; há diversos nomes para as normas que formam o objeto da Ciência que descreve essas normas: para as normas que formam o objeto da Ética, o nome ‘moral’; para as normas que formam o objeto da Ciência do direito, o nome ‘direito’” (KELSEN, 1986, p. 2).

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Como uma categoria original, Kelsen (1986, p.3) sustenta a impossibilidade de descrição mais

detalhada do dever-ser: “como não se pode descrever o que seja o ser, tão pouco há uma definição do dever-ser”.

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Portanto, “ ‘Validade’ é a específica existência da norma, que precisa ser distinguida da existência de fatos naturais, e especialmente da existência dos fatos pelos quais ela é produzida” (KELSEN, 1986, p. 3-4). Neste ponto, o autor está próximo da noção de abstração, que será retomada a seguir.

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Kelsen (1998, p. 44-45) distingue coerção e coação, para entender que o direito trata apenas desta última, que seria uma resposta jurídica a condutas proibidas. Entende que coerção só pode corresponder a sanção se o sentido desta última for ampliado, para envolver respostas jurídicas a fatos de risco, como o poder de polícia.

inerente à norma ao impor comandos de comportamento e existe uma heteronomia pelo fato dessa obrigatoriedade ser afirmada por uma instância diversa dos sujeitos envolvidos, sem a necessidade de aquiescência voluntária destes. Porém, esses aspectos restariam inócuos se não fosse atribuída à norma uma garantia de cumprimento efetivo.

A coatividade47 está manifesta pela possibilidade de sanção48 jurídica. A conseqüência da norma pode ou não ser verificada na realidade, mas uma vez descumprida faz nascer uma nova imputação, cuja conseqüência é a imposição da sanção49. Aqui surge a necessidade da tutela estatal do direito, uma vez que o Estado, por força de sua soberania e supremacia, é o único titular da violência legítima. À entidade estatal, portanto, cabe sancionar aqueles comportamentos que escapam à imperatividade normal.

Na formulação da norma, há um duplo juízo de imputação – um atribuindo um dever de conduta aos sujeitos e outro atribuindo uma sanção estatal no caso de descumprimento do primeiro. Em ambos os casos, o comando está estruturado sob a forma de conseqüência imputada a uma hipótese.

Não há uma posição consensual sobre qual a forma lógica pela qual esses dois juízos de imputação integram a norma jurídica50. Houve propostas de reconhecimento de juízos disjuntivos ou adversativos. Apesar dos méritos de cada proposta, é conveniente afastar essas possibilidades porque enfatizam aspectos, respectivamente, de alternatividade exclusiva e oposição que não são elementos essenciais da norma. Talvez, por estas razões, o conectivo lógico somativo seja o mais adequado porque demonstra que, ainda que qualquer uma das duas imputações não ocorra em concreto, no plano lógico-formal ambas estão juntas de forma complementar.

47

Tobias Barreto (2001, p. 95) pede que “convençamo-nos, portanto: o direito é um instituto humano; é um dos modos de vida social, a vida pela coação, até onde não é possível a vida pelo amor”.

48

Como parte da ordem jurídica (KELSEN, 1998, p. 26).

49

Em outras palavras, seria uma característica distintiva entre direito e moral, porque “o direito impõe uma conduta determinada somente por ligar à conduta contrária um ato de coação como sanção” (KELSEN, 1986, p. 182).

50

O próprio Kelsen (1986, p. 68-70, 181), em obra postumamente publicada, reviu sua clássica proposição entre norma jurídica primária e secundária.

Por fim, vale a pena lembrar a construção kelseniana do sistema normativo51, o ordenamento52 jurídico, como o grande encadeamento de normas que comanda as condutas na sociedade. O ordenamento jurídico é formado pelo conjunto de normas e pode ser representado, em seu aspecto estático, pela figura da Pirâmide de Kelsen, que reforça sua característica de sistema fechado e evidencia a estruturação hierárquica dos elementos normativos53.

Além da análise estática, o ordenamento também pode ser estudado sob o seu caráter dinâmico, envolvendo a criação e a supressão de normas e a forma como os aparentes conflitos são solucionados. Há, assim, a suposição de que existe um conjunto de normas que não determinam condutas, propriamente, mas estabelecem as regras para o funcionamento do próprio ordenamento jurídico e os requisitos de validade para a produção de normas.

O que se verifica da proposta de Kelsen é a formulação de uma teoria positiva54, universal55 e geral56 que permitisse o estudo do direito como um sistema fechado e perfeito. Contribuem para essa pretensão de universalidade o discurso comum sobre neutralidade axiológica, validade formal e suprimento de lacunas.

As conceituações e definições da norma jurídica variaram muito até os presentes dias, orbitando em torno desse núcleo comum. Algumas descrições mais profundas do

51

No sentido de uma ordem social (KELSEN, 1998, p. 25).

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Sobre a origem do termo, “não sabemos dizer como e quando a expressão ‘ordenamento jurídico’ estreou no uso corrente e este é um problema que merecia ser estudado; somos, entretanto, da opinião que seja a tradução italiana do termo alemão Rechtsordnung.” (BOBBIO, 1995, p. 197). Concordando com a origem italiana está a semântica de Vandyck Nóbrega de Araújo (1986, p. 41-44).

53

Norberto Bobbio (1995, p. 198) aponta como características do ordenamento jurídico positivo as idéias de unidade, coerência e completitude.

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Entende que é positiva “uma norma posta na realidade do ser por um realizante ato de vontade” (KELSEN, 1986, p. 6).

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O termo universalidade não está sendo usado no sentido de um sistema que se imponha a todo o gênero humano – o que é mais próximo do jusnaturalismo –, mas à pretensão de “plenitude do ordenamento jurídico” (KELSEN, 1986, p. 168). Vale a pena ver a definição de Peirce (2003, p. 109-110) de “universal” e o uso medieval relacionado ao termo “geral”.

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Reconhecer sua teoria como geral não significa que as normas também tenham essa característica, sempre. Essa é a diferença conceitual entre norma e regra: “Tem a norma um caráter geral, qualifica-se-lhe com uma regra do dever-ser. Apenas nessa hipótese é infundado falar de uma ‘norma’, quer dizer, de considerar o caráter geral essencial para o conceito de norma. Pois o essencial de uma norma é que uma conduta seja estatuída como devida. Isto pode acontecer de modo geral ou individual” (KELSEN, 1986, p. 11).

conjunto de teorias sobre o assunto, ou das posições adotadas pelos vários pensadores do direito, escapam ao objetivo do presente trabalho, além de deslocar o foco para uma discussão conceitual e formal que já ocupa há muito o pensamento dos juristas.

Por essa razão, como em todo conhecimento, é preciso marcar o ponto da decisão a fim de permitir a continuidade da cognição. A noção de norma jurídica a ser adotada a seguir é aquela que consta dessa breve descrição apresentada. Essa compreensão será submetida ao crivo dos conceitos peirceanos a fim de verificar a sua aplicabilidade – esse sim o objetivo deste trabalho.

Assim como a norma jurídica é uma entidade lógico-formal capaz de ser concretizada sob as mais variadas formas, o signo é também um ente lógico e abstrato apto a explicar relações com os mais diversos conteúdos. A semelhança entre as duas noções é muito mais do que aparente e sugere, de antemão, que a norma jurídica é o melhor ponto para começar a construção de um suposto signo jurídico.

Para o reconhecimento do caráter sígnico da norma jurídica, é preciso delinear com clareza em qual relação de semiose ela está inserida e qual papel desempenha neste processo. Pela complexidade inerente a esses dois elementos lógicos, é possível antecipar não apenas uma, mas várias possibilidades de convergência.

A primeira proposta de tratamento semiótico da norma jurídica é também a mais óbvia. A norma jurídica, a despeito do seu caráter lógico, é geralmente enunciada em termos lingüísticos, o que já atrai a incidência da semiótica. A linguagem verbal (a língua) é um código de comunicação composto pela articulação de elementos arbitrários, desde os mais complexos – textos, enunciados, sintagmas – até os mais básicos – expressões, palavras, fonemas. A língua é um sistema de símbolos, portanto.

A estruturação da relação de semiose, no âmbito da linguagem, acontece a partir do reconhecimento de aquilo que se percebe é diferente daquilo que se entende. Na semiose

da língua, portanto, esse componente lingüístico é o mediador entre um percipuum e uma idéia decorrente. Em termos semióticos, um corpus de imagem ou som (objeto) determina uma enunciação57 (signo), que determina uma mensagem (interpretante). A cadeia semiótica pode prosseguir em um processo de aperfeiçoamento, por exemplo, quando a mensagem passa a agir como signo para a formação de novas idéias (interpretantes).

A norma jurídica também participa do processo de semiose lingüística quando está enunciada nesta forma. Então, de modo semelhante ao que acontece com a língua, de um

corpus físico (objeto) é determinada a norma em sua forma lógica (signo), que determina uma

certa situação jurídica (interpretante). A norma jurídica, portanto, age como linguagem mediadora entre o que está manifesto de forma textual e o comando jurídico, geralmente hipotético, que lhe deve seguir.

Todavia, essa primeira consideração da norma como signo lingüístico ainda pode ser mais especificada. Isso porque, ao contrário da transmissão de idéias por meio da língua, a norma é uma linguagem de segundo nível58, ou seja, que se apropria dos códigos da língua para fazer valer o seu próprio conjunto de símbolos. Nesse movimento, a leitura de um determinado texto jurídico implica sempre pelo menos duas leituras: ler “lingüisticamente” as palavras para só então ler “juridicamente” as idéias.

Analisando essa posição, é possível formular novamente a semiose descrita, deixando evidente que há efetivamente duas relações triádicas, unidas por um processo de aperfeiçoamento do signo. Um elemento físico, como um documento jurídico em papel (objeto) determina a apreensão do valor de seu enunciado lingüístico (signo 1), que determina a aquisição das idéias que pretendia transmitir (interpretante 1), ponto em que está a norma em sua forma lógica. No processo de aperfeiçoamento, o signo (enunciado lingüístico) torna-

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No sentido lingüístico, “a enunciação é este colocar em funcionamento a língua por um ato individual de utilização” (BENVENISTE, 1989, p. 82).

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Ou, nos termos mais precisos da Escola de Semiótica de Tártu-Moscou, um “sistema modelizante secundário”, que se estrutura sobre a linguagem natural (o “sistema modelizante primário) (VERENICH, 2003, p. 81).

se implícito e o interpretante assume seu papel. Então, no nosso caso, o documento jurídico (continua sendo o objeto) determina a assimilação de uma norma jurídica (signo 2), que imputa alguma situação jurídica (interpretante 2). A manutenção do mesmo objeto e o reconhecimento de que a mensagem do texto (interpretante 1) e a norma em sua forma lógica (signo 2) são o mesmo elemento são os pontos que asseguram a continuidade do processo de semiose. Em termos mais claros, é por isso que ao ler um texto jurídico, o sujeito apreende seu sentido jurídico imediatamente após seu sentido lingüístico de maneira quase simultânea e indistinta.

Nessa proposta lingüística de análise semiótica da norma jurídica, ainda restam algumas questões relativas ao objeto e ao interpretante que serão mais detalhadas nas próximas páginas. Agora, é preciso expor algumas considerações ainda sobre a relação entre norma e signo.

Tudo o quanto foi exposto até o momento revela a possibilidade de apreensão da norma como signo lingüístico, vale dizer, como símbolo. Assim como as linguagens verbais, de uma forma geral, a norma também está estruturada em um sistema com pretensões de universalidade. Em ambos os casos – o sistema da língua e o sistema normativo jurídico – há um conjunto pré-determinado de regras de validade responsáveis por identificar o que pertence e o que não pertence ao sistema.

Muitos autores fazem suas análises transitarem por esses processos semióticos para explicar com esmerado esforço como direito e linguagem são elementos indissociáveis. De fato, há uma interdependência recíproca entre os dois sistemas, principalmente porque um legitima o outro no âmbito social.

enunciação (implícita) sentido mensagem norma texto lingüístico jurídico sentido norma texto jurídico enunciação texto lingüístico

Figura 8 – Signo jurídico - primeiro modelo: Signo normativo lingüístico 8.1. Enunciações da norma jurídica – no sentido kelseniano, a norma jurídica é um juízo lógico de imputação (I) que pode ser enunciada em língua, como em (II).

8.2. Semiose lingüística – na semiose lingüística, a relação parte de um corpus lingüístico (objeto) para determinar uma enunciação (signo 1) e uma mensagem (interpretante 1). 8.3. Semiose normativa – na semiose normativa, a relação parte de um corpus jurídico (objeto) para determinar uma norma em forma lógica (signo 2) e extrair um sentido (interpretante 2).

8.4. Semiose lingüístico-normativa – o modelo de signo normativo-jurídico resulta da consideração de que o objeto pode ser o mesmo para ambas as relações e que a norma é a mensagem resultante da leitura lingüística (interpretante 1 = signo 2). Portanto a “leitura” jurídica é um segundo nível, ou um “aperfeiçoamento” da “leitura” lingüística, que permanece necessária e prévia, mas implícita. A extração do sentido da norma pode continuar indefinidamente, em torno do objeto dado, buscando o seu mais próximo interpretante.

Figura 8.1

Enunciações da norma jurídica

Dado o FATO TEMPORAL deve ser a PRESTAÇÃO pelo SUJEITO OBRIGADO em face do SUJEITO PRETENSOR

dada a NÃO PRESTAÇÃO deve ser a SANÇÃO

pela AUTORIDADE OBRIGADA em face da SOCIEDADE PRETENSORA E hipótese conseqüência ilícito I II Figura 8.2 Semiose lingüística

Figura 8.3. Semiose normativa

signo1 objeto interpretante 1 signo2 objeto interpretante 2 hipótese conseqüência ilícito sanção Figura 8.4 Semiose lingüístico-normativa objeto signo interpretante mensagem

Porém, é possível verificar que a semiose normativo-lingüística aqui descrita tem como objetivo a extração de um comando normativo, em um processo cada vez mais aperfeiçoado de compreensão. Está no âmbito da hermenêutica jurídica59, portanto.

Mesmo assim, não é uma hermenêutica no sentido amplo da palavra. Ao comparar e reunir dois sistemas formais, como a língua e o ordenamento jurídico, o que se coloca ao sujeito cognoscente, efetivamente, é uma limitação dupla. A hermenêutica jurídica, que já tem um campo de atuação limitado, não pode ultrapassar as barreiras da língua, assim como o estudo das formações discursivas, que também cumprem ritos formais, não poderia exceder o espectro jurídico.

Ao avaliar os signos aqui descritos, o que se está fazendo é uma análise lingüística estrutural da norma60, o que é muito pouco para as pretensões universais da semiótica. Os signos da semiótica vão muito além da língua.

Uma proposta de superação do paradigma lingüístico na análise semiótica da norma jurídica é o reconhecimento de que a língua é importante como veículo hermenêutico para explicitação do “sentido” da norma. Então, é preciso recorrer à linguagem verbal para decodificar a mensagem contida na norma jurídica. Nesse ponto, todo o modelo proposto nos parágrafos anteriores é completamente válido. Porém, após a idealização da norma, a língua passa para um segundo plano. Nesse grau de abstração, a norma passa a interagir com outras normas, com situações e fatos. Esse é o sistema de “linguagem” propriamente jurídico.

Nesse nível jurídico-formal, uma dada situação pode determinar a norma como signo e essa, por sua vez, determinar uma disciplina jurídica específica. É preciso atenção para o fato de que, quando se menciona situação, não se está fazendo referência à hipótese da

59

Em relação ao método hermenêutico estimulado pelo direito, o “positivismo jurídico sustenta a teoria

da interpretação mecanicista, que na atividade do jurista faz prevalecer o elemento declarativo sobre o produtivo

ou criativo do direito” (BOBBIO, 1995, p. 133).

60

Kelsen (1986, p. 188) já aponta para a manifestação da norma jurídica por formas extralingüísticas: “o ato, cujo sentido é uma norma, pode ser executado de modos muito diferentes. Mediante um gesto: com um certo movimento de seu braço, um sinaleiro ordena que se permaneça parado, com um outro, que se deve prosseguir