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Superfície e condomínio edilício no Brasil

239 GIORGI, op. cit. p.369.

240 GIORGI, op. cit., p.369 241 Ibid. p. 370.

Diana Coelho Barbosa, em estudo da superfície logo após a sua entrada no ordenamento jurídico brasileiro, buscou diferenciar o direito de superfície do condomínio. Segundo a autora, no direito de superfície, os poderes do domínio incidem totalmente apenas sobre a parcela destacada do imóvel pela concessão, seja a coisa, a superfície ou o subsolo. No condomínio pro indiviso, por outro lado, não existe este fracionamento, os condôminos são titulares de cota ideal sobre a coisa242.

Em outras palavras, não há exercício dominial simultâneo sobre a coisa pelo proprietário e pelo superficiário. Após a concessão, ambos os direitos são exercidos de forma autônoma e independente sobre parcelas distintas da propriedade imobiliária, o que não ocorre no condomínio, onde existem coproprietários podendo exercer a totalidade dos poderes sobre uma mesma coisa.

Obviamente, quando se trata de condomínio ou superfície, está-se diante da coexistência de mais de uma titularidade recaindo sobre a propriedade imobiliária. Independentemente de a divisão ser por fração ideal, destacamento do implante ou de um dos três níveis desta propriedade, existem limites ao exercício dos poderes que visam preservar a relação jurídica em ambas as situações.

No direito de superfície, os limites podem ser acordados no contrato de concessão, instrumento em que os contratantes têm liberdade de definir os contornos desta coexistência de direitos. A própria legislação traz como hipótese de extinção da concessão superficiária, dar destinação diversa da que foi acordada ao imóvel.

Já no condomínio pro indiviso os limites não são tão delineados, uma vez que cada condômino pode se comportar como dono da coisa na totalidade, podendo praticar atos jurídicos que não sejam incompatíveis com a indivisão, como a alienação da coisa por exemplo. Por outro lado, havendo ameaça ou lesão ao direito, qualquer dos co-proprietários pode agir em defesa do direito, como dono da coisa comum, independentemente da cooperação dos demais.

No tocante à sobreelevação, é a figura do condomínio edilício, entretanto, que merece mais atenção, devido à sua semelhança prática e proximidade no que tange o seu regime jurídico, devendo-se inclusive, analisar até que ponto a existência da relação jurídica de sobreelevação está atrelada ao regime jurídico da propriedade horizontal e se sua prática seria viável sem este.

242 BARBOSA, op.cit. p. 128

Diana Coelho Barbosa quando analisa o direito de superfície em comparação ao direito de superfície chega à seguinte conclusão243:

O que os diferencia, porém, é que na propriedade em planos horizontais embora haja divisão material em relação às construções, existe comunhão quanto ao terreno (solo) sobre o qual está erguido o edifício, o que não ocorre na superfície, já que a propriedade do solo é de titularidade exclusiva do dominus soli. Em outras palavras, a propriedade em planos horizontais baseia-se no princípio da comunhão do solo.

A observação da autora, especialmente no tocante à proporção pro indiviso no condomínio edilício, suscita alguns questionamentos acerca da compatibilidade da relação jurídica superficiária com origem na sobreelevação e o regime jurídico do condomínio edilício ou propriedade horizontal, que nas legislações estrangeiras aparece como regra comum a se aplicar à sobreelevação em direito de superfície.

Pois bem, no condomínio edilício, existe um regime de propriedade híbrido, comportando frações sobre as quais recaem a propriedade exclusiva, que podem ser gravadas e alienadas e frações que se submetem ao domínio indivisível de todos os condôminos pela razão de cotas ideais.

Isto é, de acordo com o art. 1331 do CC/02, cada condômino é titular exclusivo de unidade autônoma, que pode ser um apartamento no edifício residencial ou loja em edifício comercial, e titular de fração ideal das áreas comuns, que abrangem elevadores, pátios, área de lazer, dentre outras.

O art. 1.332 do Código Civil dispõe que o ato de instituição é ato inicial de constituição do condomínio. Já a Convenção de Condomínio é uma norma interna onde são estipulados os direitos e deveres dos condôminos. Para obter validade e eficácia, necessita de aprovação de pelo menos 2/3 das unidades. Atingido o quórum, aplicar-se-á a todos os condôminos sem distinção.

Dentre as normas estipuladas em Convenção, devem constar a forma de pagamento, a forma de administração, que poderá ser realizada pelo próprio síndico ou administradora externa, quórum para realizar deliberações, possíveis sanções quando do desrespeito às normas da Convenção, percentual a ser cobrado do condômino que reservar área comum para uso exclusivo, dentre outras particularidades.

243 BARBOSA, op.cit. p. 129.

O art. 1.336 do CC/02 dispõe quais os deveres dos condôminos, dentre eles, contribuir para as despesas do condomínio, na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção, não realizar obras que comprometam a segurança da edificação, dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, dentre outros.

Rodrigo Mazzei, apesar de se posicionar dentre os que entendem não haver vedação normativa à constituição de direito de superfície por meio de concessão de sobreelevação, não enxerga nesta modalidade a mesma viabilidade prática da pactuação de condomínios. Apesar disso, o autor enxerga a admissão da sobreelevação como instrumento apto a tornar regular o direito de laje praticado no Brasil244.

De fato, não seria atípica a situação. O direito de superfície, desde sua origem, teve o condão de regularizar situações fáticas merecedoras de tutela. Desde o Império Romano, passando pela Idade Média, até os tempos atuais, na realidade em comento, o direito de superfície se apresenta como instituto apto a ser instrumento de regularização fundiária.

Viegas de Lima propõe que após a construção da propriedade superficiária sobrelevada, serão aplicadas à esta edificação as normas pertinentes ao condomínio edilício. De acordo com o autor, seria necessário realizar uma nova divisão das frações ideais existentes sobre a parcela pro indiviso do terreno, de forma a contemplar o(s) superficiário(s)245.

Subtende-se que o autor coloca a hipótese de sobreelevação sobre condomínio edilício preexistente. Desta forma, com a extinção da concessão, a propriedade sobrelevada é revertida para os condôminos, tornando-se, juntamente com as áreas comuns, parcela pro indiviso da propriedade imobiliária, na fração proporcional ao direito de cada um dos co-proprietários.

A destinação desta nova parcela de propriedade comum indivisível ficaria a critério dos condôminos. Viegas de Lima propõe, inclusive, a possibilidade de realizar-se nova concessão de direito de superfície246. Neste caso, seria contratada uma modalidade de concessão derivada diversa, a de constituição de superfície por cisão.

Em termos práticos, para que um condomínio edilício concedesse seu espaço aéreo para fins de sobreelevação, seria necessário haver anuência da totalidade dos condôminos, nos

244 MAZZEI, 2012, p. 252.

245 LIMA, op.cit. p. 306. 246 Ibid. p. 306

termos do art. 1243 do Código Civil, partindo do pressuposto de que dificilmente haverá proibição à concessão desta natureza no pacto original.

Ao ser incorporado ao condomínio, pressupõe-se que o superficiário passaria a arcar com os ônus, gozar dos bens comuns e participar das Assembleias em caráter de igualdade em relação aos demais condôminos. É particularmente difícil conjecturar tal situação hipotética em relação a um condomínio residencial, motivo pelo qual uma concessão dessa natureza em um edifício comercial pode parecer de mais simples absorção.

É bastante comum a locação, por parte de empresas ou até órgãos públicos, de andares inteiros para o exercício da respectiva atividade em edifícios comerciais. Coloca-se, então, a situação hipotética em que uma determinada empresa, fixada em um empresarial há vários anos, acaba por ver dilatada sua estrutura, de modo que necessitaria mudar de endereço.

Supondo que esta edificação comportasse modificações estruturais em sentido vertical sem impedimento da legislação urbanística, a empresa propõe ao condomínio a concessão do espaço aéreo para fins de sobreelevação, onde edificaria mais dois andares, a fim de acomodar sua nova estrutura e não abrir mão do endereço comercial que julga essencial ao desenvolvimento da sua atividade.

Deliberada a proposta e aprovada pelos condôminos, ficaria a critério da liberdade negocial a pactuação da contraprestação devida pela empresa ao condomínio pela utilização do espaço aéreo, que após edificado, será incorporado ao condomínio. Surge, entretanto, um questionamento acerca da pactuação de contraprestação em concessão urbana por tempo indeterminado.

Importante ressaltar a característica peculiar da propriedade superficiária constituída por meio de sobreelevação, que vai operar, perante a propriedade do condomínio, uma acessão ao inverso, isto é, vai adquirir, mesmo que por tempo determinado, parcela do solo, em decorrência da negociação do espaço aéreo, enquanto que o condomínio edilício opera de forma oposta, partindo a acessão da propriedade do solo.

O professor Paulo Lobo admite a sobreelevação sobre edificação preexistente, com refracionamento das cotas ideais, onde aplicar-se-ão, as normas referentes ao condomínio edilício em conjunto com as normas de direito de superfície, o que não permitiria, segundo o autor, equiparar esta nova figura à propriedade horizontal.

Deste posicionamento, depreende-se que o professor considera que a sobreelevação sobre edifício inaugura um regime jurídico híbrido de direito de superfície e condomínio edilício. Para isso, no entanto, seria necessário delinear os contornos deste novo regramento, por assim dizer.

Elcio Nacur Rezende, quando aborda o direito de superfície concedido para fins de sobreelevação, afirma: “veja-se que não se trata de condomínio edilício, em que existe repartição da propriedade a várias pessoas, cada qual com sua fração ideal, no direito de sobreelevação os três sujeitos da relação jurídica exercem seus direitos de forma autônoma247”.

Importante destacar, entretanto, que diferentemente do ilustrado pelo autor, no condomínio edilício, não há apenas a divisão da propriedade em frações ideais, sendo a principal característica da propriedade horizontal, a sua divisibilidade em unidades autônomas, restando indivisas apenas as áreas de uso comum ou coletivo. Portanto, o exercício do poder dominial de forma autônoma não é um argumento válido em termos de diferenciação.