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Transferência de potencial construtivo critério de cálculo da área construída adicional a ser transferida: nos casos da transferência de potencial

Lei 11.090/91 – Operação Urbana Anhangabaú Edital 01/91 Critérios para cálculo de contrapartida financeira

3. Transferência de potencial construtivo critério de cálculo da área construída adicional a ser transferida: nos casos da transferência de potencial

construtivo dos imóveis preservados para outros imóveis fora do perímetro da Operação Urbana, foi utilizada a seguinte fórmula:

Vtp x Cac A.c.a.= x Pcnu Vtc x Cap

onde:

A.c.a. - área construída adicional no imóvel cessionário.

Vtp - valor de mercado do m² de terreno do imóvel preservado expresso em cruzeiros. Vtc - valor atual de mercado do m² de terreno do imóvel cessionário expresso em cruzeiros. Cac - coeficiente de aproveitamento do imóvel cessionário.

Cap - coeficiente de aproveitamento do imóvel preservado (Cap =6).

Pcnu - potencial construtivo não utilizado do imóvel preservado expresso em m2.

Restrições para a transferência de potencial construtivo:

1) O adicional de área construída no imóvel receptor não poderia fazer com que o CA resultante ultrapassasse o limite de 50% do CA permitido;

2) Zonas de uso Z1, Z9, Z14, Z16, Z8-100, áreas de proteção aos mananciais, a área da própria Operação Urbana, nos corredores de usos especiais Z8-CR1, Z8-CR2, Z8-CR4 lindeiros a Z!, e nos corredores Z8-CR5 e Z8-CR6.

4 Casos de cessão de espaços públicos, a contrapartida seria definida em

função do interesse para a Operação Urbana, do benefício para os usuários, da proposta financeira do proponente e de critérios já utilizados pelo Poder Público em outras ocasiões. Seria estudada caso a caso pela impossibilidade de fixação de um critério único.

Quadro 3-2. Procedimentos para propostas apresentadas.

Quadro resumo, Operação Urbana Anhangabaú. Fonte: Edital Operação Urbana Anhangabaú – 01/91

As propostas eram examinadas por Grupo de Trabalho Intersecretarial instituído pela Portaria nº. 328 de 3 de outubro de 1991 que, sob a coordenação da EMURB24, tinha por incumbência examinar todas as propostas apresentadas, elaborando parecer técnico para a deliberação da Comissão Normativa de Legislação Urbanística – CNLU25.

Conforme o quadro acima, o cálculo da contrapartida seria realizado segundo o “critério do terreno virtual”, ou seja, a área de terreno que deveria ser adquirida pelo proponente para possibilitar que a área de construção pleiteada fosse de fato construída. Inexistente de fato, essa área de “terreno virtual” permitiria a área de construção adicional, isto é, além da área construída permitida pela legislação26. Desse modo, o cálculo da contrapartida vincula-se ao preço de mercado do terreno existente, como se o proprietário estivesse adquirindo terreno a mais para poder construir a área adicional. O preço de mercado do terreno seria determinado através de laudo de avaliação realizado por perito capacitado e constaria da proposta. No quadro a seguir, é apresentado o procedimento de cálculo para a determinação da área de terreno virtual correspondente a uma área adicional de construção dada.

Fica evidente que o cálculo do terreno virtual – assim os demais cálculos relativos a contrapartidas - repousam sobre o coeficiente de aproveitamento, que corresponde à forma que assume a restrição ao direito de construir na legislação de zoneamento.

Além do valor da contrapartida, a análise das propostas deveria abarcar os seguintes aspectos:

i) o “impacto urbanístico da implantação do empreendimento no tocante à saturação da capacidade viária do entorno e à qualidade ambiental”

ii) uso e ocupação do solo na vizinhança e suas tendências recentes iii) a valorização paisagística dos logradouros e imóveis a preservara

articulação e o encadeamento dos espaços públicos e semi-públicos iv) o aproveitamento da volumetria das edificações e a correção dos

elementos interferentes tais como: empenas cegas, fundos de edificações, visando à harmonização do desenho urbano”.

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Formado por representantes dos seguintes órgãos: EMURB (coordenação; Secretaria de Administrações Regionais – SAR; Secretaria Municipal de Transportes – SMT; Secretaria Municipal de Cultura – SMC; Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano – SEHAB; Secretaria Municipal de Planejamento – SEMPLA.

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Para caracterização e composição da CNLU, cf. item 12.2 neste trabalho.

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A cobrança de contrapartida pelo cálculo de terreno virtual é uma das formas que pode assumir a outorga onerosa do direito de construir, baseada na separação entre o direito de propriedade do solo e o direito de construir, que está na origem do “solo criado”. Ribeiro e Cardoso fizeram uma retrospectiva da questão em trabalho recente. (RIBEIRO e CARDOSO, 2003, p. 120-123)

Procedimento de cálculo para estabelecer área de terreno virtual Com base nas fórmulas e na nomenclatura utilizada nos procedimentos de cálculo de contrapartidas apresentados no Quadro 2-2 acima, o cálculo da área de terreno virtual deve dar resposta a uma questão com o seguinte enunciado:

Sabendo que é permitido construir uma área igual a Acp e que essa área será igual à área do terreno existente (At) multiplicada por um coeficiente de aproveitamento definido (CA), qual seria a área de terreno a ser adquirida (Atv) para obter uma área de construção total igual a Act ?

Tem-se que

Act = (At + Atv) x CA onde:

Act =área construída total em m²; At= área de terreno em m²;

Atv = área de terreno a adquirir (terreno virtual) em m²; CA = coeficiente de aproveitamento permitido.

A área de construção adicional (Aca) seria dada por Aca = Atv x CA

ou por

Aca = Act - Acp

e a area de construção permitida (Acp) é dada por Acp = At x CA

Quadro 3 -3. Área de “terreno virtual”.

Elaboração própria com base nos procedimentos constantes do Edital 01-91 da Operação Urbana Anhangabaú.

Do processo de análise poderia partir indicação de diretrizes para obras complementares a serem realizadas pelo interessado, de modo a atender requisitos tais como número de vagas adicionais para estacionamento, espaços para acesso de veículos, adequação da volumetria da edificação ao entorno, entre outros.

3.5. Resultados

O prazo de vigência da Operação Urbana Anhangabaú foi estipulado em três anos e expirou em 16 de setembro de 1994. Até setembro de 1992, apenas cinco propostas haviam sido protocoladas, três das quais se utilizavam do mecanismo de regularização. A primeira a ser aprovada foi relativa à regularização de 5.368,29 metros quadrados de área construída pela Bolsa de Valores de São Paulo, com contrapartida financeira estipulada em US$ 2.666.665,0027. A arrecadação total conseguida através da Operação durante seu

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período de vigência foi estimada em cerca de US$ 4,0 milhões28, o que daria a dimensão do insucesso relativo da operação, pois a expectativa de arrecadação pelas contrapartidas financeiras seria da ordem de US$ 100 milhões se todo o potencial construtivo previsto pela Operação Urbana houvesse sido utilizado pelos empreendedores privados29.

3.6. Discussão

O mecanismo fundamental da Operação Urbana foi derivado dos procedimentos adotados nas Operações Interligadas – a cessão onerosa do direito de construir, para proprietários individuais, acima dos limites permitidos pelo coeficiente de aproveitamento definido nas leis de uso e ocupação do solo. Baseada na idéia de “solo criado”, ou seja, em um terreno adicional criado virtualmente para corresponder à área excedente de construção, a contrapartida financeira seria definida com base nesse critério.

Quanto à regularização de imóveis, o instrumento incorpora mecanismo utilizado nas inúmeras anistias concedidas pelo município para regularização de imóveis em desacordo com a legislação de uso e ocupação do solo. Em relação às anistias, a penalidade adicional consistia na realização dos cálculos para a contrapartida como se o infrator estivesse adquirindo o direito de construir com base no dobro da área de terreno virtual estabelecida em função da área construída irregular.

Ao objetivo de recuperar parte dos investimentos realizados na obra do Anhangabaú através dos mecanismos de outorga onerosa de cessões urbanísticas, foram agregados objetivos de caráter mais amplo, vinculados à recuperação da área central. Ações de remanejamento no interior das quadras, a composição harmônica de faces de quadra, a integração de quadras através da cessão de uso do espaço aéreo e subterrâneo, a harmonização do desenho urbano, apesar de serem colocadas como objetivos e diretrizes urbanísticas, têm caráter mais indicativo que propositivo, pois não há definição de instrumentos específicos para efetivamente realizá-los. Quanto ao objetivo de incentivar o uso habitacional na área da Operação, a única medida concreta proposta na Lei encontra-se no Art. 3°, § 3°: “No caso de propostas que envolvam áreas em que existam habitações

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Estimativa apresentada pelo arquiteto José Eduardo de Assis Lefévre, Diretor do Departamento de Operações Urbanas da EMURB no 7º Painel de Mercado promovido pelo Secovi / SP e pelo Instituto de Engenharia em 30 de junho de 1994, citado no artigo “Todos juntos, por São Paulo” IN Indústria Imobiliária, nº. 36, agosto de 1994, reproduzido em Viva o

Centro na Imprensa, ano IV, nº. 8, março de 1995. 29

Alberto Mawakdiye, “O centro das atenções” in Revista CONSTRUÇÃO São Paulo, nº. 2470, 12/06/95, p. 16-17. O artigo apresenta dados colhidos junto à EMURB à época de sua publicação.

sub-normais, os proponentes deverão incluir em seu escopo a solução do problema habitacional dos seus moradores”.

Entre os cinco benefícios públicos apontados como resultantes da Operação30, o principal foi “a obtenção de recursos para o poder público introduzir melhorias na área”. Ou seja, um dos principais efeitos esperados da Operação Urbana seria a possibilidade de geração de recursos adicionais para o financiamento de ações de melhoramento, independentemente dos recursos orçamentários usuais, que seriam empregados em finalidades prioritárias31. Sendo assim, os benefícios seriam indiretamente alcançados pela prioridade dada à aplicação dos recursos orçamentários em programas sociais. Entretanto, não ficaram explícitos na formulação do instrumento quais seriam os programas que estariam sendo beneficiados.

Quanto aos demais benefícios enumerados, difícil negar que sejam de interesse público, mas não é sempre fácil identificar a quem beneficiariam diretamente, quais os meios através dos quais seriam alcançados, tampouco como pode ser avaliada a eficácia desses meios. È o caso da resolução das habitações subnormais, mencionadas na lei como um de seus objetivos, mas para os quais não foram encontradas propostas específicas no instrumento. O benefício de “melhorias nos espaços públicos” pode ser associado às obras de remodelação e de manutenção listadas no programa de obras, e beneficiariam em princípio a todos os usuários da área central. A preservação de imóveis de interesse histórico, cultural, arquitetônico e paisagístico, benefício suposto como de interesse geral da sociedade32, contando com o mecanismo de transferência de potencial construtivo com base em coeficiente de aproveitamento CA = 6 como estímulo adicional (frente ao CA=4 da legislação de zoneamento), poderia ter tido algum resultado, mas não houve propostas aprovadas nesse sentido.

Quanto ao aumento da atratividade da área central para atividades diversificadas, que também pode ser compreendido como de interesse geral da população, a formulação é genérica, não permitindo especificação dos beneficiários ou de mecanismos para alcançá- lo, a não ser a pressuposição genérica de que o adensamento construtivo esperado seria acompanhado pelo desenvolvimento dessas atividades, mencionadas também de forma

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Como visto acima, além da obtenção de recursos, o controle e melhoria da Paisagem Urbana; a melhoria dos espaços públicos; a preservação de imóveis significativos; e o reforço da centralidade diversificada da área central.

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Conforme a Exposição de Motivos do Projeto de Lei: “A participação da iniciativa privada na Operação Anhangabaú em termos de obtenção de recursos se faz necessária diante dos parcos recursos municipais frente ao grande número de problemas sociais que são prioritários para essa administração” (EMURB, op. cit., p.7).

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Embora continuem a ser objeto de polêmica e disputa as questões do quê preservar, como preservar, para quem preservar e com que finalidades e usos; e apesar de todo o conhecimento acumulado sobre o tema da preservação e de sua formalização na legislação de preservação do patrimônio edificado.

genérica33. Quanto aos beneficiários do “controle e melhoria da Paisagem Urbana”, pode-se afirmar igualmente que seriam todos os componentes da sociedade, de modo geral. Entretanto, quanto à definição de ações e meios efetivos para alcançar esse benefício e quanto às próprias definições do que seja a melhor paisagem urbana - para quem, com quais conteúdos e com quais finalidades - o terreno é amplo e marcado por inúmeras disputas e conflitos. Mesmo o objetivo de “compor as falhas do desenho urbano da cidade”34, relativo ao campo da forma urbana em sentido arquitetônico, está sujeito a inúmeras interpretações – sendo apenas uma delas a homogeneização das faces de quadra tendo em vista alcançar uma regularidade com base em um gabarito médio.

A participação na Operação Urbana e a aquisição de parcela do estoque de potencial adicional davam-se pelo protocolamento de propostas de empreendimento, sem estabelecimento de outra ordem de prioridade. Por outro lado, embora a participação popular no processo tenha sido apontada como desejável, não foram ao mesmo tempo apontados caminhos para criação de outras instâncias de participação que não a CNLU e as audiências públicas por ela encaminhadas, apenas em relação a propostas de cessão de uso do espaço aéreo ou subterrâneo.

Foi pressuposto básico da Operação Urbana Anhangabaú um crescimento na atratividade do centro da cidade para novos empreendimentos imobiliários, apesar de reconhecida a tendência de migração de atividades empresariais e de serviços para outras regiões da cidade (Paulista e Faria Lima são mencionadas). A cessão onerosa de potencial construtivo acima dos limites permitidos pelo zoneamento então vigente justificava-se assim por um hipotético crescimento da demanda por novos espaços edificados na área central, o que não ocorreu. Ao contrário, houve aumento na vacância de edifícios comerciais para escritórios35.

Quanto aos agentes do setor privado, pode ser tomada como emblemática a postura de Luiz Antonio Pompéia, à época presidente da firma de consultoria imobiliária Empresa Brasileira de Estudos Patrimoniais – EMBRAESP, que desenvolveu estudo básico de empreendimento localizado no Vale do Anhangabaú, com projeto arquitetônico do arquiteto Fábio Penteado. O projeto demonstrava que o estoque de área adicional de

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“[...] pequeno comércio e serviço diversos existentes [...] ampliar a oferta de escritórios de bom nível”, conforme a Exposição de Motivo já referida (EMURB, op. cit., p.6).

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Id. ibid. p. 33.

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150.000 m² poderia ser esgotado em um único empreendimento36. Em texto intitulado “A valorização do centro da cidade”, publicado algum tempo mais tarde37, explicou sua postura provocativa naquele momento, colocando-se a favor de uma ação em grande escala, através de projetos e obras de grande porte para a reversão do quadro de declínio da área central.

“A Prefeitura já tentou emplacar uma lei de Operação Urbana, com a pretensão de ‘vender’ o que ninguém estava interessado em comprar: um maior potencial construtivo que o permitido pelo zoneamento da região.[...]. A concepção da lei baseou- se na idéia de que renovar o Centro é um benefício que o poder público presta ao empresariado, e que portanto pode cobrar por isso. A prefeitura precisa compreender que é impossível promover a revalorização e a modernização do Centro e, ao mesmo tempo, querer que o processo lhe dê lucro.[...] [deve-se investir] em projetos grandes e inovadores ... e o maior lucro para todos advirá justamente do estancamento da decadência na região.” (POMPÉIA, in ASSOCIAÇÃO VIVA O CENTRO, 1994 – ênfase adicionada)

O pronunciamento de Pompéia ressalta um aspecto de fundamental interesse para a compreensão da atitude do setor de empreendimentos imobiliários: a outorga onerosa de potencial construtivo, principal mecanismo da Operação Urbana, derivado das Operações Interligadas, é compreendida em sentido estrito como compra de exceção ao zoneamento. Uma mercadoria para a qual pode haver demanda ou não, que ninguém é obrigado a comprar, e que tampouco poderá comprar aquele que não tiver meios para tal.

A Operação Urbana Anhangabaú, primeira entre as operações urbanas formuladas e implementadas para o município de São Paulo, teve declarado seu caráter experimental de “área piloto” – mas também implicou um modelo de formulação, que comungaria seu desenho básico com as demais operações.

“A Operação Anhangabaú tem caráter experimental, como uma área piloto, cujos resultados são de mais fácil controle” (EMURB, op. cit. p.41).

Com estruturação semelhante à das duas outras operações desenvolvidas pela EMURB na mesma época - Água Branca e Água Espraiada - suas principais características seriam reproduzidas nas sucessivas operações, como será visto nos próximos capítulos. Em particular, sua reformulação através das modificações introduzidas na Operação Urbana Centro irá reiterar essas características.

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Segundo Pompéia, “Foi apenas um exercício, um modelo, para mostrar o absurdo de se implantar um estoque limitado de área construída” (CAMARGO, M. I., 1993, p. 9).

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