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CAPÍTULO 2 A CONSTRUÇÃO DE UM SIGNO NORMATIVO

2.3 SOB O SIGNO DE PEIRCE

Revistos os elementos da percepção segundo Peirce, resta ainda verificar como as idéias podem ser encadeadas no processo intelectivo. Convém ressaltar que, assim como na relação triádica entre percepto, percipuum e julgamento de percepção, também no exame do signo estará presente o aspecto da mediação, característico da Terceiridade.

A teoria dos signos é o marco teórico do presente estudo, em torno do qual serão desenvolvidos os modelos jurídicos apresentados a seguir. Mesmo para quem não tem interesse na semiótica americana, segundo W. B. Gallie (1952, p.111-113), o estudo da “Doutrina dos Pensamentos-signos” é essencial para a compreensão do pragmatismo30, como método de definição e regra de inferência; para sobrestar a crítica mais importante contra o pragmatismo, a de que relacionar conceitos com efeitos é meramente circular; e para entender os conceitos que reaparecem na metafísica peirceana.

Muito embora tenha Peirce formulado diversas explicações para a noção de signo, a mais aceita é a de que o signo é sempre um suposto relacional. Conforme as características da Terceiridade, o signo peirceano é sempre representado como uma tríade, em que um elemento (signo ou representâmen) determina um outro elemento (interpretante) em relação a um objeto.

O signo ou representâmen31, para Peirce, é o Primeiro Correlato da relação triádica, que está para um objeto e determina um interpretante. É um elemento mediador entre dois outros, em uma relação irredutível. A relação triádica formada pelo signo não pode ser

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Mais conhecido por sua máxima de que a concepção de um objeto equivale à concepção de seus efeitos ou, no original, “consider what effects, which might be conceivably have practical bearings, we conceive the object of our conception to have. Then, our conception of these effects is the whole of our conception of the object” (PEIRCE, 1966, p. 124; 1940, p. 31).

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Sobre a definição de signo, entre tantas outras destaca-se o texto “Divisão dos Signos” (PEIRCE, 2003, p. 46-47).

decomposta em quaisquer outros números de relações diádicas, uma vez que os liames que unem os três elementos entre si atribuem-lhes um conjunto lógico de papéis definidos a serem exercidos sob a mediação do signo.

Uma observação necessária é o reconhecimento da desnecessidade de um intérprete atual. O signo determina o interpretante e é determinado pelo objeto independentemente das circunstâncias que emolduram o seu uso. Inclusive, uma distinção sutil entre os termos signo e representâmen aponta que o primeiro exige um interpretante mental. Ou seja, o signo determina uma idéia, enquanto o representâmen pode ou não atuar dessa forma, com ou sem intérpretes humanos. Com isso a semiótica de Peirce quebra os limites do racionalismo para estudar qualquer conjunto de fenômenos da realidade sob o prisma da relação triádica. Ambos os termos vão continuar a ser usados como sinônimos, ao longo deste trabalho, uma vez que se pretende promover a aplicação da teoria semiótica a contextos sociais e, portanto, supondo interpretantes mentais.

O aspecto autônomo do signo decorre da forma lógica como foi estruturado. A relação triádica não é uma interação criada pelo homem, nem uma alternativa de representação da realidade. A relação mediada pelo signo seria uma necessidade decorrente da própria realidade e da forma como o homem a percebe. Assim, independente da atuação de um sujeito cognoscente, o objeto determina o signo de uma forma lógica e inafastável. Da mesma forma, objeto e signo determinam o interpretante de uma maneira que outra não poderia ser.

A relação triádica, dessa forma, envolve um processo no qual cada um dos seus elementos exerce uma função determinada. Por tal razão, não se pode estabelecer critérios de importância ou prevalência entre eles, assim como não é possível reduzir essa relação aos limites do signo ou aos de qualquer outro elemento.

signo objeto interpretante signo objeto imediato interpretante imediato interpretante dinâmico interpretante final objeto dinâmico

Figura 3 – A estrutura do signo peirceano

3.1. Estrutura – a estrutura triádica do signo é o que caracteriza a semiótica peirceana. O objeto determina o signo, assim como este determina seu interpretante. O signo, portanto, atua como elemento mediador relacionando objeto e interpretante.

3.2. Implicitude – o reconhecimento da determinação entre objeto e signo e entre signo e interpretante faz supor uma relação direta entre objeto e interpretante, quando o signo é tomado por implícito.

3.3. Classificações – segundo Peirce, o objeto pode ser categorizado entre objeto imediato e objeto dinâmico, enquanto o interpretante pode ser diferenciado em interpretante imediato, interpretante dinâmico ou interpretante final.

Observação: o ponto |x| em 1.3 representa a identidade pretendida (e mediada pelo signo) entre objeto e interpretante, remota e alcançável apenas por uma aproximação ideal.

Figura 3.2 Implicitude Figura 3.3 Classificações Figura 3.1 Estrutura x

SIGNO

INTERPRETANTE

OBJETO

Signo, objeto e interpretante também são referidos nas obras de Peirce como, respectivamente, Primeiro, Segundo e Terceiro Correlatos da relação triádica. Essa denominação, apesar de largamente utilizada pelos estudiosos da semiótica, não será enfatizada neste trabalho a fim de evitar associações equivocadas com as categorias universais da Primeiridade, Secundidade e Terceiridade. Na relação triádica, seria adequado relacionar o objeto com a Primeiridade, o interpretante com a Secundidade e o signo com a Terceiridade, muito embora, como será visto, todos os elementos acabam por mostrar uma complexidade que não pode ser simplificada desta forma.

É comum o entendimento de que o signo representa o objeto, mas essa afirmação, embora não seja falsa, exige um pouco mais de esforço de explicação. A relação lógica que se estabelece entre o signo e o objeto é de determinação lógica, como visto, acrescentando agora que essa vinculação é mantida mesmo após a formação do signo. Na impossibilidade ontológica ou lógica de apropriação do objeto, o seu signo é tomado em seu lugar e assim pode ser conceituado, classificado e manipulado de qualquer forma, como se ambos fossem o mesmo ser, para essa finalidade. O que há, portanto, é muito mais uma determinação, do que uma substituição ou uma representação, principalmente porque na grande maioria dos casos o signo é a única forma de cognição possível do objeto. Resta claro que não há uma identidade perfeita, pois o objeto sempre será maior que o signo; um é pleno, o outro revela apenas um aspecto dessa plenitude. Em outras palavras, o signo está no lugar do objeto, é tomado por ele, está para ele, na medida em que é por ele determinado.

Em conseqüência, em atenção à sua função mediadora, o signo irá determinar um interpretante da mesma forma. O interpretante, dado o mesmo signo e o mesmo objeto, é uma conseqüência lógica da relação triádica, determinado pelo signo assim como este é determinado pelo objeto. A mediação do signo é necessária e inafastável, mas uma vez

estabelecida perde em largo grau a sua visibilidade, de forma a transparecer superficialmente uma relação direta entre objeto e interpretante.

Como resultado da análise e classificação das maneiras como ocorre essa determinação, Peirce dividiu os signos em três categorias32. Vale lembrar que sua descrição não faz mais do que indicar tipos abstratos, enquanto, na prática, os signos se apresentam como formas mais complexas com características compostas que ultrapassam os limites sugeridos.

O ícone (PEIRCE, 2003, p. 63-66) seria o tipo mais elementar de signo, que é associado ao seu objeto por guardar com ele uma característica comum. Essa impressão intuitiva, por isso mesmo relacionada à Primeiridade, remete ao objeto tão logo o signo seja apresentado, de uma maneira mais direta que nos outros tipos. Dada a sua natureza primária, no ícone poderia ocorrer a coincidência ontológica entre objeto e signo, ou até mesmo envolvendo o interpretante.

O índice (PEIRCE, 2003, p. 66-70) seria o segundo tipo de signo, que mantém uma relação com seu objeto por um efeito físico de aproximação ou causalidade. O signo faz referência ao objeto porque estão de algum modo associados em sua ocorrência individual, de tal forma que a verificação de um remete ou faz supor a existência do outro.

Por fim, o símbolo (PEIRCE, 2003, p. 71-74) seria o tipo mais elaborado – e por isso mesmo mais perfeito – de signo, que é determinado pelo seu objeto em virtude de um código ou uma convenção estabelecida de maneira arbitrária33.

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No texto “Divisão dos Signos” Peirce propõe várias outras classificações, omitidas em virtude da especificidade do trabalho, para tratar apenas da segunda tricotomia: símbolo, índice e ícone (PEIRCE, 2003, p. 52-53).

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Como para outros autores as noções de signo e símbolo assumem outros sentidos, às vezes permutados, Umberto Eco (1984, p. 205) analisa, sobre o símbolo de Peirce, que “a escolha terminológica peirciana deve-se provavelmente ao fato de que ele já tinha decidido usar /signo/ referindo-se ao genus generalissimum e, por isso, devia encontrar uma denominação diferente para esse tipo específico, a que pertencem também os signos ligüísticos”.

Primeiridade Secundidade Terceiridade Primeira

Tricotomia

Qualisigno Sinsigno Legissigno

o signo em si mesmo qualidade que é um signo

um evento existente e real que é um signo

uma lei que é um signo

Segunda Tricotomia

Ícone Índice Símbolo

relação do signo para com seu objeto

signo que se refere ao objeto apenas em virtude de seus caracteres próprios

signo que se refere ao objeto em virtude de ser realmente afetado por ele

signo que se refere ao objeto em virtude de uma lei Terceira Tricotomia Rema Dicissigno ou Dicente Argumento relação do signo com seu interpretante possibilidade qualitativa

existência real lei

Figura 4 – Classificação dos signos

4.1. As três tricotomias propostas por Peirce (2003, p.51-55)

4.2. As dez classes em quadro de Peirce (2003, p. 58) 4.3. Ordenação das classes – uma proposta gráfica de ordenação das classes de signos.

Observação: A formação das classes exclui algumas combinações. Por exemplo, todo qualissigno é também icônico e remático. Em termos práticos, uma classificação segundo a primeira tricotomia exige que as demais sejam equivalentes ou mais simples. Uma classificação na segunda tricotomia exige que a terceira seja equivalente ou mais simples.

Figura 4.1 As três tricotomias Figura 4.2 As dez classes Remático Icônico Qualissign Remático Icônico Legissigno Remático Simbólico Legissigno Argumento Simbólico Legissigno Remático Icônico Sinsigno Remático Indicial Legissigno Dicente Simbólico Legissigno Remático Indicial Sinsigno Dicente Indicial Legissigno Dicente Indicial Sinsigno Qualissign Argumento Icônico Sinsigno Dicente Simbólico Icônico Legissigno Remático Indicial Sinsigno Remático Simbólico Dicente Indicial Legissigno Remático Indicial Legissigno Dicente Sinsigno Figura 4.3 Ordenação das classes

Na formação simbólica, o signo não mantém, necessariamente, uma relação característica ou existencial com seu objeto, mas é usado no lugar deste por força de um sistema de códigos que se impõe pela tradição, pelo costume, pelas interações sociais ou por qualquer forma de assimilação.

Portanto, o símbolo é o signo por excelência, com uma distinção necessária entre os três elementos da relação triádica, que não se confundem e, ainda assim, são determinados mutuamente. Ao longo da aplicação da teoria semiótica, o símbolo será utilizado como modelo de signo para os efeitos a que esse trabalho se propõe. Não se descarta o reconhecimento da existência de ícones e índices, mencionados quando se fizer necessário.

O objeto, na relação triádica, é o elemento que determina o interpretante, pela mediação de um representâmen. Em uma posição um pouco mais ontológica, Peirce entende o objeto como algo distinto do sujeito cognoscente, que lhe é dado a conhecer. Por objeto não se deve tomar apenas um ente concreto ou empírico; em si, objeto pode ser qualquer elemento tido como real, ainda que abstrato, ideal ou conceitual, que impressiona a mente humana.

Assim, a noção de objeto é mais ampla que a idéia de coisa. Além disso, pode envolver fenômenos individuais ou mesmo uma coletividade categorizada. É possível verificar que o sentido atribuído por Peirce ao termo objeto é muito próximo do que entendemos hoje como conceito. Ambos orientam o pensamento para determinadas manifestações delimitando e apresentando suas características distintivas. Nesse processo, pode haver uma maior ou menor precisão. Em suma, o objeto pode ser mais delimitado, voltado para a descrição de um fenômeno de existência individual, ou mais abstrato, apontando nada mais que características de um conjunto limitado de potenciais objetos.

O representâmen, ou elemento mediador, geralmente tem existência distinta do objeto. Ainda que haja uma coincidência fenomenológica ocasional, como no caso da auto- referência ou metalinguagem, objeto e representâmen cumprem papéis distintos na

assimilação das idéias. Tanto assim que na cadeia cognitiva pode haver uma sucessão de representâmens para um mesmo objeto.

A experiência também exerce função importante na determinação do objeto. Considerando que há a formação de uma relação entre duas idéias, com a mediação de um representâmen, é preciso que, pelo menos com uma delas, o sujeito guarde familiaridade34 – ou seja, que haja um papel a ser desempenhado por ela na sua noção de realidade. Quando são relacionados elementos inteiramente desconhecidos pelo sujeito cognoscente, o que se forma é uma relação isolada, que não é integrada à cadeia de cognição até que um outro signo ou uma percepção posterior traga familiaridade a um de seus elementos. Portanto, a experiência atua como fator de integração entre os signos e seus objetos.

Atento a essas complexidades que envolvem a noção de objeto, Peirce desenvolveu algumas classificações do objeto para que, com um maior rigor conceitual, pudesse ser identificado precisamente o papel que este elemento exerce na relação triádica. Não são classificações no sentido de agrupamento de possibilidades, exatamente, mas conceitos completamente distintos em si, ou pelo menos formas distintas de considerar o elemento objeto (PEIRCE, 2003, p. 168).

Uma primeira idéia é a de objeto dinâmico, também considerado com objeto mediato ou dinamóide. Esse aspecto coincide com o fenômeno em si considerado, distinto da cadeia de significação e na plenitude de sua ocorrência real. É bastante semelhante, assim, ao papel exercido pelo percepto na relação triádica de percepção.

O objeto dinâmico é impassível de apropriação direta pelo sujeito, que está condenado a uma eterna aproximação ideal. Por ser em si inacessível, esse objeto precisa que outro elemento esteja por ele na relação triádica, a fim de permitir a assimilação de sua

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existência e a continuidade do processo de conhecimento. Esse elemento que participa da relação é o objeto imediatamente disponível, ou objeto imediato.

O objeto imediato decorre do objeto dinâmico, naquela qualidade ou característica que o signo elege como determinante. Ou seja, ele nunca vai conter toda a plenitude do fenômeno real, mas apenas aqueles aspectos limitados e compreensíveis que vão dar origem à relação triádica. Portanto, o objeto imediato é completamente assimilável pelo sujeito cognoscente, por envolver apenas uma faceta perceptível do objeto dinâmico. Essa característica do objeto dinâmico que está presente no objeto imediato é chamada de fundamento do signo.

O fundamento do signo, então, é o aspecto do objeto que é considerado determinante do signo. Por isso, um mesmo objeto pode originar múltiplos signos, cada um abrangendo um fundamento distinto. É importante ressaltar que o fundamento do signo não apenas revela uma relação entre objeto dinâmico e objeto imediato, como também fixa limites para todo o desenvolvimento posterior da relação triádica. Ou seja, um signo não pode considerar ou determinar um aspecto do objeto que esteja além daquilo que foi eleito como seu fundamento.

Em suma, uma relação triádica envolve um representâmen, um interpretante e um objeto imediatamente disponível. Este, por sua vez, está no lugar de um objeto dinâmico (que não pode ser diretamente apreendido) com base em um aspecto determinado, o fundamento do signo.

Outras considerações acerca da natureza do objeto do signo, bem como sua função na cadeia semiótica, serão apresentadas ao longo do trabalho. Para a continuidade da análise proposta, todavia, é preciso dedicar algum tempo para explicar o terceiro elemento da relação triádica do signo.

O interpretante é a conseqüência, o produto do signo, aquilo que é determinado pelo seu objeto por uma mediação do representâmen. Ele supõe, portanto, os outros dois elementos da relação triádica e, apesar de não se confundir com os demais, é considerado uma determinação necessária da atuação de um sobre o outro. Assim, o interpretante se apresenta como uma conseqüência de duas causas: uma que lhe é imediata, o representâmen; outra que lhe é mediata, o objeto. Portanto, em uma soma quase dialética, a atuação do representâmen sobre o objeto vai originar uma idéia determinada que constitui o interpretante.

Um primeiro aspecto do interpretante (e de todo os elementos da relação triádica) é que ele é uma decorrência objetiva dos demais elementos da relação triádica. Isso implica admitir que o objeto tem o poder de criar o seu representâmen, assim como ambos determinam um interpretante. Nesse processo, Peirce, com todo o seu rigor lógico, não garantia espaço para desvios de subjetividade.

A idéia de relação sígnica, como relação fenomenológica, foi resultante de uma redução lógica do pensamento às suas categorias mais básicas passíveis de conhecimento. Nessa depuração, Peirce buscou retirar todos os aspectos de subjetividade, relativismo e sugestão que pudessem comprometer a sua pretensão de neutralidade e pureza conceitual. O signo peirceano, assim, é uma implicação lógica que se relaciona, existe e atua de uma forma da qual o sujeito não pode se afastar. Aliás, a própria existência de um sujeito é irrelevante para a o estudo da relação triádica.

Por isso, a apreensão do interpretante não depende de qualquer esforço consciente de interpretação, ou mesmo da presença de um intérprete.35 Um signo somente pode ser considerado como tal se impuser seus mesmos elementos em qualquer ambiente ou cenário. Ou seja, uma relação triádica genuína tem o poder de, dado o mesmo objeto e representâmen, determinar o mesmo interpretante em qualquer intelecto, existente ou potencial.

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É apontado que Peirce revisou sua teoria dos signos em 1907 para concluir que a interpretação é orientada a fins, ou seja, independe de esforço consciente. Com isso, o pensamento consciente passa a ser apenas uma das partes da semiótica (SHORT, 2004, p. 230).

Outro ponto característico do interpretante, a ser desenvolvido mais adiante, é sua potencialidade de dar origem a novos signos. É preciso ter em mente que o interpretante é a idéia resultante do signo, que pode determinar o pensamento se for originada no intelecto humano. Ora, como visto na análise do objeto, os fenômenos abstratos, como as idéias, também podem atuar como objeto de um signo. Esse encadeamento, como será visto, não é exclusivo do interpretante e pode ocorrer envolvendo os outros pólos da relação triádica.

Assim como o objeto, o interpretante também é passível de classificação, segundo variados critérios. Sem desmerecer o valor de outras, uma das divisões mais conhecidas é a que leva em consideração os estágios ou níveis do interpretante (PEIRCE, 2003, p. 168).

A primeira categoria seria a do interpretante imediato, ou aquele imediatamente ligado ao signo. Assim como o objeto imediato, esse interpretante seria interno à relação triádica. Consiste em uma impressão direta e potencial que o signo pode determinar, com abstração de quaisquer considerações a respeito de contexto ou situações concretas.

O segundo nível seria o do interpretante dinâmico, relacionado a uma situação concreta. Esse elemento representa o efeito real efetivamente produzido pelo signo em uma mente particular. É, talvez, a única forma de interpretante genuinamente capaz de ser verificada em pesquisa empírica, uma vez que será sempre uma ocorrência específica. O interpretante dinâmico é singular, individual e necessariamente distinto quando se alterarem o contexto e o sujeito cognoscente.

Por fim, o último estágio seria o do interpretante final, aquela idéia para a qual tendem todos os interpretantes dinâmicos36. A relação entre o signo e seu objeto nunca será plena, pelos limites da compreensão humana. Todavia, há que se esperar que o signo busque sempre uma identificação com seu objeto, meta inalcançável a não ser por um exercício

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A noção de interpretante final, assim como a de objeto dinâmico, representa um estágio posterior da teoria dos signos de Peirce, relacionada com suas idéias de verdade e realidade (teoria da convergência). O interpretante final pode não ser uma teoria, mas apenas uma ação ou apreciação. “As implicações disto para teoria ética e teoria estética ainda estão para serem exploradas” (SHORT, 2004, p. 237).

abstrato de aproximação ideal. O limite dessa aproximação ideal é exatamente o que orienta o interpretante final, como um sentido elaborado e geral para o qual todos os interpretantes deveriam convergir. É por isso que esse interpretante é também chamado de destinado ou intencionado.

Outro nome que este mesmo nível recebe, ainda, é o de interpretante normal. Esse