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Capítulo I: Da população às políticas: enquadramento teórico da pesquisa

2. Da população às políticas: enquadramento teórico

2.3. Teorias da População

2.3.1. Teoria da População de Malthus

As sociedades pré-industriais estavam sujeitas às leis de equilíbrio ecológico que regem todas as espécies vivas. Com esta premissa de base, Thomas Robert Malthus escreve em 1798 a primeira edição dos seus princípios na obra An essay on the principle of population as it affects the future improvement of society with remarks on the speculations of Mr. Godwin, Mr. Condorcet and others writers.

Embora tenha havido mais cinco edições, a última das quais em 1826, a ideia central – o princípio da população - está presente em todas elas. De acordo com este princípio, a população, se não for controlada, cresce em progressão geométrica, enquanto a produção de alimentos em progressão aritmética.

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De acordo com Malthus, os problemas gerados pelo elevado crescimento demográfico teriam que ser combatidos através do controlo da natalidade para que não ocorresse, num futuro breve, a falta de alimentos e o aumento considerável da fome e da miséria no mundo.

Como o trabalho de Malthus se baseia nas leis do equilíbrio biológico, a ideia de superpopulação está associada à noção de praga biológica que ocorre quando a população de uma dada espécie tem alta taxa de natalidade e baixa taxa de mortalidade, de modo que o número de indivíduos cresce, pressionando os recursos naturais a ponto de desequilibrar o meio envolvente. As soluções que Malthus preconizava eram basicamente três:

a) A sujeição moral de retardar o casamento; b) A prática da castidade antes do casamento;

c) Ter somente o número de filhos que se pudessem sustentar.

Estas soluções equilibrariam a relação necessária entre população e os recursos existentes. Como referem Castro et al.:

Para Malthus (1798), qualquer progresso na distribuição de recursos ou no combate às doenças apenas podia gerar um mundo mais cheio temporariamente, pois o crescimento demográfico causaria pressões adicionais sobre os recursos disponíveis, os quais acabariam por se traduzir em fomes, epidemias, guerras e, consequentemente, no regresso ao mundo vazio. (2015:16)

Para ajudar os países a fazerem a previsão de curto prazo sobre o crescimento populacional e poderem, deste modo, tomar medidas para evitar problemas de ordem demográfica, Malthus chegou a criar um modelo matemático, conhecido como Lei de Malthus, que tinha como objetivo calcular o crescimento demográfico no curto prazo (10 a 20 anos).

A Teoria Malthusiana recebeu múltiplas críticas de diferentes autores nos anos seguintes à publicação dos Princípios. As duas principais críticas prendiam-se com o facto de a Teoria ser pessimista pois apontava para um cenário social mundial negativo, caso não fossem tomadas medidas de controlo da natalidade e, a segunda crítica, centrava-se na intocabilidade das classes possidentes – em particular a burguesia – relativamente aos problemas e males dos povos. A

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este propósito, Maria Luís Pinto socorrendo-se dos trabalhos de Vilquin (2006) e de Vidal (1994) refere:

Malthus acaba por fazer igualmente a apologia das desigualdades sociais, moralmente condenáveis, mas necessárias ao desenvolvimento da sociedade (…). Vidal transcreve, no entanto, um parágrafo de Malthus em que este afirma “C’est méconnaítre entièrement mes principes que de m’envisager comme un ennemi de la population. Les ennemis que je combats sont le vice et la misère ». Mas Vilquin continua a ter razão, e Malthus é saudado por essas classes pois, moralmente, sentem-se libertas de problemas de consciência. (Pinto, 2010:50)

A discussão à volta da teoria de Malthus vai permanecer todo o resto do século XIX e prolongar-se até aos dias de hoje. A separação política e ideológica que marca o pessimismo (o crescimento da população esgotará os recursos existentes) e o otimismo (as populações humanas conseguem sempre adaptar- se aos novos desafios que surgem) permanece muito atual (Butz, 2006).

Para além desta discussão, os movimentos que seguiram, na esteira do trabalho de Malthus – os neomalthusianos e os mais acérrimos opositores anti- malthusianos - vão convergir, embora em fases distintas, na necessidade de haver controlo de nascimentos no seio do casamento, isto é, vão defender a necessidade da contraceção.

No entanto, para o neomalthusianismo o intenso crescimento populacional seria o responsável pelo avanço da fome e da pobreza (subdesenvolvimento de um país). Com a aceleração do crescimento populacional tentava-se explicar o subdesenvolvimento e a pobreza. O crescimento populacional, não controlado, provoca a elevação de gastos governamentais com serviços vários. Tal comprometia a realização de investimentos nos setores produtivos e dificultaria o desenvolvimento económico.

Aceitando que uma população numerosa seria um obstáculo ao desenvolvimento e levaria ao esgotamento dos recursos naturais, os neomalthusianos vão defender a contraceção no casamento (planeamento familiar) como um meio de reduzir o ritmo de aumento da população.

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Muitos dos críticos ao neomalthusianismo defenderam que a superpopulação é consequência e não a causa do subdesenvolvimento. Em países desenvolvidos, onde há melhor qualidade de vida, ocorre um maior controlo da natalidade. Ao invés, nos países subdesenvolvidos, há um menor controlo da natalidade.

Durante o século XIX uma das alternativas ao pensamento de Malthus foi outra teoria/doutrina defendida por Karl-Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895). O materialismo dialético parte do pressuposto de que o capitalismo está cheio de contradições internas; enfatiza-se o papel central do proletariado na luta de classes e, portanto, na necessária ascensão social das classes mais desfavorecidas.

Ao contrário do Malthusianismo, o Marxismo em relação aos assuntos relacionados com as populações tem uma visão otimista. Para Marx e Engels os problemas populacionais são neutros em relação às grandes forças da história. Veja-se, a este respeito, o que escreve John May:

The Marxist doctrine applied in the communist countries has usually downplayed the population factor and individual on the part of the state a laissez-faire attitude with respect to population issues. (2012:45)

Para os defensores da teoria marxista, mais do que intervir em fatores demográficos, é necessário ter em atenção à exploração imposta aos países pobres pelos países mais desenvolvidos, que resultou num excessivo crescimento demográfico e na pobreza generalizada. Defendem (entre outras) a adoção de reformas socioeconómicas para superar esses graves problemas. No entanto, o debate em torno das relações entre as variáveis socioeconómicas e o crescimento populacional continuou em aberto. Atente-se ao trecho que a seguir se apresenta onde se mostram exemplos de trabalhos que sustentam as duas posições.

Nevertheless, ever since the publication of Malthus’ Essay, the relationships between socioeconomic variables and population growth have been hotly debated, especially with respect to the developing countries (…). For instance, India was used as a case study in the ground-breaking book by Coale and Hoover (1958),

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which asserted that a country that experiences a decline in fertility would achieve an increase in individual income. Other authors, however, have denied any major impact of demographic variables on socioeconomic development and “saw population growth as fairly neutral factor in development performance” (May 2012: 46)