• Nenhum resultado encontrado

Sublevação indígena

No documento Historia Do Rio Grande Do Norte (páginas 70-79)

CAPÍTULO III – PRESENÇA HOLANDESA

2. Sublevação indígena

Havia uma ocupação do território brasileiro que se processava de forma mais lenta e mais modesta do que à que obedecia à lógica militar que predominou no nal do século XVI e início do século XVII. Vilas foram fundadas no litoral entre a Paraíba e a Bahia. No Rio de Janeiro processou-se a exploração das áreas mais ao norte (WEHLING, 1994, p. 113). A coroa portuguesa nunca desistiu de encontrar ouro no Brasil. Se a Espanha encontrara nas suas colônias americanas, Portugal haveria também de encontrar. Por quase dois séculos, dezenas de expedições se embrenhavam pelo interior do Brasil em busca de metais e pedras preciosas. Outras expedições penetravam no interior para prear índios, ação que desde 1537, conforme as Bulas Universibus Christi delibus e

Sublimis Deus, era rechaçada pela Igreja Católica. Os documentos papais reconheciam que índios tinham uma alma imortal e proibia, “sob pena de excomunhão, a escravatura indígena no Novo Mundo”. (LOPES, 2003, p. 89).

 A pecuária foi também um elemento de conquista. No início da colonização, o gado era criado no litoral, próximo aos engenhos. Aos poucos, o gado que vivia solto foi sendo levado para o interior, abrindo uma nova fronteira. Muitos estados do Nordeste foram colonizados por criadores de gado. Em poucos anos, a pecuária nordestina se expandiu, criando uma área de atrito com os índios. Existiam bandeiras que procuravam metais e pedras preciosas (bandeiras de prospecção) e bandeiras que preavam índios (bandeiras de apresamento). As bandeiras de apresamento penetravam no interior do Brasil para prender índios e vendê-los como escravos para os agricultores e criadores de gado de São Paulo e regiões vizinhas. Esse comércio de mão-de-obra indígena teve um aumento signicativo durante domínio holandês, devido à diculdade do comércio negreiro nesses períodos. A expulsão dos holandeses e a crise da empresa açucareira levaram à decadência das bandeiras de apresamento.

 Após o m da União Ibérica e a expulsão dos holandeses, a coroa portuguesa implementou um processo de centralização administrativa no Brasil. O principal objetivo de Portugal era compensar  as perdas sofridas no resto de seu império colonial. Isso só seria possível com o aumento da atividade econômica. Entretanto, esse ímpeto de arrecadação de impostos português coincide com a crise da empresa açucareira. Relatório elaborado em 1657 pelo Conselho da Fazenda dá conta da precariedade da economia portuguesa:

 A Índia (...) acha-se hoje reduzida miseravelmente a seis praças principais, que são: Moçambique, sem defesa; Goa, pouco segura; Diu, arriscada; Cochim, pendente da amizade do rei; Columbo, invadida pelos Holandeses; Macau, sem comércio, desesperada (...) Angola, nervo da fábricas (actividades) do Brasil, necessita de prevenção contra os desejos que os Castelhanos, Ingleses, Holandeses têm de nos tirarem os negros e os levarem às Índias, às Barbadas e outras partes. (...) O Brasil, sustância principal desta coroa, pede socorros, e são- lhe necessários (...). Portugal nalmente se acha sem forças, nem ânimo para se sustentar, assim porque a Fazenda real, totalmente exausta nos juros, tenças, ordenados e outras consignações do bem público, não só falta para partidas grossas (grandes despesas) e para pagar o que deve de justiça, mas ainda para despesas miúdas, nas ocasiões mais principais (Apud SARAIVA, 1979, p. 226- 227).

Era necessário, portanto, um incremento em outros setores produtivos. Não se podia mais limitar à produção de açúcar, visto que os lucros dessa atividade baixaram “até metade por efeito da perda do monopólio, ainda mais porque os holandeses obtiveram uma produção mais racional (aproveitando até o bagaço) e de custo menor” (LOPEZ, 1991, p. 56). A procura por metais e

pedras preciosas ganhou ânimo novo, com a freqüente organização de bandeiras prospectoras. No Nordeste expandiu-se a pecuária, que entrou pelo interior da região, desbravando-o e gerando a animosidade dos índios. Segundo Lopes (2003, p. 90-91), no início da colonização do Brasil, as relações entre portugueses e indígenas eram amistosas. No entanto, à medida que a política colonizadora portuguesa avançava com a montagem do sistema de capitanias hereditárias, aumentou a pressão pela necessidade de escravizar os índios. Para tanto, o Estado português concedeu “plenos poderes aos Donatários para o cativeiro dos índios”. Somente a partir de 1549, quando da implantação do Governo-Geral e muito possivelmente já movido pela inuência das bulas papais de 1537, “houve uma modicação legal nas relações entre colonos e índios”, com as novas diretrizes da ação portuguesa no Brasil estabelecendo, entre outras coisas, que a terra do Brasil fosse povoada a “ proveito dos naturais dela”. O Regimento dos Governadores, trazido por Tomé de Souza, primeiro Governador-Geral do Brasil, proibia a escravização e a utilização dos índios como mão-de-obra, bem como a guerra contra eles sem licença do Governador, visto que, como dizia o Regimento, “o principal m por que se manda povoar o Brasil é a redução do gentio à fé católica”.

 A política missionária administrada pela Igreja e pelo Estado português, através da organização de Missões, aldeamentos indígenas criados e organizados por religiosos nos locais próximos aos que os índios se encontravam, geralmente afastados dos povoados luso-brasileiros, foi outro fator que desestabilizou os sertões. No entender da antropóloga Berta Ribeiro (apud LOPES, 2003, p. 92), as motivações dos missionários católicos eram basicamente três: converter  os índios à fé católica, salvando-lhes as almas; auxiliar no processo de colonização, garantindo a paz e conseguindo trabalhadores; sustentar a Ordem religiosa a qual fossem ligados.

Os missionários deveriam atuar, segundo Baêta Neves (apud LOPES, 2003, p. 93), pelo “convencimento”, tentando estimular por meios pacícos os ensinamentos cristãos. Se esse caminho falhasse, deveria então ser empreendida a “guerra justa” como “instrumento de salvação da alma”. Os jesuítas foram os pioneiros na ação catequética,

espalhando-se pela Bahia, pela Capitania de São Vicente e todo o restante do litoral. Nesse primeiro momento, utilizavam-se das missões volantes, isto é, os jesuítas visitavam as fazendas, engenhos e as aldeias indígenas pregando a doutrina cristã e tentando converter os indígenas, que poderiam permanecer  nas suas aldeias originais ou serem reduzidos às Aldeias de El-Rey. Pela sua importância religiosa e colonial, as missões volantes foram encaradas como a principal atividade dos missionários nas colônias, sendo os Colégios, inclusive, formados para servir de base de apoio a elas (LOPES, 2003, p. 94).

O processo de colonização avançou por todo o litoral norte e em direção ao interior do país, o que levou também à expansão da fronteira missionária. A Amazônia foi denitivamente incorporada em território brasileiro. O interior do Nordeste foi devassado e conquistado. A região do Planalto Central começou a ser explorada. Todo esse processo contribuiu para o aumento do território brasileiro, mas gerou atritos com os indígenas. Segundo Andrade (1981, p. 17), o processo de ocupação do oeste da capitania do Rio Grande deu-se concomitantemente ao processo de ocupação da costa oriental do Brasil com a empresa açucareira. Foram “os senhores de engenho de Pernambuco que estimularam a implantação de fazendas de criação de gado na costa setentrional, utilizando posteriormente os vales do Piranhas-Açu e do Mossoró-Apodi para penetrar para o interior”.

Desde a conquista da capitania do Rio Grande é notada a presença missionária, como pudemos perceber pela presença dos jesuítas Gaspar de Samperes e Francisco Lemos e dos frades franciscanos João de São Miguel e Bernardino das Neves, todos egressos

do Colégio Jesuíta de Olinda e do Convento Franciscano, que já tinham contato com os Potiguara da Paraíba, inclusive com a formação de aldeamentos nas cercanias de Nossa Senhora das Neves (atual João Pessoa). A presença desses religiosos nas expedições de conquista advinha da necessidade de se ter um meio de contato com os indígenas e também uma assistência religiosa aos portugueses (LOPES, 2003, p. 99).

Quando Antônio Vaz Gondim, novo governador de 1656 a 1662, assumiu o comando da capitania do Rio Grande, dois anos após a expulsão dos holandes es, uma de suas providências mais importantes foi, logo após o restabelecimento do senado da câmara de Natal, em 1659, conclamar  os antigos moradores a retornar às suas antigas roças e fazendas mais de 150 colonos. “Na sua administração”, diz Tarcísio Medeiros (1973, p 50), “a Capitania começou a povoar-se”, retomando a obra colonizadora iniciada antes da invasão holandesa, “agora em condições mais favoráveis, porque o interior havia sido em grande parte devassado”.

Até 1660, não havia ato prescrevendo normas uniformes à ação dos capitães-mores, que, sem uma legislação que limitasse o seu poder, abusavam da autoridade que lhes era conferida. Em 1º de outubro daquele ano, D. Vasco Mascarenhas, Conde de Óbidos, Vice-Rei37do Brasil, expediu

um regimento geral, que regulamentava a atuação dos Capitães-mores.

Quando Valentim Tavares Cabral assumiu a capitania do Rio Grande, para uma administração que se estendeu de 1663 a 1670, um dos artigos do regimento proibia a concessão de sesmarias. Mas ele as fez, não abrindo mão da competência até então ass egurada aos seus antecessores. Ainda assim, o movimento colonizador não avançava sertão adentro, restringindo-se ao litoral. Somente na administração de Antônio de Barros Rego a colonização avançou pelo sertão, com os colonos penetrando no interior da capitania em busca de vantagens proporcionadas pela pecuária. Cresce a criação de gado no sertão, mas os colonos têm de conter as freqüentes rebeliões dos índios, que aumentam substancialmente com o povoamento dos sertões, pois a penetração através dos rios Piranhas-Açu e Apodi-Mossoró encontrou um sertão ocupado por “grupos indígenas aguerridos que, refugiados nas serras, resistiram por muitos anos ao invasor (Guerra dos Bárbaros), a ponto de se tornar necessário a vinda de bandeirantes” (ANDRADE, 1981, p. 17).

 A vitória sobre os holandeses teve seu preço, pois muitos ociais que participaram das batalhas conseguiram concessões de sesmarias nas regiões que estiveram sob domínio batavo. Segundo Monteiro (2000, p. 57), membros da elite colonial, como João Fernandes Vieira, senhor  de muitos engenhos na capitania de Pernambuco, que trabalhara para a WIC e depois zera parte dos que a combateram, recebeu glebas de terra no vale do rio Ceará-Mirim e na ribeira do rio Açu, concedidas, respectivamente, em 1666 e 1680.

Os potiguares, índios do litoral, pertenciam à nação tupi-guarani. Esses índios, através da liderança de seus chefes, entre os quais destaca-se Poti, eram aliados dos portugueses. Sua importância na colonização foi tão acentuada que o governo português concedeu ao índio Poti,  já cristianizado, o título de D. Antônio Felipe Camarão. Sua mulher, Clara Camarão, chegou a

arregimentar índias para combater os holandeses. Os índios que não fossem da nação tupi-guarani eram genericamente chamados de tapuias. Os cariris eram tapuias famosos pela sua ferocidade.38

Medeiros (1973, p. 54-55) divide assim os grupos indígenas:

a) potiguares, que ocuparam todo o litoral, da Paraíba ao Ceará: divididos em potiguares legítimos, paiaguás, jundiás e guaraíras.

37Nova denominação de Governador-Geral.

38Citando Estevão Pinto, Tarcísio Medeiros (1973, p. 54) diz que cariris e tapuias não correspondem à mesma categoria

b) cariris, que viviam no interior: divididos em ariús ou areias, panatis, curemas, icós, pebas, caicós, paiacus, pajeús, janduís, pegas, moxorós, canindés, caborés, pacajus e paiins.

Tradicionalmente, potiguares e cariris eram inimigos. Enquanto os primeiros mantinham relações de amizade com os portugueses, os cariris eram aliados dos holandeses. Quando foram recambiados do sertão para o litoral por ordem de Maurício de Nassau, governador do Brasil holandês, liderados e incentivados por Jacob Rabi, os cariris, principalment e os janduís, participaram efetivamente dos principais morticínios ocorridos na capitania do Rio Grande. A Guerra dos Bárbaros ou Confederação dos Cariris “foram em grande medida o resultado imediato da desestabilizaçã o das alianças militares rmadas no período mais agudo do conito Portugal-Holanda e do realinhamento conseqüente destes mesmos grupos” (PUNTONI, 2002, p. 57-58).

Mas convém ressaltar que nem todos da nação potiguar estiveram ao lado dos portugueses, como bem lembra Tavares de Lyra (1998, p. 140): “Triunfantes os amengos, uma parte dos potiguares acompanhou Camarão, combatendo ao lado dos portugueses, e outra parte, obedecendo às inspirações de Pedro Poti e Antônio Paraupaba, seguiu os vencedores, aos quais também se aliaram os tapuias”. Porém, foram mesmo os tapuias os que, segundo Suassuna e Mariz (2002, p. 99), mais se bateram contra a expansão colonizadora portuguesa e numa luta sem trégua contra a escravidão, com destaque para os índios janduís, caracarás, areias, pegas, paiacus e canindés.

 A escravização dos indígenas era prática comum no Brasil, sendo necessária uma regulamentação. A Mesa de Consciência e Ordem decidiu, em 1565, que a prática de escravizar os índios deveria ser restringida aos casos de guerra justa, a saber, quando não aceitassem de bom grado a submissão às autoridades lusitanas. A aplicabilidade de tal determinação era difícil e até o século XVI essa determinação virou letra-morta.

Somente no início do século XVII a política portuguesa para os indígenas começou a ser  implementada tal qual o que fora determinado pela Mesa de Consciência e Ordem, quando em 1609 foi criado, no Brasil, uma seção do Tribunal de Relação, responsável pelo controle das relações políticas, jurídicas e sociais na colônia, o que signicava, entre outras coisas, fazer cumprir a garantia da liberdade aos índios, proibindo a sua escravização e exigindo dos colonos pagamento quando os mesmos lhes prestassem serviços. À Igreja, com destaque para a Ordem dos Jesuítas, caberia a função de catequizar, criar e organizar os aldeamentos e administrar as terras e os serviços dos índios. Como os colonos reagiram com veemência contra essa determinação, em 1611 o governo retrocedeu e concedeu-lhes o direito de escravizar os índios capturados em guerra justa. Começava aí um embate sério entre os colonos laicos e os colonos religiosos.

Após a expulsão dos holandeses, começou a efetiva ocupação do interior da capitania, incentivada pelo novo administrador Vaz Gondim, empurrando os indígenas ainda mais para o interior, escravizando-os e matando-os. Dessa forma, o interior da capitania foi sendo povoado, abrindo-se várias fazendas de gado. Essa incursão povoadora eliminava a possibilidade de os índios serem abastecidos com armas e munição por estrangeiros, como havia acontecido com os holandeses. À medida que as cidades e vilas iam se espalhando pelo território brasileiro, as autoridades coloniais passaram a atuar no sentido de garantir “uma melhor utilização e repartição dos solos coloniais, visando à manutenção da oferta de alimentos”, tendência que levou a uma política de maior distribuição de terras onde se pudesse criar o gado solto. A conseqüência imediata dessa ação “foi a interiorização na distribuição das terras” a “grandes senhores assentados em outras capitanias adjacentes” e a “alguns soldados que combateram os holandeses, a quem o Rei de Portugal prometera ‘remunerar’ pelos seus serviços, com terras a serem distribuídas nas capitanias do Norte antes ocupadas pelos invasores” (LOPES, 2003, p. 129-130).

A expansão portuguesa era feita em detrimento dos índios, que perdiam suas terras, eram mortos ou escravizados, mas não sem resistência. Esse processo de ocupação territorial do nordeste, batizado de “rush fundiário” por Francisco Carlos Teixeira da Silva (apud LOPES, 2003, p.

130) que “teve seu ápice entre os anos 1670 e 1690”. A expansão feita dessa forma, sem nenhum “respeito aos bens dos índios, que ainda eram preados para o eito escravo”, foi elemento essencial para o surgimento dos primeiros atritos, “o correr de sangue de uma guerra que, por espaço de cinqüenta anos”, gerou “violências, extorsões, vilipêndio e rapinagem”. Junte-se a isso “o ódio latente do colono branco aos nativos da nação Cariri, habitantes do interior, aliados aos batavos e responsáveis pelas atrocidades de Cunhaú, Ferreiro Torto, Uruaçu, Guaraíras”, e teremos o fermento que fez nascer e crescer o conito (MEDEIROS, 2001). É bom ressaltar que a resistência indígena à colonização lusitana fez-se presente desde o início, aumentando à medida que se estabelecia o avanço português sertão adentro. No Nordeste brasileiro havia “um bloco de terras habitado por  indomáveis e vultosas tribos” que, furiosamente, resistiam “ao avanço da conquista branca”. De todos os “tapuias distribuídos por numerosas tribos, os mais célebres parecem ter sido os janduins que os cronistas apontam como terríveis e ferozes adversários dos conquistadores”. Em 1662, a rainha D. Luísa, que então exercia a regência em nome de D. Afonso VI, expediu uma carta régia determinando que se deveria fazer guerra “aos ‘bárbaros janduins’ do sertão” paraibano, pois havia o receio de, “valorosos como eram, facílimo seria que se convertessem em novos araucanos como os das Índias de Castela” (TAUNAY, 1975, T. 1, p. 151-151).

Percebe-se nos documentos que garantiam a doação de terras aos colonos o mesmo padrão. Eles reiteram a idéia de um sertão “vazio”, ainda que “ocupado” por índios, como provam os documentos citados no trabalho de Fátima Lopes. Isso não constituiu, segundo a eminente professora, “uma incongruência no pensamento colonial”, tendo em vista que os colonos só admitiam “a propriedade régia no Brasil, e, não “sendo os índios tapuias vassalos do rei de Portugal, não poderiam ter direito à posse delas, como os colonos portugueses, mesmo sendo de conhecimento geral que os índios eram os seus habitantes primitivos” (2003, p. 131-132).

Como haviam sido armados pelos holandeses, os índios passaram a atacar as fazendas de gado, incendiando-as, matando o gado, os vaqueiros e os plantadores do sertão, dominando as áreas de Açu, Apodi e Ceará Mirim. A insegurança era tanta que provocou um verdadeiro êxodo dos colonos. Houve momento “em que até a Fortaleza dos Três Reis Magos, baluarte de Natal, quase cou sem guarnição”. Correram notícias de que um “verdadeiro exército tapuia” ameaçava atacar  Natal (TAUNAY, 1975, T. 1, p. 164).

Tavares de Lyra diz que no momento em que eclodiu a rebelião indígena,

os potiguares se encontravam nas várzeas próximas ao litoral e as demais tribos dominavam, entre outras, as terras banhadas pelo Apodi, Upanema, Espinharas, Seridó e alto e baixo Piranhas. Grande número de potiguares, provavelmente os que tinham servido no exército libertador ou deles descendiam, secundou os esforços das autoridades para jugular a rebelião.

Os tapuias, porém, a ela aderiram, em sua quase totalidade, desde o primeiro momento. Só muito depois e ao se tornar impossível a resistência foi que começaram as defecções (1998, p. 140).

Lembra Taunay (1975, T. 1, p. 152) que os tapuias estavam exasperados. Recordavam das violências praticadas por João Fernandes Vieira quando de seu governo na Paraíba (1655-57).  Ademais, a ocupação dos sertões e a resistência dos tapuias não foi fato isolado. No Recôncavo

Baiano, entre os anos de 1651 e 1679, “as guerras contra os tapuias que ‘assolavam’ o Recôncavo Baiano serviram de campo de provas para novas estratégias que determinariam a forma de extermínio que seria praticado nos séculos vindouros” (PUNTONI, 2002, p. 44).

Recém saída de um período de destruição, a capitania do Rio Grande passou por um longo período de violências. O ano de 1687 foi o que “os levantes tapuias ganharam radicalidade”,

principalmente em “Pernambuco e capitanias anexas”, casos do Rio Grande do Norte e do Ceará (PUNTONI, 2002, p. 44).39 Essa luta, conhecida como Guerra dos Bárbaros ou Confederação dos

Cariris, durou aproximadamente 50 anos e contribuiu para extinguir toda uma raça. Eclodiu na administração de Pascoal Gonçalves Carvalho que, sem condições de enfrentá-la, foi substituído no comando da capitania. Em 1688, o governo chegou a contratar a Companhia do Terço dos Paulistas, comandada pelo experiente bandeirante Domingos Jorge Velho, que aqui permaneceu combatendo por longo período os índios rebelados sem, contudo, vencê-los.

Vamos conferir o relato de Câmara Cascudo sobre o levante:

Em agosto de 1685 os indígenas da região do Açu, especialmente janduís, movimentaram-se hostilmente. Em paz realmente nunca tinham vivido. Vários Capitães-Mores anteriores foram obrigados a ir aquietar o indígena, num e noutro ponto, com a espada na mão. Em fevereiro de 1687 a situação estava declarada. Os indígenas corriam incendiando, matando o gado e os vaqueiros e plantadores do sertão. (...) Mais de cem homens mortos, gadaria dizimada, incêndios, depredações. (...) Em dezembro os indígenas estão senhores e possuidores das ribeiras do Açu e do Apodi e chegam ao Ceará-Mirim, cinco léguas de Natal (984, p. 97).

Os conitos não tardaram. Do sertão de Pernambuco, mas principalmente “no Rio Grande do Norte, dominavam os índios janduís, “a mais valorosa e pertinaz na sua defesa, e ódio aos Portugueses (ERNESTO ENNES, apud HOLLANDA, 1993, p. 25). A nova política portuguesa de aldear os indígenas não foi muito bem recebida, tendo em vista a limitação territorial das novas

No documento Historia Do Rio Grande Do Norte (páginas 70-79)