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TCD no ensino de LI: delineando o caminho para um lugar

CAPÍTULO 2 OS CAMINHOS DA LINGUAGEM: SER, PENSAR E

2.9 OBJETOS DIGITAIS DE ENSINO-APRENDIZAGEM –

2.9.1 TCD no ensino de LI: delineando o caminho para um lugar

Ser professor de LE nessa época em que as linguagens tornam-se líquidas, em que as certezas se dissipam e o imponderável faz parte do dia a dia, constitui saber que, por meio das tecnologias digitais, dentre tantas alternativas, é possível recuperar histórias e fantasias da infância, perdidas em nome de um materialismo exacerbado, difundido por propostas educacionais marxistas. A criança precisa da conjugação entre imagem e som para que sua atenção seja retida em favor da aprendizagem. É preciso promover a interação entre o grupo de estudantes em sala de aula, assim como boa oferta de conteúdos linguísticos pertinentes à faixa etária,

As tecnologias digitais, em suas diversas formas, estão dispondo as pessoas frente a um mundo colorido e em movimento, disseminando coisas novas e recuperando valores e crenças caídos no esquecimento. A globalização – fruto da revolução das tecnologias digitais e da expansão da Língua Inglesa – tem recuperado culturas e línguas que há muito se pensava estarem mortas. Seus saberes, tradições e conhecimentos, juntamente com suas crenças, estão brotando novamente e ajudando a entender enigmas em áreas distintas da sociedade, colaborando com a educação formal. Da mesma forma, o mundo da fantasia, o mundo encantado – próprio da criança – começa a se reaplicado e valorizado, nem tanto pela leitura, mas, acima de tudo pelas imagens e pela sonorização atrativa propiciada pelas tecnologias digitais.

Consequentemente, é possível constatar a influência positiva da digitalização na leitura verbal escrita. O mágico ressurge com uma roupagem enigmática nas telas do cinema, da televisão e dos computadores, em casa, nos Cibercafes e Lan houses87 ou em qualquer outro dispositivo digital que permite acesso à rede. É possível usufruir desses bens que estão ao alcance da escola e aplicar uma proposta de ensino compatível com um mundo encantado, de sonhos e de alegrias, no qual o aprendiz se coloque como o personagem que derrota o vilão ou que conquista a princesa. Desenvolver a imaginação é fato primordial no processo de aquisição de linguagem.

“A criança, a partir de dois anos, constrói pequenas cenas sociais”. [...] Ora, as cenas criadas pela criança são uma das demonstrações mais significativas da

87 Mesmo em comunidades pequenas, situadas na zona rural, existem “ilhas” onde as pessoas podem acessar e interagir no ciberespaço.

estruturação do espaço, [...] a presença dessa noção é imprescindível para a aquisição do discurso falado e escrito (RAMOZZI-CHIAROTTINO, 2008, p. 95). Nas palavras de Ramozzi-Chiarottino, as noções de espaço – temporais e causais – antecedentes e consequentes, dentre outras, são necessárias para que a criança possa referir-se a fatos do passado ou do futuro. Crianças que não edificam essas noções por elas mesmas podem até conhecê-las, mas acabam não construindo a representação adequada e necessária para formular um discurso coerente sobre o que conhecem na prática.

Graças à linguagem digital, as pessoas, sobretudo as crianças, sonham com o mundo de Peter Pan, dos Piratas, da Alice ou em entrar no guarda-roupa encantado e fugir para Narnia. Igualmente, o imaginário floresce diante da eterna luta do bem contra o mal. Ao serem externalizados, esses mundos mágicos surgem no pensamento dos pequenos e dos adultos e criam e desenvolvem conhecimento linguístico. Pode-se citar ainda os exemplos criativos do monólogo da menina que sonhava em entrar no espelho para passar a um mundo diferente e da menina que conversava com as gotas de chuva que, ao cair, se chocavam com o solo formando a imagem de um vestido rendando.

Assim, ao construir ideias imaginativas em seus espaços de fuga, a criança desenvolve as estruturas linguísticas que formatam a base dos argumentos e a defesa dos ideais e das convicções na vida de adulta. Desenvolve também a emoção na linguagem, a qual lhe permite uma postura de compreensão e condução de seus atos para corrigir o fazer daquele que ocupa seu lugar no mundo encantado.

São sensações e emoções que se materializam pela linguagem híbrida e pelo acoplamento da linguagem digital que atendem a todos os sentidos – olfato, tato, audição, visão e paladar. Participam desta construção outras sensações como identificar, compreender, criar novos pensamentos e novos seres – nova realidade – “uma vez que os ambientes digitais são participativos” (MURRAY, 2003, p. 78). Para a autora, o computador não foi projetado para transmitir informações estáticas, mas para incorporar comportamentos complexos e aleatórios. É como um fluxo de consciência88

88 O termo “fluxo da conciência”, usado na literatura, retrata o raciocínio lógico entremeado com impressões pessoais momentâneas associadas a ideias. São as características não lineares do pensamento que rompem a sintaxe, por meio da qual se sobresaem as lembranças e os desejos do sujeito. Não há ordem na manifestação,

que leva o pensamento por instâncias incontroláveis, indefinidas e fortuitas. É um novo devir a cada contato.

Mapas, hipertextos e metáforas se constroem e vão acontecendo a cada interação. Induzem o comportamento, reagindo às informações neles inseridas. Em termos de controle sintático, o fluxo da linguagem no ato comunicativo é desordenado. A expressão natural da fala se origina e emana sem interrupção a cada troca de tempo verbal. Isso também dá suporte à proposição de um método de ensino que dê vazão à expressão em todas as suas formas, que observe a função procedimental e participativa proporcionada pelos ODEA – ampliando a multiplicidade e evitando a linearidade.

A maior parte dos métodos modernos para fazer proliferar séries ou para fazer crescer uma multiplicidade vai perfeitamente numa direção, por exemplo, a linear, enquanto que uma unidade de totalização se afirma tanto mais numa dimensão, a de um círculo ou de um ciclo. Toda vez que uma multiplicidade se encontra presa numa estrutura, seu crescimento é compensado por uma redução das leis de combinação (DELEUZE; GUATTARI, 1996, p. 13).

Uma concepção não linear de educação abre a possibilidade de se mover e interagir com os mais diversos ambientes navegáveis, tanto pela linguagem verbal-oral, verbal-escrita, quanto por imagens – modelos tridimensionais – sem estar preso ao espaço geográfico. O ambiente espacial criado pelos ODEA depende do processo interativo, o qual não se mede nem pode ser modelado no espaço físico, “pois os movimentos entre os links não são, necessariamente, reversíveis” (MURRAY, 2003, p.87).

Os ambientes digitais apresentam recursos infinitos que harmonizam a possibilidade de expansão da memória humana. Suas capacidades enciclopédicas os fazem instigantes. Assim, um ODEA propicia a construção e circulação de grande quantidade de informações, traduzindo- se em potencial artístico com riquezas de detalhes ao representar um mundo, ao mesmo tempo, abrangente e particular. Destarte, o uso dos ODEA no ensino de LI permite a expansão ilimitada de possibilidades no processo de aquisição do idioma. São redes sinuosas, numa propagação sem fim de pensamentos, “sem linhas de articulação ou segmentaridade, sem

assim como não há ordem nem sequência em no pensamento. Presente, passado e

estratos, nem territorialidades, mas em linhas de fuga, movimentos de desterritorialização e desestratificação” (DELEUZE; GUATTARI, 1996, p. 10).

Com base nos fundamentos apresentados até aqui, propõe-se pensar o ensino de LI sem unidades de medida, sem quantificação e sem a certeza absoluta apregoada pela “pedagogia do conceito” (DELEUZE; GUATTARY, 1997, p. 34), utilizando o sistema disciplinar dos currículos escolares. O desafio central consiste na apresentação de um método para o ensino de LI que explore as formas transversais do conhecimento, ancorando-se na dinâmica propiciada pelo uso dos ODEA, com a observância do movimento dinâmico de interação entre sujeitos e objetos que se implicam, se interdeterminam, se conectam sem estratificação (CATAPAN, 2001) e criam ambientes imersivos de aprendizagem de inglês – “micromundos que permitem a navegação como se o estudante estivesse, de fato, vivendo determinada situação” (MURRAY, 2003, p. 21).

O formato digital de um ODEA possibilita uma melhor apresentação do idioma estrangeiro do que a forma verbal-escrita. Para Murray (2003), O conhecimento de uma LE pode ser melhor transmitido com exemplos de múltiplos falantes em ambientes autênticos do que com listas de palavras dispostas em uma página. O meio participativo e imersivo propiciado pelos ODEA pode levar os participantes a lugares passíveis de encenar as fantasias de um mundo encantado. É uma extensão do pensamento, com acesso irrestrito a emoções e criatividade. O ODEA se caracteriza como objeto limite entre a realidade e o mundo de fantasias que permite projetar nossos sentimentos, desejos e medos.

Para sustentar tão poderoso transe imersivo, portanto, temos de fazer algo inerentemente paradoxal: precisamos manter o mundo virtual “real”. Precisamos mantê-lo em perfeito equilíbrio no limiar do encantamento, sem deixar que desmorone para um lado ou para outro [...] nesta exploração dos limites entre o mundo da representação e o mundo real (MURRAY, 2003, p. 103, 105).

Normalmente, o uso do computador proporciona uma atividade prazerosa para o estudante, como a excitação e a emoção de qualquer jogo. A fim de que o mundo mágico – o transe imersivo – não se rompa, os elementos do mundo fantasioso não devem ser demasiadamente atraentes nem demasiadamente intimidantes. A maioria das características do pensamento e da expressão, que são fundadas na linguagem verbal-oral e

estão relacionadas com a interiorização do som, podem ser abarcadas em ODEA. As mensagens, palavras e sons são pronunciados, são ouvidos e internalizados. Com a escrita, no entanto, o sujeito precisa aguçar a atenção de outro sentido: a visão. As palavras não são mais ouvidas, mas vistas; entretanto, o que se vê não são as palavras reais, mas símbolos codificados que evocam na consciência do leitor palavras reais; o som se reduz ao registro escrito. É a decodificação da escrita no ato de ler ou de falar.

Pretende-se, portanto, formular uma proposta de ensino- aprendizagem que se distancie das versões disponíveis, sem a pretensão de acrescentar “uma dimensão superior, [...] mas que o uno faça parte do múltiplo, estando sempre subtraído dele” (DELEUZE; GUATTARI, 1995), sem terminar em lugar algum, com múltiplas linhas e muitas vozes; que esta proposta não seja a palavra final, mas que abra possibilidades de reações complexas e intensas, com redes de histórias em múltiplas tramas e possibilidades de fuga – numa palavra, um rizoma. É assim que compreendemos e propomos “ensinar e aprender” uma língua estrangeira.

Esta pesquisa tem possibilitado o conhecimento da grande quantidade de material didático que estão ao alcance de professores e de escolas. Muitos deles propõem inovação acoplando diferentes dispositivos ao livro – como apresentá-lo digitalizado para ser operacionalizado em tablets ou em lousa interativa. O estudo permitiu observar que a disposição dos conteúdos se encontra formatada em atos comunicativos, artificialmente arranjados, por meio dos quais o estudante aprende uma determinada estrutura linguística. Estão metodicamente e sequencialmente organizados como se um determinado aspecto linguístico antecedesse a aquisição de outro. Porém, o que mais se destaca é a abstração das proposições, as quais estão distantes do conhecimento construído por parte do estudante, dificultando a inferência com o conteúdo novo.

Outra vertente propõe um ensino voltado exclusivamente para os gêneros textuais que, ao tentar se aproximar do aluno, acaba adotando um foco mecânico puramente na leitura, na escrita e na tradução.

A proposta aqui defendida busca se diferenciar pelo viés do sentido da língua, construído a partir do conhecimento experenciado entre o “SER” que estuda e o “SER” que ensina. Trata-se de mente e corpo como fenômeno sistêmico na construção das metáforas de sentido. Ser, pensar e dizer se completam e se constroem por meio da linguagem.

CAPÍTULO 3 TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA: DESAFIOS