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Foto 16 Pesque-pague e parque aquático Sítio das Palmeiras

2. A contribuição de Milton Santos para a teoria social crítica através da

2.3. A Técnica

2.3.1. O meio técnico-científico-informacional

Santos (1996) assevera que, antigamente, o social estava condicionado às leis da natureza (agricultura tradicional, estações do ano, disponibilidade de recursos), mas hoje é o “natural” que se aloja ou se refugia nos interstícios do social. Apesar de atribuirmos relevância aos fenômenos da natureza, através dos eventos e das alterações físicas, químicas e biológicas que estes provocam e continuarão a provocar no planeta, concordamos com o autor em relação à idéia de que a humanidade possui um domínio total sobre o espaço geográfico, e que tal domínio se dá através das técnicas.

Esse predomínio cada vez maior dos objetos técnicos sobre os elementos da natureza, que leva à transformação das coisas (entendidas por Santos como elementos da natureza) em objetos, é um dos aspectos marcantes dos períodos de ruptura no meio geográfico. Para o autor, a humanidade já presenciou três grandes períodos que influenciaram sobremaneira a configuração do espaço geográfico, e “cada período técnico corresponde a uma mudança geral nas relações sociais.” (SANTOS, 1996, p. 238). O quadro a seguir sintetiza os períodos apontados por Santos e Silveira (2001).33

Período Características

1º - Meio Natural -Tempos lentos da natureza comandando as ações humanas (índios e europeus).

- Pesca, caça e coleta.

- Domesticação de plantas e animais /Agricultura incipiente. - O corpo do homem era agente de transformação.

- Período pré-técnico: escassez de instrumentos artificiais. 2º - Meio Técnico - Técnicas pré-máquina (autômatos) e técnicas da máquina.

- Maior domínio do homem sobre a natureza. - Início da agricultura tecnicizada.

3º - Meio Técnico- Científico-

Informacional

- Telecomunicações (satélite, internet). - Engenharia genética e biotecnologia.

- Técnicas substituindo o papel/função da natureza.

Quadro 1 – Períodos que marcam rupturas no meio geográfico e suas características Fonte: Santos e Silveira (2001).

Org.CANDIOTTO, L. Z. P. (2004)

Durante milênios, o meio geográfico correspondia ao meio natural ou pré-técnico. No final do século XVIII e, sobretudo, no século XIX, a mecanização do território marca o momento da criação do meio técnico, que substituiu o meio natural, e predominou durante dois a três séculos (SANTOS, 1997). Hoje, Santos (1996) considera o meio geográfico como meio técnico-científico-informacional. “A primeira presença do homem é um fator novo na diversificação da natureza, pois ela atribui às coisas um valor, acrescentando ao processo de mudança um dado social.” (p. 105). Num primeiro momento, o homem é criador, mas subordinado. “Depois, as invenções técnicas vão aumentando o poder da intervenção e a autonomia relativa do homem, ao mesmo tempo em que se vai ampliando a parte da – diversificação da natureza – socialmente construída” (p. 106).

Como consta no quadro 1, os avanços na área de telecomunicações são um marco para a consolidação do meio técnico-científico-informacional, que corresponde ao período que vivenciamos atualmente. A década de 1970 é tida como o período de universalização do meio técnico-científico-informacional, assim como a década do início da pós- modernidade trabalhada por Harvey (1989). Ambas as acepções têm relação com o processo de globalização. Para Santos e Silveira (2001), o meio técnico-científico- informacional é a expressão geográfica da globalização, enquanto para Harvey (op. cit.), a globalização é o elemento central da pós-modernidade.

Santos (1996, p. 190) aponta que o meio técnico-científico-informacional “começa praticamente após a segunda guerra mundial e, sua afirmação, incluindo os países de terceiro mundo, vai realmente dar-se nos anos 70”, de modo que “esse sistema técnico se torna comum a [...] todas as culturas, todos os sistemas políticos, todos os continentes e lugares." (p. 153).

[...] o meio técnico-científico-informacional é o meio geográfico do período atual, onde os objetos mais proeminentes são elaborados a partir dos mandamentos da ciência e se servem de uma técnica informacional da qual lhes vem o alto coeficiente de intencionalidade com que servem às diversas modalidades e às diversas etapas da produção. (SANTOS, 1996, p. 187).

Acreditamos que a principal diferença entre o meio técnico e o meio técnico- científico-informacional reside no uso da ciência a serviço do desenvolvimento das técnicas e das tecnologias. Os investimentos em pesquisas cientificas por parte das corporações transnacionais e de outras firmas condicionam o direcionamento da ciência em função da tecnologia e, conseqüentemente, atribuem à ciência um papel fundamental na ampliação da acumulação de capital para os agentes hegemônicos. Além disso, o próprio Estado prioriza a inovação tecnológica e a produção de uma ciência utilitarista e produtivista, ao destinar a maior parte dos recursos públicos em ciência e tecnologia para a conquista de novos mercados.

Por sua vez, essas inovações tecnológicas permitem maior rapidez na circulação de pessoas, mercadorias e informações, e, ao mesmo tempo, essa maior fluidez espacial beneficia o desenvolvimento de novas técnicas e tecnologias, gerando uma espiral de produção e consumo. Nesse sentido, a informação apresenta-se como fonte de poder, como um recurso, que se distribui de maneira desigual. Seu acesso passa a ser primordial na produção do espaço geográfico e na competição entre os lugares.

Apesar da diferença no acesso e no uso das técnicas e da informação entre os lugares, Santos (1996, p. 154) ressalta que “as técnicas atuais se difundiram universalmente, ainda que com diferente intensidade e seus efeitos se fazem sentir, direta ou indiretamente sobre a totalidade dos espaços."

Neste período, os objetos técnicos tendem a ser ao mesmo tempo técnicos e informacionais, já que, graças à extrema intencionalidade de sua produção e de sua localização, eles já surgem como informação. [...] Essa união entre técnica e ciência vai dar-se sob a égide do mercado. E o mercado, graças exatamente à ciência e à técnica, torna-se um mercado global. (SANTOS, 1996, p. 190).

Devido ao fato de o mercado objetivar o lucro crescente de seus atores hegemônicos, e de a ciência e a técnica estarem subordinadas às lógicas do mercado global, podemos afirmar que o próprio meio técnico-científico-informacional - correspondente ao meio geográfico – vem servindo de instrumento para a manutenção do poder sobre o espaço geográfico.

Sabendo que a técnica, apesar de ser universal, atinge os lugares de forma diferenciada, Santos procura estabelecer uma distinção entre o conhecimento da técnica e seu uso. Para tanto, trabalha com os conceitos de tecnosfera e psicosfera.