• Nenhum resultado encontrado

Foto 5 e 6 – Vista aérea da disposição das benfeitorias em algumas propriedades rurais.

1.4 A VIDA SOCIAL E COMUNITÁRIA

Os aspectos abordados anteriormente dão uma idéia aproximada dos percalços enfrentados pelos imigrantes quando do seu estabelecimento em busca de nova vida nas colônias. Aproximada porque somente aqueles que vivenciaram a experiência de se instalarem numa terra desconhecida, carentes de uma infra- estrutura mínima que pudessem atender suas necessidades básicas, é que poderiam expressar com fidelidade as emoções que tal aventura imprimiu em suas almas. Como sintetiza Baldessar, “teoricamente ser imigrante poderá parecer uma maravilhosa aventura, mas a realidade nua e crua a respeito dele não tem nada de poético e sim de muito de sofrimento, de privações, de doenças, de trabalho, de suor, de lágrimas e de sangue”. 87

A historiografia da imigração em Santa Catarina é muito rica em demonstrar as agruras passadas pelos colonos desde o momento em que colocaram os pés em terras brasileiras até o momento em que conseguiram colocar os pés dentro de suas próprias casas. Dissertamos um pouco a este respeito, mas o pouco que foi comentado nem de longe reflete a situação por eles vivida.

Diz Paulilo – e isto de certa forma já foi referenciado neste trabalho –, que independente das péssimas condições de vida que inicialmente os colonos tiveram que enfrentar em terras brasileiras, mesmo assim eles consideraram que aqui tinham uma perspectiva de progresso. As expectativas de tempos melhores para o futuro eram consubstanciadas por um passado recente e não muito agradável de ser lembrado pelos emigrados, tanto é que estes incentivavam a vinda dos que ficaram para trás, aparentemente por considerarem estarem em situação melhor do que as que se encontravam anteriormente na Europa. De acordo com Dall’Alba,

Não deviam lembrar muito a vida da Alemanha os velhos imigrantes. Nada de heróico, nada de saudade. Vida dura, na pobreza, sem terras, semi-escravos servos da gleba. Não existia a Alemanha como nação, ao partirem. Só pequenos estados, distribuídos a príncipes segundo o bel-prazer dos poderosos. Bismark não conseguira ainda reunificar a Alemanha do Sacro Romano Império. Lembrar o quê, portanto? Tempos tristes, de humilhação, não se contam às novas gerações. 88

87

BALDESSAR, Quinto Davide. Imigrantes: sua história, costumes e tradições no processo de colonização no sul do estado de Santa Catarina. Ed. do Autor, 1991, p. 17.

88

Não se pode descartar, contudo, a possibilidade de que os relatos positivos que os imigrantes faziam sobre a nova terra tivessem por objetivo trazer parentes ou conhecidos para diminuir a dor da saudade ou mesmo para partilhar os dissabores encontrados no Novo Mundo, até certo ponto dissimulando a real situação de penúria a que estavam expostos.

É certo que a maioria dos imigrantes se resignou a passar por esta provação, seja porque tinham consciência que não havia algo melhor do que isto na terra natal ou porque não dispunham mais de recursos financeiros para voltar atrás na empreitada em que se meteram. Mas nem todos tiveram a perseverança de lutar contra a adversidade e infortúnios que lhes eram impostos. Conforme atesta Beozzo,

A imigração nunca foi movimento de mão única. Configurava o vaivém das marés, um fluxo e refluxo, onde o pensamento primeiro era imigrar para a América, fazer um pé de meia e retornar à terra natal. (...) Havia anos em que os retornos superavam as entradas, no Estado de São Paulo por exemplo, para o qual há sérias estatísticas confiáveis. (...) Dos 1.385.756 italianos da grande imigração de 1870 a 1920, 510.000 teriam retornado à pátria, ou seja, 37% do total, a maior parte dos quais saídos de São Paulo, não só porque ali se concentrava o maior contingente de imigrados, mas porque a fazenda não oferecia a propriedade da terra, o sonho maior de todo camponês que tomava o caminho da América. 89

Ainda de acordo com Beozzo, as colônias de imigrantes que se instalaram no sul do país apresentavam situação diferenciada em relação à São Paulo, no que diz respeito ao retorno de emigrados à pátria de origem. Embora ocorressem casos de famílias que resolveram retornar para os antigos lares, o mais comum era ocorrer o processo migratório interno ou a emigração para países vizinhos ao Brasil, principalmente Argentina e Uruguai. Tal fato se dava em função de que os lotes que os colonos receberam quando da sua chegada no Brasil, com o passar do tempo foram sendo fragmentados para acomodar os filhos que iam casando. No decorrer dos anos isto se tornou um problema, tendo em vista que “como as famílias eram bem numerosas, 10 ou 12 filhos sendo a norma, a terra era logo insuficiente para tantas pessoas, sobretudo quando chegava a idade do casamento” 90, sendo a migração uma solução a este problema.

89

BEOZZO, José Oscar, op. cit., pp. 106-108.

90

Sob o nosso ponto de vista, o fato dos registros apontarem que no sul o processo de retorno de colonos à terra natal ser proporcionalmente menor, pode estar relacionado ao que foi mencionado por Kreutz. Relembrando, este autor afirma que, no caso dos alemães, era comum a emigração conjunta de toda uma parentela, ou mesmo de toda uma comunidade rural. Ora, havendo a transferência de todo um núcleo populacional certamente deixaria de existir – ou perderia grande parte de sua importância – tudo aquilo que Dall’Alba considera como significativo para ligar o indivíduo à terra natal (tradições, história, língua, costumes, cultura, laços de família, de parentesco, sentimentos afetivos), uma vez que a lógica aponta que os integrantes da comunidade trariam consigo toda esta bagagem cultural e de convivência comunitária que lhes eram comuns. Assim, tomando-se como verdadeiro que isto fosse uma prática corrente, não haveria grandes razões para que os indivíduos voltassem para a terra de origem, pois lá sim, se deparariam com um ambiente estranho no tocante as relações sociais.

Embora alijadas de recursos financeiros e do apoio estatal, a famílias de imigrantes encontravam na companhia de seus patrícios o apoio e incentivo necessários para superar as crises de puro desespero. Neste sentido, sem dúvidas que as colônias fundadas por grupos oriundos de uma mesma região eram importantes para a vida comunitária. Melhor ainda se a colônia fosse formada por famílias que mantinham grau de parentesco ou de amizade, o que contribuiria sobremaneira para a ajuda mútua, necessária e imprescindível nos primeiros tempos, não só para a obtenção da matéria que alimenta e sustenta o corpo, mas também para a convivência social que nutre e tranqüiliza o espírito.

Não sem razão, portanto, as frustradas tentativas do governo em tentar fundar colônias com imigrantes de diversas etnias. Sobre isto Veronesi, citado por Kreutz, diz que

O governo quis impedir a formação de grupos da mesma etnia e distribuiu os lotes em função dessa preocupação. Parece, porém, que o projeto não dá resultados positivos, pois os colonos se mostram refratários a esse sistema e sentem a necessidade de se reunir por etnias, o que permite a solidariedade e a ajuda recíproca, a construção de capelas, etc. A primitiva distribuição dos lotes desapareceu por iniciativa dos próprios colonos, que trocaram ou venderam seus lotes respectivos para se estabelecerem junto de seus compatriotas. 91

91

VERONESI, Pascioline Ranieir. Le colonie italiane nel Brasile meridionale. Stati di Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná. Torino, Fratelli Boca, 1904, p.94. In, KREUTZ, Lúcio, op cit., p. 49.

O certo é que, simplesmente largados no meio de uma floresta e lá esquecidos, os imigrantes tiveram que se ajudarem mutuamente, onde um se tornou parceiro do outro nos projetos e nos trabalhos de construção. A vida para eles, naquelas ermas paragens, necessariamente iria começar da estaca zero. Nestas condições nada mais natural que ocorresse uma aproximação entre os imigrantes (mesmo quando estes não eram anteriormente conhecidos entre si), de forma a dividirem as árduas tarefas de instalação na nova pátria. Sem dúvidas contribuía para este fim a própria experiência que muitos traziam de sua terra natal, onde, conforme registra Willems,

A comunidade local funciona à base de uma reciprocidade muito acentuada. O camponês e a camponesa dão presentes, emprestam, ajudam os vizinhos e à comunidade oferecendo ferramentas, trabalho e alimentos por ocasião da colheita, acodem a parturientes e moribundos, cooperam na construção de uma casa ou na alimentação dos pobres da aldeia etc, (...). 92

Descrevendo a epopéia das primeiras famílias de colonos italianos a ocuparem o território que deu origem ao atual município de Urussanga, no sul do Estado de Santa Catarina, Baldessar tece alguns comentários, os quais consideramos interessante serem reproduzidos para ilustrar o tópico ora em análise:

Começar por onde? São tantas as prioridades! Como proceder para começar com segurança, para aquela gigantesca árvore não viesse colhê-lo em sua queda? E assim, cortar fatalmente a caminhada ao dar o primeiro passo! E houve tais acidentes e se repetiram.

Atormentado pelo peso da grande empreitada a levar de vencida o Imigrante se sentia sufocado, asfixiado naquele abismo de desolação.

Não tinha sequer um telheiro para poder abrigar-se com sua mulher, com suas crianças que não entendiam o que estava ocorrendo... Nunca havia pensado anteriormente que deveria transformar-se em construtor de seu próprio teto. Como em nada disso fosse exímio na arte, resolveu o seu problema da forma mais precária e rústica que se possa imaginar. (...)

E as famílias lá ficavam aglomeradas entre as gigantescas raízes das árvores ou na solapa de alguma pedra até poder oferecer um telhado improvisado com folhas, dentro de 4 tapumes de vegetação que inicialmente foi a casa residencial.

Instrumentos de trabalho podiam ser adquiridos por financiamento, mas somente os absolutamente necessários: machado, foice, facão, enxada, picareta, pá, martelo, serrote e quase nada mais além disso. (...)

Imaginemo-nos no meio de uma floresta, acompanhados de uma família com crianças pequenas, ouvindo uma voz inexorável que aponta um piquete, dizendo: “Desta estaca até a próxima lhe

92

pertence. A partir de agora a sua residência é aqui. Pode construir a sua casa e cultivar as terras...”. 93

Em tais circunstâncias é fácil imaginar o porquê do anseio dos imigrantes em buscarem o agrupamento em comunidades compostas por conterrâneos. O interessante a notar neste processo, é como a natureza humana se manifesta na forma de solidariedade fraternal quando o grupo social se encontra em estado de flagelo. Parece que nos momentos em que menos teriam para oferecer ao próximo, maior é a solidariedade dos indivíduos em relação aos seus semelhantes. É geralmente nos momentos de crises, quando todos estão equiparados num mesmo patamar, onde não existe diferença social ou econômica, que as pessoas se dão conta da importância de se agruparem buscando alternativas conjuntas para superar os problemas que lhes são comuns. E esta solidariedade existia entre os imigrantes que aportaram em terras brasileiras.

Durham indica que, num primeiro estágio, quando os indivíduos se encontram em dificuldades a busca de auxílio é realizada dentro do próprio circulo familiar.

As relações de parentesco mais importantes, que criam laços relativamente estáveis, são aquelas que derivam da família elementar, isto é, as relações entre pais e filhos e entre irmãos. Essas relações se apresentam como extensão da solidariedade do grupo doméstico (na medida em que persistem mesmo após a segmentação da família de origem) e se manifestam através de obrigações amplas, mas não bem definidas, de ajuda mútua e de amparo em qualquer situação de crise. (...)

Para além do grupo restrito de pais e irmãos, o sistema define um círculo mais ou menos amplo de parentes mais distantes (tios, sobrinhos, primos) para com quem as mesmas obrigações gerais de solidariedade se impõem com rigidez decrescente. 94

Quando da ausência de parentes, a tendência é ampliar o grupo a quem se pode recorrer em busca de solidariedade, através do sistema de compadrio.

Estabelecido em base voluntária, o compadrio de um lado assinala relações preferenciais entre parentes, de outro estende os limites da solidariedade interfamiliar, criando laços de parentesco ritual. (...)

93

BALDESSAR, Quinto Davide, op. cit., pp. 65 - 66.

94

DURHAM, Eunice Ribeiro. A caminho da cidade. São Paulo: Ed. Perspectiva S.A., 1973, p. 71. Obs.: cabe destacar que a obra aqui citada foi elaborada fundamentalmente com base em dados obtidos entre os anos de 1959 e 1960 sobre a população de origem rural nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Curitiba, e se propõe a analisar o processo de migração rural-urbana do país. Essa ressalva se faz necessário para tornar claro que, embora a autora não se refira exatamente a época ou ao contexto específico do qual estamos tratando no momento, as suas análises teóricas foram utilizadas porque julgamos ser perfeitamente adaptáveis ao nosso estudo.

De um lado, o compadrio provê a criança de pais substitutos. De outro, através da criança, estabelece entre compadres relações semelhantes às entre irmãos. Deste modo, o compadrio não é apenas um seguro social para a criança, mas, e talvez principalmente, é uma relação entre adultos que se estabelece através da criança. 95

Embora as relações de parentesco e de compadrio tenham se constituído como elementos fundamentais na organização de grupos de ajuda mútua no processo de constituição e desenvolvimento das comunidades rurais brasileiras, Durham assinala que para além destes laços, “apenas a proximidade física, a simpatia pessoal e a experiência comum de auxílios recíprocos, a familiaridade que brota de convivência, se apresentam como fatores de solidariedade”. Neste caso não se configura a existência de uma hierarquização formal de autoridade, tal qual ocorre no âmbito familiar. Mesmo que não ocorra essa relação de chefia e subordinados, existe uma respeitosa subordinação às lideranças que se destacam por suas qualidades pessoais, pela riqueza de suas experiências individuais o que, no conjunto, lhes permite sintetizar, interpretar e exprimir os anseios coletivos. 96

No que tange as relações de solidariedade que permeavam as relações entre os imigrantes europeus há um componente importante a ser levado em consideração e que foi decisivo para a sedimentação e desenvolvimento das colônias, qual seja, a existência de um forte sentimento de nacionalismo, caracterizado pela preservação dos costumes e valores trazidos da pátria de origem e que eles queriam perpetuar no novo mundo. Particularmente em relação aos imigrantes alemães este sentimento foi exacerbado. Sobre isto Seyferth comenta que os germânicos que para cá vieram tinham a visão que viriam para estabelecer uma nova pátria. Nova apenas no que se referia ao ambiente físico a ser ocupado, mas que afora isto seria uma extensão da terra mãe, a Alemanha. Para a autora: “o isolamento, as dificuldades de implantação de serviços públicos e a homogeneidade étnica levaram os imigrantes alemães a se estabelecer, comunitariamente, nos moldes mais próximos possíveis da sua região de origem. (...): todos os imigrantes são colonos lutando contra um meio ambiente hostil.” 97 Em Outro momento, Seyferth fala que

95

DURHAM, Eunice Ribeiro, op. cit , pp. 72 - 73.

96

Idem, p. 74.

97

SEYFERTH, Giralda. (a) Nacionalismo e identidade étnica. Florianópolis: Fundação Catarinense de Cultura, 1981, pp. 126-127.

Essa maneira de ver o processo imigratório, como a integração numa nova sociedade, encontra sua expressão mais acabada na idéia de

Heimat dos teuto-brasileiros. Etimologicamente esta palavra deriva

de Heim (lar) e, no seu significado mais restrito, a pátria de um indivíduo é o seu lar. Não tem um equivalente preciso em português, mas a tradução mais apropriada é pátria, uma pátria que tem um significado étnico e restrito, porque não se refere ao país do qual um indivíduo é cidadão, mas à sua comunidade, o lugar onde nasceu. Enfim, a Heimat pode ser construída em qualquer lugar. Segundo essa ideologia, assim fizeram os imigrantes alemães no Brasil, mantendo sua solidariedade étnica. 98

Já na visão de Willems, as colônias de imigrantes alemães instaladas no Brasil tinham por característica a alta taxa de natalidade o que, por conseqüência, culminava na formação de famílias muito extensas, com parentelas muito numerosas. Além de extensas, o grau de solidariedade entre os componentes dessas grandes famílias era maior do que o observado em suas relações sociais no país de origem. “As obrigações que seus membros assumiam, uns com os outros, eram mais numerosas e mais importantes do que o podiam ser na Europa.” 99 E o autor aponta uma explicação para este fenômeno:

Em parte, esses fatos decorriam da relativa fraqueza dos poderes estatais que, pela inexistência ou indiferença permitiam se ampliasse, consideravelmente, a alçada dos grupos familiares. Assim, os novos grupos familiais, vicinais e, em parte, comunais que pouco a pouco se constituíam (...), iam preenchendo o vácuo deixado pelos poderes públicos organizando-se de maneira a resolver as dificuldades que lhes vinham principalmente da situação nova. 100 À semelhança do ocorrido em outros espaços ocupados por imigrantes alemães, as famílias germânicas que ocuparam o Vale do Braço do Norte durante muito tempo também ficaram dependentes da solidariedade do grupo social que formava a comunidade para sobrepujar as dificuldades que eram impossíveis de serem superadas individualmente, ou mesmo para tornar aquelas que o poderiam ser realizadas de forma individual, menos penosa. Desprovidos das máquinas e equipamentos que décadas mais tarde tornariam possíveis a uma família com poucos membros explorar a terra sem depender da ajuda de terceiros, os colonos por muito tempo ficaram dependentes da ajuda mútua para conseguirem algum sucesso em suas empreitadas produtivas.

98

SEYFERTH, Giralda, (b), op. cit., pp. 86-87.

99

WILLEMS, Emílio, op. cit., p. 174.

100

Citando Mello e Souza 101, Durham chama a atenção para o fato de que o mato que recobria o solo e a técnica da queimada tornavam extremamente precárias as condições de ocupação da terra, tanto mais se fosse levado em conta o estado de completo isolamento em que se encontrasse o colono. Por esta razão, em muitos casos seria praticamente impossível a um lavrador que só dispusesse da mão-de- obra doméstica dar conta do ano agrícola sem cooperação vicinal, razão pela qual se criavam os grupos de vizinhança, cujo objetivo maior era a formação de frentes de trabalho conjunto com vistas à superação de problemas que não podiam ser superados individualmente ou por um número limitado de indivíduos. 102

E os problemas de ordem particular dos imigrantes eram muitos. Conforme atesta Willems, diante a um ambiente fisicamente tão diferente ao que estavam acostumados, ficaram os colonos inviabilizados de utilizar as técnicas agrícolas de sua própria cultura, razão pela qual para derrubar a mata e obter no menor espaço de tempo uma colheita mínima, tinham que invariavelmente recorrer às técnicas que caboclos e indígenas haviam desenvolvido através dos séculos. Nestas condições, “quaisquer trabalhos não estritamente necessário, como a remoção de tocos, a construção de cercas ou de casas mais sólidas, podiam redundar, como de fato muitas vezes redundaram em fracasso completo” 103, razão mais do que suficiente para a busca do trabalho cooperativo.

Para Alves, os padres alemães que vieram para o Brasil prestar assistência religiosa aos seus compatriotas, acabaram por criar um modelo de vida e de fé cristã a ser seguida pelos colonos o qual não mais existia na Alemanha. Afirma a autora que o objetivo dos padres era recriar em São Ludgero uma Alemanha em miniatura “numa tentativa de atender ao projeto político da Igreja romanizada, ou seja, restabelecer nesse local um mundo onde se continuasse a cultivar os valores religiosos agrários de uma Alemanha pré-industrial”. 104 Particularizando a atuação do monsenhor Frederico Tombrock, que atuou como vigário do município de São Ludgero de 1896 a 1957, a autora revela que para ele

O bom cristão não se dava apenas por ser alemão e católico. Conhecedor da perda de poder e de adeptos sofrida pela Igreja

101

MELLO E SOUZA, Antônio Cândido de. Os parceiros do Rio Bonito. Estudo sobre o caipira paulista e a transformação de seus meios de vida. São Paulo, José Olympio, 1964.

102

DURHAM, Eunice Ribeiro, op. cit., p. 70.

103

WILLEMS, Emílio, op. cit., p. 238.

104

ALVES, Elza Daufenbach. (b) Nos bastidores da Cúria: desobediências e conflitos relacionais no intra-clero catarinense (1892-1955). Tese de Doutorado, Programa de Pós-graduação em História, UFSC, 2005, p. 87.

Católica na Alemanha no Século XIX, causada pelo pensamento