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A DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO

No documento Mara Isa Battisti Raulino.pdf - Univali (páginas 130-152)

Material escrito no período de Agosto de 2004 a Dezembro de 2005

4.3 ARGUMENTOS CONTRA A PROPOSTA

4.3.3 A DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO

Maria Helena de Castro (Jornal O Estado de São Paulo – 23.01.2005 – Para especialista, projeto vai cria o neocorporativismo) indaga: “quem define que há necessidade social? Pelo projeto serão as corporações profissionais. Ou seja, estamos inaugurando, com o projeto do MEC, um neocorporativismo, que o Brasil está inventando para definir o que é demanda social”.

Seguindo este mesmo pensamento, Milton Linhares (Revista Ensino Superior – Out. 2004 – Ensino exige novo desenho) sustenta que:

Acho temerário. Quem vai decidir se uma cidade precisa ou não de mais um curso superior? Como ponderar se os já existentes atendem ou não satisfatoriamente a demanda? Penso que o critério da qualidade é insubstituível. Se a proposta para um novo curso for bem avaliada, é bom que seja autorizado, mesmo que seja num município onde já existam cursos idênticos. Um bom novo curso pode provocar os antigos a se reciclarem.

Magno de Aguiar Maranhão (Revista Ensino Superior – Out. 2004 – O controle do ensino superior) apresenta outro exemplo interessante:

O MEC deve-nos uma explicação por também vincular a autorização às

“reais necessidades” da região. Necessidade de quê? De profissionais x ou y? Vejamos o caso da saúde. A Organização Mundial de Saúde (OMS) não fixa a proporção ideal de médicos por habitantes, mas estima-se que um por mil seja o mínimo. Então, deveríamos abrir escolas de medicina em todo o Norte e Nordeste, com urgência em estados como Rondônia (0,43 médico/mil habitantes) ou Maranhão (0,38 médico/mil habitantes). Quem garante, porém, que os recém-formados não partiram de lá, em busca de melhores oportunidades? Ou o governo planeja instalar novos hospitais nesses locais, estimulando a permanência dos profissionais? Pois essa seria a melhor maneira de contemplar as “reais necessidades sociais”.

Democratizar a autorização de funcionamento para novos cursos no ensino de terceiro grau, promovendo mais agilidade na abertura de novas instituições, reduzir os custos e incentivar a proliferação de ofertas onde existe demanda, eis alguns dos pensamentos do Sistema Privado de Educação Superior.

conforme apresentado pelo Ministério da Educação. É o caso da discussão das cotas.

O Anteprojeto prevê que as universidades federais reservem, em cada processo seletivo, pelo menos metade das vagas a alunos oriundos de escolas públicas. As vagas seriam divididas entre negros, pardos e indígenas, na proporção da sua presença naquela unidade federativa, consoante os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

De acordo com Cyro Queiroz Fiúza (Revista Ensino Superior – Abr. 2005 – Choque com a realidade), “os dados mostram, por exemplo, que há um número significativo de egressos de escolas públicas nas universidades federais, ao contrário do que afirmam os defensores das cotas”.

O autor ressalta que foram avaliadas informações por amostragem perfazendo um total de 33.958 alunos matriculados no segundo semestre de 2003 e no primeiro semestre de 2004 em quarenta e sete instituições federais. Ana Maria Nogales (Revista Ensino Superior – Abr. 2005 – Choque com a realidade), professora de estatística da Universidade de Brasília (UnB) avaliou os números e questionou o mito de que apenas alunos ricos conseguem estudar em universidades gratuitas, pois 84,5% (oitenta e quatro vírgula cinco por cento) deles, têm renda familiar de até R$2.804,00; 60% (sessenta por cento) dependem de transporte público para chegar à instituição e apenas 19,7% (dezenove vírgula sete por cento) utilizam veículo próprio para chegar aos locais de estudo.

A pesquisa (Revista Ensino Superior – Abr. 2005 – Choque com a realidade) ainda mostrou de 65% (sessenta e cinco por cento) dos estudantes são de família com renda mensal entre R$207,00 e R$1.600,00, sendo que 42,8% (quarenta e dois vírgula oito por cento) têm renda familiar de até R$927,00. Ainda segundo a pesquisa 46,2% (quarenta e seis vírgula dois por cento) dos estudantes entrevistados chegaram à universidade depois de passar pelo ensino médio na rede pública, incluindo-se neste percentual os que fizeram todo o período nestas escolas ou apenas parcialmente.

De acordo com a revista Veja (26.01.05 – pgs. 46 – 57):

A inclusão do regime de cotas nas universidades públicas prevista no projeto do MEC é igualmente uma jogada para a platéia. O governo quer reservar 50% (cinqüenta por cento) das vagas nessas instituições a alunos vindos de escolas públicas, negros e indígenas. Da maneira como foi apresentada, a proposta pode até abrir espaço na universidade para pessoas que de outra maneira não conseguiram cursar o ensino superior. A experiência mundial em iniciativas deste tipo, porém, mostra que o mais lógico – mas, de novo, o mais difícil, complexo, anônimo e politicamente neutro e, por isso, pouco atraente para a militância – é universalizar o ensino básico e secundário gratuito de modo a dar chances iguais a quem quer tentar a aventura intelectual de cursar uma universidade de alto nível.

Este é um tópico que vem sendo discutido com exaustão. Na ótica da sociedade civil, em especial, das instituições privadas, uma política efetiva de inclusão deveria se dar pela melhoria do ensino básico e não, simplesmente, por facilitar o acesso à universidade de pessoas que, por uma ou outra razão, não conseguem ser classificadas nos exames vestibulares.

Consoante tal pensamento, o consultor educacional Leão Lobo (Jornal O Estado de São Paulo – 23.01.2005) assinala:

Num país onde um aluno universitário custa dez vezes mais que o ensino básico (a média do exterior é três vezes mais) a apresentação de um documento ignora a importância de uma boa gestão e denuncia, na verdade, uma estratégia política. O governo, no Brasil, abandona o ensino fundamental para investir no superior. É começar a casa pelo telhado. E por quê? Porque é no ensino superior que esta a pressão política organizada - o ensino médio não existe politicamente. A universidade é o segmento mais loquaz, mais visível. Essa atitude de ceder ao político e adiar o estratégico gera tais deformações.

Seguindo este mesmo pensamento, o ex-Ministro da Educação, Cristovam Buarque (Jornal Valor Econômico - 20.01.2005) ressalta “que é favorável às cotas, mas acha que elas devem ser mecanismos temporários e não constar de um projeto para durar décadas. As cotas devem ser usadas até que o ensino fundamental melhore de qualidade e permita o acesso indiscriminado”.

Gabriel Mário Rodrigues, Presidente da Associação das Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes) (Revista do Ensino Superior – Abr. 2005 – Começar pelo básico), evidencia que “tudo começa pelo básico. Não se pode pensar em reforma sem pensar em um ensino básico de qualidade para todos”.

Ali Kamel, (Jornal O Globo – 11.01.2005) assevera que “o Anteprojeto torna obrigatório à adoção de políticas de ação afirmativas e põe um fim à meritocracia.

Cria um programa de monitores, mas determina que os escolhidos não serão os melhores, mas os melhores entre os mais pobres”.

A preocupação com medidas de ações afirmativas é um ponto extremamente positivo. A sociedade civil entende que não há uma única solução para resolver tal conflito, pois desta forma não há espaço para a experimentação e a diversidade.

De acordo com Rogério L. Furquim Werneck (Jornal O Estado de São Paulo – 28.01.2005), “a presunção de que todo aluno de escola pública é pobre e todo aluno da escola privada é rico, é primitiva e infundada”.

Há outras formas de fazermos a inclusão social sem depreciar a qualidade do ensino e do mérito acadêmico. A Unicamp começou a fazê-lo em 2005 mediante um programa de ação afirmativa que não deixa de levar em conta a qualificação do estudante. José Tadeu Jorge, reitor da Unicamp (Jornal O Estado de São Paulo – 04.07.2005 – Reforma universitária e inclusão social) esclarece,

O programa da Unicamp, cujo princípio o governo paulista acaba de aplicar em seu sistema de faculdades tecnológicas, as Fatecs, consiste em atribuir um bônus de 30 pontos – numa média de 540 – ao vestibulando que tenha cursado todo o ensino médio em escola pública, e um bônus extra de 10 pontos aos candidatos autodeclarados negros ou indígenas que igualmente tenham vindo de escola pública.

O reitor enaltece que este bônus funciona como um critério de desempate, favorecendo o aluno da escola pública, num quadro de desempenhos equivalentes, mas cujas condições originárias apresentam-se desiguais.

O professor ainda ressalta que “encontrar formas apropriadas de realizar a inclusão social começa pela compreensão histórica das diferenças, mas pode ser também uma questão de método e de congruência”.

Há que se levar em consideração outro ponto: ao colocarmos em uma mesma sala estudantes aprovados com as melhores notas e alunos beneficiados pelas cotas, serão criadas condições para uma perigosa tensão que pode levar a um conflito no meio discente, independente da capacidade destes para acompanhar o curso.

Para que estes alunos pobres que estão tendo uma série de incentivos para que entrem no ensino superior possam manter-se nas instituições durante os seus estudos, outro questionamento precisa ser melhor esclarecido: o financiamento.

Gustavo Petta, Presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) (Jornal Correio Braziliense – 25.01.2005) ressalta que “a UNE defende a criação de um Plano Nacional de Assistência Estudantil, com garantia de recursos especificados no orçamento das universidades federais”.

A entidade também solicita a regulação e garantia de recurso para ampliação de moradias universitárias no sentido de vincular a democratização do acesso às condições de permanência.

Consoante tal pensamento, Hermes Figueiredo (Revista Ensino Superior – Abr. 2005 – Uma reforma democrática) sustenta que:

O Anteprojeto não trata de forma clara do financiamento de estudos de alunos carentes e das demais formas de apoio aos estudantes. É preciso abrir novos caminhos e de alguma forma articular políticas de apoio ao estudante economicamente carente com uma maior liberdade para estabelecimento de preços, com respeito à relação entre custos e qualidade de ensino.

Seguindo este mesmo pensamento, Roberto Cláudio Frota Bezerra (Revista Ensino Superior – Nov. 2004 – Os desafios da inclusão) esclarece que a proposta atual de promover a expansão com qualidade esbarra na exaustão do modelo atual se as condições econômicas do setor continuarem as mesmas. “Não vejo possibilidade de se pensar em política afirmativa e em política de inclusão social sem se pensar na base do financiamento, tanto estudantil quanto institucional. Do setor público, observa-se uma incapacidade de responder a qualquer pressão por expansão, tendo em vista toda a base do financiamento”.

Importante ressaltar que a defesa do processo de democratização da educação superior e da inclusão social, foram promovidas, na prática, pelas instituições particulares.

Hermes Figueiredo (Revista Ensino Superior – Mar. 2005) questiona “onde estariam hoje os milhões de estudantes que ingressaram, obtiveram a sua formação e os seus diplomas em instituições particulares de ensino privado?”. A grande

reclamação das instituições privadas é a de que o governo federal enaltece programas como, por exemplo, o Programa Universidade para Todos (ProUni), sem ressaltar que o mesmo jamais teria saído do papel sem não fosse pelo setor privado, hoje, o grande responsável por 80% (oitenta por cento) das matriculas no ensino superior, conforme ressaltado anteriormente.

Seguindo tal raciocínio, o texto Propostas do Fórum Nacional da Livre Iniciativa na Educação assevera que:

Investindo maciçamente e oferecendo cada vez mais aperfeiçoados, o setor privado é parceiro fundamental para a oferta de educação superior no país.

Prova disso é que, para promover a expansão das vagas por meio do ProUNi, o MEC recorreu ao setor, que mais uma vez demonstrou maturidade, equilíbrio e espírito público, respondendo ao chamado do governo.

O Programa Universidade para Todos prevê a concessão de bolsas integrais para alunos com renda familiar per capita de até 1,5 salário mínimo e bolsa parciais para famílias com renda per capita que não exceda a 3 salários mínimos, ou seja R$

525,00 e R$1.050,00 respectivamente. A preferência para bolsa do ProUni é para os alunos que fizeram todo o ensino médio em escolas públicas, bem como para os professores da rede pública que tenham interesse em cursar as licenciaturas ou pedagogia.

Pela Constituição Federal, as instituições filantrópicas já estão isentas de 50%

(cinqüenta por cento) do pagamento de impostos federais em troca de oferecer 20%

(vinte por cento) de sua receita em gratuidade, este seguimento do setor privado hoje, representa 50% (cinqüenta por cento).

Com o ProUNi estas instituições devem ampliar anualmente 20% (vinte por cento) da sua receita bruta em bolsas de estudo e assistência social em programas extracurriculares. As instituições sem fins lucrativos podem optar por aderir ou não ao programa. As que aderirem disponibilizarão 10% (dez por cento) de suas vagas em bolsas de estudo e ficam isentas do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, da Contribuição Social sobre Lucro Líquido, do PIS e COFINS.

Nem todo o setor privado despendeu apoio ao projeto. O advogado Sérgio Roberto Back (Revista Ensino Superior – Out. 2004 – Escolas apóiam MEC no ProUni) afirma que:

Atualmente, os recursos são recolhidos da quota patronal ficam com a própria instituição educacional, como compromisso desta de prestar serviços assistenciais à comunidade. Com isso, a população recebe atendimento especial em áreas nas quais o setor público ainda não conseguiu solucionar as carências. A intenção do governo é obrigar as instituições filantrópicas a aderirem ao programa deixando a condição de isentas e, dessa forma, passarem a recolher a contribuição social (quota patronal). Isso pode resultar na redução substancial de atendimento à pessoas carentes, já que o dinheiro que seria destinado à assistência social teria que ser redirecionado para o pagamento de tributos.

O autor ainda adverte “que o ensino pode sofrer grandes perdas se o conteúdo da medida provisória não sofrer importantes alterações”.

CONSIDERAÇÕES

O objetivo global deste estudo foi analisar o debate em torno da elaboração de uma política pública, no caso, uma política pública educacional (referente ao ensino superior). O que este debate nos revela em torno dos conteúdos e das ideologias de fundo foram as questões norteadoras deste estudo.

Para compreender este processo, fizemos não apenas o resgate histórico da evolução do ensino superior no Brasil e em Santa Catarina (trabalho comum em trabalhos sobre educação), mas também analisamos a bibliografia disponível que trata das políticas educacionais de ensino superior dos últimos dois governos (FHC e Lula). Fizemos tal análise sempre levando em consideração o caráter ideológico destes governos, fortemente “neoliberal” no caso do primeiro, e bastante contraditório no caso do segundo (neoliberal ou socialista?).

Na parte empírica do trabalho, descrevemos as três versões do Anteprojeto de Reforma Universitária apresentadas pelo Ministério da Educação, evidenciando as mudanças ocorridas no processo. E, finalmente, na parte final, identificamos os argumentos mobilizados pelos atores sociais para posicionar-se diante do projeto, seja na defesa e promoção do mesmo (tarefa do governo), seja na crítica ou na afirmação de interesses (tarefa dos setores ligados ao ensino privado).

Sob o aspecto do “conteúdo” do debate, os temas mobilizadores da discussão foram: 1) mercantilização da ação, 2) democratização da gestão e, 3) democratização do acesso.

Para o governo Lula, o ensino não é mercadoria, é um bem público. Este ressalta que a educação é um dever do Estado e não comporta a relação de consumo, pois retira do Estado a definição e gestão das políticas educacionais.

Outro aspecto que suscitou contínuos debates foi a democratização da gestão, cujo pensamento é o de incluir a participação da comunidade em um conselho denominado Conselho Social de Desenvolvimento, órgão consultivo incumbido de apresentar à instituição as demandas de diversos setores da comunidade para debater as suas finalidades e ações.

Ainda na visão do governo atual, há a previsão para as novas universidades federais (que venham a ser criadas após a aprovação da Reforma) a reserva de 50% (cinqüenta por cento) das vagas de todos os cursos de graduação para os alunos que tenham cursado o ensino médio em escola pública e uma subcota que deverá ser preenchida por negros e índios, proporcionalmente ao seu Estado.

Na ótica da sociedade civil, a Constituição Federal não deixa margem de dúvidas ao elencar que o ensino é livre à iniciativa privada. A sociedade civil (setor privado) assevera que a expansão se deu para suprir a demanda não satisfeita pelo setor público e esclarece que desempenha um papel primordial na qualificação da sociedade. Outra questão divergente foi a democratização da gestão. Na opinião de representantes do setor, esta cria uma interferência na gestão acadêmica e administrativa das instituições privadas, pois as submete ao controle da sociedade e à imposição de limites para a implementação de novos cursos sob a égide da

“necessidade social”. A questão das cotas evidenciou novas discussões. A sociedade civil entende que uma política efetiva de inclusão deveria contemplar o ensino fundamental e não utilizar mecanismos facilitadores de acesso à universidade para pessoas que, por uma razão ou outra, não conseguem ser classificadas nos exames vestibulares.

Porém, mais do que identificar o conteúdo do debate, importa agora esclarecer o “padrão ideológico”, ou seja, as visões de mundo e os interesses que permearam o debate.

A primeira observação que cabe fazer é que o rumo do debate foi dado pelo governo. Foi ele que construiu a agenda temática (e os pressupostos ideológicos) em torno da Reforma. Na verdade, a sociedade civil (setores empresariais e educacionais) não criou uma agenda alternativa. Apenas limitou-se a responder aos argumentos do governo sobre a mercantilização e democratização (da gestão e do acesso).

A segunda observação é que o Anteprojeto de Reforma Universitária do governo Lula revela que este governo não é amorfo do ponto de vista ideológico (pode até ser contraditório, mas ele possui um padrão ideológico). No caso da proposta de Reforma Universitária ficam claros os pressupostos ideológicos de esquerda que guiam sua visão da educação. Duas idéias ficam claras. A primeira é uma visão negativa sobre o mercado e o capitalismo consubstanciada na crítica ao

caráter “mercantilista” do ensino privado. A concepção do governo é claramente socialista, na medida em que advoga a idéia de que ensino é uma questão pública.

A segunda idéia está ligada à democratização, seja ela política ou social. Consoante sua visão democratizante (democracia direta ou participativa), o governo defende a participação social na gestão (entidades de sociedade civil) e, de acordo com sua visão igualitarista, defende que a universidade seja aberta para os “carentes” e os

“segmentos marginalizados” (alunos de escola pública, negros, índios, etc.).

Portanto, fica claro que o Anteprojeto de Reforma Universitária mostra que o Ministério da Educação é um dos setores mais fortemente “ideológicos” do governo Lula. Se o mesmo não se pode dizer da área econômica, o fato é que a política de ensino superior proposta revela pressupostos políticos explícitos.

Do lado da sociedade civil (especialmente dos setores ligados ao ensino privado) surpreende o fato de que a reação não foi contra-ideológica. Ao invés da proclamação da propriedade privada, do capitalismo e da defesa do mercado, o que se viu foi uma reação pragmática. O padrão pragmático dos setores privados mobilizou argumentos empíricos e práticos para contrapor-se ao governo. No caso da mercantilização, alegando que o governo não consegue atender a demanda, no caso da gestão democrática fatores de ordem legal e no caso da democratização do acesso defendendo a idéia de que o problema não é de acesso, mas de incentivo para a manutenção. É como se os setores empresariais tivessem escolhido jogar no terreno do governo, mas com argumentos práticos.

Portanto, do ponto de vista do padrão ideológico, o governo orientou-se claramente por uma visão de esquerda (fortemente socialista), enquanto os setores privados mantiveram uma atitude pragmática.

Além destas questões centrais, é importante destacar também alguns aspectos particulares, referentes ao conteúdo da proposta.

No decorrer deste estudo, verificou-se que o governo Luiz Inácio Lula da Silva segue um caminho distinto, pelo menos no que tange à Educação, de seu antecessor, o ex-presidente, Fernando Henrique Cardoso.

A opção pela iniciativa privada que se expandiu fortemente nos oito anos do governo de Fernando Henrique Cardoso é uma opção ideológica daquele governo,

como bem se apresentou a concepção ideológica do Presidente Lula pela universidade pública.

O atual governo acredita que a expansão do setor educacional privado compromete a educação de qualidade. Dessa forma, pretende expandir até 2010 o porcentual de matrículas do ensino superior em 40% (quarenta por cento), ampliando assim a participação do ensino público.

O objetivo principal do governo Lula com a Reforma Universitária é ampliar o acesso de cidadãos à universidade pública, em especial em regiões que careçam de escolas superiores, interiorizando as ofertas e desregulamentando o que o governo entende como mercantilização do ensino, que retirou do Estado o protagonismo das políticas públicas educacionais nos últimos anos. Um outro objetivo fortemente apresentado foi a questão da qualidade.

O ensino privado deu a sua resposta concordando com o governo atual na preocupação com a qualidade do ensino e assegurou que não é o ensino privado, por si só, que não possui qualidade, e reiterou ao governo uma maior fiscalização em todos os níveis de ensino, pois assegura que se quisermos qualidade no ensino superior, as mudanças devem focalizar os ensinos médio e fundamental, começando com uma boa base.

No decorrer destes vários meses de debates, muitos foram os pontos que receberam críticas e sugestões da sociedade, entre os pontos mais conflitantes destacam-se: a criação do Conselho Comunitário Social, que propunha ser organizado dentro das universidades e seria formado por representantes da sociedade civil, da própria instituição e da administração pública, para supervisionar as atividades da entidade.

Outro ponto que suscitou muitas críticas foi a reserva de cotas (50% - cinqüenta por cento), em universidades federais para alunos da rede pública, com proporção mínima para negros, pardos, indígenas, na proporção da população de cada estado. Um terceiro item foi a questão da eleição do reitor e do vice-reitor nas instituições federais. A eleição deveria ocorrer na comunidade universitária, já as universidades e os centros universitários privados deveriam contar com pelo menos um dirigente, no nível de pró-reitor, eleito diretamente pela comunidade.

No documento Mara Isa Battisti Raulino.pdf - Univali (páginas 130-152)