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Teorias diplomáticas

No documento HISTÓRIA GERAL DA ÁFRICA (páginas 54-57)

Essas teorias oferecem a explicação puramente política da partilha, e talvez a mais comumente aceita. Mas – é interessantíssimo – fornecem suporte especí- fico e concreto às teorias psicológicas. Permitem ver os egoísmos nacionais dos Estados europeus, seja em conflito uns com os outros, seja agindo em acordo para se defenderem, seja ainda reagindo de maneira decisiva contra as forças

13 SCHUMPETER, 1955, p. 6. 14 Ibid., p. 65.

dos nacionalistas africanos radicais. Propomos, assim, tratar essas teorias abor- dando sucessivamente o prestígio nacional, o equilíbrio de forças e a estratégia global.

Prestígio nacional

O principal defensor desta teoria é Carlton Hayes, que, num texto de grande lucidez, sustenta:

A França procurava uma compensação para as perdas na Europa com ganhos no ultramar. O Reino Unido aspirava compensar seu isolamento na Europa engrande- cendo e exaltando o império britânico. A Rússia, bloqueada nos Bálcãs, voltava -se de novo para a Ásia. Quanto à Alemanha e à Itália, queriam mostrar ao mundo que tinham o direito de realçar seu prestígio, obtido à força na Europa por faça- nhas imperiais em outros continentes. As potências de menor importância, que não tinham prestígio a defender, lá conseguiram viver sem se lançarem na aventura imperialista, a não ser Portugal e Holanda, que demonstraram renovado interesse pelos impérios que já possuíam, esta última principalmente, administrando o seu com redobrado vigor15.

Hayes conclui dizendo que, fundamentalmente, “o novo imperialismo era um fenômeno nacionalista” e que seus defensores tinham sede ardente de prestígio nacional. Em suma, tendo consolidado e redistribuído as cartas diplomáticas no seu continente, os dirigentes europeus eram propelidos por uma força obscura, atávica, que se exprimia por uma “reação psicológica, um desejo ardente de manter ou de restaurar o prestígio nacional”.

Conclui Carlton Hayes, portanto, que a partilha da África não foi um fenô- meno econômico16.

Equilíbrio de forças

F. H. Hinsley17 sublinha, por sua vez, que o desejo de paz e de estabilidade dos

Estados europeus foi a causa principal da partilha da África. Segundo diz, a data decisiva, de verdadeira passagem para a era extraeuropeia – a era do imperialismo –, foi 1878. A partir daí, no congresso de Berlim, a rivalidade russo -britânica nos Bálcãs e no Império Otomano quase levou as nações europeias a um conflito

15 HAYES, 1941, p. 220. 16 Ibid.

generalizado. Mas os estadistas, voltando atrás, souberam evitar essa crise na política de poder. Daí em diante, até a crise da Bósnia, em 1908, tal política, banida da Europa, correu livremente na África e na Ásia. Quando os conflitos de interesses na África ameaçaram a paz na Europa, as potências europeias não tiveram outra escolha senão retalhar a África. Era o preço para se salvaguardar o equilíbrio diplomático europeu, estabilizado nos anos de 1880.

Estratégia global

Uma terceira escola sustenta que o interesse da Europa pela África – o qual provocou a invasão e a partilha – era de fato ditado por uma estratégia global e não pela economia. Os grandes defensores dessa teoria, Ronald Robinson e John Gallagher, que acentuam a importância estratégica, para o Reino Unido, do eixo África -Índia, atribuem a responsabilidade da partilha à influência dos movimentos atávicos “protonacionalistas” na África, que ameaçavam os interes- ses estratégicos globais das nações europeias. Essas “lutas românticas e reacioná- rias” – galantes anacronismos, na opinião deles – teriam compelido os relutantes estadistas europeus, até então contentes com o exercício de uma discreta hege- monia e o recurso à persuasão, a partilhar e conquistar a África contra a vontade. Portanto a África teria sido ocupada, não porque tivesse riquezas materiais a oferecer aos europeus – pois então não tinham valor do ponto de vista econô- mico –, mas porque ameaçava os interesses dos europeus alhures18.

Um objetivo básico tanto das teorias psicológicas como das diplomáticas, a elas aparentadas, é acabar com a ideia de que a partilha da África se deve a motivos econômicos. Mas a tese do prestígio nacional mostra -se pouco con- vincente precisamente quando os fatores econômicos a ele concomitantes são eliminados ou minimizados demais. Carlton Hayes, por exemplo, documentou pormenorizadamente a guerra tarifária a que se lançaram as nações europeias durante o período crucial da partilha19. Admite mesmo que

o que desencadeou, de fato, a corrida econômica para o ‘Continente Negro’ e para as ensolaradas ilhas do Pacífico não foi tanto a superprodução de bens manufaturados na Europa como uma escassez de matérias -primas”20, e que, em consequência, “para

impedir que uma parte demasiadamente grande do mundo fosse [...] monopolizada

18 Ver GALLAGHER & ROBINSON, 1953; ROBINSON & GALLAGHER, 1962, 1961. 19 HAYES, 1941, p. 205 -8.

pela França, Alemanha, Itália ou outra potência protecionista, a Grã Bretanha inter- veio vigorosamente para juntar a parte do leão a seu império livrecambista.

Por outras palavras, uma vez estabelecido, o neomercantilismo teve importan- tes consequências para a emergência das rivalidades imperialistas21. No entanto,

na página seguinte, ele contesta com bastante segurança, como já vimos, as bases econômicas do novo imperialismo!

H. Brunschwig, propondo uma interpretação não econômica do imperia- lismo francês, também se viu obrigado, diante da inegável dimensão econômica do imperialismo, a reconhecer -lhe afinal um papel. Ao mesmo tempo que qua- lificava o imperialismo anglo -saxão como econômico e filantrópico, o da França lhe parecia motivado pelo prestígio nacional22.

Já a tese da estratégia global suscitou entre os especialistas reações bastante negativas, mas atraiu irresistivelmente historiadores não africanistas e o grande público. Sabemos, no entanto, que essa tese, elaborada a partir das hipóteses de Langer23, mais ecléticas, e de Hinsley, mais ponderadas, é demasiado cate-

górica e circunstancial para ser admissível. Na África ocidental, central, austral e oriental demonstrou -se falha24. No tocante ao Egito e à África do norte,

mostrou -se que havia fortes razões para a presença britânica naquela área sem ligação com a estratégia imperialista do Reino Unido relativa à Índia25.

É gratificante notar que, por sua vez, Robinson começa a atribuir menos importância às exageradas repercussões do bâton égyptien nas lutas coloniais em toda a África26.

No documento HISTÓRIA GERAL DA ÁFRICA (páginas 54-57)