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Trajetória da legislação sobre salário docente

3.2 REMUNERAÇÃO DOCENTE

3.2.1 Trajetória da legislação sobre salário docente

Segundo Marx (1982), salário corresponde ao valor da força de trabalho e ao mínimo necessário à formação e preservação do trabalhador, equivalendo aos custos de reposição da sua capacidade de trabalho.

34 A questão salário do professor e sua relação com a qualidade da educação será aprofundada ainda nesse

Para que não se incorra em uma análise superficial acerca de salário do professor35

, necessita-se compreende-lo no plano legal desde os tempos mais remotos.

Conforme Monlevade (2000) a Constituição Imperial de 1824 já fazia menção expressa à necessidade de melhores salários, condições de trabalho e qualificação para os professores. De acordo com Pinto (2009) a primeira lei geral de educação do País, aprovada em 15 de outubro de 182736, da mesma forma, dedicava sete de um total de dezessete artigos

aos professores, definindo inclusive o valor de seus vencimentos.

A lei de 1827, quando a moeda em vigor era o Real original, mais conhecido pela alcunha de Réis, muito embora não definisse a hora-atividade, estabelecia que os ‘ordenados’ dos professores teriam um valor ‘de 200$000 a 500$00 anuais, com atenção às circunstâncias da população e carestia dos lugares’. Em valores de 2009, esses salários representariam, respectivamente, R$ 1.138 e R$ 2.846, mensais, considerando13 salários por ano. Não deixa de ser curioso que o piso aprovado em 2008, de R$ 950, em valores de janeiro daquele ano, atualizado para janeiro de 2009, com base no índice definido pela legislação, e que considera a variação do valor mínimo do Fundeb para as séries iniciais do ensino fundamental, corresponda a R$ 1.128/mês, ou seja, praticamente o ‘piso’ de 1827! (PINTO, 2009, p. 52).

A mesma lei fazia menção, inclusive, à aprovação do professor em concurso público, determinando um salário inferior aos candidatos não aprovados que assumissem as vagas que sobravam sem aprovação (MONLEVADE, 2000).

Pinto (2009) afirma que pouco efeito prático teve toda essa determinação legal, uma vez que, com a aprovação do Ato Adicional de 1834, passou-se às províncias a competência legislativa face ao então ensino primário e secundário.

De acordo com Campos (2002), a remuneração dos professores, nessa época era considerada muito baixa. Nesse sentido, a mesma autora destaca que, por volta de 1880, só poderia exercer a docência pessoas que tivessem outras atividades remuneradas, que não tivessem encontrado outra atividade melhor, ou ainda que tivessem a família para apoiar, como as mulheres, o que já demonstrava a desvalorização do trabalho docente.

Monlevade (2000) em sua tese de doutorado enfatiza que, nessa época, os salários além de baixos eram diferenciados não apenas regionalmente, mas também por nível de ensino e função exercida no magistério, sendo que os professores secundários recebiam mais que os professores primários e ambos eram superados pelos salários mais altos pagos aos administradores escolares.

35 Durante o texto, utilizar-se-á o termo professor e docente no mesmo sentido, qual seja, professor do ensino

básico. Ainda que docente seja mais comumente usado para referir-se aqueles que lecionam em graduação e pós- graduação.

Em 1932 o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, também apontou sérios problemas enfrentados pelos professores da época, relacionados a formas de ingresso na carreira e formação. De acordo com o Manifesto, os professores do secundário e superior eram na maior parte, “recrutados em todas as carreiras, sem qualquer preparação profissional”. Haja vista que a preparação dos professores era “tratada de maneira descuidada, como se a função educacional fosse a única para cujo exercício não houvesse necessidade de qualquer preparação profissional”. Portanto o Manifesto defendia a “incorporação dos estudos do magistério às universidades” (formação superior) e melhor remuneração dos professores, “que lhe permitissem manter a eficiência no trabalho, a dignidade e o prestígio indispensáveis aos educadores” (MANIFESTO, 1932).

Posteriormente, na Constituição Federal de 1937 ficou estabelecido como sendo competência da União fixar as diretrizes da educação nacional. No entanto, a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), n 4.024, só foi aprovada em 1961 e, em seu texto, apesar de haver menção à formação esperada dos professores, não se encontra referência à carreira docente nem a sua remuneração (ABREU, 2008).

Passado alguns anos, com o governo ditatorial decorrente do golpe militar de 1964, foram implementadas reformas no sistema educacional brasileiro que reorganizaram toda a Educação Básica. A lei n 5.692 de 1971 foi um dos instrumentos utilizados para isso. De acordo com Abreu (2008), essa lei assegurava que os sistemas de ensino deveriam fixar a remuneração dos professores e especialistas, tendo em vista a maior qualificação em cursos de formação, aperfeiçoamento ou especialização, sem distinção de graus de atuação.

Monlevade (2000) aponta quatro fatores explicadores para esse processo de desvalorização docente no Brasil que vão ao encontro das orientações presentes no Manifesto de 1932, evidenciando que o processo de desvalorização, conforme demonstrado, é de longa data, mas se acentuou entre as décadas de 1950 e 1970.

1) O crescimento vegetativo e imigratório aceleram taxas de aumentos demográfico da população brasileira de 1900 a 1950; 2) A industrialização acelera migração campo-cidade e fortalece demanda por escolarização; 1920-1970; 3) O extraordinário aumento de matrículas exige multiplicação de postos de trabalho docente em ritmo superior aos crescimento de arrecadação de impostos disponíveis para o pagamento de vencimentos dos professores: 1950 – 1990; e 4) A baixa do salário dos professores concomitante à espiral inflacionária, comprime a função docente para o regime de 20 horas semanais, permitindo multijornadas ou multi- empregos: 1950 – 1994 (MONLEVADE, 2000, p. 34).

Com a Constituinte de 1988 houve alguns avanços como a exigência de planos de carreira para o magistério, o que significava um elemento de valorização dos professores. O

texto aprovado da Constituição de 1988 previa, no inciso V de seu artigo 206, valorização dos profissionais do ensino, garantidos, na forma de lei; planos de carreira para o magistério, com piso salarial e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos. Esse inciso sofreu modificações pela Emenda Constitucional n 19, de 1998 e, mais recentemente, em 2006, ganhou a seguinte redação, dada pela Emenda Constitucional n 53:

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: [...]

V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da

lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;

VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei; VII - garantia de padrão de qualidade;

VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.

(grifo nosso) (BRASIL, 1988).

Sob a égide da Carta Magna de 1988, os debates em torno da formação dos profissionais da educação, com a organização das entidades da área, em especial da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE), o Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED) e União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), tomaram grande impulso (BARBOSA, 2011).

Na década de 1990, mas precisamente no ano de 1994, no âmbito do Plano Decenal de Educação para Todos, durante o governo Itamar Franco, foi assinado o Acordo Nacional de Valorização do Magistério da Educação Básica e ainda o Pacto pela Valorização do Magistério e Qualidade da Educação, que estabelecia como imprescindível o compromisso de fixar um piso salarial profissional em R$ 300,00 para o professor, o que foi completamente ignorado pelo Governo de Fernando Henrique Cardoso em 1995 (BARBOSA, 2011).

Em meio a essa situação, ainda na década de 1990, continuava o conflituoso processo de tramitação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que foi promulgada em 1996 sob o número de Lei n 9.394, e trouxe no artigo 67 algumas especificidades relacionadas à valorização docente:

Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público:

I – ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos;

II – aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse fim;

III – piso salarial profissional;

IV – progressão funcional baseada na titulação ou na habilitação, e na avaliação do desempenho;

V – período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho;

VI – condições adequadas de trabalho. (BRASIL, 1996a).

Apesar da definição desses elementos resultarem das reivindicações da sociedade, a lei ainda deixou a desejar quanto a outras questões centrais, como a definição da jornada de trabalho, a instituição de um Piso Salarial Profissional Nacional para os trabalhadores da educação e a instituição concreta do que são condições dignas de trabalho. Sobre isso, Abreu (2008) afirma que a LDB é um marco na discussão dos planos de carreira por incorporar parte das reivindicações sociais, mas se omite em pontos importantes dessa discussão:

Outro marco para a discussão de Planos de Carreira, Cargos e Salários foi a Lei Nº 9394/1996, que instituiu as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. A lei aprovada, por um lado, incorpora o concurso público de provas e títulos, licença remunerada para estudos e outras demandas do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, dos Fóruns Estaduais em Defesa da Escola Pública e de outros segmentos organizados da sociedade civil comprometidos com a defesa de uma educação de qualidade. Estes setores defendiam uma LDB consubstanciada pelo Projeto Jorge Hage a despeito do projeto Darci Ribeiro. Por outro lado, a lei continua se omitindo sobre questões centrais, como a definição da jornada de trabalho, a instituição de um Piso Salarial Profissional Nacional para todos os trabalhadores da educação e a definição concreta do que são condições dignas de trabalho (ABREU, 2008, p. 42).

O instrumento mais próximo temporalmente da prescrição legal da LDB foi a Lei n 9.424, também aprovada em 1996, que regulamentava o Fundef, anteriormente instituído pela Emenda Constitucional n 14 de setembro de 199637, que entraria em vigor em 1998. Com

a instituição do Fundef o governo Federal despertou nos professores do ensino fundamental novas expectativas relacionadas à valorização docente. Todavia essa lei delegava a responsabilidade de regulamentação de questão como, a necessidade de remuneração condigna, aos sistemas de ensino e afirmava a elaboração de planos de carreira e remuneração do magistério, estipulando até 30 de junho de 1997 para que o Conselho Nacional da Educação (CNE) estabelecesse as diretrizes para tais elaborações (BRASIL, 1996b).

Em atendimento, o CNE emitiu o Parecer n 02 de 1997, que apesar de baseado nos preceitos constitucionais vinculados à valorização do magistério, a educação como direito social e a construção de uma carreira baseada na valorização e qualificação profissional, não

37 Aprovada em 12 de setembro de 1996, a EC n 14 foi uma iniciativa do governo federal que, entre outras

disposições, estabeleceu que estados, municípios e Distrito Federal deveriam aplicar, por dez anos, até 2006, pelo menos 60% do percentual constitucional mínimo de 25% (ou seja, 15%) de impostos no ensino fundamental, e instituiu, no âmbito do Distrito Federal e de cada estado, o Fundef, com vigência obrigatória a partir de 1º de janeiro de 1998 (DAVIES, 2004).

foi homologado pelo MEC (ABREU, 2008). Desta forma, o CNE teve que reconsiderar o que havia deliberado, para que então as novas diretrizes fossem aprovadas por meio da Resolução CNE/CEB n 3 de 1997. Segundo Abreu (2008), as divergências entre o MEC e o CNE no que diz respeito às diretrizes para os planos de carreira se davam, principalmente, em dois pontos: piso salarial nacional e custo aluno-qualidade:

A alegação do Ministério da Educação em relação ao primeiro ponto foi que os pisos salariais para o magistério seriam da competência, segundo o artigo 67 da LDB, explicitamente dos sistemas de ensino (federal, estaduais e municipais). Ou seja, estes entes federativos seriam os responsáveis por definir e assegurar os pisos salariais profissionais, através de estatutos e planos de carreira, deixando de lado a discussão sobre um Piso Salarial Profissional Nacional. [...] em relação ao custo- aluno-qualidade, o MEC pediu reexame do Parecer Nº 02/97, alegando que não havia estudos, e que nem o CONSED nem a UNDIME foram consultados no processo. Assim, segundo o MEC, formular um projeto que preveja a alocação de recursos sem que se indique a fonte é inócuo e sem sentido (ABREU, 2008, p. 45).

A Resolução CNE/CEB n 03/97, dentre outras coisas, continuava permitindo a existência de jornadas de trabalho inferiores a 40 horas semanais o que, por sua vez, pode levar à duplicação da jornada. Além disso, essa Resolução restringia a porcentagem de 20% a 25% da jornada destinada às horas-atividade e não mencionava o Piso Salarial Profissional Nacional (CNE/CEB, 1997).

Diante disso, o conselheiro João A. C. de Monlevade, da Câmara de Educação Básica do CNE, relator do Parecer n 02/97 que não foi aprovado pelo MEC, votou contrário ao parecer que deu origem a essa resolução e apresentou declaração de voto na qual se posiciona quanto à relação entre salários e valorização dos professores, indicando que a valorização salarial é necessária para reduzir a multi-jornada e o multi-emprego:

[...] se queremos valorizar o professor do ensino fundamental e dos outros níveis da educação básica – educação infantil e ensino médio – não posso absolutamente concordar com mecanismos que resultem em salários abaixo do potencial e, pior, tão insuficientes e indefinidos que irão forçar o professor à escolha da multi-jornada e do multi-emprego, condições que os Conselheiros desde o princípio da discussão das Diretrizes tinham identificada como fator de desvalorização profissional e desqualificação do ensino público (CNTE, 1998, p. 47).

Ainda em 1997, conforme demonstrado no capítulo anterior, a sociedade brasileira organizada no II Congresso Nacional de Educação (CONED) formulava o projeto do PNE – Proposta da Sociedade Brasileira. Esse plano previa a implementação de planos de carreira e do piso salarial nacionalmente unificado para todos os profissionais da educação (FÓRUM NACIONAL EM DEFESA DA ESCOLA PÚBLICA, 1997).

Entretanto tal projeto não foi aprovado, restando aceito em 2001 outro PNE (Lei n 10.172) que apesar de muitos retrocessos apontava a remuneração docente como uma das formas de possibilitar a valorização desses profissionais. Segundo o texto dessa lei, a valorização dos professores dependeria da garantia de condições adequadas de formação, trabalho e remuneração, mas também de uma contrapartida em termos de desempenho satisfatório dos docentes (BRASIL, 2001a).

Posteriormente, foi criado o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) por meio da Emenda Constitucional n 53/2006 e regulamentado pela Lei n 11.494/2007, em substituição ao Fundef, que vigorou de 1998 a 2006.

Assim como o Fundef, o Fundeb se caracteriza como um fundo especial de natureza contábil e de âmbito estadual (um fundo por Estado e Distrito Federal, num total de vinte e sete fundos), formado, na quase totalidade, por recursos provenientes dos impostos e transferências dos Estados, Distrito Federal e Municípios, vinculados à educação por força do disposto no art. 212 da Constituição Federal. Além desses recursos, ainda compõe o Fundeb, a título de complementação, uma parcela de recursos federais, sempre que, no âmbito de cada Estado, seu valor por aluno não alcançar o mínimo definido nacionalmente. Independentemente da origem, todo o recurso gerado é redistribuído para aplicação exclusiva na educação básica (FNDE, 2007).

Com vigência estabelecida para o período 2007-2020, a implantação do Fundeb começou em 1º de janeiro de 2007, sendo plenamente concluída em 2009, quando o total de alunos matriculados na rede pública foi considerado na distribuição dos recursos e o percentual de contribuição dos Estados, Distrito Federal e Municípios, para a formação do Fundo, atingiu o patamar de 20% (FNDE, 2007).

Na lei n 11.494/07, que regulamentou o Fundeb, a questão da remuneração docente, da mesma forma que no Fundef, continua central. O artigo 40 da referida lei especifica as responsabilidades de Estados e Municípios com a política de remuneração docente em prol da qualidade do ensino.

Art. 40. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão implantar Planos de Carreira e remuneração dos profissionais da educação básica, de modo a assegurar:

I - a remuneração condigna dos profissionais na educação básica da rede pública;

II - integração entre o trabalho individual e a proposta pedagógica da escola;

Parágrafo único. Os Planos de Carreira deverão contemplar capacitação

profissional especialmente voltada à formação continuada com vistas na melhoria da qualidade do ensino.

grifo nosso) (BRASIL, 2007).

A referida Lei também definiu, no artigo 41, o dia 31 de agosto de 2007, como prazo para o Poder Público definir o Piso Salarial Profissional Nacional para os profissionais do magistério público da educação básica. Segundo essa lei, pelo menos 60% da receita, recebida por meio da redistribuição dos impostos, deve ser destinada ao pagamento dos profissionais do magistério, contemplando, obviamente, os professores, portanto prioriza a valorização dos trabalhadores em educação, ao dispor sobre a necessidade de remuneração condigna por meio da criação do Piso Salarial Profissional Nacional (BRASIL, 2007).

Ao discutir a importância de tal piso salarial, Monlevade (2000) destaca tratar-se de reivindicação muito antiga no meio educacional. Esse autor também considera que:

O Piso, além de seu conceito formal, adquire um duplo e desafiante sentido. Primeiro, o de ‘segurar’ – como indica a palavra piso – o valor do salário do professor, corroído pela inflação que caracterizava os tempos da Constituinte de 1987-88 e ameaçado pelo aumento da demanda de matrículas e professores, desproporcional à oferta de recursos financeiros arrecadados pelos Poderes Públicos. Segundo, o de nivelar num patamar de ‘dignidade profissional’ o valor social do professor, desfigurado pela miséria e pelas diferenças salariais no território brasileiro (MONLEVADE, 2000, p. 111).

Somente em 16 de julho de 2008, é sancionada a lei n 11.738, que institui o PSPN, fruto de dois Projetos de Lei (PL): um oriundo do Senado Federal (PL 7431/06, de autoria do senador Cristovam Buarque) e outro do Executivo (PL 619/07), em que eram coautores MEC, CONSED e UNDIME.

Ressalta-se, por oportuno que embora a lei que instituiu o piso tenha sido sancionada em julho de 2008, o valor definido inicialmente de R$ 950 foi mantido como patamar mínimo também para o ano de 2009, devendo a diferença do vencimento inicial da carreira em relação a esse valor ser integralizada progressiva e proporcionalmente em 2/3 em 2009 e totalmente em 2010. Além de que, a norma legal que implementou o piso admitiu que, excepcionalmente em 2009, o valor definido para o PSPN pudesse ser completado com as vantagens pecuniárias – abonos e outros extras, ficando a União responsável por complementar a integralização do piso no ente federativo que comprovasse não dispor de recursos suficientes para tanto (BRASIL, 2008).

Pouco mais de três meses após a promulgação da lei do piso, os governadores dos Estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso do Sul e Ceará

protocolaram junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), em 28 de outubro de 2008, a Ação Direta de Inconstitucionalidade n 4.167 (ADI), pondo em questão aspectos importantes contidos na lei (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2008).

Os referidos representantes do governo alegaram que a lei teria extrapolado os seus limites ao não se limitar em regular somente e exclusivamente o piso salarial nacional. Teria, no entanto, estabelecido o piso salarial como vencimento básico, ainda que integralizado nos anos seguintes, e não a remuneração total (vencimento mais as vantagens pecuniárias), sendo ainda atribuído à União o estabelecimento dos índices de correção. A lei também estaria desrespeitando a norma constitucional de prévia dotação orçamentária para despesa com pessoal ao exigir sua aplicação já no ano de sua aprovação. Além disso, também seria inconstitucional o estabelecimento de nova composição da jornada de trabalho. O excesso desses aspectos relativos ao vencimento inicial e à jornada de trabalho, segundo o disposto na ADI, estaria no fato de que estes seriam prerrogativas exclusivas dos poderes executivos estaduais e municipais e, daquele modo, violariam o princípio federativo de autonomia desses entes governamentais (BASSI; GIL, 2015).

Os governadores alegaram também na ADI que, ao cederem 1/3 da jornada de trabalho dos professores para o planejamento de suas atividades, os governos teriam de suprir a ausência dos referidos profissionais, com a contratação de milhares de novos docentes. Logo, segundo os governadores proponentes da ADI, isso acarretaria um aumento excessivo nos gastos com remuneração dos profissionais da educação (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2008).

A ADI 4167/2008 (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2008) foi julgada em diversas ocasiões pelo STF, sendo a primeira votação, de 17 de dezembro de 2008, deferida em partes. Nesse primeiro momento, como decisão provisória, admitiu-se que o valor do PSPN poderia ser pago aos professores, incluindo as vantagens pecuniárias, ou seja, somando- se ao vencimento básico os adicionais e as gratificações. No segundo julgamento, ocorrido em 06 de abril de 2011, a ADI foi rejeitada por oito votos a um, tornando a Lei 11.738/2008 constitucional no seu texto original. Assim, o valor do piso foi confirmado como valor de vencimento inicial, sem o acréscimo das vantagens pecuniárias. Todavia, o julgamento sobre a questão da composição da jornada de trabalho dos docentes, com 1/3 da carga horária destinada ao planejamento, ocorreu somente no dia 27 de abril de 2011. E a decisão final, julgada pelo STF, decretou improcedente a ação movida pelos cinco governadores (SOUZA, J., 2014).

A lei do piso foi declarada constitucional pelo STF em abril de 2011, passando a ser efetivamente aplicável a partir de então. “O processo de julgamento até essa data contribuiu, porém, para fragilizar a sua adoção pelos governos estaduais e municipais” (BASSI; GIL, 2015, p. 261).

Em 2012, mais uma ADI n 4848 foi solicitada por seis governadores,