2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 23
2.2.4 Técnicas e métodos de Design Participativo 35
Ainda no fichamento, ao analisar os materiais que tratam do Design Participativo, algumas técnicas e métodos foram apresentados. Em Muller, Haslwanter e Dayton (1997) é apresentada uma lista com 61 técnicas de Design Participativo, distribuídas em um quadro taxonômico no qual as técnicas estão organizadas de acordo com a fase do ciclo de vida de um software em que pode ser utilizada - identificação do problema, levantamento e análise de requisitos, design, avaliação, customização e re-design. Além disso, as técnicas também estão organizadas conforme o local de atividade suscetível de uso: no domínio do usuário, no domínio dos profissionais (ou pesquisadores) ou em um espaço intermediário entre os dois domínios.
Esta taxonomia adotada no quadro de Muller, Haslwanter e Dayton (1997, p. 257) colabora para a escolha das técnicas a serem inseridas no ciclo de vida de software ou projeto. Porém, os autores chamam a atenção para o fato de que modelos de ciclo de vida de caráter participativo promovem uma melhor continuidade da participação do que os casos em que apenas são selecionadas uma ou duas técnicas para serem aplicadas em um ciclo de vida de caráter não participativo.
Rocha e Baranauskas (2003, p. 136) afirmam que as técnicas participativas, apesar do uso mais recorrente na fase de design propriamente dito, podem ser adotadas em todas as fases do ciclo de vida de um software. As autoras afirmam que brainstorming, storyboarding e workshops são técnicas participativas bastante utilizadas. A seguir é apresentado um descritivo de algumas destas técnicas a partir da adaptação de Muller, Haslwanter e Dayton (1997):
1. Storytelling Workshop
Fase do processo de design em que é utilizado: identificação e
clarificação do problema de design.
Material necessário: nenhum material especial é requerido.
Descrição: cada participante de um grupo de usuários finais e
facilitadores traz para a oficina duas histórias curtas sobre o uso de sistemas computacionais – em geral experimentadas em seu trabalho. Uma história deve ser positiva e outra negativa com respeito ao resultado desse uso. Os participantes compartilham suas histórias, comentando semelhanças e contrastes de suas experiências.
Resultados esperados: uma coesão aumentada entre os usuários finais
e entre esses últimos e os designers, reconhecimento das dificuldades e consciência de que elas não são únicas, conhecimento de características e dificuldades da população de usuários pelos designers.
2. Picture Card
Fase do processo de design em que é utilizado: análise de requisitos -
em situações nas quais os usuários finais e profissionais de design e desenvolvimento do software ainda não compartilham a mesma linguagem.
Quantidade de participantes: não há definição de número de
participantes, porém é realizado em grupos.
Material necessário: cartões contendo figuras de objetos e eventos do
mundo de trabalho do usuário.
Descrição: Os cartões com as figuras são agrupados em seis categorias:
Pessoa, Ação, Estação, Ferramenta, Evento, Local (PAEFEL). Depois são arranjados em sequências lineares começando com as categorias PAEFEL e refinando-as em subclasses específicas, refletindo as histórias e cenários do ambiente de trabalho. As histórias contadas pelos usuários, inicialmente expressas através de cartões, são traduzidas em forma de texto.
Resultados esperados: para o designer os relatos dos usuários servem
para tornar explícito o dialeto do trabalho e alimentar o dicionário de objetos, ações, etc.
3. HOOTD- Hierarchical Object-Oriented Task Decomposition
Fase do processo de design em que é utilizado: fase inicial de design,
Quantidade de participantes: grupos muito grandes não são
recomendáveis.
Material necessário: Cartões.
Descrição: participantes decompõem a descrição de uma tarefa em
objetos e ações e depois relacionam grupos desses objetos a janelas de interface. Cada participante, em paralelo, escreve cada tarefa – representada por um substantivo e um verbo – em seu cartão. Os participantes, então em grupo, ordenam esses cartões em pilhas seguindo um critério de escolha do grupo. O esquema então é registrado. Depois seguindo novos critérios, reordenam novamente os cartões, registram todos os esquemas e escolhe um destes esquemas. Cada pilha do esquema escolhido torna-se uma tarefa do domínio, contendo em uma janela da interface os objetos e ações da pilha de cartões. Como método formal complementar de análise pode ser usada a análise de tarefas (com o GOMS, por exemplo).
Resultados esperados: a definição das janelas de interface e seus
respectivos objetos. 4. BrainDraw
Fase do processo de design em que é utilizado: design da interface. Quantidade de participantes: não há definição de número de
participantes, porém é realizado em grupos.
Material necessário: Papel e canetas arranjados em uma série de
estações de desenho colocadas em círculo.
Descrição: este método é constituído de um brainstorming cíclico,
gráfico, com o objetivo de preencher rapidamente um espaço de várias opções de design para a interface. Cada participante faz um desenho inicial em uma das estações (de desenho, já montadas no início). Ao final de um intervalo de tempo estabelecido, cada participante move-se para a estação seguinte e continua o desenho lá encontrado. O processo continua rodando até que todos tenham colaborado na criação de cada um dos outros participantes.
Resultados esperados: geração de muitos designs candidatos à
envolvidos. Cada design resultante é a fusão da ideia de todos e não são idênticos uma vez que cada um deles teve um início diferente.
5. Icon Design Game
Fase do processo de design em que é utilizado: design da interface
(para a criação dos ícones e símbolos gráficos).
Quantidade de participantes: não há definição de número de
participantes, porém é realizado em grupos. Dependendo do tamanho do grupo, este pode funcionar no estilo cooperativo ou subdividido em vários grupos para produção competitiva dos desenhos.
Material necessário: Papel de desenho e canetas.
Descrição: um dos participantes, denominado sketcher, desenha ícones
enquanto que os outros tentam “adivinhar” o conceito que o sketcher está tentando expressar (estes desenhos tornam-se rascunhos para a criação de ícones). O participante seleciona no papel do sketcher um conceito e tenta comunicar ao grupo apresentando desenhos relacionados ao conceito. O grupo tenta descobrir enquanto um observador toma notas sobre desenhos que parecem mais efetivos ou mais confusos. Os desenhos que expressam melhor o conceito são passados para a produção gráfica dos ícones.
Resultados esperados: sketches de ícones para a arte final. Pode-se
usar este método também na escolha de metáforas para a interface. 6. CISP – Cooperative Interative Storyboard Prototyping
Fase do processo de design em que é utilizado: análise de requisitos,
design da interface e avaliação.
Quantidade de participantes: não há definição de número de
participantes.
Material necessário: em geral um software associado ao método ou
outro ambiente para criação de storyboards, como o HyperCard ou Borland Delphi, por exemplo.
Descrição: uma equipe de designers e usuários gera e modifica
cooperativamente designs de interfaces, avaliam interfaces existentes comparando alternativas. O processo envolve interações de 3 passos principais: exploração do storyboard para realização da tarefa pelo
usuário final, enquanto o software registra;; avaliação do storyboard, através de análise e discussão do registro da interação;; modificação do storyboard.
Resultados esperados: o storyboard ou o protótipo melhorado e o
registro da interação dos usuários. 7. Buttons Project
Fase do processo de design em que é utilizado: pós-design (na
customização do sistema pelo usuário final).
Quantidade de participantes: não há definição de número de
participantes.
Material necessário: um software que suporta o design de funções
customizáveis.
Descrição: os usuários podem compartilhar suas customizações
enviando botões uns para os outros. Por meio de templates os usuários especificam funcionalidades em botões e enviam estes uns para os outros. Os receptores de botões podem realizar modificações.
Resultados esperados: nova funcionalidade compartilhada entre os
usuários, além do registro das inovações na forma de customizações executáveis.
8. Priority Workshop
Fase do processo de design em que é utilizado: redesign de um
sistema.
Quantidade de participantes: não há definição de número de
participantes, porém é realizado em grupos.
Material necessário: nenhum material especial é requerido.
Descrição: usuários e designers colaboram na prática do redesign
através de uma sequência de oito atividades conduzidas em formato de workshop. O processo é iniciado com uma discussão introdutória de objetivos. Segue-se uma apresentação dos usuários sobre características positivas, negativas e desejáveis no sistema. Segue-se uma apresentação dos designers sobre planos e prioridades relativas ao sistema. A quarta atividade é a exploração conduzida em pequenos grupos de protótipos alternativos (em papel), seguida de uma discussão
em plenário. Um sumário de prioridades e qualidades são rotuladas com os sinais de “+” ou “-“ pelos usuários. Segue-se uma discussão das consequências – para os usuários – das mudanças. O método termina com uma discussão final de planos de continuidade do processo.
Resultados esperados: decisões sobre características a serem incluídas
e/ou modificadas no redesign do sistema.
Neste mesmo contexto de escolha de métodos e técnicas a serem utilizadas, Brandt, Binder e Sanders (2013) afirmam que, apesar do grande número de técnicas existentes, o maior desafio é determinar quais técnicas são mais adequadas a determinado contexto. Sugerem também que não se sigam rigorosamente as técnicas da forma como são descritas e destacam a possibilidade de combinar técnicas já existentes para a formação de novas que sejam mais adequadas ao contexto em que serão aplicadas, a fim de criar maior engajamento e posse dos resultados.
Muller e Druin (2003) também defendem o hibridismo no Design Participativo e falam do Terceiro Espaço - espaço entre o domínio do usuário e domínio dos desenvolvedores de tecnologia ou pesquisadores. No Terceiro Espaço, os participantes podem compartilhar diferentes conhecimentos, perspectivas e planos de ação, e é neste contexto, consequentemente, que ocorrem estas experiências participativas e híbridas. O uso deliberado do hibridismo levou a métodos de Design Participativo capazes de “aumentar a eficácia da comunicação, a coerência da equipe, inovação e qualidade do resultado” (MULLER E DRUIN, 2003, p. 45). Os autores sugerem oito técnicas de Design Participativo que permitem explorar o hibridismo no Terceiro Espaço:
1. Sitings (Seleção de locais de trabalho compartilhados)
A escolha do domínio onde as técnicas de DP são utilizadas “pode ser uma estratégia deliberada de introduzir novas experiências e perspectivas para uma ou mais partes no processo de design” (MULLER E DRUIN, 2003, p. 19). Os principais benefícios são o aumento da aprendizagem e compreensão, e aumento do comprometimento e propriedade por parte dos participantes.
2. Workshops
Nos workshops, apesar de todos os participantes estarem fora de seu domínio natural, estes precisam trabalhar juntos para definir suas novas circunstancias e relacionamentos, o que leva a síntese de perspectivas e de conhecimento. O formato mais conhecido são os Future Workshops.
3. Stories (Storytelling)
No contexto de trabalho participativo, as Stories podem ser usadas de, no mínimo, 4 formas: como gatilhos para conversação, análise ou feedback;; podem ser contadas pelos usuários-finais como parte da sua contribuição para os conhecimentos requeridos para a compreensão das oportunidades de produtos ou serviços, bem como o que estes deveriam fazer;; podem ser usadas por equipes de design heterogêneas para apresentar o conceito de um produto ou serviço, bem como o que estes vão fazer e como vão ser utilizados, e que mudanças irão ocorrer como resultado;; e, podem ser construídas por designers para servir como intermediário para os usuários reais.
4. Fotografia do usuário final
A fotografia pode ser utilizada como forma de contar histórias, e esta prática pode ser considerada híbrida e formadora de Terceiro Espaço, porque ao mesmo tempo em que é parte da vida informal das pessoas (domínio do usuário) também é um meio de comunicação e argumentação intensivamente estudado (domínio dos desenvolvedores de tecnologia e pesquisadores).
5. Dramatização
A dramatização pode ser feita no formato de teatro ou vídeo e também é considerada uma forma de contar histórias. O principal aspecto que caracteriza esta técnica como híbrida é a forte sobreposição dos domínios dos usuários finais e dos desenvolvedores e pesquisadores. Esta técnica permite mostrar projeções concretas de ideias de um domínio para o outro e, na maioria dos usos, permite a alteração
destas ideias, visto que neste momento "eles devem negociar significado e construir colaborativamente seus entendimentos" (MULLER E DRUIN, 2003, p. 33).
6. Criação de linguagens comuns
A negociação e criação colaborativa de linguagem de trabalho, e sua significação, é uma das características do hibridismo, o que permite trazer usuários finais e desenvolvedores de ambientes estranhos para um Terceiro Espaço onde possa ocorrer a compreensão de ambos os domínios. As negociações, o trabalho colaborativo e a validação mútua são necessárias para a formação deste Terceiro Espaço.
7. Artefatos descritivos (protótipos de baixa tecnologia)
Protótipos de baixa tecnologia são conhecidos por "trazer novos insights através da combinação de diversas perspectivas" (MULLER E DRUIN, 2003, p. 42). Esta técnica permite às pessoas um melhor entendimento das perspectivas e abordagens de outras pessoas, descobrir e resolver conflitos, levando a planos de ação coletiva e a soluções que acomodem a heterogeneidade dos pontos de vista e interesses.
8. Protótipos de trabalho
Esta técnica é voltada à prototipação de softwares, que pode ser feita na forma de prototipação cooperativa ou entrega iterativa. A prototipação cooperativa é feita em um Terceiro Espaço físico, por exemplo um escritório, não pertencente nem aos usuários finais nem aos desenvolvedores – baseado no conceito da técnica de Sitings - enquanto que na entrega iterativa os protótipos são apresentados aos usuários finais em seu próprio domínio. A necessidade das ações dos usuários finais ajuda a moldar a tecnologia e reorienta a sua atenção - e a atenção dos desenvolvedores, criando a oportunidade de conversas que refletem a preocupação com a viabilidade das mudanças propostas, desafiando os pressupostos de ambos os lados e levando a planos de ação coletivos.
Apesar do extenso número de técnicas de Design Participativo apresentadas nas bibliografias citadas neste trabalho, foi preciso definir um critério para a escolha das técnicas adotadas para o contexto da presente pesquisa.
Conforme será descrito na metodologia deste trabalho, em “3.4 – Aplicação de técnicas de Design Participativo com o público idoso”, o critério escolhido para selecionar as técnicas de DP foi atender diferentes fases do processo de Design, isto porque para o desenvolvimento do material proposto nesta pesquisa é preciso levantar diferentes tipos de informação que podem ser aplicadas em diferentes fases de desenvolvimento deste material, desde características da interface gráfica a características de interação do usuário com o material.
Além do Design Participativo, a questão do Acesso Aberto também faz parte do contexto desta pesquisa, pois está relacionada à democratização da informação e do conhecimento, para que estes possam ser acessados e utilizados de forma livre, inclusive no processo de inclusão digital do público idoso.
2.2.5 Acesso aberto
Outro tema relevante para esta pesquisa é o acesso aberto a conteúdos científicos. Bjork (2004) define como acesso aberto quando o leitor pode acessar uma publicação na internet, realizar sua leitura, impressão e distribuição – desde que sem fins lucrativos - sem realizar pagamentos ou ter quaisquer restrições de uso. O autor também afirma que o rápido aumento no número de conferências sobre este tema é promissor, porém os autores de conteúdo, que ocupam uma posição chave neste contexto, acabam por não comparecer o quanto se espera nestes eventos, usualmente mais frequentados por membros da comunidade editorial.
Costa (2008, p. 219-220) define o acesso aberto como “literatura que é digital, online, livre de custos, e livre de restrições desnecessárias de copyright e licenças de uso”. Acesso aberto, nesse sentido, deve remover tanto barreiras de preço quanto de permissão (de uso).
No Brasil, a discussão sobre acesso aberto é fundamentada em três tópicos principais: as diferenças disciplinares, o sistema de comunicação científica e os