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A vulnerabilidade como ponto de partida (KELLY; ADGER, 2000), oferece subsídios e meios que possibilitam desencadear medidas mais focalizadas e exitosas nos processos de adaptação às mudanças climáticas. Neste caso, as variáveis centrais para a avaliação da vulnerabilidade passam a ser: a sensibilidade, a exposição e a capacidade de resposta dos ativos humanos frente aos fenômenos de ameaças relacionados com o clima. Existe uma relação direta entre a vulnerabilidade e a capacidade de adaptação. A capacidade ou incapacidade dos indivíduos e grupos sociais responderem, adaptarem, ou enfrentarem qualquer estresse colocado nos seus sistemas ambientais e sociais, revela quão vulneráveis ou não são esses sistemas.

Originada de uma corrente teórica voltada à vulnerabilidade social, a abordagem da vulnerabilidade como ponto de partida, apresentada por Kelly; Adger (2000), procura descrever e analisar, concertadamente, as causas da vulnerabilidade e os condicionantes regionais e locais. Logo, o foco é saber, antes de tudo, quem ou quais os grupos estão vulneráveis e por que estão vulneráveis e, em seguida, pensar em como reduzi-las? Essa vertente prioriza em suas pesquisas explicar os fatores que levam os países e grupos sociais a se tornarem vulneráveis e reivindica direito à vida como um dos meios ou estratégias para reduzir situações de vulnerabilidade.

O’Brien e colaboradores (2004) analisam a vulnerabilidade como ponto de partida como sendo predicado ou estado gerado por vários processos ambientais e sociais exacerbados pelas mudanças climáticas. No entendimento desses autores, a vulnerabilidade e os meios de reduzi-las, devem ser analisadas e interpretadas como um processo, a cima de tudo, para identificar interações entre sujeitos. O fundamental nessa corrente de abordagem é a combinação dos processos biofísicos e sociais que moldam as condições locais.

Cabe dizer, de acordo com (O'BRIEN et al., 2004), que a principal pendência entre as duas abordagens é como se posicionam em relação à adaptação. Os autores que analisam a vulnerabilidade como ponto final entendem que a capacidade

adaptação determina a vulnerabilidade, enquanto que os autores que abordam a

vulnerabilidade como ponto de partida, consideram que a vulnerabilidade

determina a capacidade de adaptação:

In the end-point interpretation, adaptive capacity has been used as a measure of whether technological climate change adaptations can be success fully adopted or implemented. In the starting-point interpretation, adaptive capacity refers to the present ability to cope with and respond to stressors and secure livelihoods. Adaptive capacity in the first case refers to future adaptations and vulnerability (Brooks, 2003), while adaptive capacity in the second case pertains to present-day vulnerability30 (O'BRIEN, et al.,

2004, p.4).

Com o intuito de reduzir as tensões de modo a facilitar uma melhor comunicação entre os pesquisadores vale a pena recorrer à síntese do (BROOKS, 2003, p. 4, 5):

30Na interpretação do ponto final, a capacidade de adaptação tem sido utilizada como uma medida de mudança tecnológica se adaptações climáticas podem ser adotados ou implementadas com sucesso. Na interpretação do ponto de partida, a capacidade de adaptação se refere à capacidade atual para lidar com os fatores de estresse e meios seguros de subsistência. Capacidade de adaptação, no primeiro caso se refere vulnerabilidade e adaptações futura (Brooks, 2003), enquanto a capacidade adaptativa no segundo caso diz respeito a vulnerabilidade atual (Burton et al., 2002) (tradução livre).

In summary, biophysical vulnerability is a function of the frequency and severity (or probability of occurrence) of a given type of hazard, while social or inherent vulnerability is not. A hazard may cause no damage if it occurs in an unpopulated area or in a region where human systems are well adapted to cope with it. Where biophysical vulnerability is viewed in terms of outcome (damage resulting from the interaction of hazard and social vulnerability), a system that sustained no net damage from a hazard might be interpreted post hoc as being “invulnerable” to that hazard. In this paper, the term “social vulnerability” is used in a broad sense to describe all the factors that determine the outcome of a hazard event of a given nature and severity. Social vulnerability encompasses all those properties of a system independent of the hazard(s) to which it is exposed, that mediate the outcome of a hazard event. This may include environmental variables and measures of exposure. For example, the vulnerability of a country to a given hazard occurring over its national territory will be a function of the percentage of the population living in the area affected by the hazard, but also of the extent to which individuals and sub-national scale systems within this area are exposed to its first-order impacts31.

Se por um lado diferentes enfoques sobre uma problemática pode dar suporte tanto para identificar onde e quem são os grupos vulneráveis quanto para apontar soluções. Por outro, há uma ampla literatura (p. ex. os relatórios de avalições do IPCC citados acima) que consideram que os mais vulneráveis tendem a ser os grupos sociais ou as nações localizadas em ambientes considerados mais suscetíveis aos eventos extremos do clima. Entretanto, as implicações desses eventos não têm relação única com os fatores climáticos. Fatores políticos, sociais, culturais e económicos devem compor o conjunto de variáveis na análise da vulnerabilidade. Por outras palavras, é afirmar que a vulnerabilidade é entendida a partir das caraterísticas internas de cada sociedade, das peculiaridades de cada comunidade e independente dos perigos externos.

31 Em resumo, a vulnerabilidade biofísica é uma função da frequência e da gravidade (ou probabilidade de ocorrência) de um determinado tipo de perigo, enquanto vulnerabilidade social ou inerente não é. Um perigo pode não causar nenhum dano se ocorrer em uma área despovoada ou em uma região onde os sistemas humanos são bem adaptados para lidar com ele. [...] o termo "vulnerabilidade social" é usada em um sentido amplo para descrever todos os fatores que determinam os resultados de um evento dado à natureza e gravidade do risco. Vulnerabilidade social engloba toda a propriedade de um sistema independente do perigo (s) a que está exposta, que medeiam o resultado de um evento de risco. Isso pode incluir variáveis ambientais e as medidas de exposição. Por exemplo, a vulnerabilidade de um país a um determinado perigo que ocorrem ao longo do território nacional será um função da percentagem da população que vive na área afetada pelo perigo, mas também da extensão em que os indivíduos e os sistemas de sub-escala nacional dentro desta área estão expostos aos seus impactos de primeira ordem. (tradução livre).

Um dos objetivos específicos da tese é identificar e descrever os fatores de limitação ao modo de vida agrícola, nas comunidades de Ubua Budo e Pinheira roça roça, não relacionados como o clima. Por isso, antes de compreender e analisar as limitações relacionadas com os eventos extremos nas referidas comunidades descrevi o quadro político e social existente.

Segundo Adger et al., (2004), ao descrevermos todos os fatores que determinam resultados que incorporam variáveis como a pobreza, as desigualdades, a marginalização, o acesso seguro à habitação e à alimentação, o estado de saúde e da educação, das infraestruturas institucionais, dos recursos naturais e, de igual modo, como os sistemas humanos se relacionam com o ambiente físico ao seu redor estaríamos a reportar a vulnerabilidade social. Quer isto dizer, que são as principais variáveis ou fatores-chave que caracterizam a vulnerabilidade e a capacidade dos sujeitos de se adaptarem aos diferentes fenômenos de ameaças relacionados à mudança do clima.

O argumento acima referido sustenta-se no entendimento dos autores que analisam a vulnerabilidade a partir do ponto de partida. De acordo com essa orientação a vulnerabilidade seria uma característica ou estado gerado por vários processos ambientais e sociais que, em certa medida, foram exacerbados pelos eventos relacionados com as mudanças climáticas (O'BRIEN et al., 2004). Deste modo, o foco para o enfrentamento centrariam-se em ações que visam à redução da pobreza, a diversificação dos meios de subsistência, a proteção dos recursos de atributo comum e o fortalecimento da ação coletiva (KELLY; ADGER, 2000).

Focar no fortalecimento das instituições e as ações que irão robustecer os indicadores sociais como, p. ex., a medida que auxiliou as comunidades costeiras a replantar manguezal exauridos, ajudou aprimorou proteção física às tempestades e reduziu o custo de proteção costeira através diques de proteção, diminuiu as perdas de vida durante temporadas de tufão no Vietnã (ALLISON; ANDREW; OLIVER, 2007). Pequenas ações, a exemplo dessas, planeadas desde de dentro com as comunidades, podem contribuir para minimizar os efeitos dos impactos dos eventos extremos e ao mesmo tempo reduzir a vulnerabilidade social.

Em síntese, pode-se afirmar que as definições de vulnerabilidade, principalmente, entre autores do IPCC, tendem a cair em duas perspectivas de abordagens. A primeira – a que interpreta a vulnerabilidade com ponto final – quantifica os danos causados aos sistemas socioecológicos e analisa os fatores de exposição humana aos riscos. Por exemplo, com base em projeções estimam quantas pessoas estariam vulneráveis aos impactos da subida do nível do mar. Esses autores estão preocupados, acima de tudo, com a quantificação dos danos e impacto ao final de um evento de risco. Entretanto, distanciam das análises que enfatizam a capacidade de os sujeitos superarem as situações de vulnerabilidade, como é o caso da segunda perspectiva.

A segunda perspectiva – a de vulnerabilidade com ponto de partida – interpreta a vulnerabilidade como uma variável que descreve o estado interno dos sistemas socioecológicos antes da ocorrência de um evento de risco. Isto é, analisa fatores estruturais relacionados como a vulnerabilidade social, estes associados aos aspetos climáticos determinam quanto um país, uma região, uma comunidade, de acordo seus modos de vida e localização geográficas é vulnerável. A vulnerabilidade é entendida como uma variável que expõe os processos ambientais, sociais e políticos tal como é pontuado na abordagem de gestão de riscos de desastre e a de adaptação de base comunitária apresentado acima.