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2.2 DE ONDE SE VÊ A CENA

2.2.3 Bastidores da Luz – Equipamentos e Espaço Técnico

2.2.3.1 Sistema de iluminação sempre de menos

Creio que devemos pensar a iluminação cênica do TAC em correlação com a iluminação da cidade de Florianópolis do século XIX, então denominada de Desterro. E esta não era muito iluminada, como diz Cabral: “Viveu Desterro às escuras até 1837” (1979:265). Segundo as descrições de Cabral, o governo provincial encaminhou medida deliberativa no ano de 1837 solicitando a aquisição de 80 lampiões com a finalidade de iluminar as ruas da cidade. Mas como sempre ocorre nas medidas administrativas, os recursos eram poucos e só foram compradas 50 unidades de candeeiros. As chamas dos lampiões eram alimentadas com azeite de baleia ou de peixe que, segundo Cabral, era de odor forte e de péssima qualidade. Somente em 1868, com o Theatro Santa Izabel ainda em construção, “conseguiu Desterro livrar-se dos candeeiros de azeite de peixe, tão malsinados por mal cheirosos e bruxuleantes, que por cerca de 30 anos haviam servido para iluminar a escuridão das noites da cidade, exceto as de lua cheia, por desnecessário, e as de vento sul, por impossível” (1979: 160). Deu-se então, neste ano, no dia 24 de outubro, a inauguração da iluminação a querosene e com uma quantidade de 100 lampiões em toda a cidade. Novos e, na época, modernos meios de iluminação foram implantados no inicio do ano de 1880. Segundo Cabral, em janeiro daquele ano “começou a ser usado o sistema de gás- globo, com 150 combustores [...] Os lampiões recebiam óleo de nafta e cada um tinha uma intensidade equivalente a 8 a 10 velas” (1979: 161,162).

70 Se a cidade era deficitária na iluminação de seus espaços públicos e privados, é evidente que o TAC também teria problemas nesse quesito. Quando de sua inauguração em 1875, não foi dado a esse teatro um bom sistema de luminosidade para o trabalho com a representação artística. A iluminação existente no recinto passou a ser um dos assuntos constantemente ironizados pela imprensa local:

O teatro é defeituoso, mas a empresa já poderia ter feito alguma coisa para remediar esses defeitos; pois, que dizer [de] cenas de noites e o teatro está claro como dia? Se a pessoa que fez o teatro não contou com iluminação, e por conseguinte não preparou o necessário para ela, a empresa [...] já deveria ter feito alguma coisa para não continuar a ser a caixa do teatro iluminada com luz fixa (A Regeneração. Florianópolis, 10 de outubro de 1878).

As críticas continuaram no ano de 1879. A imprensa local salientava a falta de iluminação minimamente adequada para o teatro. Diziam: “Nada mais [...] desagradável do que estar em um teatro iluminado por lamparinas. Falta luz, quer na sala, quer no palco [...] tendo o palco iluminado apenas por 5 ou 6 lamparinas, que outro nome não tem os candeeiros de boca”.31 Em outra crítica sobre esse

problema temos: “No palco, custa a conhecer os atores, o que só conseguem os que mais próximos, ou pela voz ou à custa de binóculo. Os quatro candeeiros que se aumentaram na boca de cena, foram para inglês ver, pois que já desapareceram dois”.32 Com as persistentes estocadas sobre a deficiência luminosa, as manifestações obtiveram algum resultado:

As nossas reclamações sobre iluminação vão sendo atendidas, felizmente; o palco já não está às escuras, embora ainda não tenha luz suficiente. Aumentou-se a iluminação do proscênio com mais dois lampeões e puseram gambiarras entre as bambolinas; as cenas que se passam no segundo plano, ou além do primeiro pano, como as do terraço, etc, são sempre feitas em completa escuridão (Collaço 1984:76)

31 O Despertador. Desterro, 09 de abril de 1879. 32 O Despertador. Desterro, 22 de abril de 1879.

71 O espaço ainda continuava necessitando de melhorias e já se pensava em controlar a intensidade de luminosidade diferenciada no palco e na platéia. Sobre a situação fragilizada da casa, e na tentativa de solucionar o problema, o fiscal do teatro propõe ao governo provincial, em 1879, uma atitude inovadora: “Arranjar um sistema de iluminação da caixa de forma a permitir escurecer esta quando for mister” (Collaço, 1984: 89).

O problema da iluminação do teatro permaneceria um incômodo com o passar dos anos. Críticas na imprensa, às vezes carregadas de tons trágicos ou melodramáticos, exigiam melhorias: “O teatro estava quase em completas trevas, e só se diferenciavam os atores uns dos outros pela voz, não sendo possível distinguir-lhes as feições” (O Despertador, de 15 de novembro de 1882).

O governo organizou, então, uma comissão para cuidar e avaliar a situação do teatro, e por recomendação desta Comissão o governo provincial aprovou, a 22 de dezembro de 1885, um Regulamento do Theatro Santa Izabel, que no seu artigo 5º se referia à necessidade de resolver problemas relativos aos bastidores e cuidado com a iluminação. Haveria um zelador nomeado pelo fiscal para cuidar da iluminação do espaço e determinava gratificações a serem pagas pelas funções desempenhadas (Collaço, 1984:65).

Saindo um pouco do limite do TAC, temos que a primeira demonstração sobre o funcionamento da luz elétrica no Brasil ocorreu em 1879 no Rio de Janeiro e contou com a presença do inventor da lâmpada, Thomas Edson. O espaço foi na antiga Estrada de Ferro D Pedro II, onde hoje se localiza a Central do Brasil. Em 24 de junho de 1883 o primeiro sistema elétrico da América Latina era inaugurado em Campos, Província do Rio de Janeiro, com a presença do Imperador D. Pedro II.

Em 1894, o Teatro Éden Dramático, no Rio de Janeiro já contava com a iluminação elétrica produzida por um pequeno gerador a vapor. O Teatro Amazonas, em Manaus, inaugurado em 1896, já contava com instalações elétricas. O Teatro Municipal do Rio de Janeiro foi inaugurado em 1909 já contava com sua unidade geradora de energia elétrica. Assim se deu com os demais grandes teatros municipais das grandes capitais brasileira, a partir de então – o Teatro Municipal de São Paulo, por exemplo, foi inaugurado em 1911 (Prenafeta, 2005:61).

72 O século XIX se findava e Florianópolis iniciava, tal como a maioria das capitais brasileiras, suas primeiras tentativas de experimentos com iluminação elétrica. As iniciativas partiram da Prefeitura e como Capital do Estado o Governo de Santa Catarina se empenhou para nessa cidade instalar um gerador elétrico com propósitos de obter iluminação. Outras iniciativas particulares também ocorriam em cidades como Blumenau e Joinville, prósperas colônias de imigrantes alemães. O governador Hercílio Luz, em seu primeiro mandato estadual (1894-1898), encaminhou uma medida de auxílio ao município destinando um valor anual “para o serviço de canalização de água, esgoto e iluminação elétrica” (Lei n. 149, de 9 de setembro de 1895).

No final do século XIX o Governo do Estado tinha esboçado uma tímida melhoria no único teatro de Florianópolis, mas no início do século XX os problemas persistiam e um dos pontos de reclamação era o novo sistema de utilização da luz elétrica, que ainda não dava conta de boa claridade no palco, deixando as cenas na penumbra. Ao adentrar no novo século o teatro continuou com velhas dificuldades de melhorias e com uma iluminação precária.

No governo de Gustavo Richard (1906-1910) foi celebrado, em 2 de dezembro de 1907, entre o Estado e a Prefeitura de Florianópolis, um convênio para a construção da primeira usina elétrica para iluminação pública e domiciliar de Florianópolis. O sistema distribuidor de luz elétrica foi inaugurado com grande pompa em 25 de setembro de 1910. Na ocasião, na cidade foram “instaladas 500 lâmpadas de 50 velas cada e 20 de arco voltaico de 1.200 em postes de aço galvanizado” (Corrêa, 2004: 289).

Mas, a cidade continuaria com problemas de geração e distribuição de energia elétrica. As precárias condições da iluminação de Florianópolis, nas décadas seguintes, interferiam também com frequência nas condições das representações no Teatro Álvaro de Carvalho. As luminárias lá instaladas ainda tinham o propósito de tão somente clarear, sem uma preocupação de controle de intensidade e interferência na estética do trabalho representado. O serviço de fornecimento de energia elétrica teve novos desdobramentos em 1924, quando o Estado estabeleceu contrato de arrendamento com a Companhia Tração, Luz e Força. Esta empresa responsabilizou-se pelos serviços de fornecimento de

73 energia elétrica também na região de Florianópolis. Contudo, os resultados não surtiram efeitos imediatos, pois na década de 1930 os problemas continuavam quase os mesmos das décadas anteriores, como se percebe no incidente ocorrido quando a Companhia Nacional de Comédia Ribeiro Cancela exibia seu espetáculo: “[...] Quasi ao terminar o 2º ato, a luz fez das suas. Apagou-se. O Teatro ficou às escuras e os artistas emudeceram no palco, tal qual os astros da tela, quando a luz falta” (Diário da Tarde, 25 out. 1939).

No ano de 1943 foram tomadas novas medidas para amenizar os problemas. O Governo do Estado incorporou as redes dos municípios de Biguaçu, São José, e dos bairros do Estreito e Coqueiros, integrando-as com a rede de Florianópolis. Tinham essas redes como única fonte geradora de energia “um motor Diesel – Ingerssoll Band, de 105 H.P. que agora depois de sofrer reforma completa, está sendo montado para trabalhar com um gerador de 8 KW de propriedade do Estado” (Pauli,1997, 114).

Florianópolis conectou-se no ano de 1950 com a Usina de Beneficiamento do Carvão da Siderúrgica Nacional, de Tubarão. Isso determina o início da integração do sistema elétrico do Estado. E no ano de 1953, esse sistema foi ampliado em direção ao norte do estado, e em março de 1957 se ligava, então, a cidade de Joinville ao sistema de Capivari-Tubarão.

No ano de 1954, a retomada do projeto da Usina Garcia visava à construção de uma barragem em Angelina, que ainda era distrito do município de São José. Essas medidas trouxeram novos alentos para a região. Outros sistemas de geração e ligação em rede começaram a prosperar pelo Estado por iniciativas e colaboração do Governo. No ano de 1964, o governador Celso Ramos inaugurou, então, a Usina Garcia I. Em sua gestão (1961-1966), Celso Ramos se concentrou na busca de uma integração mais ampla do sistema de energia elétrica, projetando a criação da CELESC, Centrais Elétricas do Estado de Santa Catarina, que se relacionaria, a partir de 1968, diretamente com a ELETROSUL. A Eletrosul Centrais Elétricas S.A. - Eletrosul foi criada, pelo governo federal, em 23 de dezembro de 1968 e é uma subsidiária das Centrais Elétricas Brasileiras S.A. – Eletrobrás, vinculada ao Ministério de Minas e Energia.

74 A empresa tem seu sistema de transmissão nos estados da Região Sul e no Mato Grosso do Sul.

Apesar disso, a distribuição de energia elétrica ainda é um grande problema em Florianópolis, vide o apagão de outubro/novembro de 2003, quando a cidade ficou quase 3 dias sem nenhuma eletricidade. Realidade que nos dias atuais, 2011, os governos do Estado e do Município tentam resolver com a construção de subestações distribuidoras em pontos centrais da cidade.

Com as crises energéticas na cidade, é evidente que o mesmo problema estaria presente no TAC, tanto na qualidade da energia ali conectada, sempre com possibilidade de quedas e variação de tensão, como em apagões constantes, podendo deixar um espetáculo às escuras. O problema ainda se faz presente no TAC, nos dias atuais de 2011.