• Nenhum resultado encontrado

Parte I: Delimitação Teórica

1.4. Tecnologia DNA forense em contexto de Brasil

Conforme o debate apresentado anteriormente vimos que nas últimas décadas houve grande avanço das tecnologias DNA por diversos países, e o Brasil não ficou fora da súplica do desenvolvimento científico emoldurado pelo cariz de produzir certezas. Ou seja, a constituição do banco de dados no território brasileiro não se trata de um assunto que possa ser isolado de todo um contexto multifacetado (Santos, Costa & Richter, 2017). De modo que o Brasil foi um dos países que mais recentemente aderiu ao projeto de criação de um banco de dados genéticos, através da promulgação da Lei 12.654/12, a qual alterou a Lei 12.037/09, especificamente, sobre a identificação criminal do civilmente identificado, isto é, incluiu a possibilidade da coleta de material biológico enquanto parte do procedimento de identificação (BRASIL, 2012).

genética com finalidade criminal antes da criação de bancos de dados, na década de 1990 os órgãos de perícia brasileiros iniciaram a utilização deste método por via de parceria com os laboratórios das universidades. E no final da década de 1990 e início do século XX foram sendo criados os laboratórios forenses das polícias, propiciando o uso do DNA lentamente e expandindo-se. A princípio, a utilização da genética forense no Brasil era solicitada a colaborar nos “casos fechados”, este tipo de caso configura-se nos perfis elaborados desde vestígios biológicos encontrados em cenas de crime ou corpos de vítimas, normalmente sêmen e sangue, e perfis produzidos a partir de amostras de suspeitos já conhecidos pelos investigadores e coletadas em laboratório sob mandato judicial ou sob a concordância do suspeito (Santos, Costa & Richter, 2017).

Conforme (Santos, Costa & Richter, 2017), entre a segunda metade da década de 2000 e início da década de 2010, apareceram algumas notícias informando que institutos de perícia estavam realizando experimentos com o armazenamento de informações genéticas. De acordo com citação:

Em São Paulo foi anunciado, em 2010, com a ressalva que ainda dependiam de algumas decisões judiciais, a criação de um banco de perfis genéticos de vítimas e de corpos não identificados (FOLHA DE S. PAULO, 2010). Em Brasília, havia um banco informal de condenados. O banco do DF conta com mais 400 perfis genéticos fruto do recolhimento sistemático de evidências em cenas de crime e junto às vítimas de violência sexual. Em 2010, a perita da Polícia Civil Flávia Seixas Maia, durante mestrado na área de ciências genômicas e biotecnologia, inseriu no 'banco informal' o material genético colhido em 143 vítimas de crimes sexuais sem suspeitos que ocorreram entre 2004 e 2009 (Santos, Costa & Richter, 2017, p. s/n apud CÉO, 2012, s./p.).

O Estado de Minas Gerais também configura como pioneiro no armazenamento de amostras genéticas, no mesmo período citado acima, esse Estado mantinha há uma década armazenada amostras coletadas em vítimas de violência sexual. Entretanto, o material armazenado nessa época, mesmo com a identificação dos suspeitos, não havia cobertura legislativa para o uso na persecução criminal, assim não poderiam ser utilizadas para esse fim (Santos, Costa & Richter, 2017).

Neste sentido, surge as primeiras tentativas legislativas para o DNA compor as técnicas de identificação criminal. Com o envio de projeto de lei (PL 417/03) ao Congresso

36

Nacional no ano de 2003, esse propunha a inclusão do DNA, sem esclarecimentos quanto a critérios ou definições sobre procedimentos adotados, entre as técnicas já existente como fotografia e datiloscopia. Porém não houve nenhuma tramitação desse projeto na Câmara dos Deputados e nem mesmo chegou a votação. Assim, a nova investida de inclusão do DNA no campo criminal aconteceu no ano de 2011 com um projeto de lei em que regulamenta o uso de material genético com fins de identificação criminal, desta vez conta com a fundamentação do uso da tecnologia pela Polícia Federal (Richter, 2015; Santos, Costa & Richter, 2017).

Com isso, a implementação da tecnologia de perfis genéticos para fins de investigação criminal no território brasileiro, iniciou-se em junho de 2009, o Federal Bureau of Investigations (FBI) norte-americano assinou um acordo com o Departamento da Polícia Federal (DPF) em que consistia na licença de uso Combined DNA Index System (Sistema Indexado de DNA Combinado), a maior instalação do sistema CODIS fora dos Estados Unidos. Posteriormente, foi promulgada a Lei Federal nº 12.654/2012, a qual, criou formalmente os laboratórios oficiais para armazenamento de perfis genéticos. Com isso, surge a constituição da Rede Integrada de Banco de Perfis Genéticos (RIBPG), os bancos de dados de perfis genéticos encontram-se no âmbito Federal do Ministério da Justiça (MJ), na esfera Estadual das Secretarias de Segurança Pública, gerenciados pelos Unidades Oficiais de Perícia Criminal. Esse modelo de entrecruzamento de informações, atualmente, vincula entre 19 (dezenove) unidades laboratoriais e uma unidade sob a direção de peritos criminais da Polícia Federal (PF) (Schiocchet, 2012, Richter, 2015).

Deste modo, a partir do ano de 2012 a coleta de material biológico de suspeitos para fins de cadastro no Banco Nacional de Perfis Genéticos (BNPG) é prevista com decisão judicial. Porém, a lei ainda prevê que os condenados por crime doloso, com violência de natureza grave contra pessoa, ou por crime hediondo, sejam submetidos, obrigatoriamente, à identificação do perfil genético, mediante extração de DNA. A constituição da estrutura tecnológica instaladas nos laboratórios forenses brasileiros versa sobre o combate à criminalidade, conforme (RIBPG, 2019), até o mês de maio de 2019 o compartilhamento de informações armazenadas nos bancos de DNA brasileiros auxiliaram nas investigações criminais de 825 casos, incluindo crimes contra a vida, crimes sexuais e crime organizado, e foram processados no BNPG mais de nove mil vestígios de local de crime. (Richter, 2015, Brasil, 2019).

Entretanto o assunto não é pacífico na comunidade científica e entre operadores do direito, no tocante ao aspecto da Lei 12.654/2012 com previsão de incluir o material genético dos condenados de forma compulsória, Richter (2017) destaca como um dos pontos mais polêmico, contribuindo no sentido de alguns operadores do direito considerá- la inconstitucional, com base no princípio constitucional do artigo 5º LVIII da Constituição Federal do Brasil, em que versa “ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo” (Brasil, 1988, p. s/n). Este princípio além de ser consagrado pela Constituição Federal do Brasil, também consta na legislação internacional da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) de 22 de novembro de 1969, em que o Brasil é signatário através do Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992 (Schiocchet, 2012; Richter, 2015). Todavia, a Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos apresenta abertura com fins a obter dados genéticos sem a necessidade de consentimento. Confirma a citação:

(...) a Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos abre uma brecha para a não obtenção de consentimento por razões imperativas impostas pelo direito interno em conformidade com o direito internacional relativo aos direitos humanos. Este é o caso implícito na Lei 12.654/12 quando torna obrigatória a identificação do perfil genético, mediante extração de DNA, por técnica adequada e indolor para os condenados por crime praticado, dolosamente, com violência de natureza grave contra pessoa, ou por qualquer dos crimes previstos no art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990 (Garrido & Garrido, 2013). Ainda existe argumentações que o projeto de difusão da tecnologia DNA forense, vislumbra uma expansão de mercado implicando outros acessórios agregados aos investimentos, de forma que para o uso rotineiro das tecnologias de DNA os laboratórios, em contexto de construir um banco de dados, implica, por exemplo, a certificação dos laboratórios forenses (norma ISO 17025). Também o desafio do Brasil em gerir esta tecnologia diferi dos contextos em que já aderiram há mais tempo, por exemplo, a União Europeia, cada Estado-membro tem a sua própria legislação. E Nos Estados Unidos da América, cada estado possui legislação própria sobre o uso do banco de dados. No entanto, o caso brasileiro configura a aplicação dos mesmos preceitos legais para 26 estados e um Distrito Federal. Importante destacar as enormes diferenças existente entre os estados membros do Brasil, além das disparidades estruturais assinaladas entre as polícias que

38

atuam com esta tecnologia (Santos, Costa & Richter, 2017).

As diferenças estruturais são replicadas e se agravam à medida que o foco se desloca da Polícia Federal para as várias polícias estaduais, e das capitais para o interior dos estados. Os desafios apresentados neste cenário colocam em causa aspetos fundamentais de cidadania e de igualdade de acesso à justiça, evidenciando os problemas de base que se levantam à execução da Lei 12.654/12 (Santos, Costa & Richter, 2017, p. s/n). Contudo, esta investigação direciona atenção em analisar a utilização da tecnologia genética como auxílio nas investigações criminais, nomeadamente, a cidade de Fortaleza, capital do Estado do Ceará. Para tanto, a próxima sessão apresenta um panorama das circunstâncias de criminalidade em que assola esta cidade.