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Três canais de processamento visual deixam a retina para chegar ao córtex visual via gânglio geniculado lateral (GGL). Cada um deles é associado a um circuito retinal específi- co com sinais adicionados ou subtraídos logo após abandonar os cones (Lee & Dacey, 1997).

Um dos canais transporta a informação dos cones M e L, pensa-se que esta infor- mação forma a base do canal de luminância (valor) e esteja envolvida na perceção de mo- vimento e intermitência visual e é pouco sensível ao matiz. Origina de uma classe específica de células ganglionares, as células parasol, e passa pelas camadas magnocelulares do GGL a caminho do córtex.

Um segundo canal transmite a diferença de sinal entre os cones M e L e forma o canal de deteção vermelho/verde. Começa nas células ganglionares anãs da retina e passa através das camadas parvocelulares do GGL.

O terceiro canal conduz a diferença de sinal entre os cones S e a soma dos cones M e L, é a base do mecanismo de deteção azul/amarelo. Começa nas pequenas células gangli- onares bi-extratificadas e tem projeções direcionadas às estruturas interlaminares do GGL, as camadas coniocelulares. As células coniocelulares compõem outro sistema e parecem

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possuir características intermédias entre os sistemas parvocelular e magno celular, em ter- mos de anatomia e fisiologia. O seu papel na perceção visual não é claro mas estudos em primatas parecem concluir que está relacionado com o sistema somatossensorial e envolve também a perceção de cor (Xu, et al., 2001).

Na literatura (Yoonessi & Yoonessi, 2011) há referências sobre a existência de mais 7 a 12 tipos de células ganglionares, mas aparentemente são menos frequentes e não apre- sentam camadas distintas no GGL.

5. 12 - Diagrama dos canais de informação das três classes de cones (desenho da autora).

Os sinais de luminosidade parecem seguir para a corrente de processamento visual parietal que tem a ver com a perceção de movimento e é dominado pelo sistema magnoce- lular. Os sinais cromáticos passam para a corrente de processamento visual temporal para o sistema parvocelular onde são processados, concorrendo para a perceção de cor e forma. O sistema coniocelular recebe informação do eixo azul-amarelo e parece contribuir tanto para os aspetos visuais espaciais e temporais como para o contraste de luminosidade e de cor (Xu et al., 2001).

A neurofisiologia e anatomia destes mecanismos periféricos cromáticos estão já es- tabelecidas com algum detalhe (Lee, 1996) (Yoonessi & Yoonessi, 2011).

Pensa-se que o gânglio geniculado lateral não altera substancialmente a informação de cor enviada pela retina mas não se sabe com rigor o que acontece no córtex cerebral.

É possível determinar a sensibilidade espectral do processo de canais oponentes de Hering (Lee, 2001) e isso implica que o nosso espaço percetivo cromático tem diferentes propriedades espectrais das informações recebidas nos sinais das diferentes classes de co- nes que deixam a retina e que utilizamos para distinguir subtis diferenças de cor.

Segundo Conway (2009), o processamento de cor envolve uma série de etapas que começam na retina com as três classes de cones. A atividade dos cones é comparada por oponência pelas células ganglionares da retina, estabelecendo a base do processo de opo-

cones

M+L magnocelular

M vs L

eixo vermelho-verde parvocelular S vs ML

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nência. Antes de chegar ao córtex, estes sinais passam através do GGL, e chegam à área V115 do córtex estriado. Na área V1 há células especializadas, com dupla oponência, que

comparam as respostas opoentes dos cones pelo espaço visual e processam o contraste e a constância de cor. As células de cor no GGL e na área V1 estão restritas à sintonização de cor segundo dois eixos, vermelho-ciano e azul-amarelo. As células de cor na área V1 estão aglomeradas nas cytochrome-oxidase blobs, as blobs enviam informação para a área V2 que por sua vez a projeta para o córtex infratemporal (IT). O ajuste de cor da população de células glob tende para o vermelho, verde, azul e em certa medida para o amarelo, os quatro mati- zes particulares. A fase final do processamento de cores ocorre no córtex IT, que se relaci- ona com os programas comportamentais que presumivelmente ajudam na modelação da tomada de decisões (Conway, 2009, p. 287).

Aparentemente diferentes partes do cérebro utilizam e processam distintos tipos de informação. A segregação da informação visual começa na retina onde as diferentes classes de células ganglionares recebem a informação dos fotorrecetores, através das células bipola- res, enviando estes dados para o cérebro, mas cada tipo de célula envia informação distinta formando sistemas de processamento paralelos e complementares (Dacey, 2000).

Livingstone divide o sistema sensorial, em particular o da visão, em dois sub- sistemas que designa por sistema where e sistema what, ou o sistema dorsal (where) e sistema ventral (what)16.

“The evolutionary older large-cell subdivision, which we share with other mam- mals, is responsible for our perception of motion, space, position, depth (three- dimensionality), figure/ground segregation, and the overall organization of the visual scene. I will refer to this system as the ‘where’ system. The small-cell subdivision is well developed only in primates and is responsible for our ability to recognize objects, including faces, in color and in complex detail. I will refer to this system as the ‘what’ system.” (Livingstone, 2002, p. 50)

A integração dos dois sistemas, where e what, permite a compreensão e interação com o meio (Livingstone, 2002, p. 50) e cada um responde a diferentes funções na perce- ção visual, a partir de dados recebidos do ambiente e com processamentos particulares e agindo em paralelo. Em resumo: o sistema where é importante para a locomoção, o movi- mento, perceção de profundidade e segregação figura/fundo; o sistema what, desenvolvido apenas nos primatas, é responsável pela capacidade de reconhecimento de objetos, incluin- do cor e detalhes complexos. O sistema where está relacionado com as células magnocelula- res e o sistema what com as células parvocelulares, mas recentes estudos têm apontado para

15 “O córtex visual primário (V1), corresponde à área 17 de Brodmann, localizada nos lábios da cisura calcari-

na, na face medial do lobo occipital (córtex estriado). O V1 é um segregador de sinais visuais no cérebro humano, encontrando-se numa relação dinâmica (e não estática) com as diferentes áreas visuais, enviando- lhes múltiplos sinais.” (Pereira et al., 2003, p. 113)

16 Aparentemente o sistema ventral é responsável pela perceção e caracterização de objetos e suas característi-

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a deteção de outro tipo de células, as coniocelulas, que implicam uma reflexão consequente desta teoria.

Aparentemente o sistema where é acromático, lida com informação de escalas de cinzento, é importante para as variações de luminosidade. Lida com a perceção de movi- mento, profundidade, direção, ajuda a compreender os objetos, mesmo os complexos, co- mo um todo. Segundo esta teoria, informação como a perceção de movimento ou profun- didade dependem apenas da informação acromática (mais ou menos preto) que é percecio- nada no nosso ambiente.

O sistema what é sensível ao matiz calcula a cor das superfícies, utiliza a diferença entre as cores para detetar os limites das configurações ou formas e para reconhecer o ma- tiz. Sabe-se que deve estar relacionado com o reconhecimento de objetos, pessoas, animais e matizes. Há indícios de que haver uma subdivisão deste sistema, possivelmente com um subsistema para as cores e outro para as formas (Livingstone, 2002), mas esta especializa- ção pode ser ainda mais específica já que o sistema de cores também está separado do sis- tema de reconhecimento de faces (Lafer-Sousa & Conway, 2013).

Esta organização em dois sistemas de processamento paralelos era útil para a com- preensão e organização do sistema visual mas hoje é considerada uma simplificação do processo. Recentes estudos17 têm demonstrado que algumas áreas do sistema dorsal exibem

seletividade para formas bidimensionais simples comparáveis às exibidas pelo sistema ven- tral18, pelo que a sua separação não é sustentável. Aparentemente ambos os sistemas pro-

cessam informação sobre orientação, tamanho, configuração e suas relações espaciais, e são ambos moldados pela atenção. No entanto, cada sistema parece lidar com a informação de modo distinto: o sistema ventral transforma a informação visual em representações perce- tivas que incorporam as características duradouras dos objetos e suas relações espaciais. As transformações visuais realizadas no sistema dorsal parecem utilizar informações instantâ- neas sobre a disposição dos objetos dentro de quadros de referência egocêntricos e são responsáveis pelo controlo de ação direcionada (AA.VV., 1999, p. 873).

A nível cortical o que parece ser consensual é que há células especializadas em cor, de acordo com o que acontece com os restantes atributos visuais, de facto os neurónios parecem ter preferência por matizes em particular e a sua sintonização é estreita e específi- ca. Células especializadas em cor parecem estar concentradas na área do cérebro designada por V4, o centro cortical de cor, mas há outras regiões com alta sensibilidade à cor como as áreas V1 e V2. No entanto, estudos recentes sugerem que a discriminação de cor, a cons- tância cromática e a memória de cor não parecem estar correlacionadas em exclusivo com

17 Citado de Sereno, M. I. and Tootell, B. H. (2005) From monkeys to humans: what do we now know about

brain homologies? Curr. Opin. Neurobiol. 15, 135-144.

18 A literatura científica confirma que há novas teorias que colocam em causa esta organização do sistema

visual: “recent findings from a broad range of studies in both humans and monkeys has forced a reinterpreta- tion of the division of labor between the two streams (for review, see Jeannerod 1997; Milner and Goodale 1995).” (AA.VV., 1999, p. 874)

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o córtex estriado, pelo que poderão, como outros atributos visuais, depender da atividade neuronal de várias áreas corticais. Ou seja, a perceção da cor é complexa e poderá ser pro- cessada por diversas áreas no cérebro humano.

5. 13 - Gráfico do resumo do processamento de cor (Conway, 2009, p. 285).