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A função principal do sistema visual humano parece ser processar luz em informa- ção útil para o organismo, para a vida e para a sobrevivência, e é no olho que se inicia este processo de extração da informação.

Para ver é necessário luz, ou algum estímulo luminoso (ou físico) rececionado pela retina, que depois será transformada em perceção de cor pelo sistema visual cromático1.

Visão cromática é a habilidade em detetar, analisar e distinguir as diferentes alterações dos comprimentos de onda da composição da luz.

5. 1 - Joseph Beuys, Capri-Batterie, instalação, 1985, National Galleries of Scotland.

A cor de um material ou objeto é determinada pela frequência média dos comprimentos de onda que as suas moléculas constituintes refletem, ou seja, o objeto terá a cor correspondente aos comprimentos de onda que o objeto não absorve mas que reflete. A luz refletida ativará a sensação de cor percecionada. Por outras pala- vras, se um objeto é amarelo este absorve preferencialmente os comprimentos de onda não amarelos.

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A perceção da cor depende da interpretação do estímulo luminoso. A cor de um objeto resulta da quantidade e qualidade de luz refletida que por sua vez origina das quali- dades físicas das superfícies do próprio objeto. A energia espectral do sinal cromático de- pende de dois fatores físicos, da composição espectral da fonte de luz que incide no objeto e da qualidade das superfícies do próprio objeto2. Diferentes fontes de luz apresentam lu-

minância distinta quer na quantidade, quer na qualidade, a própria incidência luminosa po- de afetar a perceção de cor, por isso um mesmo objeto pode ter cores distintas sob uma luz incandescente ou luz solar. Diferentes superfícies apresentam diferentes capacidades de absorção e reflexão de partes do espectro luminoso, por exemplo, a luz é refletida de super- fícies opacas e transmitida em superfícies semi-opacas ou transparentes, também o tama- nho do objeto, ou até a distância a que o objeto se encontra, pode afetar a perceção de cor.

“The first is the spectral power distribution of the illuminant incident on the ob- ject. This varies considerably over the course of the day with weather conditions, and be- tween natural and artificial illuminations. The second factor is the object’s surface reflec- tance function, which specifies, at each wavelength, what faction of the incident illuminant is reflected.” (Brainard, 2001, p. 148)

Outro aspeto que interfere na perceção de cor são as características fisiológicas e até psicológicas do observador. Sabe-se que a maioria das pessoas reage de modo idêntico ao estímulo luminoso na mesma classe de cones, identificáveis pelos seus fotopigmentos, e que são ativados ao serem estimulados por um determinado comprimento de onda (Lichtenstein, 2004, p. 33). Assim, as similaridades e diferenças entre a perceção de uma cor podem variar porque o cérebro é construído tanto pela informação genética como pelas experiências individuais adquiridas ao longo da vida. Aparentemente as cores são “vistas” de modo semelhante3 mas a experiência cromática pessoal pode interferir na relação sensi-

tiva, emocional ou simbólica que se tem com a cor.

Muitos aspetos cognitivos da visão cromática surgem ao nível cortical, resulta das características neuronais do processamento de cor. Por exemplo, as cores em plano (bidi- mensional) dependem do contexto em que são visualizadas - a cor castanha depende da composição espectral observada sobre um fundo claro, mas se visualizada sobre um fundo escuro vai parecer amarelada.

“Some colors are special, but not spectral: brown, for example, is orange light that is surrounded by something lighter. That is, you can make a brown patch by producing a spot of orange (any orange will do, spectral or mixture) and then surrounding it by a

2 Por vezes é a própria estrutura física de uma superfície que produz a cor que se vê, ou seja, o resultado é

uma cor estrutural que se obtém por um processo chamado “interferência construtiva da difração”. A cor estrutural difere da cor química pela ausência de pigmentos e é o resultado de efeitos ópticos superficiais, como acontece com as cores que vemos nas asas de uma borboleta.

3 A não ser que, como sabemos, haja alguma diferença na composição das classes de cones, faltando uma ou

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brighter light of any color. Similarly, maroon is red light surrounded by something lighter.” (Livingstone, 2002, p. 30)

A perceção de cores não depende unicamente do comprimento de onda do estímu- lo luminoso recebido mas do ambiente cromático onde este estímulo se apresenta, de como é interpretado pelas células pós-recetoras e finalmente pelo funcionamento do nosso cére- bro. Esta interferência cromática na perceção das cores tem outras consequências visíveis, nomeadamente a interação da cor e o impacto do contexto visual na perceção da cor, com que os pintores lidam e que já foi empiricamente identificado e catalogado (Albers, 2009 [1963]).

O primeiro requisito para a visão cromática é a retina, com diferentes fotorreceto- res, com distinta sensibilidade ou absorção espectral, responsáveis pela transformação do estímulo luminoso em estímulo neuronal. O segundo requisito é a presença na retina de pós-recetores neuronais que são capazes de produzir sinais cromáticos adequados a serem enviados para o córtex visual. O terceiro requisito é um mecanismo nervoso central que transforma os sinais cromáticos recebidos em espaço cromático dentro do qual um obser- vador normal experiencia as suas sensações, entre elas a experiência de cor.

5. 2 - Diagrama de síntese da visão cromática (desenho da autora).

Há muita informação sobre a neurofisiologia e a anatomia dos primeiros dois requi- sitos, as células fotorrecetoras e os pós-recetores neuronais, mas pouco se sabe realmente sobre o modo como esta informação é gerida pelo córtex cerebral, ou seja, como é que realmente passa de estímulo eletromagnético para a nossa experiência de cor (Conway et al., 2010).

Para se perceber cor tem de existir um estímulo físico que depois é interpretado subjetivamente pelo observador, pelo que o mesmo estímulo físico pode resultar em distin- tas experiências cromáticas. Esta dupla qualidade da cor, de ser um estímulo físico e o re- sultado de um processamento subjetivo do indivíduo, é um dos aspetos mais interessantes e distintivos e que torna tão complexa e rica a definição de cor.