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2.5 A isenção tributária na doutrina

2.5.1 Teorias que definem a isenção tributária

Já se disse que muitas são as teorias que tratam de definir a isenção tributária, algumas importadas e aplicadas no ordenamento pátrio sem muitos cuidados, e outras mais profundas e elaboradas com esmero para o sistema positivo brasileiro. Passa-se adiante a tratar das teorias mais relevantes, trazendo ao estudo seus expoentes e seguidores, de dentro e de fora do país. Contudo, não se pretende esgotá-las nem apresentar todas as nuances e divergências daqueles que se afiliam a uma ou outra definição específica, senão em alguns casos pertinentes, quando se demonstram sobremaneira relevantes. João Augusto Filho elaborou excelente trabalho aporético sobre o assunto e veio a expor com precisão seis das mais influentes teorias sobre a isenção tributária122.

De início, já se demonstra necessário apresentar, ainda que em termos provisórios, porque merecerá melhor abordagem, uma diferenciação que a doutrina estrangeira adota e foi, talvez com razão, pouquíssimo difundida no Brasil. Trata-se de distinguir a exclusão da isenção tributária. Percebe-se na obra de João Augusto Filho que a definição de um destes dois institutos pode alterar consideravelmente o segundo e ambos estão relacionados, de alguma forma, com a hipótese tributária (antecedente da norma jurídica de tributação).

Neste sentido, expõe o autor que tinha por objetivo, em sua obra, estabelecer se a) as exclusões tributárias são despidas de significado jurídico ou se integram, como conceitos auxiliares, isto é, como predicados negativos do tipo tributário, a norma jurídica definidora da hipótese de incidência tributária; b) se as disposições sobre a isenção devem ser tomadas como normas jurídicas autônomas ou, ao contrário; c) se também são apenas definidoras da hipótese de incidência tributária; d) para, ao final, estabelecer se exclusões e isenções tributárias se inserem, ou não, em um único conceito jurídico.123 Estes, inclusive, também são objetivos deste trabalho dissertativo.

122 AUGUSTO FILHO, João. Isenções e Exclusões Tributárias. São Paulo: José Bushatsky, 1979. 123 Ibid., p. 16-17.

Enfim, não se mostra insipiente alertar que a exclusão tributária nada tem de similar à exclusão do crédito tributário tratado no Capítulo V do CTN: enquanto este se refere ao

crédito tributário, figura constante da obrigação tributária e que aparece, portanto, apenas no

consequente da norma jurídica de tributação, a discussão que gira entorno da exclusão tributária (e não do crédito) volta-se para a hipótese tributária.

a) Isenção como dispensa legal do pagamento de tributo devido. Esta é a teoria

adotada por Rubens Gomes de Souza e perfunctoriamente analisada no tópico anterior. Segundo o professor paulista, com o acontecimento do evento tributário haveria a incidência da norma de tributação e, com esta, o nascimento da obrigação tributária. Posteriormente, em razão da incidência de outra norma, a isencional, dispensar-se-ia o pagamento. Em suas palavras:

É importante fixar bem as diferenças entre não incidência e isenção: tratando-se de não incidência, não é devido o tributo porque não chega a surgir a própria obrigação tributária; ao contrário, na isenção o tributo é devido, porque existe a obrigação, mas a lei dispensa o seu pagamento; por conseguinte, a isenção pressupõe a incidência, porque é claro que só se pode dispensar o pagamento de um tributo que seja efetivamente devido. Finalmente, a não incidência decorre da própria definição do fato gerador contido na lei tributária: desde que o fato ocorrido não corresponda àquela definição, dá-se a não incidência; a isenção, ao contrário, depende de lei expressa, justamente por ser um favor, isto é, uma exceção à regra de que, verificado o fato gerador, é devido o tributo.124

Todavia, não obstante os relevantes avanços que se deram em razão dos estudos iniciados por Rubens Gomes de Sousa, não nos parece haver muito sentido tratar a fenomenologia normativa como uma sucessão cronológica de incidências de um mesmo evento. Paulo de Barros Carvalho ressalta que “Não há cronologia na atuação de normas vigorantes num dado sistema, quando contemplam idêntico fato do relacionamento social.”125.

No momento em que se dá o evento (o suporte fáctico de Pontes de Miranda), várias normas podem ser incididas, o que daria nascimento a vários fatos e relações jurídicas. Porém, se a mesma ocorrência der gênese a relações jurídicas contraditórias, então há uma antinomia presente no sistema que deve ser sanada pelo jurista126. Sustentar que o mesmo evento jurídico pode criar a obrigação de realizar o pagamento e de não ter que cumprir a obrigação

124 SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de Legislação Tributária. São Paulo: Resenha Tributária, 1975, p.

97.

125 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 524. 126 A antinomia e seus métodos de solução serão objeto de estudo do próximo capítulo desta dissertação.

de pagar é uma contradição nos próprios termos e apenas uma das duas normas poderia se sustentar no ordenamento.

Sainz de Bujanda afirma que a isenção supõe que a obrigação tributária não chega a surgir, exatamente porque é outro instituto jurídico – a remissão – que recai sobre o pagamento: na isenção não existe a obrigação de pagar e, este, portanto, não pode nunca ser dispensado.127 A explicação do mestre espanhol é perfeitamente aplicável no Brasil.

Ademais, uma dispensa do pagamento seria uma hipótese de facultatividade do sujeito passivo tributário. Dispensa é a “licença, permissão para não executar um dever, um trabalho”128, ou seja, o devedor tributário poderia escolher ou não realizar o pagamento do tributo, o que a princípio, não parece ser uma escolha que caiba ao contribuinte, situação que possivelmente esvaziaria situações de tributos estabelecidos com fins extrafiscais, argumento que também será retomado adiante.

Outras duas teorias, a do privilégio legal ou do favor legal, decorrem, ou até mesmo se confundem, com a teoria da “dispensa legal do pagamento”. Rubens Gomes de Souza, inclusive, já se referia à isenção como favor.129 José Souto Maior Borges apresenta estas vertentes e a elas tece enfática crítica: “Considerada a isenção uma liberalidade, favou ou privilégio, segue-se que estaria ditada apenas por motivos de conveniência e oportunidade, cuja apreciação é discricionariamente objeto de decisão política do poder tributante.”130. Portanto, não há como se sustentar, nos termos da Constituição Federal de 1988, uma isenção- favor ou isenção-privilégio.

b) Isenção como delimitação negativa da hipótese de incidência tributária ou “mera técnica de redação legislativa”. João Augusto Filho afirma que, para os autores que

sustentam esta teoria, “não passa a isenção de mera técnica legislativa para delimitar, por forma negativa, a exata compreensão (no sentido desta palavra em Lógica) da hipótese de

127 “Por lo general, la exención supone que la obligación tributaria no llega a surgir, por lo que con aquélla el

beneficiario no queda dispensado de ningún pago. Le exoneración de pagar sólo puede, en términos jurídicos, otorgar-se a quien previamente esté obligado, que es precisamente lo que no ocurre al beneficiario de la exención”. (SAINZ DE BUJANDA, Fernando. Hacienda y Derecho: Estudios de Derecho financiero. v. 3. Madrid: Instituto de Estudios Políticos, 1963, p. 409-410). Em momento posterior, o autor admite a hipótese de isenção parcial, o que não impede de utilizar este argumento para elucidar a questão da incongruência da dispensa legal do pagamento.

128 HOUAISS. Instituto Antonio Houaiss. Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa. Versão

monousuário, 3.0. CD-ROM. Rio de Janeiro: Objetiva, jun. 2009, s.v. Dispensa.

129 Repita-se: “a isenção, ao contrário, depende de lei expressa, justamente por ser um favor, isto é, uma exceção

à regra de que, verificado o fato gerador, é devido o tributo.” (SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de Legislação Tributária. São Paulo: Resenha Tributária, 1975, p. 97).

130 BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da Isenção Tributária. 3. ed., 2. tir. São Paulo: Malheiros, 2007,

incidência do tributo”131. A isenção tributária serviria como forma do Poder Legislativo alterar a hipótese tributária ao modificar os suportes fácticos sobre os quais deveria incidir. Não haveria distinção entre exclusão e isenção e esta última não apresentaria, portanto, autonomia jurídica frente à norma de tributação, tendendo a um formalismo jurídico extremado.

No Brasil, Luciano Amaro adota este entendimento e explica cuidadosamente a isenção como técnica legiferante em trecho logo que, pela relevância, merece ser colacionado integralmente:

Finalmente, a isenção. O que há aqui é uma técnica peculiar utilizada no processo de definição do campo de incidência. Suponhamos que o legislador possa, num universo de cem espécies, tributar noventa (porque as outras dez são imunes e, portanto ficam fora do campo onde a competência tributária pode ser exercitada). Se o legislador ordinário não tributar essas noventa espécies, total ou parcialmente, teremos a situação que referimos no parágrafo anterior (não-incidência pura e simples). Mas pode ocorrer que o legislador, pretendendo tributar parte das noventa espécies, decida, em vez de relacionar as espécies que efetivamente queira gravar, optar pela técnica da isenção, que consiste em estabelecer, em regra, a tributação do universo, e, por exceção, as espécies que ficarão fora da incidência, ou seja, continuarão não tributáveis. Essas espécies excepcionadas dizem-se isentas.132

Tratar a isenção como mera técnica legislativa parece afirmar que se trata de uma mera faculdade do legislador em estabelecer tais “espécies excepcionadas”. Interpretação esta que pode levar a crer que as isenções não obedeceriam a princípios constitucionais como o da igualdade, o da capacidade contributiva e o da generalidade da tributação, podendo ser estabelecida e revogada de acordo com a arbitrariedade do Poder Legislativo. Deve, portanto, ser evitada.

c) Isenção como tutela jurídica do interesse do contribuinte. Este é o entendimento

adotado por Salvatore La Rosa em uma das obras mais profundas sobre o tema, em que estabelece interessante relação entre a isenção tributária e os princípios da igualdade e da capacidade contributiva. Neste estudo, afirma-se uma prevalência do interesse do contribuinte sobre o interesse fiscal, em que, na isenção tributária,

131 AUGUSTO FILHO, João. Isenções e Exclusões Tributárias. São Paulo: José Bushatsky, 1979, p. 35.

132 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Em sentido semelhante,

cf. Sacha Calmon Navarro Coêlho, para quem: “A imunidade e a isenção são, existem, vêm de entes legais positivos. A não-incidência natural ou pura como tal inexiste, é um não-ser. A imunidade e a isenção são técnicas legislativas.” (Curso de Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 150).

pressupõe-se como valor jurídico digno de autônoma tutela o interesse do contribuinte à conservação de sua riqueza, que deve ser tomada, como consequência da incidência do interesse estranho àquele ao qual a norma impositiva opera, e ao qual o ordenamento tutela positivamente, ainda que de forma indireta.133

Distingue, também, exclusão de isenção tributária ao afirmar o professor da Universidade de Catania que a exclusão seria a forma negativa da definição do fato gerador da obrigação tributária, enquanto que a isenção representaria sua disciplina jurídica interna ao ordenamento134.

Isto posto, segundo o entendimento do autor italiano, o legislador tutela o interesse do contribuinte de não dispor de sua riqueza, mesmo nos casos em que há uma norma de tributação a tutelar, em favor do interesse fiscal, tal fato como passível de tributação. Assim, a norma isentiva seria autônoma porque teria consequências próprias: juridicizar o interesse do contribuinte ao valorar positivamente e, assim, protege-o para conservar sua riqueza e evitar a tributação.135

Um grande problema que se vê neste posicionamento é pôr o interesse do contribuinte frente ao do fisco e afastar, por completo, o interesse público. No caso, o interesse resguardado não é o de um ou outro contribuinte, ou mesmo o interesse do fisco, pois as normas tributárias voltam-se para a arrecadação de valores que permitam ao entes políticos, ou quem lhes faça as vezes, cumprirem suas funções constitucionalmente estipuladas. A isenção ou a tributação não pode ser estabelecida com fins a tutelar o interesse de uma determinada classe (contribuinte ou fisco), mas para tutelar o interesse da sociedade como um todo: arrecadando mais, arrecadando menos ou mesmo não arrecadando.

d) Isenção como fato impeditivo. Segundo João Augusto Filho, esta talvez seja a

teoria de maior aceitação na doutrina estrangeira e seria adotada, ainda que implicitamente,

133 LA ROSA, Salvatore. Eguaglianza Tributaria ed Esenzioni Fiscali. Milano: Dott. A. Giuffrè, 1968, p. 139.

No original: “[…] l’assunzione a valore giuridico meritevole di autónoma tutela dell’interesse del contribuente alla conservazione della ricchezza che dovrebbe esere prelevata, come conseguenza dell’incidenza di interessi estranei a quelli sui quali le norme impositivi operano, ed ai quali l’ordinamento così accorda una positiva, ancorchè indiretta, tutela.”.

134 Neste sentido: “[...] abbia una notevole importanza la distinzione tra le esclusioni (identificate con le

disposizioni le quali concorrono, in forma negativa, alla definizione del fato generatore dell´obbligazione tributaria) e le esenzioni fiscali (ravvisate in quelle le quali rappresentano aspetti della sua disciplina giuridica).” (ibid., p. 125).

135 “Il fato che si abbia asenzione solo allorché l´intassabilità è dovuta all´incidenza di interessi esterni rispetto a

quelli sui quali operano i tributi, ed ai quali l´ordinamento intende accordare una (sia pure indiretta) tutela, è proprio l´indice dell´esistenza di una autonoma qualificazione dell´interesse del contribuente alla conservazione della ricchezza.” (ibid., p. 187).

por Alberto Xavier, Enrico Allorio, Antonio Berliri, Sainz de Bujanda, 136 Alfredo Augusto Becker137 e o próprio João Augusto Filho138. Para esta corrente, a hipótese de incidência é verificada no mundo social, mas não há obrigação tributária porque a norma de isenção impede sua incidência, sendo esta, portanto, uma norma autônoma e com um predicado a mais, um plus, em relação à norma de tributação, a tolher sua eficácia. “A isenção dá-se quando, não obstante se ter verificado o facto tributário em todos os seus elementos, a eficácia constitutiva deste é paralisada originariamente pela ocorrência de um outro facto a que a lei atribui assim eficácia impeditiva.”139.

Há, contudo, dissenções entre aqueles postos como seguidores desta teoria. Alguns, a exemplo de Alfredo Augusto Becker, afirmam que a norma de isenção, não obstante conter predicados a mais, retira, também, predicados da norma de tributação, e incide apenas quando aquela não pode incidir. Trata-se de situação disjuntiva excludente, ou seja, ou aplica-se uma ou outra, nunca as duas, porque compostas por hipóteses de incidência diversas:

Para que pudesse existe aquela anterior relação jurídica tributária, seria indispensável que, antes da incidência da regra jurídica de isenção, houvesse ocorrido a incidência da regra jurídica de tributação. Porém, esta nunca chegou a incidir porque faltou, ou excedeu, um dos elementos da composição de sua hipótese de incidência, sem o qual ou com o qual, ela não se realiza.140

Vê-se que não se assemelha muito com a teoria do fato impeditivo, pois não se verifica, no caso, a hipótese de incidência da norma de tributação, mas apenas a hipótese de incidência da norma isentiva.

O mesmo pode-se dizer de Sainz de Bujanda, para quem a norma de isenção alberga inclusive os fatos que dão nascimento à obrigação tributária e afirmar existirem as chamadas isenções parciais.141 Neste sentido, parece contraditório falar em fato impeditivo que pode

136 Cf. AUGUSTO FILHO, João. Isenções e Exclusões Tributárias. São Paulo: José Bushatsky, 1979, p. 38 et

seq.

137 Cf. ibid., p. 69. 138 Ibid., p. 124.

139 XAVIER, Alberto. Manual de Direito Fiscal. v. 1. Lisboa: Almedina, 1974, p. 283-284.

140 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 4. ed. São Paulo: Marcial Pons; Noeses,

2007, p. 325.

141 “Es, en efecto, cierto que en la mayoría de los casos la exención impide que nazca la deuda tributaria. Ahora

bien: ¿ocurre esto siempre? Creo que no. Se me ocurren estos ejemplos, en los que no advierto como podría afirmarse la inexistencia del nacimiento de una obligación, a pesar de estar en presencia de una exención tributaria: 1.º El supuesto de las exenciones parciales, en las que el hecho imponible se produce y genera una deuda tributaria, aunque, a virtud de mecanismos a los que luego aludiré, sea dicha deuda de cuantía inferior a la que normalmente hubiera correspondido ; y 2.ºEl supuesto de las exenciones que despliegan su eficacia

nada impedir, isto é, nas isenções parciais haveria apenas uma redução da carga tributária, mas a obrigação tributária teria nascimento como consequência da incidência da hipótese tributária e seu cumprimento não seria (totalmente) afastado.

O maior empecilho que se observa em definir a isenção tributária como um fato impeditivo e alegar a coexistência de duas hipóteses que contenham a previsão de um mesmo evento é, exatamente, o desnecessário conflito entre as normas de isenção e de tributação: independentemente daquela ter um predicado a mais que esta, sustentam seus defensores que a norma de isenção impede (fato impeditivo) a incidência da norma de tributação. Porém as normas não brigam entre si. E o ordenamento, com fins a evitar a antinomia, exporia formas de retirar uma das duas do sistema, com sérios resultados teóricos e práticos. Destarte, não haveria como se falar, desde já, em uma coexistência, ou talvez mais precisamente, em uma covigência (vigência simultânea) de duas normas que se voltam para o mesmo evento e determinem relações jurídicas diversas e contraditórias: a da obrigação tributária a obrigar ao pagamento, enquanto a norma isentiva teria em seu consequente o impedimento desta mesma prestação.

A posição de Augusto Becker, por sua vez, já se demonstra mais coesa e afasta a incongruência ao afirmar, categoricamente, que a norma de isenção incide apenas em situações em que a norma de tributação não pode incidir, seja porque faltou ou porque excedeu um de seus elementos de composição: as hipóteses de incidência são diversas e, consequentemente, não são contraditórias nem contrárias. Argumento que parece retirar o autor paulista desta definição de isenção como fato impeditivo.

e) Isenção como não-incidência legalmente qualificada (posição de José Souto Maior Borges). De início, a definição pareceu um pouco sucinta e a “não-incidência

qualificada por lei” foi objeto de severas críticas: não se a diferenciaria, por exemplo, das excludentes de ilicitude do fato penal típico, pois estas também são hipóteses de não- incidência legalmente qualificada, apesar de não serem isenções142, bem como padeceria do vício da definição pela negativa, o que é bastante repugnado pela Lógica Clássica143.

A primeira crítica foi afastada pelo professor pernambucano ao especificar a definição apresentada dentro do contexto do direito tributário, ou seja, complementa-se-a com uma excluyente de la carga tributaria mediante el sistema de rembolso de cuotas impositivas previamente satisfechas.” (SAINZ DE BUJANDA, Fernando. Hacienda y Derecho: Estudios de Derecho financiero. v. 3. Madrid: Instituto de Estudios Políticos, 1963, p. 427).

142 Cf. AUGUSTO FILHO, João. Isenções e Exclusões Tributárias. São Paulo: José Bushatsky, 1979, p. 75. 143 Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 526.

locução, qual seja a norma de isenção é a não-incidência legalmente qualificada da norma

jurídica de tributação. Isto é, a norma jurídica de isenção implica a não-incidência da norma

de tributação e é posta no sistema mediante enunciados previstos em lei infraconstitucional. Neste sentido, “em decorrência da isenção, dá-se o fato isento, distinto enquanto tal do ‘fato gerador’ da obrigação tributária, fato jurídico tributário no sentido estrito. Como o fato aí é juridicamente qualificado, não se extrapassa o campo normativo”144.

À segunda crítica, contudo, José Souto Maior Borges elaborou resposta mais longa. Delimitou e melhor explicou a teoria em tópico específico de sua obra145. A regra da Lógica, em verdade, estipula que a definição não deve ser negativa quando pode ser afirmativa em razão de haver, para um termo, uma quantidade excessiva de coisas que este não significa. Porém nada impede que, em casos de poucos objetos abarcados, defina-se o conceito pela negativa, a exemplo dos triângulos, conforme explicação de Irving Copi: “Como existem apenas três espécies de triângulos, quando esse gênero é dividido de acordo com os comprimentos relativos dos lados, uma definição perfeitamente adequada de ‘triângulo escaleno’ é a de um triângulo que não é eqüilátero nem isósceles.”146. E assim arremata o mestre da Faculdade de Direito do Recife:

Se assim o é, está atendida na hipótese a ressalva da regra: a definição que formulei é destinada a um conjunto limitado (finito: diriam os lógicos) de normas bem demarcado: as normas isentantes em sua relação com as normas obrigacionais tributárias. Porque não se trata genericamente de normas, mas especificamente de normas obrigacionais tributárias, todas elas podem ser abrangidas, sem contra- indicação lógica, pela negação. Prestigiada está, portanto, a ponderação de Irving Copi. São muito diferentes as hipóteses em que a negação, essa sim inaceitável,