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CAPÍTULO 1 A MULHER E O FENÓMENO CRIMINAL

1.5. Algumas Teorias relativas à Criminalidade Feminina

1.5.5. Teoria do Controlo Social

Em meados do século XX uma das primeiras explicações criminológicas derivadas da Escola de Chicago44 baseou-se no facto que a falta de integração dentro da comunidade, isto é a diminuição dos laços afectivos com a família, escola, amigos produz uma situação de afastamento social, afastamento social que facilitaria a conduta criminal (GARRIDO, STANGELAND & REDONDO, 2001). A maioria das explicações sociológicas tenta compreender a razão que está subjacente ao crime. No entanto, a teoria do Controlo Social partilha do pressuposto contrário, tentando procurar razões pelas quais nem todos violem a lei. Começa por assumir que o crime e a delinquência não necessitam de nenhuma especial explicação, tendo em conta as “recompensas” e as “atracções” destes (como o dinheiro, o poder, a aventura, entre outros). A resposta à pergunta formulada no caso da mulher reside no tipo de controlo (interno ou externo) a que é submetida, estando o mesmo na base da explicação da baixa frequência de ilícitos criminais cometidos e no seu conformismo (COLEMAN & NORRIS, 2000). Neste sentido, tornou-se comum para inúmeros criminólogos atribuir como causa da díspar participação feminina e masculina no fenómeno criminal, a socialização diferenciada a que ambos os sexos estavam submetidos. O facto de a mulher ser mais vigiada, controlada pela família e pela própria sociedade explica segundo esta teoria a pequena percentagem de criminalidade feminina (SIEGEL, 1995).

Hirschi, um dos mais conhecidos teóricos do controlo social, tentou comprovar a superioridade da sua versão do controlo social em relação a outras explicações do fenómeno criminal, numa versão “gender-neutral”. Na sua perspectiva, o desvio ocorre quando não se verifica qualquer um dos diversos elementos de vínculo com a sociedade: o apego aos agentes de socialização primários (pais, escola e amigos), empenho com as instituições convencionais (trabalho e escola), envolvimento na vida estudantil ou profissional, e a crença nas regras convencionais de comportamento (AGRA & MATOS, 1997; WILLIAMS, 1991). Contudo, segundo Naffine, a teoria do Controlo Social elaborado por Hirschi, por inúmeras razões continua a ser uma teoria baseada no sexo masculino, pois se Hirschi estivesse mesmo interessado em estudar

44Em 1892 foi criado o Departamento de Sociologia da Universidade de Chicago, que viria a ter um papel decisivo na consolidação do estudo científico da criminalidade. A Escola de Chicago partilha do conceito que um contacto mais directo com o objecto em estudo e fazendo uso de uma sociologia mais rigorosa e científica, utilizando instrumentos como as histórias de vida, análise demográfica, estatísticas e com contacto com a realidade, poderia acarretar um maior conhecimento e informação dos factores sócio culturais influencia dores da criminalidade. A Escola de Chicago era da opinião que existe uma ligação muito estreita entre a estrutura urbana e a criminalidade, propondo que existe uma clara relação directa entre a “desorganização social” das diferentes áreas da cidade e os índices de criminalidade (GARRIDO, STANGELAND & REDONDO, 2001). Neste sentido, a Escola de Chicago vem concluir que não existe nada de intrínseco ou biológico na personalidade de criminosos ou não criminosos, apresentando-se a criminalidade como um

a “conformidade”45, teria estudado a mulher e não o homem. A mulher é a mais “conformista” dos

dois sexos, e estudando a mulher poderia compreender a influência da conformidade nas taxas de criminalidade. Em segundo lugar Naffine argumenta que o autor alterou a natureza da “conformidade”, já que concebe a conformidade como sendo mais masculina do que feminina, tendo Hagan, Simpson e Gillis (1979) concluindo em estudo realizado com adolescentes, que as raparigas são mais “conformistas” do que os rapazes (WILLIAMS, 1991:510).

Hindelang (JONES, 1998:283) utilizou uma réplica do estudo de Hirschi, mas em raparigas, concluindo que a teoria de controlo poderia prever a criminalidade em ambos os sexos, mas com um ligeiro acréscimo para o sexo masculino. Hindelang reafirmou que a maior conformidade feminina verificada se devia especialmente ao controlo mais apertado a que estavam submetidas pela família e amigos, tendo Nye em 1958 chegado à mesma conclusão.

Hagan, em duas investigações semelhantes à de Hirschi, realizadas em inúmeras escolas de Toronto através de inquérito de criminalidade auto-revelada, concluiu que a delinquência estaria muito relacionada com a socialização, sendo que as raparigas têm maior probabilidade de serem objecto de um controlo informal mais rígido do que os rapazes. Considera mesmo que as raparigas com uma carreira a tempo inteiro não conseguem escapar à anterior socialização doméstica a que são submetidas (LEONARD, CHESNEY-LIND & HAWKINS, 2001). Desta forma, estas conclusões suportam a teoria de que o maior controlo a que as raparigas são submetidas, especialmente em casa, resulta numa maior conformidade destas, ao contrário dos rapazes que têm uma maior liberdade, acabando mais facilmente por estar envolvidos em actos delinquentes46 (JONES, 1998). Hagan, Simpson e Gillis, concluíram que o crime era um fenómeno mais “aberto” ao sexo masculino, visto que as mulheres estariam mais frequentemente sujeitas ao controlo familiar, dentro da esfera doméstica. Esse controlo acarretaria que a mulher não fosse submetida ao controlo público e a supervisão das instâncias formais de controlo, tendo como consequência que quanto mais estivessem confinadas ao espaço doméstico, menor seria a sua participação do fenómeno criminal conhecido (McIVOR, 2004:21).

Heidensohn, por sua vez argumenta que a mulher é sujeita a um maior controlo no ambiente familiar e mesmo que tenham um emprego, continuam a estar limitadas pelas tarefas que lhes cabe realizar no seu domicílio. Igualmente considera que a violência masculina surge como uma forma de controlo da mulher, tanto em casa, sob a forma de violência doméstica, como no exterior, pela

45 Conformidade consiste num comportamento que está de acordo com os parâmetros definidos pela sociedade e segundo a própria lei (GIDDENS, 1997).

46De acordo com alguns autores, a rapariga enquanto adolescente “é muito mais frequentemente responsável por tarefas domésticas do que os rapazes e isto mantém-na em casa. Quando a rapariga trabalha na rua, é mais frequentemente acompanhada (...) contínua, portanto sujeita ao controlo familiar; a rapariga não faz aprendizagem da rua, essa aprendizagem é realizada no interior da esfera privada; nas representações femininas da rua, esta é um espaço masculino e perigoso; têm mais oportunidades de emprego de que o rapaz, entre outros” (LUCCHINI, 1997: 111)

forma de tentativas de assaltos, violações, entre outros. Desta forma Heidensohn argumenta que a tese do Controlo Social consubstancia-se na melhor teoria para explicar a criminalidade feminina e de forma mais particular, o conformismo feminino (WILLIAMS, 1991:510).

Apesar de um dos grandes factores de previsibilidade da delinquência ser o género, somente um em seis de todos os jovens delinquentes são do sexo feminino, respeitando quase todas as suas condutas criminais a actos menos gravosos (MUNCIE, 1999).