• Nenhum resultado encontrado

4 A CONSTRUÇÃO DO REFERENCIAL TEÓRICO SOB A LUZ DA

4.2 A Teoria Histórico-Cultural

4.2.3 Zona de Desenvolvimento Proximal: um conceito importante para o processo de ensino

A Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) é um dos conceitos da THC mais difundido na Educação por contribuir de maneira significativa para o repensar do papel do professor no processo de ensino e aprendizagem, uma vez que defende a importância da mediação do professor para a formação e apropriação de conceitos por parte dos educandos.

Para Vygotsky a ZDP é constituída pela “área” ou “diferença” compreendida entre o saber já apropriado pelo indivíduo - refletida naquilo que o indivíduo pode fazer sozinho e o saber que pode ser apropriado pelo indivíduo por meio da mediação de indivíduos mais

experientes - ponderada naquilo que o indivíduo pode vir a aprender ou a fazer com a ajuda de outras pessoas.

Traduzindo as abordagens de Vygotsky (1993) a ZDP é definida da seguinte maneira:

A distância entre o nível real de desenvolvimento, determinado pela capacidade de resolver independentemente um problema, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da resolucão de um problema sob a orientação de um adulto ou em colaboração com outro parceiro mais capaz (VYGOTSKY, 1993, p. 133, tradução nossa).

No cenário educacional este conceito possibilita redimensionar a prática pedagógica, uma vez que o modo de formação e apropriação de conhecimentos passa a ter considerável relevância no processo de ensino e aprendizagem e, portanto, deve ser considerado tão importante quanto o produto gerado no fim do processo.

Na esteira de compreensão o professor assume o papel de agente mediador do processo de aprendizagem, propondo aos educandos situações-problema desafiadoras e ajudando-os a resolvê-las, num processo colaborativo marcado pela interação entre os alunos e o professor.

Nosso entendimento a respeito da ZDP nos leva a crer que o professor, sujeito consciente de suas atribuições como agente mediador no processo de ensino e aprendizagem, é o principal responsável pela sua prática pedagógica e deve identificar a capacidade real de seus educandos para resolver determinados problemas, bem como, vislumbrar o nível de desenvolvimento potencial de seus educandos para colaborar da melhor forma possível na construção de novos conhecimentos.

Vygotsky ao refletir sobre a ZDP afirma de maneira categórica que “[...] ensinar uma criança aquilo que é incapaz de aprender é tão inútil como ensinar-lhe a fazer o que é capaz de realizar por si mesma” (1993, p. 245). Esse pensamento contesta o ensino que se limita ao nível de desenvolvimento real do indivíduo, propondo que o único bom ensino é aquele que está para além do desenvolvimento real com vista na internalização de um novo saber.

O pensamento de Vygotsky apresenta para o professor o quanto é necessário identificar o nível de desenvolvimento real do educando acerca de determinado conteúdo, isto é, evidencia a importância de identificar o conhecimento prévio do educando, de maneira que o permita reconhecer a ZDP em que o estudante se encontra e, a partir daí, criar condições que possibilitem a apropriação do novo. O professor consciente dessa ação pode assumir na lógica interna do processo de ensino e aprendizagem o papel de mediador da construção de conhecimentos.

Sarmento (2006) traz as explanações de Wertsch (1988) que asseveram ser mais adequado utilizar o termo Zona de Desenvolvimento Próximo, alegando que a tradução literal deste termo do idioma russo para o espanhol sugere a ideia de mais próximo ou mais imediato o que pode provocar melhor entendimento do termo, uma vez que o mesmo surge dentro do contexto das problemáticas relacionadas “[...] à avaliação das capacidades intelectuais das crianças e à avaliação das práticas de instrução” (WERTSCH, 1988, p. 83).

Na tradução realizada por Pasqualini (2011) da obra de Chaiklin intitulada “The zone of proximal development in Vygotsky’s analysis of learning and instruction”18 publicada em 2003, apresenta como aspecto importante da ZDP o pressuposto da assistência, uma concepção comum sobre a teoria que nos faz crer que “[...] o professor competente é importante para a aprendizagem, a noção de zona de desenvolvimento próximo é com frequência utilizada para focalizar a importância de auxílio [de um par] mais competente” (PASQUALINI, 2011, p. 662). O autor chama a nossa atenção para o fato de que Vygotsky considera que “[...] a criança é sempre capaz de fazer mais e resolver tarefas mais difíceis em colaboração, sob direção ou mediante algum tipo de auxílio do que independentemente”. (VYGOTSKY, 1987, p. 209).

Na concepção do supracitado autor, o que Vygotsky põe em pauta não resume como fator primordial a competência em si da pessoa mais experiente, mas o fato de quão é importante “[...] compreender o significado da assistência em relação à aprendizagem e desenvolvimento da criança”. (PASQUALINI, 2011, p. 662). Em outras palavras, na educação o pressuposto da assistência não deve focar a competência do professor como o aspecto mais relevante no processo de ensino e aprendizagem; o professor não está no centro do processo. Pelo contrário, o educando é quem está no centro do processo de ensino e aprendizagem; fato esse que coloca a compreensão do significado da assistência como o aspecto mais relevante em relação à aprendizagem e desenvolvimento do indivíduo.

É possível observar o quanto é importante para o processo de aprendizagem a compreensão da assistência nos dizeres de Vygotsky quando este afirma que “o aprendizado adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em movimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossíveis de acontecer” (1987, p. 101).

18 Tradução do capítulo de livro: CHAIKLIN, Seth. The zone of proximal development in Vygotsky’s analysis of learning and instruction. In: KOZULIN, A., GINDIS, B., AGEYEV, V. S.; MILLER, S.M. (orgs.), Vygotsky’s educational theory in cultural context. Cambridge University Press, 2003. Com autorização da Cambridge University Press.

Quando se trata de aprendizagem, angariamos nos estudos de Costa e Peres (2012, p. 6- 7) que sua elaboração se faz como um fenômeno ocorrido num evento que plaina um plano ainda mais efetivo, ou seja:

[...] se dá no plano psicológico envolvendo as funções mentais humanas, mas que sofre a influência dos processos social e cultural, com variados fatores que envolvem a história pessoal/coletiva de cada indivíduo, inclusive processos pedagógicos escolares (Grifo nosso).

Nos últimos dizeres dos autores é possível perceber a elevada importância que a organização do ensino tem para o processo de aprendizagem, reafirmando o papel do professor quanto à necessidade de compreender o significado da assistência na construção de conhecimento.

Por esse ângulo, Pereira (1996, p. 79), em consonância com as tessituras de Vygotsky, busca dentro da THC estabelecer a finalidade da aprendizagem escolar destacando que:

[...] desempenha um amplo papel – o de permitir a apropriação e interiorização dos conhecimentos históricos e socialmente acumulados e o de promover o desenvolvimento das funções psicológicas superiores que deem condições ao indivíduo de constituir-se enquanto sujeito, capaz de pensar e transformar a realidade por ele vivenciada.

Em síntese, o papel que a interação mediada desempenha na constituição dos processos de aprendizagem e do desenvolvimento das funções psicológicas superiores é um aspecto transformador do trabalho pedagógico que assume a humanização dos indivíduos a partir da apropriação e internalização dos saberes constituídos historicamente e culturalmente, perpassando por todas as situações interativas em uma sala de aula. Esse pensamento, em nosso entendimento, é o que diferencia essa perspectiva teórica de outras utilizadas na Educação.

Sobre a perspectiva teórica preconizada por Vygotsky, Martins (2016, p. 120) leciona que:

1. O processo de construção do conhecimento pressupõe a superação da síncrese pela mediação da análise, tendo em vista a formulação da síntese, condição para a formação dos ‘verdadeiros conceitos’.

2. À educação escolar compete, articulando forma e conteúdo, socializar os conhecimentos historicamente sistematizados ampliando o universo de significações, todavia, de significações calcadas naquilo que rege, objetivamente, a realidade concreta.

3. O trabalho pedagógico, pautado no ensino de conceitos científicos é mediação requerida à reprodução do concreto pela via do pensamento, é exigência para o alcance do pensamento abstrato e enriquecimento da consciência dos indivíduos.

Caminhando pelas estradas concretas das ideias de Martins (2013) notamos a relevância da ZDP para a formação de conceitos, uma vez que a compreensão de tal conceito nos orienta em relação ao papel do professor (enquanto mediador) e do estudante (enquanto sujeito ativo) no processo de ensino e aprendizagem.

Dessa maneira, o professor deve dentro do processo constituir-se numa autoridade que se manifesta por meio de sua responsabilidade nos processos de apropriação de conhecimento. Na esteira do que foi explanado, Garuti (1995, p. 102) propõe que:

[...] o valor das intervenções do professor, pois ficou evidenciado que sua participação no processo interativo é fundamental para que as interações sejam frutíferas como estratégias pedagógicas. Na tentativa de promover a construção do conjunto do conhecimento, é o professor que terá o papel de propiciar interações entre os alunos, mediando-as sempre que necessário, garantindo a cada parceiro a possibilidade de contribuir para o trabalho que está sendo partilhado.

Nesse sentido, um fator relevante para a Educação que é abordado com clareza pela THC diz respeito a imprescindibilidade da interação mediada entre o professor (sujeito historicamente constituído de um saber) e aluno (sujeito ativo em formação). É no reconhecimento da importância da mediação que o professor pode contemplar em seu planejamento as possibilidades de apropriação de determinado saber pelo educando.

4.2.4 Formação de Conceitos: entrelaces entre os conceitos espontâneos e os conceitos