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Sobre a Formação Contínua em Portugal – Breve Abordagem ao Enquadramento Legal

3. Formação ética de educadores e professores

3.2. Sobre a Formação Contínua em Portugal – Breve Abordagem ao Enquadramento Legal

A Formação Contínua de Professores é enquadrada legalmente pela primeira vez em Portugal na Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE), Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, mais especificamente no artigo 35.º, que regulamenta genericamente os princípios básicos. De acordo com o disposto na LBSE, educadores, professores e outros profissionais da educação têm direito à formação contínua, sendo que esta deve ser o mais diversificada possível, contribuindo para completar e actualizar os conhecimentos e as competências profissionais e possibilitar a mobilidade e a progressão na carreira. A LBSE refere ainda que a formação contínua deve realizar-se num regime de cooperação entre as instituições de formação inicial e os estabelecimentos em que os profissionais da educação exerçam as suas funções.

Treze anos depois da primeira regulamentação da formação contínua de professores em Portugal é publicado o Regime Jurídico da Formação Contínua de Professores (RJFCP)

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pelo Decreto-Lei n.º 249/92, de 9 de Novembro. Especificamente criado para legislar a formação contínua de professores em Portugal, este documento tem também como objectivos: melhorar a qualidade do ensino e das aprendizagens; aperfeiçoar as competências profissionais dos docentes nos diversos domínios da actividade educativa; incentivar a auto-formação, a investigação e a inovação educacional; adquirir capacidades, competências e saberes que favoreçam a construção da autonomia das escolas e dos seus projectos educativos; estimular os processos de mudança ao nível das escolas e dos territórios educativos em que estas se inserem susceptíveis de gerar dinâmicas formativas; e apoiar programas de reconversão profissional, de mobilidade profissional e de complemento de habilitações.

Os objectivos definidos em ambos os documentos legais acima mencionados concorrem para a necessidade de uma constante actualização dos conhecimentos e práticas dos professores e estimulam a realização de uma formação idealmente mais participada, consciente e autónoma. Tanto a LBSE como o RJFCP têm implícita a importância da reflexão em torno das práticas pedagógicas necessárias para a construção de um ensino mais eficaz.

De acordo com o disposto no art. 6.º do RJFCP (com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.o 15/2007 de 19 de Janeiro) constituem áreas de formação contínua: a) ciências de especialidade que constituam matéria curricular nos vários níveis de educação e ensino, b) ciências da educação, c) prática de investigação pedagógica e didáctica nos diferentes domínios da docência e d) formação ética e deontológica. O plano de formação que nos propomos elaborar insere-se, portanto, na formação da alínea d) formação ética e deontológica do disposto no referido artigo.

Os arts. 33.º e 34.º do Capítulo V do referido documento legal regulamentam os direitos e deveres dos formandos. De acordo com o disposto são direitos dos formandos: a escolha das acções de formação que maior adequação encontrem em relação ao seu plano de desenvolvimento profissional e pessoal, a participação na elaboração do plano de formação do centro a que se encontra associada a escola a que pertence, a cooperação com os outros formandos na constituição de equipas que desenvolvam projectos ou promovam ciclos de estudos, a contabilização dos créditos das acções de formação que frequentem, o benefício das dispensas de actividade para frequentar as acções de formação contínua e a frequência em regime gratuito das acções de formação de carácter obrigatório.

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Os formandos têm os deveres de participar nas acções de formação contínua que não integrem os programas considerados prioritários para o desenvolvimento do sistema educativo e das escolas e de custear as acções de formação contínua que não tenham um carácter obrigatório.

3.2.1. Do lugar da formação ética no enquadramento legal da formação contínua em Portugal

A competência ética está, naturalmente, presente na legislação portuguesa, como adiante se verá, embora partilhemos da opinião de Estrela & Marques (2009) de que pouco ainda se fez no que respeita à formação de educadores e professores neste domínio.

Antes de passarmos à revisão da legislação portuguesa no que às recomendações no âmbito da ética e deontologia diz respeito, importa abrir um parêntesis para relembrar que o estudo que aqui apresentamos foi desenvolvido com um grupo de educadoras de infância, pelo que a análise que se segue refere-se principalmente às competências e objectivos definidos para o pré-escolar.

A Lei de Bases do Sistema Educativo, Lei 46/86, de 14 de Outubro (revista pela Lei nº 49/2005 de 30 de Agosto) apresenta, no artigo 5.º da Secção I – Educação Pré-escolar, oito objectivos, de entre os quais consideramos aqui merecerem destaque os seguintes:

a) Estimular as capacidades de cada criança e favorecer a sua formação e o desenvolvimento equilibrado de todas as suas potencialidades;

d) Desenvolver a formação moral da criança e o sentido da responsabilidade, associado ao da liberdade

Ora, estes dois objectivos parecem-nos da maior pertinência, pois como afirma Estrela (2009), se “a responsabilidade é a obrigação de assumir a autoria dos actos livremente cometidos e de arcar com as suas consequências, o professor além de toda a gama de responsabilidades como pessoa inserida numa sociedade politicamente organizada onde desempenha múltiplos papéis, tem também a responsabilidade inerente ao desempenho das suas funções profissionais, entre as quais, a de contribuir para a educação dos seus alunos na responsabilidade”. D‟Orey da Cunha (1994) vai ao encontro da ideia defendida pela autora ao considerar que só será autêntica a acção moral se realizada com sentido de responsabilidade, não existindo esta, por sua vez, na ausência de liberdade. Neste sentido, encontramos a responsabilidade como um dos princípios

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fundamentais na orientação da conduta profissional do professor. Uma responsabilidade que implica um “profissionalismo dinâmico que se desenvolve na interacção com os alunos e a instituição escolar, tornando os professores co-responsáveis pelo desenvolvimento dos alunos e proporcionando-lhes as ferramentas necessárias para a realização pessoal e bem-estar.” (Oliveira, 2008).

Da leitura que fazemos do Decreto-lei n.º 241/2001 de 30 de Agosto, Perfis específicos

de desempenho profissional do educador de infância e do professor do 1.º ciclo do ensino básico, verificamos que este, no âmbito da relação e da acção educativa,

perspectiva, por exemplo, que o educador de infância:

“a) Relaciona-se com as crianças por forma a favorecer a necessária segurança afectiva e a promover a sua autonomia;

c) Fomenta a cooperação entre as crianças, garantindo que todas se sintam valorizadas e integradas no grupo;

e) Apoia e fomenta o desenvolvimento afectivo, emocional e social de cada criança e do grupo;

h) Promove o desenvolvimento pessoal, social e cívico numa perspectiva de educação para a cidadania.”

A assunção destas responsabilidades dos educadores de infância reflecte, em nosso entender, uma preocupação já antiga presente na Lei n.º 5/97 de 10 de Fevereiro (lei-quadro que consagra o ordenamento jurídico específico da educação pré-escolar), traduzida logo ao abrir do documento pelos nove objectivos da educação pré-escolar de entre os quais, destacamos o primeiro por nos parecer suficientemente abrangente:

a) Promover o desenvolvimento pessoal e social da criança com base em experiências de vida democrática numa perspectiva de educação para a cidadania.

Um outro documento legal cuja análise se afigura pertinente por se dedicar exclusivamente à educação pré-escolar é a Lei-quadro n.º 5/97 de 10 de Fevereiro que define como um dos princípios gerais que a educação pré-escolar, sendo a primeira fase da educação básica na educação da criança, deve estabelecer estreita cooperação com a família, complementando a sua acção educativa e, neste sentido, favorecer a formação e

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o desenvolvimento equilibrado da criança procurando a sua inserção plena na sociedade “como ser autónomo, livre e solidário” (artigo 2.º, capítulo II).

Mais recentemente, o Regime Jurídico da Habilitação Profissional para a Docência na Educação Pré-escolar e nos Ensinos Básico e Secundário (Decreto-Lei nº43/2007, de 22 de Fevereiro) regulamenta a Formação Cultural, Social e Ética como uma das componentes de formação (art.º 14, 1d), referindo mais especificamente, a preparação para as áreas curriculares não disciplinares e a reflexão sobre as dimensões ética e cívica da actividade docente" (artº.14, 5c).